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Cap.26 (Parte 2: Um beijo de brincadeira)

Inspiração que EU TIVE para o Capítulo:







Eu tenho me escondido por tanto tempo
Esses sentimentos, eles não se foram
Posso contar a alguém?
Tenho medo do que vão dizer
Então eu os afasto
Eu estou agindo tão estranho

Elas são tão bonitas que dói
Eu não estou falando de garotos, estou falando de garotas
Elas são tão bonitas com suas camisas de botão

...

Eu deveria gostar desse cara
Mas seria apenas perda de tempo
Ele realmente não faz o meu tipo
Eu sei do que eu gosto

(Girls - Girl in red)

Finalmente estou usando as músicas que eu queria usar desde que criei a Playlist

Agora as coisas vão ficar sérias, pessoal

Jade Luisa de Cabral

Eu tinha um plano: esquecer Diana e se distrair com meus novos amigos, nosso quarteto, porém meu plano foi por água abaixo.

Esquecer Diana era impossível, ela foi uma amiga muito importante para mim e não podia esquecer ela, era até cruel pensar em apagar as memórias com ela, nada disso podia acontecer.

Só que agora conseguia entender melhor meus sentimentos e não sei quando isso aconteceu, mas comecei a gostar mesmo foi de Ravena.

Tentei sair dessa fase de gostar de Diana e me negar a pensar em meninas.

E acabei chegando a conclusão que nunca ia poder fugir disso, estava em mim, fazia parte de quem eu era e por mais difícil que fosse aceitar, eu sabia que meu caminho ia se tornar cheio de dor se não aceitasse.

Só que ser uma criança de 10 anos em uma cidade nova e descobrindo quem eu era no meio disso tudo... não estava sendo fácil.

As lembranças com Diana eram de momentos bons, especiais, lembrava dela com carinho.

Com Ravena era diferente.

Não sei em qual momento comecei a sentir algo por ela.

Talvez tudo tenha começado naquela noite de lua cheia onde eu e Ravena ficamos no meu quarto, era a noite do filme, eu e ela junto com Oliver.

Podia ter começado no momento que eu olhei para ela sem parar, porque algo me intrigava, e acabei refletindo sobre seu jeito inocente, tímida e solitária.

De quanto o brilho da lua cheia iluminou seu rosto e suas sardas ficaram expostas, pareciam estrelas ou pequenas manchas de tinta na pele, como reticências que não acabavam nunca.

Talvez ter feito aquele texto/poesia também foi uma maneira para mim expressar a importância dela na minha vida.

Só que eu não sabia que aquele texto/poesia significava meus sentimentos por ela.

- Eu te observo como se fosse um quadro, um desenho, uma pintura.

Tinha dito isso e agora tudo fazia mais sentido.

Talvez tudo tenha ficado mais claro quando tive aquele sonho com Diana de mãos dadas com um garoto e no final Ravena dizendo para mim seguir em frente.

Era como se o sonho fosse um aviso que precisava superar o meu primeiro amor e viver novas coisas.

Não tinha como ter certeza em qual momento havia se iniciado, o fato era que não podia negar esse sentimento, um dos sentimentos mais assustadores que já senti.

Gostar de garotas era interessante.

Era como fazer arte. Fazer uma pintura de duas garotas juntas em um abraço cheio de leveza e inocência.

Era intenso.

Era empolgante e fofo e incrível.

Uma adrenalina que corria por minhas veias, a sensação de liberdade, aquela culpa e arrependimento para atrapalhar e uma dose de coragem no final.

Não sei se mamãe estava orgulhosa de mim depois de eu ter confessado o meu segredo

Queria poder ver mamãe pela primeira vez e poder ter certeza que ela estava viva e depois abraçá-la e chorar

Só o abraço dela ia ser a solução nesse momento

Um abraço que nunca tive oportunidade de vivenciar, o cheiro do seu perfume que nunca ia saber qual era, o seu toque que era desconhecido.

Franciele não podia aparecer aqui para me abraçar, isso nem ia acontecer hoje, nem amanhã ou dias depois, era algo muito impossível de acontecer e eu sabia disso, mas doía precisar aceitar esse fato.

