Luz da Noite -14
Mais rápido do que eu esperava, chegam as férias de verão. Comecei a pensar no ano que vem: eu estaria no último ano de ensino médio... e meu último ano com Steven como meu professor.
Mas talvez naquele ano nos tornássemos algo além de aluna e professor.
Não, estou brincando. Sabia que era impossível termos algo enquanto fossemos aluna e professor. O que eu ia fazer durante aquele ano, era me preparar para o depois.
E sabia que a espera me mataria. As férias sim tinham suas vantagens. Sem precisar acordar cedo de segunda à sexta, sem provas, sem lição de casa, sem Vivianne... e o lado ruim, sem Steven. Entretanto...
Era final de julho. A ideia de ver Steven nas férias e em um lugar que não era o colégio me animava muito, e não quis esperar para contar ao Jamie.
– Tenho notícias excelentes – falei alegre, quase eufórica, colocando o computador sobre a cama e sentando-me. – Vai ter na semana que vem uma exposição de arte que a escola ajudou a organizar... e Steven vai se encarregar de conseguir convites para alguns alunos que estiverem interessados. Ele vai me ver e sem uniforme. Isso não é... ótimo?
– Sem uniforme, Satsuki? Você vai pelada? Vai conquistar o cara, mas vai se meter em problemas.
– Muito engraçado. Bom, vou desligar, preciso decidir qual roupa vou usar. Ah não, espera. Você tinha algo para contar sobre Jessica...
Jamie compartilhou que andava preocupado mais do que nunca com o passado de Jessica, que continha algumas atitudes preocupantes em relação à relacionamentos. Jamie se preocupava apesar de não haver nenhum motivo aparente para se preocupar no presente. Minha resposta para ele foi que o tempo iria dizer... mas que se Jessica tem um histórico problemático, ele não deveria ignorar isso. Quando terminamos de falar sobre Jessica, resolvi checar os meus e-mails enquanto Jamie ainda estava na linha e me manifestei imediatamente.
– Oba, ele respondeu.
Eu tinha o e-mail do Steven. De vez em quando o escrevia, quando me surgia alguma desculpa, e claro, eram sempre assuntos relacionados à escola. Ele costumava responder, às vezes levava horas, às vezes dias, mas respondia. Ontem, pedi detalhes sobre o evento e não achei que ele fosse responder, e embora fosse um assunto sem graça e no geral sem importância, adorava a simples ideia de falar com ele fora da escola.
– E? – quis saber Jamie.
– Curto e seco. Como sempre.
As respostas do Steven seguiam um padrão... que ele não seguia de propósito, mas machucava. Ele podia dar respostas mais entusiasmadas e menos breves... mas não. Seria por falta de tempo ou falta de vontade? Apesar de não serem os tipos de respostas que eu queria, fazia toda vez um esforço para não responder na hora - primeiro porque sabia que se ele era escasso, eu também precisava ser. Segundo, eu estudava cada palavra antes de usar. Precisava. E realmente, não importava o padrão que as respostas tinham, eu não ficava menos alegre quando abria a minha caixa de mensagens e via que tinha um e-mail dele. Acabei compartilhando com Vivianne como, apesar de todas as decepções, a experiência de gostar de alguém, ter esse sentimento dentro de você, era a melhor coisa que já tinha me acontecido.
– Sentir isso... eu juro que não consigo pensar em nada melhor. É divertido, é tão divertido. E eu penso, se é assim o simples fato de gostar... como deve ser ser correspondido? Isso... isso eu não consigo nem imaginar.
Naquele momento eu estava expressando os meus sentimentos de forma muita entusiasmada. Na expressão de Vivianne, entretanto, havia uma dor contida. Ela já tinha passado por algo parecido. Mas não podia compartilhar nada comigo.
– E você está animada para o evento, Satsuki?
– Estou.
– Não se esqueça de ir preparada. Mantenha uma boa pose. Tudo bem... terminamos por hoje.
