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6 TRABALHOS ESCOLARES

UM FATO PECULIAR DE REGIMES AUTORITÁRIOS É QUE, POR MAIS QUE TENTEM, NUNCA CONSEGUEM CALAR TODAS AS PESSOAS. Na Escola Damariana, não era diferente. Apesar de um clima desfavorável às manifestações progressistas, sociais, combatentes às discriminações, aqui e ali alguns personagens conseguiam fugir das imposições do Conselho Estudantil do colégio. Naquela manhã, uma dessas pessoas estava diante da turma 9-C em mais uma tentativa de revolução.

— Então, pessoal, a nota deste semestre será um seminário.

— Lá vem coisa de esquerdista... — o comentário sobrevoou a turma, sem identificação de seu autor. Mesmo assim, o professor direcionou a resposta para a turma do fundão.

— Pois, é exatamente isso. E a coisa de esquerdista que vai determinar a nota de vocês é um seminário sobre escravidão no Brasil e suas consequências nos dias de hoje.

O professor Bélis juntou as pontas dos dedos e aguardou. Talvez por ter uma barba branca à la Alvo Dumbledore, talvez por não cair nas provocações dos alunos, o professor de História era admirado e respeitado por (quase) todos.

— Alguma pergunta, senhoras e senhores?

— Professor, aqui — uma menina do grupo de Cléver ergueu a mão. — O senhor acha mesmo que é necessário discutir uma coisa assim?

O senhor olhou para a aluna por tanto tempo que Lucas pensou que tivesse adormecido ali de pé, com os olhos abertos. Mas não. Bélis estava buscando argumentos para replicar a garota.

— Sim, eu acho.

— Mas isso não seria uma questão de ideologia nas...

— Não, não seria. O nome disso é entender nossas raízes, doa a quem doer. Mais alguém com uma pergunta relevante?

Otávio, sentado atrás de Lucas, sorriu.

— Eu amo esse cara — confidenciou num sussurro que saiu mais alto do que devia.

— Eu fico muito honrado com o seu amor, senhor Tromep, mas eu já sou casado. — A turma sorriu. — Além dessa oportuna declaração de amor, o senhor tem alguma pergunta?

Otávio, um tomate em forma de gente, arregalou os olhos.

— Grupo seminário vai em ser?

— Boa pergunta, Mestre Yoda. — Bélis brincou e caminhou para a mesa. Por isso, não escutou quando Cléver chamou o colega de "Baby Yoda Baleia". Lucas sentiu a raiva subir. — Sim, o seminário será em grupo. Quatro alunos para cada tema.

Foi uma agitação. Carteiras começaram a ser arrastadas, o falatório acendeu feito fogo na palha, gritos de "ei, já tem grupo?" encheram o ar. Dez minutos depois, grupos formados, Lucas, Otávio, Evandro e Domingas felicíssimos por terem ficado juntos, o professor Bélis se levantou. Estava com uma expressão de criança prestes a dizer para a mãe que tirou dez em todas as matérias da escola.

— A paciência é uma virtude. Aprendam a escutar ao invés de apenas reagir. Eu disse que o trabalho será em grupo, sim. Mas eu escolherei a formação desses grupos.

— Por quê? — Alguém gritou.

— Porque num tema como esse eu preciso que os grupos sejam diversos. Muitos dos meus colegas professores não querem admitir obviedades, mas eu não sou assim — todos notaram que ele mais uma vez olhou para o fundo da sala onde Cléver e a patota estavam. — Se vocês escolhessem com quem trabalhar, ficariam apenas na zona de conforto para discutir um tema que é muito delicado nesta escola e no país: o racismo. E foi exatamente o que fizeram — e fez um aceno para o grupo de Lucas.

O professor foi até sua pasta e puxou uma folha impressa. Pigarreou e começou a ler as novas formações de grupos. Carteiras voltaram a ser arrastadas, mas desse vez com um silêncio que predominou até Bélis terminar o anúncio. Ao final, tudo redefinido, o senhor fez uma varredura pela sala, o rosto irradiando satisfação.

— Muito bem, muito bem. O seminário será daqui a duas aulas. Espero que tenhamos discussões proveitosas e respeitosas. Vou liberar nosso próximo horário para que vocês comecem os preparativos.

O sinal tocou e ele se empoleirou em sua cadeira com a cara enfiada em "Cem Anos de Solidão" do Gabriel Garcia Márquez. Ao redor dele, só faltavam velas para completar o clima de velório entre os alunos.

