XXIV
(Escrito 17.10.2020)
Quarta-feira. 24/03.
Jungkook se mexeu novamente na cama, encarando o teto, agora, amarelo. O despertador tocou pela terceira vez e ele resolveu, por fim, desligá-lo. Decidiu não ir à aula hoje.
A madrugada do garoto de fios rosa cereja, foi turbulenta, não houve nada que o fizesse conseguir fechar os olhos e dormir ao menos por cinco minutos. Estava cansado, triste, enjoado, irritado, chateado, indisposto, ansioso e outros mais adjetivos que se parasse para recitar, levaria ao menos três horas para concluir a fala. Não aguentava mais.
E a coisa, ou melhor, quem deixava Jungkook assim, tinha nome, sobrenome, endereço, identidade e personalidade: ele mesmo.
Até poucas semanas atrás, Jungkook nunca imaginaria a possibilidade de voltar a falar com Taehyung e seus amigos. Isso o confundia e o deixava ansioso. Taehyung não era a mesma pessoa mais, afinal, haviam passado ao menos 10 anos desde a última vez. E se falasse algo estranho? E se ele não gostasse de sua "nova" personalidade? E se ele desistisse da amizade dos dois do dia para a noite? E se, e se, e se?
Todas as possibilidades rondavam sua cabeça, o deixando paranóico. E essas possibilidades lhe tiraram o sono, fazendo-o ter uma das madrugadas mais produtivas de sua vida, algo que ele não queria ter, definitivamente.
Por volta das 22h, quando se deitou, sentiu fome. Então levantou e foi para a cozinha, dando de cara com seu pai e sua irmã, que faziam um lanche no escuro, temendo serem ouvidos pela mãe. No final, saíram da cozinha só às onze, quando ela apareceu e empurrou todos para os quartos, dizendo que poderiam continuar a comer no café da manhã.
E nessa hora, os surtos começaram oficialmente.
Resolveu jogar The Sims. Fez uma casa fantástica, mas não se sentiu disposto a criar os sims e jogar com eles, portanto, desligou o notebook. Era meia-noite.
Deitou na cama e observou seu teto branco, enjoado da cor. Correu para a garagem, procurando as latas de tinta que sobraram da pintura do quarto de Nayeon e achou uma lata cheia, além de rolos, lonas para chão, fitas e tudo mais. Obviamente foi ao quarto da irmã pedir ajuda e, sim, ela estava acordada e resolveu ajudar o irmão. Com todo o cuidado do mundo, eles cobriram os móveis com as lonas, certificando de que nada estava exposto. Pegaram a escada na garagem e começaram o trabalho; com uma mão de tinta, tudo havia ficado perfeitamente arrumado. Era 1h.
Foi para o quarto de Nayeon com ela, deitando junto à irmã, já que não podia deitar em sua própria cama ainda. Ela dormiu, mas ele não. Resolveu pegar seu notebook e dar continuidade a um roteiro que vinha escrevendo ultimamente — um dos mil que já tinha. Acabou de escrever o décimo ato e sorriu, estalando as costas e o pescoço, vendo a irmã dormir abraçada e usando sua costela como travesseiro. Eram 5h.
Se levantou devagar, com cuidado, enquanto deitava a irmã no travesseiro. Calçou suas pantufas, pegou seu computador e voltou para o quarto, tirando a lona somente da cama e deitando, tentando dormir.
E voltamos ao tempo atual.
Jungkook se sentou na cama, encarando o nada. Deveria ir tomar banho? Deveria ignorar seu celular que, no momento, parecia um vibrador? Deveria tentar fazer a água levar suas preocupações? Respondeu sim para todas as questões e foi para o banheiro, tropeçando no degrauzinho.
Entrou no chuveiro, sentindo a água quente contornar seu corpo ainda bronzeado. Sem que percebesse, a água que caía do chuveiro se misturou com a que saía de seus olhos escuros ao que ele começava a soluçar. Por que tudo era tão difícil? Taehyung era um enigma para si, e a velocidade em que as coisas aconteciam o assustavam.
Desde o começo, Jungkook não teve tempo para raciocinar.
Fechou o registro e enrolou seu corpo inteiro com a toalha, saindo do boxe e se encarando no espelho. Se sentou na tampa da privada, tentando recuperar seu fôlego enquanto ainda dava pequenos soluços. Decidiu ignorar os pensamentos por hora, indo trocar de roupa. Vestiu apenas uma bermuda e sentou em sua cama, secando seus cabelos pensativamente.
— Jungkook, daqui a pouco você vai se atrasar, filho. — sua mãe disse pelo lado de fora no quarto, dando dois toquinhos na porta antes de abrí-la e ver o filho. — Acordou tarde?
— Não vou 'pra escola hoje. — ela o encarou confusa.
— Não vai? 'Tá se sentindo bem? Quer que a mamãe te leve no médico?
— Eu só preciso ficar quietinho, por favor.
