XV
Mackensie já não via mais os dois; Guerra e Ferraro tinham sumido como fumaça. Virou-se para Maksimovich, que tinha um sorriso vitorioso nos lábios.
— O que você quer desta vez? — Guardou na bainha do cinto a adaga que Ferraro lhe dera.
— Pensei que receberia uma recepção mais calorosa. — O homem abriu os braços, à espera de um abraço. — “Como vai, Mak? Obrigada por me salvar pela segunda vez.”
Ela então se afastou; não abraçaria o vampiro, estava grata por ter sido salva mas isso não significava que gostaria de proximidade. Com o silêncio da mulher, o homem continuou a falar:
— Eu fiquei sabendo do plano de Bolsevaro para te matar.
Baixou os braços.
— Fiquei sabendo de tudo e, quando soube, eu tive que vir; sabia que Ferraro e Guerra não dariam conta. — Ele avaliava as marcas sobre o pescoço da mulher. — Sinto muito por ter demorado.
Ela colocou as mãos sobre os olhos; assim que o sol despontou completamente, sua visão ardeu, o que a fez fechar os olhos um pouco.
— Por que demorou?
O homem soltou um suspiro ao se aproximar dela; estava com uma calça jeans e camisa social de botões. Abriu os três de cima, deixando à mostra a grande ferida em seu peito.
— Ainda não me curei da última vez — falou, olhando para o horizonte. Não gostava de ver a cara de piedade da mulher.
— Não disse que se curava rápido? — questionou, aproximando-se mais e observando a ferida.
— Aparentemente, não fui ferido com madeira; fui ferido com prata. — Fechou a camisa à medida que ela se aproximava. — O que eu poderia curar em um dia, se torna dois, três ou quatro dias.
— Eu sinto muito — falou ela, solene, voltando a se afastar.
— Tudo bem, não foi sua culpa.
— Foi sua culpa — falou baixo. — Não estou dizendo que sinto muito por seu machucado. — Aumentou o tom de voz. — Estou muito feliz que esteja machucado, pode-se dizer que estamos quites pelas vezes que tentou me matar, mas eu sinto muito por conviver com isso, sinto muito por conviver com um erro que é seu — esbravejou, irritada.
— Mackensie — o homem falou baixo, aproximando-se da mulher. — Eu sinto muito pelo dano que lhe causei; eu queria permanecer longe, todavia, se eu fazer isso, outros virão atrás de você, pois a forma mais eficaz de me ferir é matando você.
Ele tinha os olhos tão serenos enquanto estava sobre ela, tão calmos e cheios de ternura, o que era raro de acontecer. Quando olhava para ela, era como se toda a sua dor fosse embora.
— Eu não tenho escolha; tudo o que posso fazer é amar você.
A mulher escutou cada palavra dele, tudo estava sendo degustado, tudo estava sendo absorvido; estava grata por ter sido salva pela segunda vez, mas não estava confiante no homem, apesar de algo dentro dela, uma parte obscura e ingênua, acreditar que ele estava sendo sincero.
— Então me prove.
— Provar o quê? — Cruzou os braços, sem entender o que ela falava.
— Prove-me seu amor. — Ela fez uma pausa. — Eu já entendi que está destinado a me amar, porque meu cheiro é chamativo, mas achar meu cheiro atraente não é sinônimo de amor.
O homem passou a língua pelos lábios, aproximando-se com um sorriso cético, e cruzou os braços bem próximo dela, olhando-a de cima a baixo.
— Eu quase morri por você. — Ele se aproximou mais — Isso não é uma grande prova de amor? O que mais poderia ter além da minha vida?
— Você é imortal — corrigiu. — Praticamente imortal, então se fez aquilo é porque sabia que não morreria; você não me deu sua vida. — Aproximou-se mais, encarando o homem. — Você apenas fingiu fazer algo por mim.
Ele respirou fundo, avaliando as feições da mulher, e então segurou no braço dela e rapidamente a colocou no colo, correu com a mulher para o carro e em questão de minutos ela estava dentro do veículo e com cinto no banco de motorista.