Meus joelhos enfaixados faziam minhas pernas se moverem lentamente em direção a entrada da "casinha" e entrar lá para se esconder deixava o clima de rebeldia mais presente.

Eu e Ravena estávamos nos escondendo.

Havia faltado energia na escola de novo e tivemos sorte, porque podíamos passar o tempo que quiséssemos escondidas, a gente não ia perder as provas da terça.

Escutei uma risada conhecida, olhamos para o lado direito e vimos Olivia e Rute passando enquanto conversavam e riam sem parar, as duas pareciam distraídas e nem viram a gente.

Lembrei da confissão de minutos atrás: "Eu gostava de Olivia."

Devia ser difícil Raven lidar com isso.

Pensei no que ela fez no dia anterior, defendeu seus amigos com muita força e vontade, deixou todo mundo surpreso com sua coragem de dizer umas boas verdades para Olivia e Rute.

Como devia ter sido complicado para ela dizer aquelas coisas, mesmo gostando da popular ainda conseguiu enfrentá-la e defender a gente.

- Vamos fazer ficar tudo bem - eu disse - Ficar olhando para popular vai te fazer mal porque sei que você gosta...

- Gostava - completou e engoliu em seco - Gostava dela, admirava o seu jeito de ser, enxergava suas qualidades e beleza, a partir do momento que percebi seus defeitos... seu preconceito... acordei, despertei, notei que ela não era perfeita como eu achava.

Fiquei em silêncio por uns instantes e senti um nó na garganta.

- Eu sinto... - gaguejei - Sinto muito, Ravena. De verdade.

- Vamos fazer ficar tudo bem - sorriu forçado - Aproveita que faltou energia e não vai precisar encarar as provas.

Eu sorri.

Entramos na casinha de madeira.

Olhamos para o baú no canto, o baú "mágico" onde tinha de tudo, foi com esse baú que Julie e Raven conseguiram improvisar na hora de contar a história da Rainha da Neve para as crianças.

No baú tinha as renas de brinquedo, o pássaro preto de brinquedo, o corvo, inclusive a capa branca, grande e brilhosa, que Julie usou quando fingiu ser a Rainha da Neve.

Queria alegrar minha amiga, porque depois dela ter chorado tanto, seu rosto ficou vermelho e era ruim ver ela assim.

Abri o baú e me surpreendi com um vestido vermelho brilhoso de alcinha que tinha lá dentro e uma coroa de flores.

- Fecha os olhos - pedi enquanto estava de costas para ela.

- Para que tanto mistério, Luly? - achei ter visto ela cruzar os braços - Vai me surpreender com mais uma atitude "rebelde"?

- Atitude rebelde? - sorri - Do que você tá falando?

- A popular perfeitinha guarda segredos e gosta de garotas - disse por fim - Temos isso em comum. A gente se entende. Não acha que isso é um tipo de atitude rebelde?

- Não sou rebelde como você - eu balancei a cabeça - Agora fecha os olhos.

Ravena se afastou e ficou de frente para parede do outro lado.

Vesti o vestido vermelho brilhoso e peguei a coroa de flores, ajeitei a franja do meu cabelo e coloquei a coroa na cabeça.

Avistei algumas sandálias no chão e peguei uma sandália infantil.

A sandália era meu número e tinha um desenho de unicórnio.

Calcei rapidamente.

- Pode olhar agora - coloquei as mãos na cintura - Então, estrangeira? Estou bonita?

Lembrei do dia que escrevi o bilhete na sala de aula, de quando ela estava distante, depois de termos feito aquele tour pela lagoa encantada e a igreja abandonada.

No bilhete eu me referi a ela como uma estrangeira.

Raven se virou e seu olhar confuso encontrou meus sapatos da escola jogados pelo chão.

Seus olhos encontraram os meus e não sei se vi direito, mas achei ter visto um brilho nos olhos dela.

- A princesa Gabriela tá esperando a opinião da estrangeira.

- Você tá... ótima. Muito fofa com essa sandália de unicórnio.

- Que você nunca usaria, não é?

