Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

Cap.20 E se um dia eu mudasse?

Sombras nas colinas
Esboce as árvores e os narcisos
Sinta a brisa e os arrepios do inverno
Nas cores da terra coberta de neve

Agora eu entendo
O que você tentou me dizer
E como você sofreu por sua sanidade
E como você tentou libertá-los

Eles não te ouviam, não sabiam como
Talvez agora eles te ouçam

Estrelada, noite estrelada
Flores flamejantes que brilham em chamas
Nuvens que giram na neblina roxa
Refletem nos olhos azuis de Vincent

( Starry, starry night - Don McLean)

Essa música é somente para Parte da aula

Dica: Reparem bem nesses questionamentos de Jade Luisa sobre se ela saberia ou não lidar com a liberdade e como seria ficar longe da super proteção de seu pai.

Jade Luisa livre? Será?

Nesse Capítulo tem novo personagem na escola

E esse Gilberto? Quem será?

Jade Luisa de Cabral

As vezes eu imaginava como era a vida de uma lagarta.

Era interessante aprender sobre a metamorfose.

Lembro de quando eu tinha 6 anos e papai me ensinou sobre a metamorfose da borboleta.

Ele explicou que a borboleta não nascia assim.

Antes ela passava por fases

Primeira fase era o ovo, segunda fase larva ou lagarta, terceira fase era a pupa e quarta fase a borboleta adulta

Era um processo.

Um dia a borboleta foi uma lagarta.

Eu achava legal ouvir essa história e me imaginar como uma lagarta, porque eu ainda estava no casulo e não tinha aberto minhas asas.

Eu estava passando pelo processo.

Bem no meio.

Parecia que nunca ia ser livre de verdade. Como se eu não fosse ter a oportunidade de sair do casulo ou ter a sensação de voar.

Para ser livre eu tinha que fugir dessas coisas, ficar curada e não adoecer rápido, e assim eu podia correr sem medo.

Não precisava temer as doenças e nem as reclamações de papai.

Papai ia ficar feliz ao saber que fui curada. Eu ia ficar feliz. Um final feliz para todo mundo.

A Jade Luisa aventureira podia começar a dar os seus primeiros sinais.

Eu imaginava um futuro próximo onde pudesse viver aventuras e parar de usar a imaginação, pois eu ia viver de verdade. Não ia precisar imaginar nada.

Explorar os jardins e as mais belas flores.

Conseguir me livrar da super proteção de papai.

As vezes eu ficava pensando...

Como ia ser minha vida se eu tivesse saúde e pudesse viajar para onde quisesse? Como ia ser ficar longe de papai e construir meu próprio destino?

E se um dia eu mudasse?

Ficasse rebelde depois que conseguisse sair do casulo e virar borboleta?

Será que eu sabia lidar com a liberdade?

Olhei para o colchonete e vi Ravena dormindo.

Ela dormia sem mexer nenhum dedo. Somente com a respiração calma. Fiquei observando a leveza daquele momento.

Lembrei de todos os episódios que tinham acontecido no dia anterior.

Estava com raiva de Olivia por tudo que ela falou e como agiu ao ofender Ravena, magoada com Olivia e Rute por terem sido péssimas amigas, surpresa com a atitude inesperada.

Eu queria ser amiga de todo mundo, mas eles não entendiam isso.

Os populares não aceitavam que eu andasse com os excluídos e insistiam para mim fazer uma escolha sobre qual grupo parecia o “certo.”

Era tão sem sentido.

Passei a tarde inteira de quinta-feira pensando em como podia solucionar esse problema da melhor maneira possível. Eu resolvi ligar para Ravena e pedir que ela viesse na minha casa.

Eu tinha um plano

Foi dito e feito.

Conseguir distrair Ravena e brincamos juntas.

No final eu abri o jogo e falei a verdade sobre o plano e de ter pensado dela dormir aqui.

O pijama de unicórnio havia ficado fofo nela, no seu cabelo tinha uma trancinha normal e aquela “trança” com duas mechas que eu tentei fazer, o caderno de desenhos estava aberto do seu lado e o lápis caído no chão.

Ela desenhou tanto que acabou dormindo sem perceber.

Era 05h50 e eu tinha acordado cedo, pois acabei perdendo o sono então aproveitei para levantar e peguei o álbum de fotografias de mamãe.

Porém, antes de abrir o álbum, algo chamou minha atenção. O álbum de mamãe ficava dentro de uma gaveta da cômoda junto com o diário dela.

Tinha um papel saindo do diário.

Franzi as sobrancelhas sem entender direito, puxei o papel e percebi que era uma foto 3×4.

A foto estava escura, pois era bem antiga e tinha dois meninos sorrindo. Um deles possuía cabelo preto, olhos castanhos, vestia um suéter, sapato e pela sua altura aparentava ter 14 ou 15 anos.

