𖤍𖡼↷ 𝐓𝐇𝐈𝐑𝐓𝐘 𝐍𝐈𝐍𝐄
DEIXADA DE LADO
Os pesadelos insistiam em me atormentar com tanta frequência que quando não aconteciam, eu até mesmo acordava surpresa. Mas aquela não foi uma noite tranquila, muito pelo contrário. Minha vida estava uma verdadeira de uma merda, e nem mesmo quando eu fechava os olhos para dormir parecia dar uma trégua. Depois de mais um sonho horrível com Tenko e com a morte de Eijirou por culpa minha, acordei com o coração acelerado e a respiração ofegante. Mesmo tentando usar minha individualidade em mim mesma, parecia incapaz de controlar meus sentimentos e me acalmar, mesmo que minimamente. Quando aquilo acontecia, eu geralmente tinha Kirishima comigo; ele sempre fazia eu me sentir melhor e mais tranquila, mas ele não estava lá. Ele sequer sabia quem eu era para ele, e aquele fato conseguia me destruir bem mais do que qualquer sonho estúpido que eu pudesse ter.
Com um suspiro pesado, joguei minhas cobertas para o lado e me arrastei para fora da cama, esfregando meu olho enquanto caminhava até o banheiro feminino para jogar água no rosto. Tudo que eu menos precisava era acabar encontrando alguém no caminho até a cozinha com cara de choro, mesmo que fosse inevitável ficar sem chorar sentindo toda aquelede peso maldito no meu coração. Talvez se eu nunca tivesse permitido que Kirishima tivesse uma importância tão grande em minha vida, nada daquilo estivesse acontecendo naquele exato momento. Mas era inevitável, no final das contas; quando você encontra sua alma gêmea, não dá pra fingir que não existe nenhuma ligação entre você, seja ela romântica ou não, seja ela boa ou ruim. E eu tinha aprendido isso da pior forma possível.
Era uma droga ficar sem Eijirou. Durante muito tempo, me neguei a aceitar o akai ito, a aceitar a ligação poderosa entre ele e eu. Eu o evitei de todas as formas possíveis e no final das contas, nada disso serviu para algo. Porque eu acabei me apaixonando por ele e me tornando tão terrivelmente dependente do amor de Kiri que estar sem ele era a mesma coisa que perder uma parte de mim. E eu sabia que esse tipo de sentimento não era bom, mas o que eu poderia fazer, afinal? Ele significava o mundo para mim; era simplesmente injusto e cruel que as coisas entre Kirishima e eu tivessem ficado da forma como ficaram. Era injusto e cruel colocar ele no meu caminho, fazer eu o amar tanto assim mesmo que eu tivesse feito de tudo para que não, apenas para ter tudo isso arrancado de forma maldosa de mim.
Tentava não pensar tanto no que eu tinha perdido, pois por mais que eu quisesse, minha vida não podia parar. Eu tinha funções como estudante do curso de heróis a cumprir e não podia deixar isso de lado por meu coração estar completamente despedaçado. E mesmo tendo feito a promessa a mim mesma de reconquistar Eijirou, eu sabia que a dor de ele não lembrar de nós dois jamais iria ir embora. Eu ter que carregar sozinha e para sempre todas as memórias boas do nosso relacionamento não parecia nem um pouco justo. E ainda assim, lá estava eu, sem ele do meu lado e me sentindo mais vazia do que nunca, um sentimento que conseguia ser pior que o de saber que Tenko não era mais Tenko e que as memórias de quem costumávamos ser eu também carregaria como uma cruz pesada nas minhas costas.
Fiz o mínimo de barulho possível enquanto descia para ir até a cozinha em busca de um copo de água. Em momentos como aquele, eu precisava sair do quarto para respirar fundo e fingir que estava tudo bem. Fazer meu coração ficar mais tranquilo para tentar voltar a dormir. Nem sempre funcionava, honestamente. Nos últimos dias, o que menos vinha funcionando era isso, se eu fosse ser bem honesta. Ainda assim, eu tentava.
Franzi o cenho em confusão quando vi que a luz da sala estava ligada. Já deviam ser por volta da meia noite e já tinha passado do horário de todos estarmos na cama dormindo. Apesar de ser sexta feira e todos geralmente irem dormir maos tarde, era incomum ficarem na sala, por isso eu fui bem devagar até lá para ver se descobria quem poderia ser. Já estava me preparando para assustar alguém quando me deparei com algo que definitivamente não queria ter encontrado.