- Não. Odeio usar coisinhas assim.

- Mas você ficou fofa com meu pijama de unicórnio.

Ela fez uma careta.

- Não faz parte do meu estilo, obrigada.

Comecei a desfilar enquanto segurava a barra do vestido e consegui fazer ela soltar uma risada.

- Para com isso, Luly. Tá passando vergonha.

- Não conheço essa Luly. Meu nome é Gabriela e eu sou uma princesa então me respeite.

Ela continuou rindo por causa da minha voz diferente.

- Eu só vejo uma menina tentando ser engraçada - mordeu o lábio tentando parar de rir - Você é uma péssima atriz, Luly.

Sua voz rouca e aveludada ficou como uma lembrança nos meus pensamentos.

As duas trancinhas no seu cabelo, seu sorriso que parecia tão inocente, sardas pelo rosto e seu tom de voz falando uma brincadeira, tentando ser forte, tentando não se entregar facilmente.

Adorava implicar com Oliver e agora implicava comigo

Fiquei nervosa.

- E quem você é nessa brincadeira? - tentei disfarçar - Quer continuar sendo a estrangeira?

- Para participar do seu mundo? - eu assenti com a cabeça - Deixa eu ver.

Raven abriu o baú e revirou as roupas, finalmente achou uma peça de roupa escondida, vestiu a blusa com mangas e uma jardineira jeans por cima.

Continuou com os sapatos da escola.

- Eu sou a melhor amiga da princesa - deu de ombros - Vivo no castelo junto com ela e os moradores pensam que eu moro no castelo, mas a verdade é que tenho uma casa na floresta.

- Bem a sua cara mesmo - revirei os olhos e completei - Ter uma casa na floresta.

Escutei uma música.

Paramos para ouvir e percebemos que era eurodance.

Entramos no personagem de novo e começamos a dançar com as nossas coreografias bem malucas.

Meu mundo encantado saiu dos meus pensamentos e veio para a vida real.

Eu estava brincando junto com alguém.

Não precisava estar brincando sozinha e fingindo que tinha alguém do meu lado.

- Como é bom estar viva - comecei a jogar confetes para o alto e continuei dançando.

- E se sentir viva é melhor ainda - completou - A sensação de estar presente vivendo cada momento.

Eu parei de dançar e continuei jogando os confetes para cima.

Observei a coreografia maluca que ela estava fazendo.

Seus cabelos cobrindo parte do seu rosto, sua roupa cheia de estilo, o cheiro do seu perfume se espalhando pela casinha.

Seria uma boa ideia se eu fizesse o que realmente quero fazer?

A pergunta ficou como um eco nos meus pensamentos e controlei minhas pernas que não paravam quietas.

Garotas, garotas, garotas, garotas.

Diana tinha saido de cena e nem se quer conseguia lembrar do meu nervosismo perto dela.

Só existia uma garota do meu lado.

E meu Deus como isso era errado.

Era viciante.

As meninas sempre iam chamar minha atenção de algum jeito, mas ter esse choque de realidade dizendo: "Você não pode fingir gostar de Oliver" e perceber que devia seguir meu coração, fazia as borboletas se agitarem bastante no meu estômago.

Eu ignorava o que o meu cérebro dizia e seguia o coração.

Seria uma boa ideia se eu fizesse o que realmente quero fazer?

Eu quero beijar ela

Meu Pai do céu.

Eu estava querendo beijar minha amiga.

- O mundo tem muita beleza, sabia? - a pergunta veio tão naturalmente e a fez parar de dançar - Com sua amizade eu descobri que tudo pode ficar melhor.

Ela desviou o olhar para o chão.

- Mil vezes melhor - completou.

- Ravena...

Peguei na bochecha dela e passei meu dedo por suas sardas espalhadas pelo rosto.

- O que tá fazendo, Jade Luisa?

- Estou... ligando os pontos, as manchas de tinta na sua pele.

Ravena respirou fundo ainda evitando o contato visual e sussurrou baixinho:

- Para com isso, por favor.

Ravena dizendo por favor era uma novidade.

- Somos só crianças... e precisamos nos preocupar com coisa de criança.