O outro menino possuía cabelo preto, olhos pretos, era baixinho, vestia uma camisa e calça, sapatos bem limpos. Aparentava ter 12 ou 13 anos.

Espera...

Eu conhecia esse menino de olhos castanhos.

Aproximei a foto 3×4 para ver melhor e notei um sinal de nascença no pescoço dele, outro sinal no seu pulso parecido com o formato da lua, pulseira azul no braço.

Meu Deus.

Aquele menino era o meu pai.

Ainda em choque eu virei a foto e vi algo escrito com uma letra bonita.

As amizades podem durar uma vida toda e a amizade de vocês era especial. Podiam ter sido grandes amigos na vida adulta, mas escolheram brigar por minha causa. Espero que você, Gilberto, perdoe seu amigo e entenda que ele me ama e eu também o amo muito. A gente tá feliz e eu quero te ver bem. Espero te ver apaixonado por uma mulher linda, se casando, formando uma família, porque você merece.

De: Franciele e Joel
Para: Gilberto

A cartinha estava escrita em um papel branco que havia sido colado com a foto.

— Bom dia, meninas.

Papai entrou no quarto e deixei a foto cair por ter tomado um susto.

— O que foi, filha? — ele sorriu se aproximando — Qual o problema? Perdeu o sono?

— Bom dia, papai. O senhor me assustou agora.

Ele ia falar algo, mas parou de sorrir quando viu os meninos na foto antiga. Ele mudou a postura, cruzou os braços e ficou sério.

Aquele homem gentil e amoroso foi sumindo.

Ele não parecia mais o herói que eu conhecia.

— Tá tudo bem, papai? — levantei e abracei ele — O senhor tá sentindo alguma coisa?

Mexi seus braços e chamei ele várias vezes.

— Eu... estou bem — gaguejou quase sem voz — Venha... venha tomar o... café da manhã.

Ele gaguejava muito enquanto falava e fazia um esforço enorme para conseguir dizer cada palavra.

Será que sua reação estranha tinha sido por causa dos meninos da fotografia?

— Conhece eles? Um deles tem o seu nome, papai — eu disse — Olha só essa cartinha. No final tem o nome da mamãe Franciele e seu nome. Foi a mamãe que escreveu, não foi?

— Chega desse assunto, Jade Luisa — ele gritou — Chame sua amiga e venham comer logo.

Ele saiu com muita raiva do quarto e senti um arrepio na espinha.

Ravena acordou e sentou no colchonete.

Ela olhava para mim com os olhos pequenos de sono, cabelo assanhado, bochecha direita rosada por ter passado a noite com a bochecha voltada para o colchonete.

Tive vontade de rir da cena, mas nenhuma gargalhada saiu.

Fiquei preocupada com a reação de papai e não tinha como sorrir.

— O que aconteceu? — ela perguntou com voz de sono — Seu pai acabou de gritar?

— Não foi nada, Ravena — sorri forçado — Vamos se arrumar para a escola.

Ravena decidiu ir a paisano, porque tinha vindo para minha casa e não sabia que ia passar a noite.

Então ela não tinha levado o uniforme da escola.

Eu me arrumei e ajeitei a franja do cabelo.

Prometi que ia ficar do lado dela para lermos as atividades dos livros. Já que ela também estava sem a mochila.

Fomos para a cozinha e encontramos papai tomando café da manhã.

Ele estava pensativo e não parecia normal.

— Desculpa, filha — disse quando a gente sentou na cadeira — Gritei sem necessidade e não tinha intenção de brigar com você.

— Eu te perdôo, papai — suspirei — Vamos então esquecer isso?

— Não. Eu estaria sendo um covarde se fugisse de um assunto que eu estou envolvido — deixou a xícara na mesa — Peço licença, Ravena, porque preciso explicar uma coisa para minha filha e espero que você compreenda.

— Entendo perfeitamente, senhor — pegou o pão — Finjam que eu não existo e podem conversar a vontade.

Joel sorriu com o comentário.

— Sim, minha filha, foi sua mãe que escreveu aquilo. Eu nunca tinha visto aquele papel, mas quando vi a letra... com certeza era dela.

— Então aquele menino era seu amigo?

— Exato. Éramos amigos de infância. Gilberto era um garoto esperto e muito iludido. A gente não sabia como brincar com outros colegas. Sempre era só nós dois.

— Nossa. Que lindo, papai. A amizade de vocês era verdadeira.

— Tudo é verdadeiro, bonito, sincero no começo. Depois vem os problemas e as consequências dos nossos atos.

— O que quer dizer com isso?

Observei uma linha de expressão surgir na sua testa e percebi como ele estava preocupado.

