Luz da Noite - 5
Passaram-se quase três meses. Eu estava diferente de como havia chegado - havia ganho um pouco de peso, o suficiente para não parecer mais uma subnutrida, mas continuava muito magra. Não que a comida do orfanato fosse ruim, mas não tinha tanto apetite e tampouco estava acostumada à aqueles tipos de comida. Fruta era o que eu mais amava (na selva era o que mais comia) e era o que menos serviam. Insistiam em prender o meu cabelo, e eu insistia em mantê-lo solto. Naquele meio tempo, entretanto, as perguntas seguiam na minha cabeça: Onde estava papai? Estava bem? Sentia a minha falta tanto quanto eu sentia a falta dele? Estava à minha procura ou havia desistido? Iria um dia em busca de uma nova filha assim como eu fui em busca de novos pais? Bom, na verdade não fui em busca de nada, apenas disse "sim" quando me disseram que eu seria posta para adoção. E tive a sorte de ser escolhida por um casal de americanos e que viviam em uma cidade, segundo me disseram, lotada de parques de diversões. Eu nem sabia o que era um parque de diversão.
Estava prestes a fazer a minha primeira viagem longa e provavelmente a mais longa que faria na vida, e não sabia. John e Amy viriam me buscar não em Gana mas na África do Sul, em Joanesburgo, há quase quinze horas de distância. De Joanesburgo, pegaríamos um voo de quase vinte cinco horas para Miami, com escala em Madrid. De Miami, pegaríamos a estrada para finalmente chegarmos ao destino final. Era tempo suficiente para estabelecermos algum vínculo antes de eu ser apresentada ao meu novo lar e ao meu irmão. Também era tempo suficiente para eu me encher de vez de ficar trancada dentro de um avião. Mas desta vez, não seria tão ruim. Depois de encarar o longo trajeto de Acra para Joanesburgo, eu me encontraria com os meus novos pais. Para que não fosse um trajeto tão exaustivo para uma criança de oito anos recém adotada, passaríamos um dia em Joanesburgo para então pegarmos o voo para os Estados Unidos. No dia da viagem, tomei meu banho mais caprichado e me deram roupas novas – uma calça cor creme e uma blusa de malha verde escura. Elas haviam sido enviadas pelos Hamptons. Quando as recebi, me lembrei que certa vez haviam me perguntado qual era a minha cor favorita. Respondi verde.
No avião, sentada ao meu lado, minha acompanhante era uma mulher britânica de trinta e poucos anos chamada Katie. Embora tivesse gostado da cor da blusa, não resisti e me queixei dizendo "Pinica". Ela apenas sorriu e disse "Você vai se acostumar, assim como se acostumou aos sapatos." Ela me aconselhou a colocar o cabelo atrás da orelha, para que os meus novos pais pudessem ver melhor o meu rosto.
Não o fiz. Chegando ao aeroporto, o Sr. e a Sra. Hampton me esperavam de pé em uma salinha vip com uma salamandra de pelúcia, toda colorida. Acho que o fato de eles estarem de pé significava que estavam ansiosos demais para esperarem sentados. Pareciam estar mais nervosos do que eu, isso era certo, e acima de tudo, emocionados.
Mais tarde, John e Amy me contaram que tinham a consciência de que era aconselhável que não fossem com muita sede ao pote quando me vissem, o que significava não me encher de beijos e abraços logo no primeiro instante. Eu por outro lado, tinha sido instruída pela minha acompanhante a cumprimentar meus novos pais com um abraço e não me esquecer de dizer "obrigada" se me dessem algo. Eles se aproximaram devagar enquanto Katie me incentivava a ir ao encontro deles, mantendo a mão de leve em minhas costas. Enquanto a expressão de John e Amy era quase indescritível, a minha era séria.
– Veja Satsuki, são sua mãe e seu pai – apontou Katie, com aquele sotaque estranho e pronunciando meu nome errado pela décima vez. – Cumprimente.
Como eu não disse nada, Katie levantou o olhar para John e Amy e se apresentou. Eles responderam e sua atenção voltou imediatamente para mim. Segurando a salamandra de pelúcia, John se abaixou para me cumprimentar seguido de Amy.
– Olá, Satsuki – sussurrou, pronunciando meu nome com perfeição. Isso me tranquilizou e me deixou feliz imediatamente, de modo que esbocei um leve sorriso.
– Olá – disse Amy em seguida, e assim como John, parecia estar emocionada demais para deixar sair muitas palavras. John me mostrou a salamandra.
– Isso é pra você.
Estava tímida demais para me lembrar de agradecer. Entretanto, me lembrei do abraço, o que já era uma forma de agradecer. Dei um breve abraço em papai e em seguida em mamãe. Naquele momento, seus olhos se encheram de lágrimas.
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