- E fugir do que sentimos? Agir como se não significasse nada?

Consegui escutar as batidas do seu coração acelerado.

- Estou cansada de obedecer e só fazer o que meu pai quer que eu faça. Por um dia queria... sair do casulo e poder voar, virar a borboleta com asas enormes, ser livre como sempre quis.

- Quer quebrar as regras.

- Não, Raven. Eu quero ser livre de verdade e parar de seguir o que o meu pai diz para mim. Ouvir mais minhas vontades... mesmo que não entenda bem o motivo de eu gostar de garotas. Quero fazer o que vai ser bom para mim.

- E o que seria bom, Jade?

- Ser eu mesma e parar de negar o que sinto.

As ordens de seu Joel apareceram nas minhas lembranças, o certo e o errado de acordo com o que ele achava, seus gritos e autoridade máxima fazendo o meu mundo encantado se acabar aos poucos.

Uma parte do meu cérebro gritava: "Seja perfeita."

E eu ignorava.

Papai dizia uma coisa, a sociedade dizia outra e eu escolhia silenciar essas vozes.

Ela pegou na coroa de flores, passou a mão na franja do meu cabelo e por fim fizemos contato visual.

Seus olhos encaravam meus olhos azuis, podia passar horas somente observando suas íris negras, enquanto os seus olhos pareciam querer fazer tudo parar a nossa volta, os seus lábios tremiam e sua respiração estava pesada.

- Sua presença... - gaguejou - Tira as minhas defesas, me deixa exposta sem ter para onde correr, consigo ser eu mesma do seu lado e isso é incrível e assustador.

- Tudo que é novo é assim - falei dando de ombros - Assusta mesmo.

Observei uma lágrima descendo e automaticamente passei o meu dedo na intenção de enxugar essa lágrima.

- Não quero que a gente se afaste. Eu preciso admitir que estou gostando de você.

- Jade Luisa...

Não deixei ela terminar, dei um passo para frente e tive a primeira atitude, a gente era quase do mesmo tamanho e isso não foi problema.

Seus lábios tocaram os meus.

Senti o gosto de chiclete na sua boca e seus lábios macios, macios e delicados como nunca pensei que fossem, o nosso beijo nada planejado acabou deixando tudo mais natural.

Eu estava beijando a garota que devia ser só minha amiga

Meus batimentos cardíacos aceleraram e o friozinho na barriga não deixava eu ficar nenhum pouco tranquila.

Consegui sentir muito mais do que achei ser possível.

Com esse beijo totalmente inesperado onde a gente nem sabia o que fazer direito...

Cheguei a conclusão que beijar uma garota era extraordinário

Aquilo durou somente segundos, mas a sensação esquisita de nervosismo e o friozinho na barriga diziam o contrário, parecia que tinha durado mesmo uma eternidade.

Ravena se afastou rapidamente e percebi que ela chorava.

O que eu fiz???

- Desculpa - sussurrei - Não queria...

- Para de pedir desculpa - continuou chorando - Você não teve culpa.

O nó na minha garganta fez meu corpo tremer e nem consegui reagir.

- Seu poder de hipnotizar as pessoas, esses olhos azuis que parecem cristais, um imã hipnotizante e essa vontade de escrever uma poesia.

Suspirou.

- Eu sinto isso sempre que te vejo. Você tem esse poder de me deixar exposta e sem defesas. O que fez comigo, Jade?

Tentei controlar os batimentos cardíacos acelerados.

- Nem Olivia e ninguém conseguiu chegar perto disso, eu só vejo contigo, só é possível ao seu lado. Única garota que tem a fama de perfeitinha e tá tendo muito mais atitude que eu.

Um sorriso escapou com o seu comentário.

- Eu também gosto de você. Ficou feliz?

O choro foi parando aos poucos.

Ao mesmo tempo que observava tristeza em sua expressão, também observava um certo alívio, algo semelhante a uma alegria surgindo.

Um sorriso surgiu no canto da sua boca.

- O que sentiu? - mudei de assunto.

Ela pensou por um tempo enquanto parava de chorar.