Otávio, que ficara em um grupo com Túlio e uma menina que vivia fazendo piadinhas sobre todos, tinha a boca que era uma linha. Domingas, obrigada a fazer o trabalho com três típicas "patricinhas", era como uma pérola jogada no meio da lavagem dos porcos.

— Vou logo dizendo que não tenho tempo pra fazer trabalho besta na casa de ninguém.

Lucas tomou fôlego e encarou Francis. O rapaz, coque samurai, bigode bem feito, rato de academia, olhou de volta, pupilas flamejantes. Era aquele tipo de aluno provocativo, que adorava fazer confusão na surdina para que o professor acusasse outra pessoa. Por sorte, a menina que estava no grupo, Lucy, deu a melhor ideia.

— Bom, hoje a gente não tem aula à tarde. A gente podia ficar para discutir o trabalho, dividir os assuntos e adiantar a pesquisa. O que vocês acham?

— Eu gosto — Evandro assentiu. — Não atrapalha os — olhou para o bíceps musculoso de Francis e ergueu uma sobrancelha — compromissos sérios de ninguém.

— Olha aqui, se você quer ser...

— Eu também concordo — Lucas interrompeu o rapaz. Francis se calou.

— Depois do almoço a gente se encontra na biblioteca do terceiro andar. Que tal?

Todos confirmaram presença. Resolvido isso, cada um pegou seu celular e foi fingir que fazia algo relacionado à aula para passar o tempo.

***

A BIBLIOTECA DO TERCEIRO ANDAR, SOZINHA, TINHA METADE DA QUANTIDADE DE LIVROS QUE A BIBLIOTECA GERAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO. Poltronas acolchoadas, paredes de vidro com vista para o Parque Ecológico do Rangedor, ar-condicionado sempre com uma temperatura convidativa, todo esse esplendor era ignorado pelos alunos. Encontrar alguém ali uma raridade. Muitos não compreendiam o motivo de a escola ter quatro bibliotecas daquele tamanho, mas Lucas tinha suas teorias.

Jorim comentava que, quando houve o desabamento da quadra da Agildo Eliaquim, a Damariana só possuía duas bibliotecas comuns. Ao longo dos anos, coincidindo com a "benesse" de ter cedido a quadra para os alunos do município, a escola fez investimentos polpudos, incluindo as duas novas bibliotecas de nível super luxo.

"Tu acha, então, que o Isaú escondeu dinheiro fazendo essas obras?", Lucas chegou a perguntar para o primo.

"Olha, provas ninguém tem, né? Mas é muito esquisito essa coincidência de que a nossa quadra tenha desabado, demorado séculos para ser reconstruída, ao mesmo tempo que a Damariana cresceu cada vez mais."

"Mas o senhor Fauller não fez um escarcéu dizendo que não teria dinheiro público na reconstrução e que tudo sairia do bolso dele?"

Lucas lembrava de Jorim ter sorrido nessa parte da conversa.

"E tu acha mesmo que alguém como Isaú Fauller ia gastar dinheiro de graça com uma escolinha pobre da Ilhinha, inocente?"

Lucas virou a poltrona para ver a extensão da biblioteca. Os corredores entre as prateleiras eram tão longos que daria para fazer uma maratona olímpica ali dentro.

— Tá admirado com o que nunca teve, Carvão?

— O Lucas não. Mas tu deves estar admirado de conhecer o que é um livro, né, Francis? Tu pelo menos sabes ler?

Evandro e o outro se encararam, energia de intimidação. Lucy, agoniada com a situação, começou a folhear as anotações passadas pelo professor e a falar muito rápido. Pela imposição de uma coisa chamada nota (e o fato de que Bélis não dava segunda chance nem para o Papa), trataram de engolir as opiniões um sobre o outro e trabalhar no seminário.

Algumas poucas pessoas entraram e saíram da biblioteca, livros foram folheados, o sol caiu no horizonte. Os frequentadores do Parque do Rangedor começaram a chegar para curtir o entardecer e fazer caminhadas, praticar esportes ou participar de piqueniques. Do outro lado da avenida, enfurnados naquela biblioteca há quase quatro horas, boa parte do trabalho já caminhava bem. Para a surpresa dos outros três, Francis se mostrou um digitador habilidoso e, aproveitando os computadores disponíveis, decidiram redigir o artigo. Como Evandro e Lucas eram bons de produção textual e Lucy uma craque em encontrar as referências certas nos livros, finalizaram o trabalho.