— A sua mãe apareceu na história e mudou completamente nossas vidas.

— Olha a coincidência. Vocês se conheceram na infância.

— Sim, Jade Luisa. Eu, Gilberto e Franciele fizemos um trio. Até que o tempo foi se passando...

— Vocês foram crescendo...

— E consequentemente começamos a viver as fases difíceis da primeira paixão. Foi aí que tudo piorou. Eu e Gilberto acabamos nos apaixonando pela nossa melhor amiga, Franciele.

Ravena parou de comer e eu quase cuspi o café.

A história tomou caminhos surpreendentes

Essa nem eu imaginava.

— A mamãe sabia disso? — perguntei em seguida — Como foi a reação dela? Agora fiquei curiosa.

— Ela nem desconfiava. Até que um dia a gente combinou de se encontrar e eu tinha novidade para contar, mas ele também tinha uma. Então na hora certa nós falamos ao mesmo tempo... sobre nossa paixão secreta. Eu disse: “estou gostando da Franciele” e Gilberto me surpreendeu ao dizer a mesma coisa.

— Vocês se envolveram em uma confusão — Ravena comentou — Desculpa, senhor, mas é impossível não escutar nada se eu também estou na mesa.

— Uma confusão não. Um verdadeiro  quebra-cabeça. Minha mãe arrasando corações.

— Ela era uma garota incrível — concordou — Não fiquei chateado, Ravena. Pode comentar o que quiser.

— O que aconteceu? Qual o desfecho de tudo?

— Se acalme, filha. Tá muito ansiosa. Nem se empolgue muito. A história não teve um final feliz.

Eu e Raven nos entreolhamos.

Será que mamãe ficou sabendo do pior jeito possível?

— A gente se afastou — desviou o olhar e cruzou as mãos — Ficamos estranhos e com vergonha depois disso. É difícil ver o seu melhor amigo  virar um completo desconhecido e foi por “culpa” da Franciele no tempo. Hoje em dia eu sei que a culpa foi do Gilberto, pois ele nunca aceitou o fato dela ter preferido ficar comigo.

— O que?

Gritamos e a tranquilidade do momento sagrado chamado café da manhã  foi completamente embora.

— Deixa eu ver se entendi... vocês ficaram mal um com o outro só pelo fato da mamãe ter ficado com você?

— Tenha calma. Vamos chegar lá. Marcamos de nos encontrar novamente e tivemos a ideia de fazer uma aposta. Apostamos para ver quem conseguia conquistar Franciele primeiro.

— Nossa. Que aposta machista — ela deixou escapar — Sem querer ofender ninguém. Essa só é minha opinião. Acho sem sentido apostar e entrar em uma briga para conquistar alguém. É perda de tempo.

Ficamos em silêncio e eu pedi a Deus para que papai não brigasse com ela por causa desse comentário.

— Sua amiga tem razão — ele apontou para ela — Realmente a aposta foi machista e boba. Nós entramos em uma briga infantil. Hoje reconheço meu erro. Voltando a história... começamos a aposta e fizemos um esforço enorme querendo agradar ela. De repente nosso trio se desfez em questão de dias e ficamos empenhados em revezar. As vezes eu saia com Fran e em outras era Gilberto.

— Mamãe deve ter achado estranho.

— Com certeza. Ela era a favor da amizade eterna e ficou confusa por estar sendo convidada para sair ou comigo ou com ele. Gil era tão iludido que vivia dizendo: “Viu? Fran trocou olhares comigo” ou “Ela sorriu para mim. Você percebeu?” Sendo que ela nunca se quer demonstrou sentir nada por ele.

Segurei a risada e tive vontade de chorar por lembrar do desfecho.

— Tinha pena dele todo iludido. Então acabou que ela descobriu a aposta e ficou bastante magoada e chateada. Foi um dos piores dias da minha vida. De novo nosso trio se afastou e passamos dois meses distantes. Até que no terceiro mês recebi uma cartinha dela nos chamando para termos uma conversa séria.

— Deve ter sido complicado. Ela não merecia esse sofrimento.

— Foi complicado. Nos encontramos e para total surpresa de todos, ela admitiu que não conseguia mais esconder um segredo. O segredo era que ela estava gostando de mim.

Enxuguei as lágrimas emocionada.

— Ela pediu desculpas ao Gil e pediu que ele tentasse voltar a ser amigo dela. Disse sentir saudades da companhia dele, risada, das brincadeiras. A gente já era adolescente. No fim ele preferiu ter raiva de mim e nos tratar como se nós fôssemos traidores. Então eu e sua mãe começamos a namorar na adolescência.

Me levantei e abracei Joel.

Sabia que ele nunca ia ser capaz de admitir sua tristeza ou chorar, mas eu imaginava o quanto ele ainda sofria quando se lembrava disso.