No dia do evento, não fiquei nervosa como achei que ficaria. Estava mais animada que nervosa. Queria, depois de tanto tempo sem vê-lo, causar impacto. Fui ao closet de Amy e peguei o vestido rosa-claro que eu não adorava mas queria sair do convencional – isso significava usar cores e tons que eu não costumava usar... e além do mais, era uma exposição de arte. Não seria apropriado ir de jeans. Já em meu quarto, em frente ao espelho, penteava o meu cabelo sem parar mesmo sabendo que não era necessário – com um cabelo tão liso como o meu, não havia muito segredo. Coloquei um pouco de maquiagem também. Só um pouco porque não tinha jeito e nem paciência e era um evento diurno. Nos pés, seria legal colocar um salto e a ocasião pedia... mas não estava acostumava e sabia que iria ter que passar muito tempo em pé. Mesmo sendo sábado, isso não significava que John tinha mais tempo livre, já que trabalhava todos os dias menos aos domingos, mas isso não o impediu de me dar uma carona, até porque, o evento era no Centro, perto de onde morávamos.
Sabia que existia a possibilidade de Steven aparecer naquele evento acompanhado de Hana (não precisava que Vivianne ficasse me lembrando). Estava curiosa para descobrir e já preparei o meu emocional caso a resposta fosse sim. Pelo menos, eu ia poder vê-lo nas férias e fora do colégio, algo que não imaginei que seria possível. Entretanto, ao mesmo tempo em que estava animada em vê-lo... parte de mim não estava tão animada assim, pois estava, um pouco, chateada com ele. Mais ou menos um mês antes de as férias começarem, me aproximei da mesa dele e perguntei se não haveriam exercícios extras que ele poderia me passar. Ele ficou surpreso, e disse que sim, que havia uma lista de exercícios que ele poderia mandar... e não os mandara até hoje.
Pedindo lição de casa extra para as férias, eu estava tentando mostrar que era boa aluna e que me interessava a matéria. Aparentemente, isso não causou em Steven o efeito que deveria causar. Quando o comentei com Jamie, ele simplesmente disse "Não leve à mal, ele é velho, deve ter esquecido"... aproveitando para fazer uma piadinha.
Eu sabia que não era por falta de memória, digo, sabia que isso não era a raiz. A raiz era falta de interesse, o que causava a falta de memória. Eu já havia cobrado os exercícios antes.
Fui uma das primeiras a chegar, vindo com uma hora de antecedência – quis chegar cedo por vias das dúvidas, caso o Steven chegasse cedo também... ainda bem que dispensei os saltos! Não havia um lugar sequer para sentar. Claro, esperaria do lado de fora, só poderia entrar depois que Steven me entregasse o convite. John estacionou em frente ao local.
– Ok. Divirta-se – disse ele. – Você está linda.
Abri a porta do carro.
– Valeu, pai. Te vejo mais tarde. Te amo.
– Também te amo.
Desci e segui pela calçada sem olhar para trás, já na esperança de avistar Steven de longe.
Me lembrava de quando vivi o meu primeiro furacão. Me disseram que na Flórida haviam muitos parques de diversões... e esconderam a parte de que haviam muitos tornados e furacões também. Quando eu tinha dez anos, fomos atacados pelo primeiro, que eu fiquei sabendo alguns dias antes quando vi as notícias na TV. Meu irmão estava largado no sofá com o controle remoto na mão, e foi quando cheguei, permanecendo em pé ao lado do sofá. Não deu nem um minuto, Hudson mudou o canal.
– Ei! Não podemos assistir isso? – pedi. Ignorando ao meu pedido, ele continuou mudando os canais até chegar no canal de esportes que aparentemente era aonde queria chegar.
– Hudson – insisti. Ele continuou me ignorando. Estava zero interessado nas notícias sobre o furacão, vindo do Golfo do México e com grande chance de chegar à Flórida, segundo o noticiário. Decidi ir embora e procurei por Amy, encontrando-a na mesa do escritório fazendo algumas anotações, provavelmente do trabalho. A porta estava meio aberta.
