XIII. Não Foi em Vão
— Entrem, por favor! — A mãe os convidou, ignorando a postura inadequada da tia. — Aproveitem e se sentem...
— Não posso demorar, tenho um culto hoje! — O tio disse, seguindo na direção da cadeira, com certa pressa.
— Pois, é bom se encarregar de ligar para os seus fiéis e dizer que não terá culto hoje! — A mãe disse, calma.
A tia deu de ombros, fitou a mãe de cima a baixo — talvez indagando sua autoridade —, mas foi o tio quem tentou falar:
— Não tenho c-
— Sem "mas", Vaguinho. — A mãe o interrompeu. — Sou sua amiga e você sabe... crescemos juntos... nossas filhas estão crescendo juntas... ouve sua amiga Vivi e cancela essa- — A mãe respirou fundo. — Cancela isso.
— Não podemos deixar nossos fiéis! — A tia disse.
— Não estou bem para ouvir a voz da tua mulher! — A mãe continuou olhando o tio. — É bom que você a cale para que eu não precise fazê-lo de forma um pouco rude.
Foi a primeira vez que vi a mãe ameaçar a tia... não mentirei, que foi bem engraçado de ver.
A tia silenciou, engolindo seco.
— Pode ir ao carro ligar, meu amor? — O tio pediu à sua esposa. — Pede para comunicarem os que não têm acesso a um telefone... enquanto descubro o que há.
Incontentada, a tia saiu batendo o pé.
— Viviane, não há necessidade de ameaçar minha esposa. — O tio repreendeu. — Sei que não se gostam, mas não é para tanto... pelo amor de Deus!
— Não foi a primeira vez, Vagner. Sua filha virou brinquedinho de riquinhos no colégio. No plural! — A mãe disse em negativa. — Tenho muitas perguntas, mas não farei para não me estressar... já que quero ajudar a solucionar.
O tio silenciou, franzindo o cenho e fitando a mãe.
— A garota chorou a tarde toda... quer fugir de casa porque vocês não se dão ao trabalho de ouvi-la. O que está acontecendo? Estão tendo problemas? Precisam de ajuda?
Apesar da melancolia no tom de voz, a mãe não voltou a derramar lágrima alguma. Na churrasqueira, Jonathan parou o que fazia para encostar no muro, olhando na direção do tio.
— L-Luma está aqui. — O tio disse.
— Sei que está. Conversamos sobre o que ocorreu porque Luma me implorou para ajudar Aline. Isso é normal, Vagner?
Talvez ele estivesse aturdido demais para tecer algum comentário. Suspirando, ele sentou com as mãos na cabeça.
No canto, Jonathan agitava a perna, parecendo impaciente — talvez com raiva, mas eu não podia identificar a linha tênue que separa a externalização de ambos os sentimentos.
— E-ela conversou com a mãe. — O tio disse, talvez para si, agitando e coçando a cabeça numa perpétua negativa.
— Nunca te disse que aquela vagabunda não presta para nada... nem quando precisei ouvir milhares de idiotices saindo daquela boca suja... nunca falei mal dessa mulher, mas hoje eu estou realmente com muita raiva dela! — A mãe disse.
— Onde está minha filha? — Ele finalmente perguntou.
— Dormindo no meu quarto. Tem duas escolhas, meu amigo: dá um jeito nessa- nisso... ou eu vou dar um jeito e, infelizmente, meu jeito não agradará você, nem a vagabunda!
A mãe respirou fundo, estendendo o copo na direção de Jonathan, que se aproximou para servi-la mais cerveja.
— Quem disse que você tem que agradar meu marido? — A tia perguntou, entrando no quintal com o telefone em mãos.
Eles eram um dos poucos que já tinham um celular, apesar de usarem o velho Motorola, que se popularizou poucos anos depois na versão "menininha", o Oi Xuxa.
— O dia pode terminar bem gelado... — Jonathan falou, olhando para ambos, parecia ainda mais calmo.
— Amor, por favor! — O tio repreendeu a tia. — O que aconteceu na tal conversa que teve com Aline?
Descontente com o corte, ela bufou e foi até o tio, sentou ao seu lado, como estava, ignorando a pergunta que ele fez.
— Minha esposa pode me responder!? — Ele insistiu.
— Ela queria sair do colégio, neguei porque sabemos o que é melhor para ela. Ficar nesse fim de mundo, num colégio cheio de bandidinho, nunca será bom! — falou arrogante.
— Cacete! — Jonathan franziu o cenho em negativa.
— Jonathan... A Luma... — A mãe o repreendeu.
— Desculpa! — suspirou, me olhando. — Sabe que não pode repetir isso, não é, minha princesa!? — perguntou-me.
— Sim, senhor — assenti com a cabeça.
— Parece que o dono da moralidade tem algo para dizer!? — A tia debochou de Jonathan. — Deveria lembrar que tem teto de vidro! — deu de ombros.
Ele sorriu de canto de boca e cerrou os punhos em negativa. Novamente, precisou respirar fundo.
— Assim se mata consideração, Vaguinho. — Jonathan falou, assentindo com a cabeça e olhando para o tio.
Sua voz ficou ainda mais baixa — numa agressividade silenciosa, cínica demais, talvez uma das mais perigosas.
— Eneide, por favor! — O tio levantou o tom de voz.
— O que está havendo!? — A tia perguntou.
— Nossa filha! — arfou. — Aquele colégio é uma fortuna! Nunca esperaria isso de um lugar tão bem estruturado. Eles têm a própria segurança!
— Jonathan, pega ela e entra, por favor!? — A mãe pediu.
Inquieto, ele assentiu com a cabeça e veio em minha direção. Eu ainda estava cabisbaixa, quando ele me ofereceu colo, claro que aceitei, e ele me abraçou bem forte.
Talvez, naquele momento, só me imaginasse no lugar de Aline... mas, isso é algo que só pensei alguns anos depois.
Fomos ao quarto. Enquanto me levava, podia sentir sua carne tremer, seu corpo muito mais tenso que o normal.
Chegando, ele sentou na cama e me deixou ao lado de Aline, permitindo que eu usasse sua coxa como travesseiro.
— Tenta descansar um pouco — falou, beijando a minha testa. — Imagino que não tenha sido fácil descobrir isso... não se esquece que eu te amo, 'tá!? — sorriu amarelo.
***
Da superfície de um planeta vermelho, eu consegui ver o planeta terra. Infelizmente, ele estava exatamente como o planeta pequeno das mentes pequenas, preto e branco.
Foi triste não ver o azul do mar ou o verde das florestas.
Envolvendo-me estavam os braços de um Jonathan vermelho, olhei minhas mãos e eu também tinha aquela cor; ao redor, tudo era completamente vermelho.
Alguns tons mais claro ou mais escuro, mas rubro.
O céu fugia dessa regra. Era o azul céu noturno, mas algumas nuvens passeavam com a cor do céu diurno; parecendo que ambos se mesclavam naquele momento.
Não mentirei, desejei que ele fosse assim para sempre.
Infelizmente, nem essa beleza me fez sorrir.
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