Papai se fazia de forte o tempo todo.

Ele nunca mostrava uma falha.

Queria eu ser perfeita como ele.

— Gil se mudou com a família e foram morar em outra cidade. Ele não teve oportunidade de se despedir, dar um último abraço, última promessa de amizade. Simplesmente foi embora sem dizer adeus e nunca mais nos vimos. Ele nem imagina que o grande amor da vida dele... acabou... ele não sabe que ela morreu.

Eu estava em choque com toda essa história do passado. Abraçava ele e escondia meu rosto no seu pescoço. Não era fácil olhar papai e mostrar minha fraqueza.

Eu precisava ser perfeita.

Ele não chorou. Contou tudo direitinho.

Só eu fiquei emocionada.

Eu não estava conseguindo agradar Joel.

Por que eu me cobrava tanto?

Queria mesmo ser perfeita para fazer minha vontade ou queria ser perfeita com intenção de agradar o meu pai?

E o que eu queria? Também importava?

Ou só importava o que ele pensava?

Eu estava disposta a passar por cima das suas ordens e seguir o meu próprio caminho?

Mas eu ia ser uma filha horrível a ponto de desobedecer suas ordens e só pensar em mim.

Não queria ser egoísta.

— Se recomponha. Pare de chorar. Tem anos que aconteceu e eu não quero mais falar disso. Para o Gil eu devo ser um traidor e eu também odeio ele.

— Como assim? O senhor odeia seu antigo amigo  de infância?

Ravena questionou.

— Ele era um egoísta e só pensava nele. Nem fez um esforço, nem tentou entender, nem foi amigo de verdade. Devia ter aceitado, pois esse negócio de paixão não escolhemos. Acontece por acaso e ficar com raiva da Franciele foi idiotice dele. Sua mãe, Jade, acreditava que estávamos predestinados.

— Ela era extraordinária — passei um pano no rosto — Desculpa por ter chorado. Fiquei surpresa com tanta informação nova.

Sentei e abaixei a cabeça.

Queria entender o motivo de estar me sentindo culpada.

— Ainda bem que nunca mais vi esse Gilberto.

Terminamos de comer e fomos escovar os dentes.

Eu continuava pensativa sem ânimo nenhum de ir estudar.

Entramos no carro e Ravena pegou no meu ombro, e veio outra novidade.

— Tem algo nessa confusão toda que tá bem estranho.

— E o que seria?

— Esse nome Gilberto.

— O que tem isso, Raven?

— Gilberto é o nome do meu pai.

Observei Joel colocar o cinto de segurança.

— Tem certeza?

— Óbvio. Porém, é impossível ser ele. Meu pai nasceu no Lugar das Lendas e cresceu aqui. Esse outro Gilberto se mudou... eles não podem ser a mesma pessoa.


Chegamos na escola. Sai do carro, olhei em volta e respirei fundo sentindo o ar entrar e ir para os meus pulmões.

A sensação de sentir o vento assoprar meus cabelos me fez rir.

Como era bom estar viva.

Deus estava sentado no seu trono e olhando para o mundo. Ele devia se sentir feliz por ver a sua criação.

Ou talvez desanimado, pois existe maldade no mundo e eu tenho certeza que o plano Dele nunca foi esse.

No meu mundo encantado também existia Deus e Ele nunca ficava triste com o ser humano.

No meu mundo todos viviam bem, trabalhavam, brincavam, se divertiam em campos e jardins, comiam bem, descansavam e a vida seguia o seu rumo.

Ninguém ficava desanimado.

Existia somente coisas boas.

Todos se respeitavam e se amavam.

Uma boa risada e um abraço eram os melhores remédios, e  ninguém ficava doente. Nem se quer existia os hospitais.

Todos eram livres para amar quem quisessem

Respeitavam as diferenças

Se ajudavam

E trabalhavam em equipe

Papai era a primeira família que eu tinha, meus amigos novos junto com Diana, Ana Lucia, Eunice e Luciana eram minha segunda família e a última era os moradores do meu mundo encantado.

— Parece que alguém tá animada — Raven empurrou meu ombro — No que você tanto pensa?

Sorri enquanto encarava os seus olhos negros.

Uma noite escura sem lua e nem estrelas “olhava” para mim de volta e me perdi nas palavras que pensei em dizer.

— Eu — pisquei e comecei a balançar meus braços como uma forma de disfarçar o meu nervosismo — Estava pensando em como é bom estar viva.

— E se sentir viva é melhor ainda, Jade — ela completou — Muitos vivem por viver. Eu não quero ser assim. Prefiro aproveitar os mínimos detalhes e cada beleza do mundo e da natureza.

