XVII. Que Maravilha!
Quando a mãe chegou naquele dia, eu estava terminando de cozinhar o almoço enquanto Aline estava sentada no sofá, comendo o chocolate que lhe dei.
Tivemos nossa refeição e conversamos sobre a dificuldade de Aline. A mãe ficou bem preocupada e tirou o resto da tarde para ir conosco ao Sonhar, onde estudamos.
Ficou claro para mim o quanto o colégio em que Aline estava também falhou miseravelmente em ensiná-la — o que já era mais que inevitável, já que falharam com a segurança.
— Após o colégio, estudarão comigo até às três! — A mãe nos disse ao terminarmos. — Aos finais de semana também.
Aline parecia bem acanhada, mas assentiu.
— Se a senhora não se incomodar, poderia também ajudar o Gabriel, que mora lá em cima — sugeri à mãe. — Ele disse que também tem dificuldades... mas, ele quase não tem tempo.
— Convida que eu ajudo. Sua mãe ficará o dia inteiro em casa, a partir de hoje. — Ela assentiu com a cabeça, sorrindo.
A mãe sempre trabalhou fora.
Difícil exprimir o quanto fiquei animada quando descobri que ela estaria em casa pelo dia inteiro, diariamente!
Adiamos nossa ida à praia novamente, dedicando aquela primeira semana ao foco nos estudos de Aline, que realmente estava triste por não entender das coisas faladas no colégio.
Talvez a mãe tenha priorizado os estudos por entender que animá-la quanto aos estudos seria fácil e rápido. Dona Vivi tinha alma de professora. Se não lembrava, estudava conosco.
Nessa semana, Biel se juntou a nós em três dias. Era bem esforçado e, além do caderno levado à escola, ele guardava um caderno com todas as suas dúvidas — que, ao ter tempo, ele tentava sanar com os livros didáticos em casa.
Não consegui associar a mãe em casa com abandono de emprego. Um dia, chegando do colégio, um carro grande estava na frente de casa e alguns rapazes do morro descarregavam.
Eram alguns muitos tecidos coloridos.
Cumprimentei a todos e entrei, estranhando.
Alguns papelões cobriam o chão, onde colocavam os tecidos e Jonathan estava num canto, observando os rapazes.
— Boa tarde, tio... está tudo bem!? — Preocupei-me.
— Sim, princesa! Como foi o colégio?
— Bem... o que está havendo? — indaguei, olhando-os.
— Nada. A rainha está lá dentro com a tia Ana.
Assenti e entrei, ainda mais curiosa. A mãe e tia Ana bebiam cerveja, sentadas no sofá enquanto conversavam.
— Tudo bem, mãe?
— Sim, minha filha. — A mãe riu.
— Tem um monte de coisa sendo colocada no quintal — falei, tentando deixar claro que a culpa não era minha, sabe!?
— Não se preocupa... é o novo trabalho da mãe! — riu.
— Essa menina não muda! — Ana riu.
— Oi, tia. Desculpa. Fiquei preocupada.
Aproximei-me para tomar a benção das duas. Aline as cumprimentou e fomos ao quarto para tomar nosso banho.
O almoço estava pronto, mas aguardamos os meninos terminarem seu serviço para dispensá-los e comermos.
A mãe convidou Jonathan para se juntar a refeição. Ela e a tia sempre tinham muita conversa e conseguiram incluir todos no assunto — que eu já nem lembro de tão frívolo.
— Amanhã é dia, hein, meninas! — A mãe disse. — Organizarei aquela pequena bagunça hoje... é bom descansar para não acabarem dormindo na praia.
Aline e eu sorrimos largo, mas guardamos a comemoração para o momento em que chegamos ao banheiro.
— Temos muita coisa para fazer! — falei para Aline. — Terminando de estudar, vamos até a Val e... se você não se importar... seria bom chamar o Biel para ir... o que acha?
— Não me incomodo, mas ele é mentiroso!
— Mentiroso!? — Franzi o cenho, olhando-a.
— Sim, ele sabe aquelas matérias que disse não saber, por isso mentiroso, 'ué! — deu de ombros, rindo. — Não me incomodo que ele vá, já disse. Ele me trata muito bem.
— Ele te olha como Jonathan olha a mãe — ri.
— Nossa! Nada a ver. Jonathan é doido pela sua mãe. — Ela falou em negativa. — Ninguém nunca será assim comigo.
Cabisbaixa, ela abaixou a cabeça.
— Duvido... Você é muito maravilhosa para esse mundo.
Um tímido sorriso nasceu em seu rosto e seguimos aos nossos estudos. Quando Biel apareceu, convidamos e ele ficou de verificar com sua mãe se poderia, nos avisaria pela noite.
Ao fim dos estudos, fomos à sala e conseguimos ver a mãe e Jonathan no quintal. Ele a ajudava a dobrar os tecidos e eles conversavam, rindo bastante.
Foi a primeira vez que identifiquei o efeito da nostalgia sobre os sorrisos, os olhares das pessoas... é bem bonito!
— Mãe, Aline e eu podemos ir na Val? — pedi.
Com aquele lindo sorriso, ela me olhou e assentiu.
Nós nos apressamos para sair.
Na nossa geração, Aline e eu éramos as únicas meninas — pelo menos ali no morro, afinal, o número aumentava no asfalto, só era longe demais para sermos próximas.
O resto das meninas estava, em maioria, na adolescência.
Valéria era a mais nova, tinha catorze anos, mas ainda conseguia conciliar interagir conosco, sem ficar muito entediada ou nos usar para ver algum menino de seu interesse.
Ela era amável. Sua mãe tinha o mais bem-sucedido salão do morro, que já estava por lá há anos e não dava sinais de que fecharia jamais — já que realmente era a melhor cabeleireira!
Bastou falarmos com Valéria, sem entrar em muitos detalhes do que ocorreu, para ela ajudar a falarmos com sua mãe e organizarmos algo no salão.
Em troca, a mãe de Valéria me pediu uma apresentação gratuita numa festa que ela faria para algumas velhas amigas — algo que fiquei ansiosa para aceitar, mas pedi que ela nos acompanhasse em casa para falar com a mãe.
Felizmente, a mãe aceitou e, melhor ainda, poderia me acompanhar. Eu não estava desejando nada além do bingo nos últimos dias para continuar arriscando novos repertórios.
De novo, me vejo num imbróglio semântico. Como definir tanta alegria, felicidade, realização, emoção... tudo num só?
Maior que minha estreia no bingo, aquele seria um novo tipo de evento, onde eu seria a única atração, com um novo público, majoritariamente feminino e adulto, o que já era impressionante e maravilhoso, por si só.
Para melhorar, eu teria Aline pela primeira vez numa apresentação. Não há uma palavra para denominar isso — talvez haja, mas resumo esse sentimento com o belo brilho no olhar de Aline ao saber que finalmente estaria lá.
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