– Mãe. Vai ter um furacão – falei.
Assim como Hudson parecia estar com nem um pouco de medo, eu também não estava. Eu só queria saber exatamente do que se tratava aquilo, para então decidir se ficava com medo ou não. Ela parou com o que fazia e virou a cadeira para mim.
– Querida... onde viu isso?
– Nas notícias.
Ela cruzou os braços.
– Hmmm... e você ficou com medo?
– Eu não sei.
– Vem aqui. Saiba que provavelmente ainda vamos ter algumas tempestades fortes por aqui... mas não há razão para ter medo. Se ficarmos em casa, todos juntos, ficaremos bem. Tem mais, posso te preparar um chocolate quente... algo quente e doce é sempre bom, não acha?
Dei um leve sorriso. De fato, quando chuva e os fortes ventos chegaram, numa tarde de sábado, Amy e John me recomendaram não olhar pela janela, fecharam todas as cortinas, fizeram chocolate quente e até pipoca... e durante um tempo ficamos todos juntos no sofá. Não podíamos ver um filme ou ouvir música pois não havia energia. Enquanto John estava na cozinha preparando mais pipoca, Hudson estava no sofá encolhido com a cabeça deitada sobre o ombro de Amy enquanto ela o abraçava, eu estava agitada, não queria sentar. Por alguns segundos, cobri os ouvidos com as mãos para tentar abafar o som do caos que acontecia do lado de fora.
Quando cheguei em casa, à noite, estava com a pior dor de cabeça do mundo, mas ainda sim fiz questão de mandar uma mensagem para Jamie contando como havia sido, não importava que fosse madrugada na Inglaterra.
Jamie não acompanhou o evento. Lhe mandei mensagens enquanto estava lá, mas acredito que não as leu. Resolvi então mandar um resumo quando cheguei em casa. Escrevi:
"Quis chegar uma hora antes por via das dúvidas. Vieram poucos colegas, nenhum deles conversou comigo, mas eu própria não queria conversar, fiquei o tempo todo olhando de um lado para o outro esperando avistar Steven. Ele chegou (para a minha surpresa sozinho) encima da hora. Me deu a porra do convite, mal falou comigo, me deu as costas e foi embora. Passou o resto do dia me ignorando e conversando com pessoas que eu não conhecia. Eu não esperava isso dele, muito pelo contrário, eu acho que ele deveria ter pelo menos me dado uma satisfação pelo lance dos exercícios. Enfim... acho melhor parar por aqui."
Deveria ter dito também que a atitude do Steven era mais assustadora que qualquer tempestade. Jamie respondeu na manhã seguinte dizendo que pena que a noite tenha sido ruim mas que eu deveria comemorar porque o Steven veio sozinho.
"É um indício mas não prova nada", respondi.
Resolvi telefonar. Mas antes, consultei. Ele diz que não, que está prestes a sair para se encontrar com Jessica. Telefonei mais tarde então... e não conversamos apenas sobre Steven e Hana.
– Você já sonhou... que você é outra pessoa? – perguntei.
– Hã... não, Satsuki, não que eu me lembre. Por quê?
Eu não tinha certeza se isso era dos homens em geral... ou só de Jamie. Tinha vezes que ele era um pouco lento, e eu precisava explicar coisas que já haviam sido ditas.
– Tenho sonhado com isso ultimamente, não consigo dizer quantas vezes já... mas ontem, de novo. Eu sou uma mulher do século passado ou não sei de que época... de cabelo ruivo e olhos azuis. E Steven, ele... nós estamos juntos. Acho.
– Por que você acha?
– Porque tudo o que fazemos é conversar. Mas...
– Chi, me desculpe, mas eu preciso estudar. Me conte o resto depois, pode ser tanto por e-mail quanto por mensagem.
Desligamos e continuei pensando. Quem era aquela mulher, por quê no sonho eu sou ela e por quê ela parece familiar? E o mais importante... por quê estou sonhando isso?
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