— Você tá inspirada hoje — parei de balançar os braços.

— Eu estou com inspiração todos os dias — deu de ombros — Por isso eu preciso comprar um caderno para escrever durante o dia. Vivo tendo ideias e é bom anotar tudo ou escrever logo um texto.

— Falando em texto — limpei a garganta — Gostou de verdade daquela poesia?

— Claro que gostei, garota — abriu minha mochila e tirou o papel — Estou guardando sua poesia.

Parece que eu estava ganhando pontos e finalmente subi uns degraus da escada.

Ganhei uns três pontinhos por ter feito a poesia e mais quatro pontinhos por ela ter gostado do presente.

Aos poucos eu ia passando confiança para ela.

Esse foi meu objetivo desde que a gente se conheceu no jardim da escola.

Oliver chegou e fomos para sala de aula, mas eu vi Olivia e Rute no corredor e disse que eles podiam ir sozinhos e eu ia depois.

As meninas conversavam e eu comecei a andar em direção a elas.

Parei no meio do caminho quando lembrei do imprevisto que aconteceu ontem. Eu precisava evitar as meninas, manter distância, ficar perto das pessoas certas e que queriam o meu bem.

Era hora de focar em mim e no nosso trio de amigos... ou quarteto com a chegada de Julie.

Deixei meus ombros caírem e precisei me segurar para não ir falar com elas. Porém, a vontade que eu tinha era de fazer as pazes e ser amiga de todos.

Achava chato ficar numa briguinha boba.

Só que Olivia merecia isso. Ela tinha que aprender a respeitar.

Entrei na sala e sentei na cadeira da frente.

Escutei uma voz feminina sussurrando atrás de mim.

— Reunião hoje? — Julie perguntou — Mais um encontro da nossa Biblioteca Ultrasecreta?

— Bom dia para você também — brinquei e me virei para trás — Fala com Oliver e Raven. Tenho certeza que eles vão gostar. Qual o livro de hoje?

— A Bela e a Fera — respondeu com a voz misteriosa — Vamos mostrar algo novo para as criancinhas.

Olhei na lousa e tinha uma frase intrigante. Voltei toda a atenção ao ver o que estava escrito.

“Não tenho certeza de nada, mas a visão das estrelas me faz sonhar.”

Vincent Van Gogh

Já ouvi falar sobre ele, mas não sabia muita coisa.

— Bom dia, alunos — professora Kátia entrou na sala — Hoje vamos tratar sobre um tema muito interessante. Vocês já ouviram falar de Vincent Van Gogh?

Os alunos olharam ao redor.

— Ele era um pintor holandês? — Julie tentou acertar.

— Ele era escritor. Tenho certeza — um menino lá atrás falou.

Todos riram e começaram a falar ao mesmo tempo.

Parecia uma feira com tanto barulho.

— Silêncio, pessoal. Mantenham um bom comportamento na sala de aula. Não podem fazer tanto barulho.

A agitação dos alunos foi sumindo.

Aos poucos a calma e a tranquilidade voltaram a fazer parte da manhã.

— Vincent Van Gogh não foi um escritor — ela continuou — Ele foi um pintor holandês. Ele era filho de um pastor e o primogênito de 6 irmãos.  Infelizmente Van Gogh teve uma vida difícil. O povo da época não entendia o pintor, pois não estavam prontos e nem queriam lidar com a genialidade da pintura dele. Simplesmente levaram esse caso para um caminho totalmente errado. Talvez vocês, crianças, não tenham essa noção do quanto é importante falarmos sobre ansiedade ou depressão.

Respirei fundo e afundei na cadeira vendo que a aula estava indo por um caminho novo. Nunca tinha estudado sobre esses temas que as vezes eram tratados como tabu.

Deixavam a gente de fora da conversa quando consideravam o tema delicado.

— Van Gogh precisava de tratamento para tratar sua ansiedade e depressão. Muitos julgaram ele e também suas obras. Sei que sou suspeita para falar, mas eu particularmente sou apaixonada pelas pinturas e frases de Van Gogh. Para mim ele merecia ter tido sorte a ponto do povo da época ter percebido o seu pedido de socorro e o atendido no momento certo. Nós ficamos pensativos e refletindo e perguntando a Deus o motivo dele ter sofrido tanto. Deus sabe das coisas, crianças. Ele não merece receber a culpa por nada. Eu cheguei a essa conclusão. E eu fico feliz porque imagino que lá no futuro muitos se lembrarão de Vincent e muitas pessoas vão poder ver fotos do pintor, suas obras, ler sobre sua vida e espero que as futuras gerações se conscientizem da importância de tratar a ansiedade e a depressão.

O silêncio não trouxe conforto e percebi o quanto todos meus colegas ficaram reflexivos.