- Foi como fugir da sala de aula - respondeu por fim - Sair de fininho e correr pelos corredores da escola, chegar no jardim e ficar perto das árvores.

- Adrenalina - completei - Mas esse de chegar perto das árvores por acaso tá me comparando a uma árvore?

- Não, sua boba - sorriu - Eu quis dizer que esse beijo fez a adrenalina aparecer, símbolo de fugir da aula, e chegar no jardim significa que cheguei no meu destino.

Franzi as sobrancelhas.

- Cheguei em casa - concluiu -
Te beijar foi como estar em casa pela primeira vez e se sentir parte daquilo. Parte de algum lugar onde posso ser eu mesma sem máscaras.

Fiquei em silêncio emocionada com sua confissão.

- A lagoa encantada pode ser um lugar de refúgio, uma forma poética de ver a beleza da natureza, só que sempre tive a sensação de que se eu passasse por essa lagoa... podia enfim encontrar alguma casa no meio do mato, te beijar acabou despertando esse meu sonho, sabe?

- Uau - deixei escapar - Nem sei o que dizer.

- Então não diz nada - puxou meu braço - Só vamos aproveitar e se permitir sentir sem arrependimentos.

- E o que faremos depois? - coloquei a mão no seu ombro - Quando a culpa surgir junto com o medo.

- Não faz pergunta complicada, Jade - pegou na minha cintura - Podemos dançar e esquecer esses medos.

Começamos a dançar juntinhas e seus dedos passeavam por minhas costas enquanto a gente dançava devagar.

Não queria acordar desse sonho nunca.

Aqui eu podia ser a Jade Luisa aventureira, curiosa, brincalhona.

Ravena despertava meu lado romântico.

Escutei ela sussurrar:

- Foi só um selinho, mas podemos imaginar que foi um beijo.

- Exatamente. É uma brincadeira de criança.

Concordamos.

Preferia pensar que estávamos apenas brincando e ignorando a realidade e a sociedade.

Um beijo de brincadeira.

Que fique bem claro.

O sinal tocou na segunda aula

Estava andando sozinha enquanto segurava a coroa de espinhos, a atividade que fiz na igreja quando nós fomos aprender sobre a quaresma.

Tirei um espinho da coroa e sorri satisfeita.

Eu fiz uma boa ação.

Conseguir fazer Ravena sorrir e alegrei seu dia.

Mas tinha um porém.

Uma dor chata estava se iniciando acima das minhas sobrancelhas, em lugares específicos, mostrando que nem tudo tinha saido como eu esperava.

Enxaqueca.

Eu beijei uma garota

EU BEIJEI UMA GAROTA

RAVENA E EU.

Quebrar as regras era viciante, um caminho perigoso, sem pedras no meio para atrapalhar, como se eu fosse entrar em uma nova fase da minha vida.

Não sabia o que estava me esperando do outro lado.

Ou se eu ia conseguir chegar ao outro lado com a mesma coragem que estava sentindo agora.

O fato era: quebrei uma regra.

Mas acima de tudo...

Eu fui eu mesma.

Eu fiz o que devia ser feito.

- Oi, meninas - ouvi uma voz conhecida - Estou dando aulas de reforço, se vocês conhecerem alguma criança que tá na 4° ou 5° série, podem me procurar.

Era Trix.

Ela usava um boné e seu cabelo loiro escuro estava solto, com o uniforme da escola, segurava vários folhetos, e logo entregou um folheto para cada uma das meninas.

- Obrigada - gritou enquanto acenava com a mão.

Observei as árvores do jardim e o balanço.

Os alunos caminhavam devagar em direção as suas respectivas salas, pois os alunos do fundamental precisavam fazer provas.

E eu também era para estar indo com eles.

Vi de longe um papel apregado na parede, estranhei porque não lembrava de ter visto isso antes, a curiosidade fez com que meus pés andassem rápido até chegar perto o suficiente e conseguir ler.

A foto de Trix estava bem visível no papel e em baixo tinha algumas coisas escritas em negrito.

