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Luz e Escuridão: Parte I - ESCURIDÃO

(Crônica vencedora do concurso AVENTURABR)

ESTE CONTO É BASEADO EM ALGUMAS QUESTÕES E CONFLITOS EXPOSTOS NO LIVRO "LONGE DA ÁRVORE" DE ANDREW SOLOMON (NO VÍDEO ALGO SOBRE ESTE ADMIRÁVEL LIVRO).

A escuridão não me prende. Eu que me prendo nela.

Klebson Pinheiro

Lucas ouvia histórias sobre a luz, as nuvens, as cores, o céu e sabia que por mais forte que fosse sua imaginação jamais chegaria perto do que eram aquelas coisas. Vivia em outra dimensão, em outra realidade, vivia na escuridão. Seu refúgio era o breu, lá ele não se sentia pressionado, lá a luz não fazia sentido. O saber sobre a luz trazia angústia e ele sentia-se menor. "Seria melhor não saber? Eu seria mais feliz?" "Eu teria ideia da existência da luz se todos fossem cegos?"

Todos os dias ele tinha que superar os obstáculos de viver no mundo das pessoas que enxergam. "Está condenado". Diziam os sussurros dos vultos que imaginava. Como vencer a escuridão? Era a dúvida que na infância se consolidou.

As pessoas tinham pena de Lucas, consideravam um tormento o fato de ele ser cego. O maior desejo de sua mãe e amigos era que o menino, por um milagre, adquirisse visão. Isso consumia Lucas. Não queria ver, gostava do sentir. O diferente sempre é anormal? Refletia em suas horas solitárias. Percebeu que seu problema não era a escuridão, mas sim a vontade alheia. Mesmo jovem compreendeu quando alguém na televisão citou Sartre:

"O inferno são os outros."

Um dos maiores mistérios de sua vida era o mesmo de seus colegas ditos normais. O que são as mulheres? Era a pergunta encravada em sua mente juvenil. De certa maneira à busca pela resposta dava sentido a sua vida. Conquistar uma garota provaria que a cegueira não o diminuía apenas o diferenciava. Então seu objetivo de vida se tornou: beijar uma menina. Um sonho intangível. Conseguir se aproximar sem tremer nas bases já era um desafio, imagina conseguir um beijo. Do beijo migrar para ficarem nus e então prosseguir para o ato mítico que os gemidos dos filmes mostravam, nossa que absurdo. "Como alguém consegue isso?" "Conquistar uma mulher é uma arte". O rosto espinhento, cheio de pus, o bigode recém-estabelecido e o cabelo despenteado não colaboravam em nada para concluir o objetivo mirabolante. Na época ele sabia do efeito negativo das espinhas, e até mesmo sobre o cabelo, mas convenhamos, estourar espinhas e pentear o cabelo são tarefas intrincadas. Em relação ao bigode tinha algumas dúvidas e por isso deixava sobre seus lábios aqueles pelos finos e espaçados. "Bigode é coisa de homem". "As mulheres adoram um bigodudo." "Agora você é um homem." Era o que familiares lhe diziam.

O desejo de conquistar uma bela donzela era seu combustível, foi assim que conquistou um pouco de independência, provando que podia fazer quase tudo que os que enxergam fazem.

O seu único amigo na escola, Gustavo, que se dizia um mestre da conquista, havia lhe dito que o básico para "pegar" uma garota, ou várias, era conseguir ficar distante, não se importar, fingir que as mulheres não são grande coisa. "Tentar acreditar nisso é crucial para diminuir o medo", dizia Gustavo. Em teoria parecia fácil, mas era só Lucas se lembrar da pele lisa como seda, do cheiro e maciez dos cabelos, da fala delicada e da atitude firme de quem sabe que é desejada, que tudo escoava para a caverna escura da solidão. As mulheres possuíam um poder assombroso sobre Lucas e o pior é que ele não conseguia disfarçar sua insegurança. "Elas percebem tudo". "Elas sabem ler pensamentos". "Elas dominam o mundo".