Tinham ficado confusos por terem sido pegos de surpresa.

— Van Gogh gostava muito do seu irmão, Theo, e eles eram unidos. Ele não teve sucesso com suas pinturas e nem conseguiu vender nada. Vendeu só um quadro ainda em vida que foi A Vinha Encarnada. Então Theo ajudou o irmão financeiramente e o sustentou até o fim. Só que precisava trabalhar e cuidar da família.

— Quem fazia companhia ao Vincent? — Oliver indagou — Ele ficava em casa sem ninguém?

— Seu apoio, companhia e inspiração foi a natureza, Oliver — cruzou os braços — Tinha uma relação próxima com as árvores, raízes, plantas e isso servia de inspiração para suas obras. Ele se encontrava na natureza.

Ravena sorriu empolgada. Talvez gostou de saber essa curiosidade.

Ela também gostava da natureza

— Não tenho certeza de nada, mas a visão das estrelas me faz sonhar.

Kátia leu, pegou o giz e fez uma ceta apontando para a frase na lousa.

— A Noite Estrelada foi sua obra mais famosa. A  pintura é de 1889.

Ela abriu um livro e mostrou uma imagem.

— Aqui é a tela. Uma paisagem noturna e muitos acreditam ser sombrio por essa causa. O céu e as estrelas são o grande destaque, também tem ciprestes que sobem ao firmamento, umas montanhas e povoados.

— As estrelas parecem fogo — uma menina disse — Tem redemoinhos de vento ao redor.

— Eu vejo as estrelas como se tivessem com os anéis de saturno rodando em volta — Vinícius sorriu — E as casinhas  chegam nem perto da grandiosidade do céu.

— Boa observação, Vinícius — Kátia elogiou — Alguns dizem que parecem fogo mesmo. Tem várias interpretações. Vincent fez essa obra quando estava internado por vontade própria no sanatório Saint-Rémy-de-Provence na França.

— Nossa. Ele ficou em um sanatório — Olivia deixou escapar — Quanta força teve, pois enfrentou tudo isso e fez uma obra enquanto ficou internado.

— É, Olivia, ele não era considerado um gênio — a professora se entristeceu — Muitas cartas que Vincent escreveu para o irmão, Theo, mostram todos os seus pensamentos e como ele via o mundo. Antes de produzir essa tela acabou escrevendo uma carta ao irmão.

Ela apontou para o textinho em negrito em baixo da pintura do livro.

“Observando o céu pela janela antes do amanhecer, notei que estava límpido, nada além de uma estrela muito grande, que só poderia ser a Estrela d’Alva.”

— A estrelinha que fica pertinho da lua — Berenice falou encantada — A magia acontece de novo.

Os alunos começaram a rir do jeito romântico de Berenice e começaram a vaiar a garota.

Fiquei incomodada com a zoação só por um simples comentário.

Berenice não ligou e continuou sorrindo toda romântica.

— Ele nasceu em 30 de março de 1853 e faleceu em 29 de julho de 1890.

Alguém bateu na porta.

— Licença, tia Kátia — a diretora se desculpou — Interrompi sua aula por uma boa causa. Temos um aluno novo chegando. Completamos a meta de 43 estudantes no 5° ano.

Um garoto de cabelo loiro entrou com as mãos no bolso da calça, de cabeça baixa, sorriso tímido.

— Seja bem-vindo, Miguel — a diretora desejou — Espero que você seja bem recebido por seus novos colegas.

Ela se despediu e o tal Miguel ficou parado feito uma estátua.

Algo caiu no chão e pulei de susto na hora.

Não tive como raciocinar direito e descobri tarde que o barulho foi do caderno de Rute.

Todo mundo ficou encarando o caderno, o sorriso sem graça e o jeito desajeitado dela.

Deixou o caderno cair por ter se distraído com a chegada do novato.

Percebi tarde demais a mudança de TODAS as meninas.

Elas ficaram encantadas por ele. Como se tivessem sido enfeitiçadas.

O novato estátua continuou sem se mexer e deduzi que ele podia estar mal ou sentindo dores.

Depois de ter passado longos minutos com os sorrisos bobos, a professora confusa, alunas sussurrando umas com as outras, os meninos perdidos sem saber o que aconteceu.

Enfim o novato encarou a pequena platéia de garotas encantadas. Pareciam ter visto um cantor famoso.

As suas íris verdes foi a primeira coisa incrível que reparei.

As mãos dele estavam suadas. Dava para perceber de longe seu nervosismo.

Ele tinha a natureza completa pintada em suas íris.

— Podemos fazer a atividade? — Kátia despertou as meninas — Sente, Miguel. Pode conhecer seus companheiros no intervalo.

Ela brincou.

Miguel concordou e correu para o primeiro canto desocupado do lado de Berenice.