Estão vendo essa menina da foto? Ela tá tentando ser professora de reforço e entregando folhetos pela escola. Peço que não confiem nela e nunca levem seus irmãos mais novos para casa dessa menina. Trix, com esse sorriso doce e gentil, é uma má influência para todos e ela pega mulher. É isso mesmo, senhoras e senhores. Trix namora com Jamile do 9° ano e elas são o novo casal... uma vergonha para história da nossa escola.

Parecia que meu coração tinha parado de bater, essa sensação como se o mundo tivesse parado e eu tivesse ficado aqui sozinha.

Não escutava os pássaros cantando, nem o som do vento, muito menos os alunos correndo.

A impressão era que tinha uma cachoeira dentro do meu ouvido.

Um barulho de água, tipo lago ou o mar, só existia aquelas letras em negrito, cada letra se misturando e saindo do papel voando com o vento, as letras ganhavam vida.

Ela pega mulher

Eles deviam se preocupar com suas rotinas e pararem de espalhar boatos por aí, muito cruel ler um negócio desse e não poder fazer nada, queria poder arrancar aquilo e sair a procura do responsável de ter espalhado isso.

Balancei a cabeça e comecei a andar.

Espera aí.

Trix namorava com Jamile?

Quem era Jamile?

Observei duas adolescentes correndo pelos corredores praticamente vazios, as duas soltavam gargalhadas e estavam de mãos dadas, a adolescente de cabelo loiro escuro olhou para os lados e não percebeu a minha presença, então deu um sorrisinho e elas se beijaram.

- Achei vocês - uma adolescente chegou correndo - Desculpa aí por atrapalhar, mas vocês precisam ver isso.

Entregou o papel para elas e a de cabelo loiro escuro começou a ler.

Os seus olhos piscaram duas vezes enquanto lia aquilo e sua expressão confusa deixou a outra menina apreensiva.

- Meu bem - ela disse com a voz trêmula - Agora eles foram longe demais.

A outra menina leu rapidamente e elas se entreolharam.

- O que vamos fazer, meu bem? - perguntou com raiva - Eles querem manchar minha imagem e acabar com meu sonho de ser professora de reforço.

- Eles não vão ir adiante - a outra disse - Deixa falarem. Você sempre diz que não devemos ligar para as opiniões alheias e que não podemos nos deixar levar por pessoas de mente fechada.

As três se abraçaram.

- Eu acho vocês um casal tão fofo. Qual o problema se são duas mulheres?

Estava explicado.

Mais surpresas.

As duas adolescentes eram Trix e Jamile.

Um casal de mulheres.

Por que essa frase trazia conforto para mim e ao mesmo tempo trazia medo e incerteza?

Uma frase tão clara e com um toque de poesia, palavras que podiam virar a inspiração para fazer arte, um casal de mulheres algo tão específico.

Trix também entendia meu dilema.


Terminei as provas da terça feira.

Guardei meus livros na mochila e agradeci a Deus mentalmente por ter terminado as duas provas, tudo bem que eu deixei quatro questões em branco na prova de história e duas questões em branco na de geografia, eu pelo menos havia dado meu melhor.

Não consegui ter concentração o suficiente para ler os textos, ler com calma todas as questões, escrever toda a resposta nas linhas.

Porém, eu fiz o meu melhor e isso já era o suficiente.

Chega por hoje.

Muitas surpresas haviam acontecido e eu precisava repensar nas atitudes que tive nas horas anteriores.

A maioria dos alunos encarava nosso quarteto, no dia anterior tínhamos chamado atenção de muita gente com o show que Olivia e Rute inventaram de fazer, Ravena era a principal "ameaça" nisso tudo.

Os alunos olhavam para ela com olhares de medo, pois enfrentou as populares e ainda recebeu os aplausos das crianças da Biblioteca Ultrassecreta.

- Que clima mais pesado - Julie comentou enquanto se levantava da cadeira atrás de mim - As gurias não param de encarar a gente.

- Mandou bem, Raven - Oliver elogiou e abraçou ela - Você tem fãs agora.

- Para com isso - ela retribuiu o abraço e bateu no braço dele - Não fiz nada demais. Só defendi meus amigos.