— Temos o dia todo pela frente; à noite prometo te deixar no instituto. — Ele olhou para ela, ligando o carro. — Mas me dê o dia de hoje para aproveitar com você.
Ela, depois de olhar para o vampiro um tanto quanto assustada, pois tudo acontecera para ela em um piscar de olhos, apenas olhou pela janela; não queria dizer não, todavia também não queria dizer sim. Era um paradoxo do qual ela não sabia sair.
— Quem cala, consente.
Maksimovich dirigia devagar; o homem tinha os olhos atentos a tudo o que se passava; ela ficou em silêncio o tempo todo, e ele fazia o mesmo, pois temia incomodá-la. Ele dirigiu por algumas horas até entrar no estacionamento de um parque de diversões.
— O que vamos fazer aqui? — questionou, tirando o cinto, e, em questão se segundos, mais uma vez ele já estava fora, abrindo a porta para a mulher sair.
— Ainda não sei como provar meu amor. — Ele deu de ombros, olhando para as pessoas. — Apesar disso, ainda posso fazer você sorrir, e é isso que irei fazer.
Quando a mulher saiu do carro, ele segurou na mão dela. O vampiro tinha uma empolgação no olhar, e o sorriso sutil era visível.
— Conhece esse lugar? — ela questionou enquanto eles entravam no parque.
— É uma das poucas lembranças que tenho de quando era jovem. — Ele apontou para a pequena fila que havia no brinquedo de atirar.
— E como você se lembra? — falou, observando o casal da frente comemorar por ganhar um bichinho de pelúcia.
— Eu não me lembro muito bem, quase não tenho memória da época que eu era um humano. — Assim que falou isso, o homem que pegou a próxima arma olhou para trás, desconfiado. Mak ignorou. — A única coisa que me lembro daqui era que, quando meu pai me trazia para cá, todas as vezes ele queria que eu risse; era meu pontinho de felicidade, esse lugar.
Ela ficou alguns segundos olhando para o homem; sabia que as pessoas carregavam marcas em forma de dor, e algumas dessas marcas eram capazes de mudar alguém. Perguntava-se o que fizera o homem mudar. Toda vez que falava com ele, via o resquício de um homem que não era visto. Ele então pegou a arma quando finalmente chegou sua vez e finalmente voltou a falar.
— Você participou de algumas competições de tiro ao alvo. — Pegou uma segunda arma de brinquedo, entregando a ela. — Vamos ver quem é o melhor.
A mulher olhou para o objeto em sua mão e depois para ele, e com um sorriso ela mirou no primeiro alvo.
— São três tiros, senhores — o atendente falou.
Ela então se inclinou um pouco, colocou o dedo no gatilho e puxou: acertou o primeiro alvo, errou no segundo e acertou a beirada do terceiro.
— Droga! — exclamou alto, recebendo uma balinha como prêmio. — Quero ver fazer melhor. — Apontou para o urso de pelúcia grande. — Moço, como faz para ganhá-lo? — quis saber, olhando para o atendente.
— Acertar no meio de todos os alvos — respondeu, acreditando que Mak iria errar.
Ela voltou-se para o homem, que tinha o sorriso largo nos lábios, a fim de dizer que aquele era um desafio. Maksimovich inclinou-se sobre o balcão, entendendo o recado, e concentrou-se, mas a mulher com intuito de atrapalhá-lo se aproximava dele, pois sabia que era uma fraqueza a ele. E foi certeiro: ele se mexeu desconfortável com o toque da mulher em seus braços, e ela se aproximou mais. Ela estava tão perto que ele podia sentir a respiração dela sobre si, e a vontade de atacá-la esparramava-se dentro de si como papel pegando fogo. Surgia como uma faísca que logo se tornava um incêndio que tomava conta de todos os seus músculos. Apesar disso, ele se manteve parado e puxou o gatilho. Atingiu o primeiro alvo, e logo o segundo e terceiro, todos bem no meio. O atendente, boquiaberto e relutante, pegou o urso grande e marrom, entregando-o ao homem. Ele se afastou dela, controlando o resquício da loucura que ela deixara nele, e pegou o urso, afastando-se da fila; ela ia ao lado dele.
— Isso não foi justo — ele falou demasiadamente chateado.
— Você tinha vantagem sobre mim, tudo o que eu fiz foi equilibrar. — Ela balançou a mão no ar enquanto falava.
— Você é uma trapaceira — disse, com um suspiro. — Apesar disso, o urso é seu. — Entregou-o a ela.
Nesse momento a atenção do atendente estava sobre ela, nas marcas no seu pescoço.
— A senhorita está bem? — questionou, sendo ignorado.
— Não, é seu. Você acertou o alvo — falou, olhando o urso e se voltando para o atendente.
— Mac, ganhei para você. Fique com ele, para que se lembre de mim.
— Senhorita — o atendente insistiu. — Se foi esse monstro que fez isso — falou com rancor —, pode falar que nós te protegemos.
Ela passou a mão no pescoço para onde o homem apontava, praguejando mentalmente por não ter reparado nisso. Mas como poderia ter visto? Maksimovich estava com os olhos repletos de raiva, e então ela respondeu:
— Não foi ele, eu estou bem.
Passou a mão pelo pescoço, tentando tapar.
Caminhou até a barraca de lenços, escolheu um vermelho e logo o comprou. Após colocá-lo no pescoço, voltou-se para Mak, que a seguiu. Ele estava com tanto ódio que era visível. E ela, tentando acalmá-lo, falou:
— Eu não preciso disso para me lembrar de você...
Parou de falar ao perceber que completaria a frase com algo meloso.
Ele colocou um o sorriso caloroso, então apontou para a máquina de fotos.
— Vamos lá. — Ele segurou a mão livre da mulher. — Quando eu era jovem, meu pai sempre me falava que um dia eu encontraria uma companheira, tiraria uma foto com ela e guardaria eternamente.
— Você afirmou que mal se lembrava de sua infância — ela falou, seguindo o homem, observando como os dois pareciam um casal com as mãos entrelaçadas assim.
Ela entrou na cabine de fotos com ele, e o homem parecia tão empolgado. Ela sentou-se no banco, e ele ao lado. O fotógrafo ligou a câmera; ela sabia bem que seriam duas fotos, e então resolveu deixar o momento mais inesquecível ainda: abraçou Mak, e seus olhos foram para os dele no exato momento em que os dele foram para o dela. Foi tirada a primeira foto em meio a olhares e sorrisos, e em seguida ele colocou a mão sobre o rosto da mulher, deslizando-a até os lábios, avaliando todos os ângulos da amada. Aproximou os lábios da fronte da mulher, depositando um beijo demorado, e ficou assim até depois da foto.
Afastou-se quando a mulher foi em direção à saída, acompanhando-a. Ela olhou para os colares na vitrine. admirada com o que podia observar, viu os colares e olhou para o homem que a olhava com aqueles olhos repletos de temores. Ela então apontou para um dos colares, e logo um homem se aproximou, tirando as fotos da cabine.
— Esse me lembra você: um coração com uma rachadura, ferido — ela falava do colar com o coração partido.
— Então vamos levar esse — ele falou com o atendente.
O homem logo pegou o colar, e ela se inclinou sobre o balcão para ver todo o processo. Mak não tirava os olhos dela nem por um minuto, pois não queria perder um segundo sequer de cada respiração, de cada sorriso — pois cada minuto que não fosse com ela seria perdido. O homem logo colocou a foto dentro do colar e o entregou à mulher. Mak pagou e estendeu a mão para ela.
— Deixe que eu coloque em você — Mac disse.
Balançou a cabeça negativamente, e então se colocou atrás do homem, colocando o colar nele.
— Me entregue quando fazer sua prova de amor.
Ele virou-se para a mulher com um sorriso entreaberto, segurou no punho dela e então depositou um beijo.
— Prometo que não irei decepcioná-la, mas por ora deve voltar para o instituto.
— Por quê? Para ser obrigada a lutar? Para escutar coisas que não quero? — esbravejou.
— Para ficar protegida, até que eu possa fazer algo.
— Proteja-me deles, faça isso por mim e não me leve — falou, doce, tentando convencer o homem.
— Eu adoraria que fosse simples assim, todavia meus inimigos são muitos, e você é uma só. Prefiro ficar longe de você por alguns dias a deixá-la se machucar.
— Não teria feito tantos inimigos se não fosse tão tolo — falou, a raiva se afastando. Não teria problemas com isso.
Ela seguiu para o carro e entrou em silêncio, colocando o cinto. O homem fez o mesmo, os dois em silencio, ele respeitando o estado da mulher e dirigindo por longas horas até chegar perto do instituto. A mulher por vezes dormia, olhava a paisagem, até que seus olhos finalmente avistaram a instituição e ela olhou para Mak. Ele parou o carro.
— Não quero uma guerra com o instituto agora, por isso não vou me aproximar tanto — falou, saindo do carro. — Eu entrarei em contato.
Ela desceu do carro e aproximou-se do homem — uma parte dela desejava que ele ficasse. Ele a abraçou, apertou a mulher em meio à sua própria escuridão e desejou ardentemente trazer luz a ela.
— Eu estarei por perto, sempre. — Relutante, soltou a mulher, pois sabia que logo alguns vampiros viriam abordá-lo. Foi em questão de segundos para deixar a mulher ali sozinha.
Ela entrou no carro e olhou para o banco de trás, conferindo se não havia deixado nada. E lá estava a pelúcia que ganhara no parque. Pegou-a e, com um sorriso, ficou a observar; Maksimovich não era o monstro que falavam, ele parecia pior na voz das pessoas que o acusavam.
Ela entrou no carro e se aproximou mais do instituto; o sol já estava se pondo, e ela sabia que Ferraro logo apareceria. Parou o carro em frente ao local, pegou o urso de pelúcia e ficou olhando para ele. Abraçou-o, tentando achar o cheiro de Mak no brinquedo, e ficou ali por minutos até a porta se abrir. Era Ferraro, claramente furioso. Ela, olhando para ele ainda abraçada no urso, escutou:
— O que ele fez? — Olhou em volta, pois sentia o cheiro de seu inimigo por perto.
— Ele não fez nada, apenas me levou a um parque e tivemos uma conversa — respondeu, entrando no quarto.
— E o que é isso daqui? — questionou, puxando o urso da mão da mulher.
Ela então o puxou de volta, pois era dela e Ferraro não tinha permissão para ser tão invasivo.
— Eu ganhei — falou, caminhando até a entrada do instituto.
Ferraro a seguiu, entraram em silencio e ela caminhou pelos corredores cujos caminhos ainda não conhecia muito bem — mas tinha a convicção que estava indo ao lugar certo.
— Eu sei que ele pode se mostrar gentil agora, mas deve lembrar que ele é um monstro, Mackensie — falou em advertência.
Ela, por sua vez, soltou um longo suspiro ao ver que estava bem em frente à porta de seu quarto.
— Eu sei bem o que ele é — falou um pouco brava. — Sei o que ele fez e o que ele faz, Ferraro, não se preocupe com minhas decisões. — Colocou a mão sobre a maçaneta. — Não remetem a você.
Sem entender o sentido de tanta arrogância da mulher, Ferraro deu um passo para trás; tudo o que queria fazer era protegê-la e matar Maksimovich. Com ele em silêncio, a mulher apenas entrou rapidamente no quarto, pois não desejava estender assunto. Ficou parada por alguns segundos, observando o quarto novo dela, e então se aproximou da cama, deixando o urso sobre ela, e foi para o banho.
Estava cansada, e os pensamentos insistiam em atormentá-la da pior forma possível. Ao sair do banheiro, já estava de roupa íntima e se deitou assim, sentindo a pele macia sendo cortada pelo vento da janela aberta. Ficou parada, olhando para o teto; de alguma forma se sentia atraída por Mak. Talvez fosse as sombras que o rodeavam ou o coração vivo por baixo da dor. Ela não sabia explicar, apenas se atraía, e ficou imóvel até cair no sono.
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