Elas acompanharam seus passos sem piscar os olhos e fiquei com medo.

— Vocês vão ficar em grupo — avisou — Grupo de 4 pessoas. Vou distribuir uma folha para cada grupo e cada folha terá uma frase diferente de Van Gogh. Vão debater a respeito do que estiver escrito e cada um vai fazer um texto de no máximo 15 linhas com sua própria interpretação da frase e também da vida do pintor. Lembrem do que falei aqui e nisso vão refletindo suas interpretações.

Julie correu e sentou perto de Berenice e Miguel.

Oliver se aproximou de mim e em seguida Ravena sentou na cadeira a minha frente.

— Aceitam mais um? — Vinícius se aproximou — Prometo ajudar vocês com alguma inspiração para tirarem nota 10.

— Toda ajuda é bem-vinda — Oliver tirou o lápis de dentro do estojo — Preciso tirar pelo menos um 7.

— Além de jogar no Fliperama com a Julie e não acreditar em duendes — me manifestei — Você se interessa por arte e pintores da Holanda?

— Só um em especial — ele sentou e pegou a folha — Só por esse gênio mesmo. Olhem só isso aqui.

“Se você perdeu dinheiro, perdeu pouco. Se perdeu a honra, perdeu muito. Se perdeu a coragem, perdeu tudo.”

— O que entendem a partir disso?

— Entendo que a coragem é a chave.
O dinheiro não é o suficiente por ser passageiro, perder a honra é horrível e perder a coragem é extremamente trágico.

— Ravena explicou tudo. Eu ainda acrescento o fato de ser corajoso e inteligente a ponto de saber se vale a pena arriscar.

Demos início aos debates e por último iniciamos a atividade. Escrevi 10 linhas, Vinícius escreveu 15 por ter pegado mais inspiração, Raven fez 9 linhas e Oliver concluiu com 12.

Entregamos nossa tarefa.

As horas foram se passando...

( 11h30 )

As aulas haviam terminado e papai se atrasou um pouco. Acabou indo me buscar tarde.

Dentro do carro a música tocava, mas meu pensamento permanecia distante.

Faltava Ravena.

Lembrei da noite de brincadeiras que tivemos e de quando ela entrou no carro para irmos juntas para escola.

Agora só tinha eu e papai como sempre.

Eu ia passar a tarde sozinha com minhas imaginações e não podia brincar no balanço.

Nessa nova casa nem existia um quintal grande.

Era meio vazio, silencioso, distante de tudo apesar de ser uma rua bonita. Casinhas de interior em uma cidade assombrada.

Eu nem ia ter a oportunidade de fazer guerra de travesseiro novamente.


Quando sai do carro eu decidi colher um dente-de-leão. Fiquei guardando a pequena flor e não a perdi de vista.

Na hora do almoço, o momento sagrado, deixei o dente-de-leão em cima da mesa do meu lado.

Na hora de tomar banho, escutar o CD de Sandy e Júnior e Trem da Alegria, hora de dormir a tarde...

Continuei guardando com todo cuidado.

Peguei a flor delicada e abri um pouco da cortina da janela.

Estava no quarto com a companheira dos meus brinquedos.

Abri a janela devagar sem fazer barulho, pois seu Joel ia brigar comigo se visse a bendita janela aberta.

O sol nem se quer iluminou o quarto. Era fim de tarde e o sol se preparava para ir embora.

O sol precisava nascer em outro lugar

Assoprei suavemente e as pétalas foram voando, voando, voando e se perdendo no ar. As pétalas brancas inundaram minha visão e me fizeram ver tudo branco.

Soltei uma risada maravilhada com tamanho milagre.

Lembrei de mamãe, Gilberto e seu Joel. Eles tinham tudo para serem amigos até hoje.

Eu ia assoprando e imaginando Franciele criança brincando com meu pai, Joel e Gilberto. Gilberto que era um enigma por enquanto, porque a gente não sabia muita coisa sobre ele.

O telefone tocou e rapidamente fechei a janela junto com a cortina.

Encostei na parede e olhei o caule. Todas as pétalas tinham saído e estavam voando pelo ar.

Papai abriu a porta de repente.

— Suas amigas estão no telefone, filha. Elas estão ansiosas para falar com você.

Corri sem pensar duas vezes e agarrei o telefone.

— Alô? Estão aí? — perguntei gritando — Falem comigo.

— Oi, Jade Luisa — escutei o grito das quatro meninas.

Elas estavam eufóricas.

Eu não parava de sorrir.

Os gritos delas ainda pareciam ecoar. Como um eco que nunca ia esquecer.

— Vocês vivem sumindo — reclamei — A gente mal consegue se comunicar. Ainda ligam assim de surpresa.