Ravena levantou a cabeça e fizemos contato visual, piscou os olhos bem rápido e desviou o olhar, eu entendi o recado, queria dizer que o clima bom daquela hora havia desaparecido e só restou as lembranças.

Será que Ravena se arrependeu?

Levantei sem deixar as perguntas inundarem meus pensamentos e lembrei de um compromisso que prometi a mim mesma.

Nos despedimos e prometemos tentar convencer nossos pais de deixar a gente ir para o parque a noite.

Meu compromisso? Encontrar Trix

Esbarrei com alguém na saída e a coroa de espinhos caiu.

- Ah não - abaixei rapidamente e peguei a coroa de espinhos.

- Foi mal - um garoto disse - A coroa tá inteira? Não diga que eu destruir a atividade que o padre pediu na igreja.

Era Vinícius, o amigo de Julie que jogava no fliperama com ela e ainda tinha nos ajudado no trabalho sobre Vincent Van Gogh.

- Não destruiu nada. Fica tranquilo.
Eu nem te vi na igreja quando fizemos a coroa.

- Eu te vi, Jade Luisa. Normalmente fico bem atrás e por isso poucos conseguem notar minha presença.

- Alguns te chamariam de "bicho do mato" se soubessem que gosta de ficar excluído.

Vinícius deu de ombros como se não se importasse.

- Jogo hoje no Fliperama? - Julie chegou - Depois nosso destino é o parque.

- Marcado - Vini concordou - Pode levar 10 reais.

- Eu vou levar nada, guri - subiu em cima do skate - Vamos apostar e tu vai perder como sempre.

Jogou uma moeda para ele e o garoto se desequilibrou e deixou a moeda cair.

- A moeda caiu - fez beicinho - Tá me devendo 10 reais, guri.

Soltou um beijo no ar para ele e saiu andando no skate.

- Preciso ir, Vinícius. Tenho um compromisso.

- Tudo bem. Tá convidada a participar do jogo lá no Fliperama.

- Obrigada pelo convite. Vou assistir vocês jogando, porque não sei nada sobre jogo.

Eu segurei as alças da mochila.

Passei pelos corredores, pelo altar de Nossa Senhora, pelo jardim e não achei ela em lugar nenhum, de longe vi uma adolescente sentada no balanço, conheci imediatamente que era Trix.

Fui ao seu encontro.

- Tem lugar para mais uma? - pisei na areia em volta do brinquedo.

- Oi loirinha - sorriu fraco - A gente se encontrou de novo.

Era a segunda vez que eu conversava com Trix, apesar de parecer a nossa quarta conversa, pois a sensação de familiriade estava presente como se nós duas tivéssemos nos conhecido a muito tempo.

Essa adolescente parecia ser a irmã mais velha que eu nunca tive.

Sentei no balanço e sujei meus sapatos de areia.

Ela permaneceu se balançando devagar.

- É bom te ver novamente.

- Digo o mesmo, loirinha. O que fez você querer ficar aqui?

Respira fundo, Jade. Nada de nervosismo

Senti meu rosto esquentar e com certeza fiquei vermelha de vergonha.

- Eu sei que mal nos conhecemos, mas fiquei sabendo de algo importante.

Trix continuou em silêncio.

- Tá preocupada por conta das fofocas.

Ela parou de balançar e enterrou os pés na areia.

- Não estou preocupada, loirinha.

- Nem adianta negar.

Nos entreolhamos.

- Quando a gente se conheceu... - eu comecei a lembrar dos acontecimentos - No intervalo eu te vi sentada aqui na grama, estava acompanhada de uma garota que percebi estar deitada com a cabeça nas suas pernas, fiquei de longe observando e notei o amor que tinham uma pela outra, você fazendo carinho no braço dela e eu achei aquilo tão bonito, sabe?

- Achou bonito? - deixou escapar - Onde tá querendo chegar?

- Sei das fofocas - revelei - Descobri que aquela garota se chama Jamile.

- Virou detetive agora? - ajeitou o boné - Ainda não entendi onde quer chegar.