Poppy, Katsuki e Eijirou eram as pessoas que estavam ali na sala e as últimas que eu esperava encontrar naquele horário ali, falando baixinho e parecendo alarmados em serem pegos por alguém, juntos como um grupo de amigos fazendo fofoca e tramando algo ou o que quer que estivessem fazendo aquela hora da noite.
Apenas os três.
Sem mim.
Eu sabia que era um sentimento ridículo, mas não consegui deixar de lado o incômodo que tomou conta do meu peito ao me deparar com aquela cena. Eles estavam tão envolvidos em fosse qual fosse a conversa que nem tinham tempo para perceber que alguém estava faltando ali. Se é que eu realmente fazia falta para eles, pois estava começando a achar que não; não, eu não fazia falta e talvez nem mesmo pertencesse mais aquele lugar. Eles nem pareciam se dar conta de que eu não estava ali!
Meus sentimentos negativos devem ter chamado a atenção de Poppy, pois ela se virou e cravou os olhos bonitos diretamente em mim, os arregalando como se tivessem fazendo algo muito errado. Foi ai que tive certeza que eles não haviam só se esquecido de comentar comigo e me chamar para aquele momento, eles apenas não quiseram que eu estivesse ali. Era isso.
Poppy sabia exatamente como eu estava me sentindo naquele momento e eu percebi isso pela forma como ela abriu e fechou a boca, mas nada saiu. Querendo ou não, Poppy me conhecia muito bem para saber. E eu não era exatamente boa em esconder quando estava incomodada com algo. Minha expressão facial sempre me entregava, e às vezes isso era uma merda.
Eu tentei fingir não ter visto nada, mas Poppy se levantou em um pulo, fazendo com que Katsuki e Eijirou se virassem, dando de cara comigo. E pelas expressões nos rostos dos dois, eles definitivamente não queriam que eu tivesse surgido naquele momento em específico.
Aquilo só serviu para me irritar mais ainda.
-Aoi, espera! - a voz de Eijirou me fez travar quando me virei para ir embora dali e fingir que não tinha me sentindo péssima por ver eles juntos sem mim. Eu sabia que não era um sentimento justo, mas era inevitável. Porra, eles eram meus melhores amigos! E nós costumávamos ser um grupo, certo? Por que eu sentia que estava sendo deixada de lado então? -Tá tudo bem?
Eu encarei aqueles olhos vermelhos de Kirishima. Por mais que existisse uma preocupação genuína ali, eu também sabia que era diferente. Não era a forma como ele sempre me olhava com amor e carinho, um tipo de cuidado diferente. Eijirou era uma pessoa boa e sempre se preocupava com os outros; o olhar que ele me lançava agora era o mesmo que usaria com qualquer outra pessoa, como se eu não fosse importante na vida dele. E de fato eu já não era mais.
-Claro que sim, Kirishima. - falei, soando mais ríspida do que eu gostaria de ter soado. -Por que, tenho motivos para não estar por acaso?
Eu sabia que não era justo e vi a forma como minhas palavras afetaram não só Kirishima, mas como Poppy também. Bakugo apenas revirou os olhos, deixando claro o quanto aquele drama o irritava. Mas ele não podia me julgar sendo que teria surtado por muito menos caso estivesse na minha situação.
-Pode parar com isso agora. - Bakugo falou, me lançando um olhar significativo que eu ignorei completamente.
-Ah, certo, claro. Vou fingir que não vi meus amigos me deixando de fora do que quer que isso seja. - falei, indicando eles três. Poppy abriu a boca para falar algo, mas Katsuki deu um tapa no braço dela em um pedido silencioso para que ela não o fizesse.
-Ninguém nasceu grudado com você, Aoi. A gente tem direito de querer ter um momento sem a sua presença. - Katsuki retrucou, arqueando a sobrancelha pra mim.
Senti tanta raiva que tive vontade de bater nele e de o fazer sentir os mesmos sentimentos ruins que eu estava sentindo. E eu poderia fazer isso sem precisar dar um único passo.
Mas o olhar de Eijirou me dizia o suficiente sobre quais seriam as consequências caso eu tomasse aquela decisão. E tudo o que eu menos precisava naquele momento, era que o garoto que eu amava ficasse com medo e quisesse distância de mim. Por isso, apenas balancei a cabeça e dei as costas para eles.
-Boa noite pra vocês. - resmunguei irritada, sentindo as lágrimas queimando.
-Aoi, espera! - a voz de Poppy me chamou, mas eu ignorei completamente enquanto fazia o caminho de volta para meu quarto, esfregando o rosto com força o suficiente para deixar um rastro vermelho na pele.
Não vou chorar, não vou chorar, não vou chorar.
E inevitavelmente eu acabei chorando quando entrei no quarto, dando um chute irritado na lata de lixo ao lado da escrivaninha e afundando os dedos no meu cabelo, puxando as mexas com tanta força que meu couro cabeludo ficou dolorido.
Eu sabia que não estava tendo uma crise de ansiedade só porque meus amigos estavam conversando sem mim. Eu tinha plena consciência que ia muito além disso, mas não conseguia controlar, não conseguia me acalmar o suficiente para ver as coisas com a razão. E acho que foi por isso que deixei minha individualidade tomar controle de mim mesma, mesmo que fosse por apenas por um instante.
Esse pequeno instante foi o suficiente pra fazer estrago, pois com choque e horror, vi o fio vermelho que me ligava a Kirishima assumir um tom muito mais escuro de vermelho e ficar tão fino que achei que ia se romper. E eu sabia o que era aquilo; era o efeito dos meus sentimentos negativos envenenando a ligação que existia entre Eijirou e eu. Almas gêmeas nem sempre faziam bem uma para a outra e eu já tinha visto o estrago que aquilo poderia causar. E o como o fio ficava feio e frágil, como tinha ficado por aqueles curtos segundos antes de voltar ao normal. Mas esses curtos segundos foram o suficiente para me desesperar, pois eu sabia que a cada dia que passava sem Eijirou lembrar de mim, mais fraca ficava a conexão entre nós dois.
Eu odiava a sensação de que estava perdendo tudo o que mais era importante para mim e eu odiava a sensação amargurada que crescia dentro do meu peito. Quando ergui a cabeça e dei de cara com meu reflexo, eu realmente me assustei; porque me olhando de volta não estava a Aoi do curso de heróis, mas sim a Aoi que eu costumava ser antes de ter minhas memórias bagunçadas por completo e minha mente ser fragmentada.
Aquela Aoi que tinha uma raiva tão grande dentro do próprio coração que poderia incendiar todo o Japão. O mundo inteiro, se deixassem. Que constantemente precisava ser puxada de volta ao lado menos sombrio dentro de si mesma. E o pior era perceber que a pessoa que sempre fizera isso por mim quando eu era mais nova, era agora o líder da Liga dos Vilões e motivo para todos os meus pesadelos que me atormentavam todas as noites, sem me dar um segundo de paz.
Aos poucos aquela pessoa desconhecida no reflexo do espelho foi embora, deixando Aoi Yamazaki, quem eu era agora. Uma estudante da U.A, aspirante a super heroína, que tinha sim amigos e não era mais sozinha e dependente emocionalmente de alguém com o psicológico tão fodido quanto o meu. Eu tinha uma família agora, uma que me amava e jamais iria me deixar, independente de qualquer merda que eu pudesse fazer. Aquela raiva dentro do meu peito, eu não queria ela ali; não mais.
Sentindo as lágrimas queimando e me sentindo verdadeiramente estúpida pelo show que eu dei, abri a porta do quarto e fiz meu caminho de volta para a sala. Eu devia no mínimo um pedido de desculpas para os meus amigos, e mesmo que eu fosse absurdamente orgulhosa, se tinha algo que eu havia aprendido com minhas irmãs e com Aizawa, é que estava tudo bem em admitir quando estava errada e me desculpas com as pessoas. Isso era muito mais significativo do que orgulho idiota, e eu não queria perder nenhum dos três por causa de uma idiotice daquelas.
Mas assim que cheguei na sala, o que encontrei não foi Poppy e Bakugo conversando com Eijirou, mas sim apena minha alma gêmea ali, na sala, completamente sozinho. Mas essa não era a pior parte; a pior parte eram as lágrimas nos olhos de Eijirou enquanto ele fitava o chão, e os sentimentos negativos dele me atingindo com tanta força que meu coração doeu de uma forma inexplicável. E o pior era perceber que o motivo para ele estar sofrendo era eu.
-Eiji... Kirishima. - chamei, fazendo ele virar a cabeça na minha direção, esfregando o rosto rapidamente em uma tentativa falha de esconder as lágrimas, forçando um sorriso para mim. Eu suspirei.
Eu sabia o como Eijirou tentava a todo custo mostrar que era otimista e feliz. Mas até mesmo essas pessoas tinham seus moments de insegurança, e eu sabia que Kirishima não era isento desses momentos. Eu já escutei muitas histórias e muitos desabafos; eu conhecia meu namorado. E eu sabia que por mais que ele tentasse esconder, tudo estava uma merda dentro dele. Eu podia sentir, eu era empática; mas muito mais que isso, eu era a alma gêmea dele.
-Não adianta esconder de mim, Kirishima. - falei com um sorriso fraco, me sentando ao seu lado no sofá. Ele apenas piscou os olhos para mim.
-Por que você consegue sentir meus sentimentos graças a sua individualidade? - ele questionou, franzindo as sobrancelhas. Eu dei uma risada um tanto triste, desviando o olhar e fitando minhas mãos por um instante.
-Não, porque você é minha alma gêmea. É por isso. - falei baixinho, piscando para afastar as lágrimas que ameaçaram cair.
-Eu queria tanto me lembrar de você, Aoi. Da gente. - Kirishima disse de uma forma que destruiu meu coração por completo. Era a inconformidade em seu tom de voz que me fez respirar fundo, porque eu sabia que dizer a cois errada acabaria com tudo. -É injusto! Qu tipo de homem eu sou se não consigo nem me lembrar da minha alma gêmea? Eu fico vendo nossas fotos juntos e eu me sinto péssimo por não conseguir me lembrar de nada! Porque são momentos importantes que mesmo forçando muito eu não sei como aconteceram! E nada que eu tento parece funcionar!
A respiração de Kirishima ficou ofegante, desesperada. A forma como ele afundou os dedos nos cabelos vermelhos e puxou me fez ter a certeza de que ele estava surtando. E aquilo me assustou, porque jamais pensei que iria ver Eijirou em tal estado.
Ele estava tendo uma crise de ansiedade bem ali, na minha frente.
-E eu te vejo triste todos os dias, principalmente quando me vê, e eu me sinto um merda. Eu sei que você tá sofrendo e isso é uma porcaria, porque não queria que sofresse por minha causa! Eu sinto muito, Aoi, eu...
Ele não estava nem respirando direito e aquilo me desesperou de tal forma que não pensei duas vezes.
Eu segurei o rosto de Eijirou em minhas mãos e me inclinei em sua direção. Quando meus lábios encostaram nos dele, Eijirou ficou imóvel, estagnado, sem sequer respirar, seus olhos se arregalando tanto que facilmente poderiam saltar para fora.
Foi um selinho, apenas o suficiente para fazer ele se acalmar. E de fato tinha dado certo.
-O que...- ele disse, baixino, abrindo e fechando a boca várias vezes, suas bochechas ficando absurdamente vermelhas. Aquilo me fez dar uma risada leve, sincera.
-Alguém me disse uma vez que é o melhor jeito de parar um ataque de pânico. - falei como quem não quer nada, dando de ombros. Ele franziu as sobrancelhas em confusão.
-Quem te ensinou? Eu aprendi isso em Teen Wolf. - ele falou, o que me fez dar risada pra valer. -O que? - ele estava visivelmente confuso, mas eu apenas arqueei uma sobrancelha para ele. Eijirou arregalou os olhos quando entendeu. -Não me diz que eu...
-Ah, sim. Você me deu um beijo igual a esse quando eu estava tendo um ataque de pânico uma vez. E bem na época que eu fazia de tudo pra afastar você de mim. - falei com um sorriso para ele, empurrando de leve o ombro dele. Kirishima pareceu ter vontade de se enterrar no sofá, o que eu achei fofo. -Kirishima, eu sei que você não lembra de nós e eu realmente não te culpo. Sim, eu estou me sentindo um lixo e não vou mentir, mas é porque eu realmente amo você. E sinto sua falta.
-Aoi...- ele começou, mas eu apenas estiquei minha mão e agarrei a dele, dando um aperto leve e sincero.
-Está tudo bem. Eu não vou desistir da gente, Kiri. E mesmo que você não se lembre e que nem queira mais nada comigo, eu sempre vou estar aqui por você, seja como sua amiga ou namorada. Porque sou sua alma gêmea e isso é pra sempre. Pra toda a eternidade. - falei com honestidade e Kirishima apenas me olhou. Levei a mão dele entrelaçada na minha até meus lábios, dando um beijo carinhoso ali, o que fez Eijirou apenas me olhar e olhar. -Então, por favor, não se culpe. Se tem algo que eu aprendi é que o universo tem tudo planejado pra nós. E nada do que a gente fizer vai mudar a rota do destino.
Eijirou apenas me fitou antes de apertar minha mão contra a dele. E então ele sussurrou, tão baixo que quase não escutei:
-Espero que essa rota me leve de volta pra você.
Data: 26/03/24
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