Isso até Evandro dar uma sugestão quase ao final.

— Assim, a gente sabe que essa questão do racismo é a base do trabalho, mas é impossível não pensar que esse assunto dá margem para a gente falar sobre outros preconceitos, né?

Os olhos de Francis se estreitaram, mas ele ficou calado.

— Você quer expandir o final do texto?

— É, só pra lembrar que a luta contra o racismo pode impulsionar a luta em relação a outros preconceitos, contra machismo, etarismo, gordofobia, capacitismo, sabe? Cês não acham que seria uma conclusão legal?

— Taí, é uma boa ideia — Lucas apontou.

Lucy concordou

— Gostei também. Como o professor Bélis disse, o trabalho foi motivado pelo que acontece aqui na escola. Seria mesmo interessante a gente falar, mesmo que seja só na conclusão, sobre homofobia, transfobia e...

Francis fez um barulho com a boca que quem visse de fora pareceria engraçado, como um estalinho. Porém, eles três se assustaram. Soava como o disparo de uma arma.

— Vocês tão de zoas com a minha cara, né?

— Por quê? — Evandro cruzou os braços.

— Filhinha, a gente tá há horas aqui, tava tudo bonitinho, tudo certinho pra terminar essa merda, só faltava o ponto final. Aí lá vem tu com esse mimimi de novo? Fala sério! Toda hora essa bosta?

— Essa bosta é causada por vocês! Por isso mesmo que eu quero colocar no trabalho.

Francis jogou a cabeça para trás.

— Meu Deus, que saco! Esse pessoal quer colocar viado em tudo que é lugar! Tu precisa é de um macho pra te ensinar o que é ser mulher, isso sim!

Aconteceu num sopro. Num momento, Evandro estava sentado na poltrona, no outro, estava dando um tapa no rosto de Francis. Pego de surpresa, o rapaz se desequilibrou e caiu no chão. Mas logo se levantou, cabelo bagunçado, as marcas dos dedos na bochecha direita e um fio de sangue no nariz. Lucy e Lucas ficaram estáticos, boquiabertos.

— Olha — Francis limpou o sangue com a mão —, a sapatão sabe bater. Eu só não vou revidar porque não bato em mulher.

— É, mas teu pai bate na tua mãe, né?

O pai de Francis, conhecido dono de uma emissora de TV de São Luís, fora processado há alguns anos pela ex-esposa. Na época do litígio, os podres do casal vieram à tona e ela o acusou de agressões físicas e psicológicas, mostrando boletins de ocorrência que, devido à influência e ao dinheiro do ex-marido, nunca foram adiante. Depois do escândalo, o empresário sumiu dos holofotes, mas o processo continuou aberto e sendo relembrado vez ou outra.

E, é claro, o filho foi uma vítima de tudo isso.

— Repete se tu for macho mesmo — Francis desafiou, o peitoral inflando e desinflando, mais vermelho do que a vermelhidão do tapa. Estava com os olhos cheios d'água.

O bibliotecário se aproximou às pressas. Um aluno próximo gravava tudo com o celular. Evandro ergueu o queixo, fez voz de criança.

— O papai do Francis batia na mamãe do Francis; espancava a mamãe do Francis; abusava da mãe do...

A poltrona entre eles voou. Francis agarrou Evandro feito um aríete, ergueu-o do chão e empurrou o garoto contra parede. Lucy gritou, Lucas e o bibliotecário lutaram para tirar as mãos do rapaz do pescoço do outro. Os pés de Evandro se debatiam no ar enquanto batia nos ombros de Francis. Foi necessária a chegada de dois professores para apartar a briga.

Enquanto no Parque do Rangedor um grupo de crianças tirava fotos vestidas com roupas de bumba-meu-boi, na Escola Damariana o bibliotecário e os professores levavam os quatro para a Coordenação-Geral. No caminho, foram acompanhados por uma enxurrada de fotos tiradas pelos demais alunos que de repente surgiram na biblioteca.

Quer atrair as pessoas? Não ofereça livros, mas sim fofocas e caos. Sempre funciona..

*

Fight! Tenso, tensíssimo. O bullying é um eterno gotejar, constante, diário, dentro de um copo de opressão que uma hora explode e acontece isso. Dói. Dói muito. E doerá mais ainda porque, no próximo capítulo, veremos como a escola lidará com esse copo - e as mortes que isso acarretará. Obrigado pela leitura, continue comigo, até a próxima!

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