A principal teoria de Lucas sobre a arte da conquista era de que as garotas gostavam de homens que impunham respeito. "Caras ridículos conseguem ter namoradas porque de alguma forma conquistaram o respeito dos outros." Explicava ele para Gustavo. "Veja o retardado do Josefo, não sei como, conseguiu beijar a Tâmila. Pensava que as meninas não gostassem de babacas, mas não é bem assim. Josefo é especialista em aplicar chá de cueca em caras como eu, sabe meter bicudas, tropeções, distribuir pancadas e xingamentos. Por isso e outras imbecilidades é respeitado. As pessoas riem dessas coisas, incentivam. Gostam de ver os palhaços sendo ridicularizados. Por esses belos feitos o Josefo foi premiado ficando com a Tâmila. Não estão namorando, mas os lábios dela tocaram os dele. Algo miraculoso para mim. Vai entender."

Ser respeitado, outro ponto bastante complicado para um adolescente, e pior ainda para um que seja cego. Não era a toa que Lucas ficava isolado em um canto na hora do recreio, que se sentava na primeira fileira da sala, que quase não falava com ninguém, que era o último a conseguir sair do colégio, que ouvia piadinhas sobre sua condição todo dia e que principalmente não conseguia nem puxar assunto com uma garota.

O maior medo de Lucas era uma menina chamada Jennifer. Só o nome de mocinha de romance americano fazia arrepiar cada pelo do seu corpo. Se estivesse andando na rua e percebesse a presença dela, o desejo de se esconder vinha com força, e para um cego se esconder pode ser constrangedor. Trocar palavras com Jennifer sem parecer o cara mais estranho do mundo era uma missão impossível. Qualquer mulher bonita, aos sentidos dele, era como se fosse uma loba: hipnotizante, apaixonante, mas também maquiavélica e indomável. Como domesticar e se proteger dessas feras sem ter nem ao mesmo um pedaço de pau, uma tocha, uma focinheira, um rifle, ou até mesmo visão?

Filho único de mãe solteira, com pouco dinheiro, poucos recursos, poucos amigos, sem namorada e cego de nascença. Esse poderia ser o status de Lucas nas redes sociais, caso ele tivesse um surto de sinceridade exagerada. Porém, por incrível que pareça não era bem assim que o garoto se enxergava, pois considerava sua vida boa, podendo vir a ser ótima no futuro. Sim, ele era um otimista, não se sabe por quê. Acho que nasceu com esse temperamento. Sabia que sua "luz" viria assim que conquistasse uma menina.

Jennifer era sua colega desde dos oito anos, porém, ele sempre teve receio dela. Medo de sua beleza. A beleza para um cego não é exatamente a mesma para alguém que enxerga. Na escuridão aspectos de uma pessoa como o cheiro, a tessitura da voz, a maciez da pele e algo mais subjetivo como a energia são mais valorizados. Pelos comentários dos colegas ele sabia que tanto para os cegos quanto para os que enxergam Jennifer era bela.

Graças à tia Luzia, sua amável professora, e suas atividades para incluí-lo ele tinha uma melhor noção do aspecto físico de seus colegas. A dedicada docente havia incutido uma forma de apresentação e interação entre alunos diferenciada. Sempre que iniciava-se um ano todas as classes faziam o exercício, não era voltado só para Lucas. Os alunos eram vendados e recebiam uma folha de papel em branco colada nas costas. Seguia-se então encontros às cegas onde a pessoa tinha que dizer o nome, tatear a face e escrever na folha das costas uma característica física ou psicológica da outra. Lucas apaixonou-se na primeira vez que tocou o rosto de Jennifer, ouviu sua respiração e sentiu de perto o leve cheiro de shampoo de seus cabelos. Todo ano ele esperava por aquele momento de interação na escola, ficar pelo menos um instante mais próximo dela, era bom. Os professores recolhiam as folhas e claro não liam todas as características inseridas, pois sempre estavam presentes algumas piadas indevidas. Para Jennifer as características mais citadas eram: linda, delicada, inteligente, tímida, simpática, alta e misteriosa. Para Lucas, oficialmente, o que vinha era: tímido, persistente, engraçado (ele considerava esse engraçado como sinônimo de desengonçado ou atrapalhado), alto e magro. Não oficialmente o que vinha era: cegueta, morcegão, Batman, trouxa, feio, idiota, bigodudo, espinhento, nerd e bicha. Anos depois de tocar a face de Jennifer e se apaixonar, Lucas tentou colocar em palavras os sentimentos daquele dia. Deixou relatos no seu diário.

Medo. Um sentimento talvez tão importante quanto o amor. O medo reprime ou faz agir, depende do momento. Com o amor é a mesma coisa. Medo e amor são da mesma família, não são maus ou bons, são complexos. Arrisco dizer que esses dois sentimentos são a base que constituí Deus.

Eu gosto de sentir medo. Ele me intriga. Eu gosto de amar, pois me faz querer viver. Acho que é nesse ponto que o amor e o medo se chocam. O amor é a base de uma vida que vale a pena. Pelo menos é o que eu penso. Surge então o grande medo. Aquele que todos nós, ou quase todos, pois exceções sempre existem, temos. O medo da morte. Saber que vamos morrer é aterrador. Para mim o único medo que supera o da própria morte é o medo da morte de alguém próximo. Isso porque é a morte do amor, do ser amado. Ou seja, sem amor não existe medo.

E se a morte não existisse? É de se pensar que o medo também pudesse não existir. Sem medo como seria o amor? Sem a morte como seria a vida? Morte, amor e medo. Precisamos de todos, pois é a mistura desses ingredientes que dá sabor a nossas vidas. Deus é amor. Medo é o demo. Um completa o outro e se unem na morte. Seria isso?

Penso nessas questões quando lembro do dia que me descobri amando pela primeira vez. O que eu sentia no peito era a mistura de medo e desejo, o que resulta no que chamo de amor. Para dar uma classificação mais exata: amor de paixão. Amor é algo tão maluco, trata-se de muitos sentimentos simultâneos. É confuso. Mas foi o que eu senti quando toquei a face de Jennifer.

Linda de morrer. Expressão certa para vocês entenderem como ela era fisicamente. Pena que chegar perto dela sem deixar transparecer minha panaquice era algo impossível. Pelo menos foi por um longo tempo. Se um dia Jennifer parar de existir, sei que não terei mais medo de morrer. Isso é amor. Agora eu entendi.

Seu objetivo ficou mais específico, tinha que conquistar Jennifer. Pelo menos se ela pudesse ler o que ele escrevia, sentir o que ele sentia, saber que o mundo dele mesmo escuro tinha beleza.

Naquela cidade, no seu dia a dia, Lucas enfrentava alguns despreparos dos cidadãos. Muitos falavam com ele gritando, como se a cegueira levasse a surdez, não sei dá onde tiravam essas conclusões, outros achavam que ele era um ser místico e poderoso que ouvia e sentia cheiros como um lobo, para fechar ainda tinham aqueles que achavam que ele teria algum retardo mental, pois falavam pausadamente e explicavam as coisas como para debilóides. Anos e anos se passaram, mas essas idiotices sempre estiveram presentes. Mas o que Jennifer achava de tudo aquilo? O que ela sabia sobre ele? Pobre coitado. É isso que ela deve pensar, dizia ele no escuro de seu quarto.

Certo dia durante um almoço surgiu à ideia, um plano de conquista. O cheiro do purê de batata estava ótimo, uma brisa gostosa vinha da janela e espantava o zum zum das moscas que se interessavam pelo seu prato.

"Sabe o professor Truta?" Disse dona Jacira, a amiga de sua mãe que sempre filava boia por lá.

"Sei, aquele que se mudou faz pouco tempo."

"Dizem que veio fugido, tinha quatro mulheres ao mesmo tempo. É um cafajeste de marca maior."

"Esses músicos são sempre assim."

"Toca violão como ninguém, está dando aulas e por estranho que pareça ele só atende durante a noite."

"Deve ser para seduzir alunas."

"Espalhou pela cidade que atende sempre a meia noite, quantas pessoas aparecerem."

"Nossa! Que coisa estranha."

"Pior ainda, ele mora no fim da cidade, em um bairro com casas ainda vazias."

Neste instante Lucas se lembrou de uma frase inesquecível que por acaso ouviu sua musa dizer em meio ao recreio. "Eu adoro MPB, tenho uma queda por Tom Jobim." A sentença era emblemática, pois aquilo comprovava que Jennifer era diferente das outras, divergia do normal, assim como ele, afinal o que as outras gostavam era de Justim Bieber. Também foi chocante por mostrar que ela gostava das mesmas músicas que ele. Tudo pareceu ser coisa do destino, pois agora todo o tempo que ele passava ouvindo música ao invés da televisão tinha mais sentido. Na sua mente entorpecida pelas fofocas da mesa veio seu plano: aprender violão.

A empreitada seria difícil, teria de cruzar a cidade durante a noite, sem contar e nem ser visto por sua mãe. Chegar até o tal de Truta e implorar que lhe ensinasse. A aventura da conquista de um amor dependia de enfrentar a cidade noturna e ainda por cima o esforço de praticar um instrumento. O velho violão, a única lembrança que seu pai havia lhe deixado, teria de ser reativado.

Ainda no mesmo almoço, não aguentou e pegou a mãe de surpresa.

"Mãe, o pai um dia vem buscar o violão?"

O tilintar do talher caindo soou tenso. O silêncio constrangedor foi curto, mas notável.

"Não, com certeza não. O violão é seu. Ele nunca vai voltar, não faz o tipo dele."

Mais algumas colheres de arroz e feijão e Lucas voltou a questionar.

"Ele tocava bem?"

O soco na mesa assustou Lucas. O som da cadeira caindo e dos passos da mãe se recolhendo foram como limão em um ferida.

"Isso é pergunta que se faça menino?" Disse dona Jacira enquanto saía para reconfortar a pobre mulher abandonada.

Lucas sabia que não devia, mas sorriu. Aquilo tudo respondeu dúvidas antigas.

Na terça-feira quase na madrugada, destemido saiu pela janela do quarto. Com perícia e o auxílio de sua bengala caminhou até o ponto de ônibus. Até ali era parecido com o trajeto da escola. Naquele horário as ruas eram vazias, era melhor para andar e pegar o ônibus. O trajeto até a casa do professor estava estimado em cerca de uma hora. Lucas sentiu-se livre para suas divagações filosóficas, independente como nunca.

"As loucuras que nos levam ao sucesso." Falou baixinho para si mesmo.

Gostou do clima, uma tranquilidade fluía no vento, todos pareciam dormir, isso deixou-o mais calmo, tinha a certeza que não seria incomodado, sentia o tempo livre para pensar mais sobre a vida, seu destino, e suas milhões de dúvidas.

Desceu no ponto próximo onde Gustavo lhe informara ser a casa do professor. Andou alguns quarteirões tateando a rua com seu bastão de Hoover. Ouviu burburinhos que vinham de bares; sentiu a variação do piso da calçada; os diferentes tipos de muros e grades; os cheiros de hot dogs, cerveja, urina; e quando o bastão bateu em uma cerca metálica fazendo o som de uma nota tilintar, ele soube que havia chegado. Por instinto e pela contagem de casas. Bateu palmas inúmeras vezes, mas não recebeu resposta. Encostou de leve no portão e percebeu que estava aberto. Entrou, perdeu-se no pequeno jardim, caiu sobre uma roseira espinhosa, seu coração se afligiu, trombou em vasos de cerâmica e no que parecia ser uma bicicleta. Meia hora depois de sofrimento chegou até a porta de entrada, que estranhamente também estava aberta. Estava engatinhando, pois sentiu-se mais seguro assim, foi entrando sorrateiramente, lacrimejando de angústia e temor. "Alguém em casa?" Perguntou timidamente. O chute no estomago fez o corpo inteiro levitar por um breve momento.

"Seu filho de uma puta, tá pensando o quê?"

Lucas em pânico sentido cheiro de cerveja balbuciou:

"Calma! Acho que errei de casa."

"Errou o caralho. Levanta e vaza antes que eu chame a polícia. Vaza e não volta."

Lucas desnorteado não conseguia achar um apoio para levantar-se, ficou rodeando no chão com as mãos trêmulas.

"O que foi, você é retardado?"

Lucas chorando se virou em direção à voz que lhe ofendia.

"Eu sou cego."

Truta ficou desconsolado, não podia acreditar. Ajudou o menino a se recompor, jogou a lata de cerveja no lixo e ouviu as explicações do infeliz. A casa era muito simples e Truta não se ligava em segurança, deixava tudo aberto para facilitar a entrada dos alunos.

"Olha garoto, aqui não tem regras, a galera chega e eu ensino. Mas achei que você era algum doido, tava dormindo, acordei pra tomar uma birita e reparei nos barulhos de alguém no jardim, quebrando tudo. Foi mau. Achei que era um drogado maluco. Fica sussa, vem quando quiser, estarei à disposição. Devido esse inconveniente, suas três primeiras aulas são gratuitas. Ok?"

Aquela estranha negociação funcionou. Dois estranhos em noites tranquilas na pacata cidade tocando violão, meses e meses. Truta não fazia questionamentos, só ensinava e pedia o dinheiro. Lucas usava toda sua mesada e treinava obcecado. Sua mãe achava estranho e um pouco ofensivo o uso do violão herdado do pai.

Certo dia Truta mudou seu método de ensino. Após um longo gole de cerveja explicou para Lucas.

"Olhe garoto, você tá indo bem, mas nesse momento não precisa mais de mim, tem que seguir sozinho por um tempo. Só volte aqui quando tiver conseguido tocar com perfeição essa bendita música do Tom. Vou ficar aqui no aguardo." A voz de bêbado estava mais forte e aquilo irritou Lucas.

"Como assim? Preciso de você."

"Nesse momento não precisa não. Tem que seguir sozinho. É meu método. Também não estou em um momento bom, preciso de paz."

"Beleza então! Volto se conseguir."

"Isso, vai nessa, confio em você."

O cegueta foi embora com os ombros curvados, quando cruzou o portão Truta sorriu e deitou-se cansado no sofá.

Exatamente um mês depois Lucas voltou e as portas estavam abertas como sempre, e para variar Truta não ouviu as palmas. Naquele dia o notívago mestre do violão havia adormecido no sofá enquanto assistia televisão. Com essa programação ruim não tem quem não durma. Pensou Lucas. Tateando os móveis da pequena casa foi seguindo o som da respiração forte do professor. Ajoelhou ao lado do sofá e ficou parado em frente ao homem, passou a mão por cima do corpo até sentir o calor que saia das narinas. Não tocou na face de Truta, apenas queria sentir o amigo. Quem olhasse a cena acharia estranho e juraria que o garoto estava enxergando, pois os olhos pareciam encarar o rosto barbado do jovem professor. De repente, os olhos de Truta abriram e um grito de horror ecoou.

"Haaaaa!"

"Calma Truta! Sou eu o Lucas."

"Caralho Lucas! Precisava ficar me olhando desse jeito?"

"Eu não estava olhando nada."

Truta se aprumou no sofá, esfregou as mãos no rosto e ficou observando o cegueta se localizar na sala e achar a cadeira em que sempre sentava. Depois que Lucas se sentou Truta começou a gargalhar. Lucas acompanhou a risada, mas de forma tímida.

"Beleza, vamos ao que interessa? Chega de pegadinha."

"Ok, vamos nessa."

"Pegue o violão ao seu lado e bora tocar a música de estudo."

Lucas todo cuidadoso pegou o violão, parecia estar enxergando tudo a sua volta. Dobrou as pernas, como faria uma mulher de saia e ajeitou o violão no colo. Sentiu as cordas, a madeira. Fez o acorde mi maior para verificar a afinação. Ele adorava o som daquele acorde, era denso e ao mesmo tempo amplo. Sentiu que a afinação não estava perfeita, afinou dando leves apertos no botão que esticava a corda de nylon mais fina, a chamada mizinho. Preparou o primeiro acorde, era daqueles cabeludos, constantes na bossa nova. Foi iniciar, mas os dedos estavam frouxos, o acorde saiu fraco, pouco envolvente. Pediu desculpa e tentou novamente. A gostosa levada da bossa surgiu, um som melancólico, lindo de arder o coração. O dedilhado iniciou a melodia, era "Insensatez" de Tom e Vinícius. A levada era perfeita, o som era nítido, não tracejava e havia emoção. Dava vontade de sair flutuando pela sala. Não parecia que era apenas um garoto tocando, pareciam vários. Truta estava relaxado no sofá e os olhos lacrimejavam. Quando a música terminou foi como se os dois tivessem se entreolhado, sorriram juntos.

"Isso é arte, pura arte!" Exclamou o entusiasmado professor.

"Você disse que não tem namorada. Certo? Comece a tocar assim por aí e não vai ter só uma. Se eu fosse uma boazuda dava pra você agora."

Gargalharam, Lucas tentou evitar, mas sua risada foi sonora, quase um desabafo.

"Lucas, como você chegou nesse nível tão rápido? Isso não é normal meu garoto. Verdade."

Lucas com a voz baixa respondeu:

"Eu gosto de tocar. Quando eu toco é como se todos fossem cegos. É como se o mundo mudasse. Ouvir música no escuro é bom pra todo mundo, não é? Gosto da sensação e por isso sou capaz de ficar quase o dia inteiro dedilhando essas cordas." O professor pensou no ditado: a prática leva a perfeição.

Obs: Quem curtiu levanta a mão e toca na estrelinha.

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