- Pode sair da defensiva, Trix - sorri a consolando - Posso ter apenas 10 anos e parecer inocente, só que eu sei das coisas e descobri sobre seu namoro com Jamile do 9° ano, vai esconder isso ou vai admitir?

Silêncio.

Minutos de silêncio que fez eu notar as nuvens no céu e os urubus voando bem alto.

Pensei em pedir perdão pelo jeito que falei, mas ela resolveu continuar a conversa.

- Fiquei passada com o que você disse que se eu fosse uma mãe maravilhosa aí os meus filhos teriam sorte - mordeu o lábio enquanto sorria nervosa - Ainda citou os motivos para eles terem sorte de ter uma mãe como eu. Aí você vem de novo me surpreender dizendo isso tudo.

- Eu só falei a verdade sobre seus futuros filhos - dei de ombros - E também não vejo motivo para tanta surpresa. Espalharam pela escola inteira sobre seu namoro.

- Loirinha, quer dizer, Jade Luisa certo? - corrigiu rapidamente - Admito e não nego. Fiquei passada com o teu jeito de falar, foi direto ao ponto e me colocou contra a parede até fazer eu admitir, qual o teu plano? Quer me confortar ou tem alguém escondido esperando te dar um pagamento extra?

Franzi as sobrancelhas e fui tentando ligar os pontos.

- Estou completamente sozinha nessa missão, meu trabalho de detetive rende bastante, obrigada.

Trix caiu na gargalhada.

- Você é boa. Cadê as câmeras? Alguém tá te ajudando a tirar algo de mim?

- Não estranho sua desconfiança. Sei de uma pessoa que teria o mesmo comportamento.

Relembrei de Ravena desconfiada que alguém tinha me desafiado para falar com ela no dia que conversamos pela primeira vez.

- Eu sou confiável. Fica tranquila.

- Então por que tá agindo como se fosse algo normal? Tá tudo bem para tu ficar sabendo disso?

- Calma, Trix. Sou confiável, lembra?

Levantei e comecei a empurrar em suas costas, resolvi balançar ela no balanço em uma tentativa de fazê-la se acalmar, confiar que eu estava do seu lado.

- Infelizmente nós não temos muita voz na sociedade e esquecem que também somos seres humanos, nunca mais vou esquecer do que você disse, e enfim eu liguei os pontos e entendi seus conselhos e o motivo da promessa.

- Como assim nós? Não tem nós, Jade Luisa.

- Tem sim.

O vento fez companhia em meio ao silêncio constrangedor.

- Eu gosto de garotas.

Trix parou com o balanço e eu quase fui atingida com o brinquedo por causa da rapidez.

- Sabia que a minha intuição estava certa, algo dizia para eu te aconselhar a ter sua própria opinião e defender o seu ponto de vista, um imã que puxava a gente e termos nos conhecido do nada.

- Exato. A estranha familiaridade e o fato de eu ter a sensação de você ser a irmã mais velha que nunca tive.

- Então, loirinha, bem-vinda ao clube.

Eu fiquei tímida.

- Obrigada.

- Temos muito em comum e isso é bem maluco.

- Bom, estou assustada com tantas descobertas, assusta saber que estive negando a verdade por tantos anos e o pior é saber que sou uma criancinha no meio de uma sociedade diferente, e em uma cidade cheia de perigos.

- Entendo estar assustada, descobri ser lésbica quando era pequena igual você, talvez por isso eu vi a minha versão de 9 anos no exato momento que a coelha correu e acabaram se encontrando.

- Adorei conhecer Mavie, sua coelhinha. Quantos anos tem?

- Tenho 15 e faço o 8° ano. E tu?

- Tenho 10 e faço o 5° ano.

Descobri ser lésbica

Uma luz acendeu em alguma parte do meu cérebro.

- Repete o que falou. Descobri ser lésbica?

- Sim.

- Nunca tinha ouvido esse nome.

- Somos lésbicas. Resumindo... meninas que gostam de meninas.

- Achei poético.

- Vem cá, irmãzinha. Vou te proteger do mundo e dos moradores daqui. Vamos vencer todo o preconceito que existe no Lugar das Lendas.

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