— Adoramos fazer surpresas — Ana Lucia riu ao pegar o telefone — Como você tá? Como é a cidade? Tem matos rodando as casas velhas?

— Ana Lucia, quantas perguntas — balancei a cabeça rindo — Primeiro, a cidade não é essa coisa toda. Tem uma lenda da lua e as pessoas tem umas regras estranhas. Segundo, eu estou bem gracas a Deus. Terceiro, as casas aqui da rua são bem bonitas e é como aquelas cidadezinhas de interior.

— Você tá sobrevivendo — ela suspirou aliviada — Nossos pais queriam que nos concentrassemos nas tarefas escolares e não nos distraíssimos escrevendo cartas ou te ligando.

— Que absurdo. Eu sou mais importante — fingi ter ficado com raiva — Também conheci Oliver, Ravena, Julie e Vinícius. São meus colegas de sala.

— Ei, somos amigas eternamente. Não pode nos abandonar — fez uma voz triste — Nós temos uma...

Ela não terminou e tive a impressão da ligação ter encerrado.

— Oi Jade.

Luciana gritou tão alto que precisei de uns segundos para ver se eu não tinha perdido a audição.

Era minha pequena Lú de 8 anos.

Ela adorava ser engraçadinha.

Ainda sentia que eu tinha o papel de mãe na vida dela.

— Para de ser mal educada — Ana Lucia reclamou do outro lado da linha — Você não pode pegar o telefone sem avisar.

— Foi mal — Luciana abafou uma risada — Jade, estou com muitas saudades. Você leu nossa carta?

— Eu li sim e adorei — sentei no sofá — O que anda aprontando?

— Eu não apronto — disse rápido — Queria contar uma coisinha... Tá preparada?

— Preparada? Isso é algo sério? Conte logo que fiquei curiosa.

— Que rufem os tambores.

Ela fez suspense e bateu na madeira.

— Diana tá apaixonada.

Imaginei que Luciana estava pulando e comemorando.

— Eunice gosta do Luisinho e Diana gosta do Rafa.

O QUE???????????

Com vários pontos de interrogação.

Só podia ser mais uma brincadeira de Luciana.

— Jade Luisa ficou muda.

Escutei as reclamações das meninas e senti que era difícil ter uma boa reação diante daquilo.

Como isso aconteceu??????????

— Diana... Como isso aconteceu? — sussurrei com a voz diferente — Você tá brincando...

Minha voz demonstrou meu nervosismo.

— Não é brincadeira. Eu estava ansiosa para te deixar por dentro das novidades.

— Quem é Rafa? Ele estuda com vocês?

— É um garoto que é vizinho dela. Ele e Luisinho estão se aproximando também.

Fechei os olhos.

— Desculpa — Diana tomou o telefone — Eu sei que estamos distantes, mas eu tentei te contar por carta. Minha mãe não deixou... queria que eu estudasse para as provas.

— Eu entendo — sorri forçado — Você gosta dele?

— Ah... não sei. Acho que sim — disse tímida — Ele é meu novo vizinho... e você? Me fala se tem algum menino que mexeu com seu coração.

Suspirei.

— Nenhum mexeu com meu coração. Somos muito novas para pensar nisso.

— Você sempre diz isso. Até parece que nunca vai crescer e se apaixonar.

Eu gosto de você, Diana

Eu não acho. Agora tenho certeza

— Em um futuro próximo... posso gostar de alguém...

— Me mantenha informada.

Rafael não tinha culpa de nada. Talvez ele nem gostasse dela.

Eu precisava apoiar minha amiga.

Mostrar que queria ver o seu bem e pedir para ela descrever a aparência dele.

Mas só Deus sabia o quanto aquilo havia me magoado.

O quarteto.

Imaginei uma luz acendendo em cima da minha cabeça.

Nosso quarteto.

Como não tinha pensado nisso antes?

Para esquecer Diana tinha que brincar bastante, apostar corrida com Oliver, conversar até cansar com eles, convidar eles para virem aqui.

Precisava manter minha mente ocupada.

Isso era só uma fase.

Uma fase passageira.

Eu pertencia ao Lugar das Lendas e aqui era o meu lugar, meu lar, meu “refúgio”.

Havia encontrado paz na lagoa encantada. Pertencia a esse novo mundo.

Podíamos ter feito promessas na Cidade do Sabiá, eu lembrava de todas elas, e estava cumprindo uma por uma, mas a realidade agora essa, o caminho era esse, a mudança também.

Foque no grupo

Você faz parte desse quarteto

Se distrair. Se distrair

Nas próximas semanas eu ia ficar ainda mais próxima deles.

Assim esse sentimento ia embora.

O que acharam da atitude de Jade de se concentrar no quarteto e esquecer Diana?

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro