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06

- Você poderia, sei lá, ir para outro lugar. - apontou em um tom cortante, baixando os óculos de sol para cobrir seus olhos.

- O seu esforço para se ver livre de mim às vezes é até fofo. - a risada leve após a fala a irritou ainda mais.

- Sossego, só isso que eu queria. - resmungou, segurando um bufo quando uma sombra bloqueou seu banho de sol. - Você está fazendo de propósito, Hopalong.

- O que foi agora?

Ignorou a voz arrastada e o sotaque do sul sempre fazia algo dentro dela vibrar. Segurou um bufo impaciente, continuando com sua acusação entredentes.

- Essa praia é imensamente espaçosa e você veio colocar sua cadeira logo na minha frente. E não diga que não foi proposital.

- Não vou dizer porque não foi.

Franziu o cenho quando o viu se levantar e retirar a cadeira da sua frente, torcendo o nariz quando ele a colocou ao seu lado. Resolveu ignorá-lo, mas como o mundo não era seu para ter o que quisesse, obviamente seu plano não deu certo.

- Então, o que você está fazendo aqui sozinha?

- Você também está sozinho, Guarda Rick. - apontou de forma seca, não se dando o trabalho de abrir os olhos.

O cheiro da maresia, o vento costante e os raios de sol esquentando sua pele possuíam um poder tranquilizador que quase a fazia esquecer do mundo. Quase, porque o inconveniente ao seu lado tinha que aparecer e, como sempre, não saber o significado de silêncio.

- Quis um pouco de paz. - ele continuou, não entendo a sua óbvia falta de entusiasmo para a conversa. - Meu último caso, como você sabe, deu um pouquinho errado. Nunca achei que ia ser processado por um cliente, ainda mais por atentado ao pudor. Mas como eu ia imaginar que a Amélia que estava me ligando não era a minha namorada e sim a minha cliente?

- Olhando antes de atender a chamada, gênio.

- Mas sabe o que é mais engraçado? - fingiu não ouvir a pergunta, continuando mesmo assim. - Você estava ao meu lado e me passou a ligação, Short stack.

Retirou o óculos quando escutou a acusação velada e o apelido ridículo, estreitando os olhos ao virar para encará-lo.

- O que você está querendo dizer? E já falei para você não me chamar assim.

- Que você fez de propósito. - respondeu despreocupado, sorrindo para ela antes de se virar para o mar revolto. - Sei que você pensa que me odeia, mas não acredito que foi tudo premeditado. Você viu a oportunidade e aproveitou.

- Você faria o mesmo. - acusou, cruzando seus braços abaixo do peito.

- Ah, mas aí eu teria que saber como você atenderia a ligação do seu ex...

- Como você sabe que nós terminamos?

- E torcer para a sua saudação não ter mudado. - prosseguiu inalterado. - Só que um, você nunca atende qualquer ligação de forma constrangedora e dois, você nunca atendia uma ligação dele se eu estivesse por perto. - virou o rosto para ela, seus olhos em um tom mais claro por conta da luz. - Estou certo?

Torceu a boca, errado ele não estava. A risada que ele soltou quando ela virou a cara era estranhamente calma. Quis voltar para a sua contemplação da natureza e todas aquelas coisas, mas algo que ele havia dito estava martelando no fundo de sua mente a fazendo se sentir incomodada.

- Por que você disse que eu acho que te odeio? - a pergunta saiu antes que pudesse controlar. Não quis saber a reação dele, sua atenção ainda voltada para as ondas que quebravam na areia com uma força extra. - Eu só não gosto dessa sua positividade e da mania irritante que você tem de se dar bem com todo mundo. Mas nunca, sabe, te odiei nem pensei que te odiava.

- Eu sei, mas às vezes parece que você não sabe disso.

A resposta a pegou desprevenida. Sentou ereta, as mãos caindo em seu colo quando se voltou completamente para ele.

- Quando eu dei a entender que te odiava? Ou pensei que te odiava? - reformulou após o leve arquear de sobrancelhas vindo dele.

- Isso não importa, o que importa é que eu sei que você é incapaz de odiar alguém. - ele sorriu da expressão surpresa em seu rosto. - Eu a conheço há quase três anos, Maya Hart, acredito que sei que o ódio não faz parte da sua vida. Você é igual uma vela de aniversário.

- O quê?

- Aquelas velas que acendem e brilham, mas a luz some em segundos. - explicou. - Sua raiva vem em uma explosão, então evapora tão rápido quanto veio. Você não tem combustível para deixar queimar o ódio. Rancor talvez, mas não ódio.

- Seu eu poético retornou.

- Você adora quando eu falo assim.

- Você queria que eu adorasse. - murmurou, revirando os olhos quando o escutou rir.

- Você não gosta muito de mim, o que é até interessante porque até que eu gosto de você.

- Por que você gostaria de alguém que não te quer por perto, Lucas?

- Ah, você ainda está na negação. - podia escutar cada nota de sorriso na voz dele, ele estava adorando cada segundo daquilo. - Você sempre mantém café pronto quando volto de algum caso, só tem praticamente nós dois naquele andar e sei que outra pessoa não iria fazer isso.

Se encolheu internamente ao escutá-lo, ela não fazia isso por ele, fazia porque também gostava de café quente. E daí que o momento que ela escolhia para tomar café coincidia com a chegada dele?

- Toda vez que trabalhamos até mais tarde você pede duas sobremesas porque sabe que eu posso ficar até depois de você.

- Vai recusar comida agora?

- Nunca, Short stack. - ele riu ainda mais quando ela lhe dirigiu uma careta. - Só acho muito atencioso da sua parte quando você diz para a alguém da minha família que estou trabalhando mesmo que saiba que estou tentando respirar em algum lugar do telhado.

Ele fazia isso às vezes, quando começava a tamborilar em um ritmo desconexo na mesa, a qual ela podia ver porque as portas de suas salas ficavam de frente uma para a outra, ou andava de uma lado para o outro afrouxando a gravata e encarando a vista da janela. Toda vez que ele fazia algo asism exageradamente, ela sabia que ele precisava de um tempo e iria sumir por alguns minutos.

Então, quando ligavam e seu assistente não sabia para onde ele havia ido, quando esse dito assistente resolvia trabalhar, Lucas era muito condescendente com ele para o seu próprio bem, ela pedia para ele dizer que o Friar estava trabalhando ou falava ela mesma quando atendia a ligação, ou mandava a sua assistente atender. Elisa era um amor, ela possuía um futuro brilhante pela frente. Mas voltando ao presente...

- Certo, você percebeu. - suspirou, envergonhada sem saber o porquê.

- Não precisa ficar estranho, sabe? Tudo entre a gente.

- Então temos que ficar quites. - declarou, sentindo a animação por poder provocá-lo nascendo em seu peito. Sentou com as pernas cruzadas abaixo do corpo, um pequeno sorriso malicioso em seus lábios. - Que tal falarmos sobre o fato de você desenhar carinhas felizes no meu chocolate quente toda vez que volta da cafeteria? Ou como você abre todas as portas para que eu passe primeiro do que você...

- Vai me culpar por ser um cavalheiro?

- Ou como toda a sua família sabia quem eu era antes mesmo de eu começar a atender as suas ligações? - o leve rubor que coloriu as bochechas dele fez o sorriso em seu próprio rosto aumentar. - Sabe, sua mãe me contou algo muito interessante.

- Acho que já deu.

- Na, na, não. - o puxou pelo braço para continuar sentado. - Foi algo tão fofo. Ela me disse que você pediu para ela fazer uma torta de maçã no domingo a noite. Se bem me lembro, na manhã de segunda tinha uma caixa muito bem decorada com uma linda torta me esperando em cima da minha mesa. - riu de como ele desviou o olhar, a mão ainda presa no antebraço dele para impedi-lo de escapar. - Mas por que você fez isso?

- Riley tinha comentado que você iria visitar seu pai no fim de semana.

Se afastou dele, surpresa pela resposta sincera e pelo motivo. Sabia que não voltava bem depois de uma visita ao seu pai, só continuava a ir por conta de seu meio irmão, porém, nunca parou para pensar que Lucas percebia que algo estava diferente. Um calor conhecido, e a muito tempo não sentido, começou a se espalhar por seu peito. Pigarreando, pôs um sorriso tranquilo no rosto.

- Obrigada.

A expressão angustiada no rosto dele se dissolveu, dando lugar a uma de surpresa e alívio. Quis rir do fato dele provavelmente estar esperando que ela fosse reclamar por ele estar se intrometendo em sua vida ou pedir para que nunca mais fizesse isso. Bom, Maya não iria admitir verbalmente que estava grata pela atenção de Lucas, mas também não iria negar qualquer gesto de carinho vindo dele, principalmente se tivesse comida envolvida no meio.

- Sempre. - a palavra saiu como uma promessa de seus lábios.

O brilho em seu rosto parecia vim tanto dos raios de sol quanto de um sentimento interno, um sorriso foi compartilhado entre eles. Maya se viu respirando aliviada, como se há muito estivesse prendendo algo enorme em seu peito. Se recostou novamente na cadeira de praia, observando as nuvens escuras dando um indício no horizonte.

- Agora podemos aproveitar esse tempo em silêncio? - propôs, decidindo não colocar o óculos de sol.

Virou o rosto para o lado quando o escutou arrastar a cadeira para ficar mais perto dela. Riu suavemente após ele praticamente se jogar e inclinar o corpo em sua direção.

- Vou tentar o meu melhor.

- Acredito em você, Sundance.

Ele riu alto de sua expressão nem um pouco crédula.

- Sei que sim, raio de sol.

O riso dele se tornou ainda mais animado quando ela corou. Maya bufou, resolvendo ignorá-lo, mesmo que seu coração batesse a mil como se estivesse correndo uma marotona onde a linha de chegada se encontrava nos braços do Friar.

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