Dayang tombou a cabeça para o lado, mas sorriu levemente. Se aproximou de Jungkook, tomando a toalha das mãos dele e secando seu cabelo rapidamente, como fazia quando ele era pequeno. Depois, se inclinou ao que segurava o rosto dele, beijando as bochechas, o queixo, o nariz, os olhos e a testa diversas vezes enquanto ele ria.
— Tudo bem, meu menino. Você pode ficar em casa. Se cuida, viu? Qualquer coisa, liga 'pra mamãe ou 'pro papai que nós voltamos 'pra casa, okay? E dá um jeitinho em casa 'pra se distrair.
— Okay, mamãe. Obrigado mesmo.
— Vou trazer seu café da manhã.
Dayang desceu e voltou minutos depois com um sanduíche, um yakult, um copo de suco e uma maçã, alegando que sabia que Jungkook não iria comer mais nada até a hora do almoço, portanto, deveria se alimentar direito. O garoto reclamou de início, mas comeu. Sabia que sua mãe só se preocupava consigo.
Assim que a casa ficou vazia, ele havia acabado de comer. Levou as louças para a cozinha e lavou-as. Estava sozinho e sem nada 'pra fazer, então resolveu fazer a faxina pesada, que geralmente, era feita nas sextas, naquele dia. Na área de serviço pegou balde, vassoura, rodo, pano de chão e produtos de limpeza, levando tudo para o balcão do cômodo. Preparou tudo e então começou.
🐯🤞🐰
Eram 13h. Jungkook estava sentado no sofá, com uma música do 5SOS tocando ao máximo na TV enquanto o suor molhava sua testa. Seus cabelos estavam presos num rabo de cavalo e ele descansava, finalmente havia acabado de limpar. Longe, pelo volume alto, ouvindo a porta ser aberta. Abriu o olho direito e virou a cabeça na direção, vendo Nayeon tirar os sapatos. Pausou a música.
— Nie, como foi seu dia? — perguntou quando voltou a fechar os olhos.
— Foi bem e eu 'tô vendo que o seu foi bem movimentado, né? A casa 'tá limpíssima.
— Acabei de acabar. Se quiser, o almoço já está pronto.
— Você cozinhou? Uau, quero sim. Vou só tomar um banho.
— Vou guardar as coisas, tomar banho e já almoço também.
— Então eu te espero e almoçamos juntos, oppa.
— Okay. — ele respondeu, se levantando.
Assim que guardou os itens na área de serviço, correu para o seu quarto e foi direto ao chuveiro, lavando seu corpo e seu cabelo o mais rápido que conseguiu para não deixar a irmã esperando. Vestiu uma regata juntamente com uma bermuda e desceu, vendo Nayeon em pé desligando a TV.
— Bora almoçar? — ele perguntou, vendo ela virar para si com o pijama de calor e sorrir.
— Vamos, oppa. Quero descobrir se você já pode sobreviver sozinho.
— Oras, até parece que você não sabe que eu só saio da casa da mamãe, quando eu me casar.
— Por que, Kook?
— Porque eu quero aproveitar o máximo de tempo aqui antes de ir formar minha própria família. Além de que tem uma ótima localização e eu não pago aluguel.
— Palhaço. — ela riu, dando um tapa no irmão. — Me serve aí.
— Folgada, hein? — ele brincou, mas já foi pegando os potes para separar a comida.
Jungkook havia feito um simples arroz, carne, vegetais e pego o kimchi que havia na geladeira e esquentado. Colocou nas vasilhas e as levou para a pequena mesa da cozinha, onde cabia até três pessoas, para começar a comer com a irmã.
— Como foi seu dia? — ela perguntou, pegando uma colherada de arroz.
— Normal, só limpei a casa. E o seu?
— Odeio língua coreana e biologia.
— Ano que vem você aprende a gostar de coreano, a professora Mina é incrível.
— Eu nunca a conheci. Ela é boa mesmo?
— Demais, provavelmente você só não vai gostar da professora de história, a Kimberly.
— Todo mundo fala que ela é insuportável.
— Ela só se preocupa demais com o nosso futuro, fica tranquila, mas pode odiar um pouquinho sim. Se não fizer aula dela varada de raiva, o conteúdo não entra.
— Por que, oppa? — perguntou rindo.
— Quando você 'tá com raiva da aula dela, você aprende só 'pra ela parar de explicar, sempre assim. Enfim... — ele pegou um pedaço de carne. — Como estão as suas... amigas?
— As meninas 'tão bem, oppa.
— E o romance?
— Nós estamos ficando sério, as três. Eu não sei bem o que acontece, mas eu gosto tanto delas. Eu não sinto ciúmes delas uma com a outra, nem elas sentem de mim, mas sentimos com outras pessoas, eu não entendo direito, então só estou deixando rolar. Ainda somos novas.
— Não fica pensando muito nisso não, deixa ir. Se for 'pra ser, vai acontecer.
— Você deveria ouvir a si mesmo, oppa.
Ele a encarou, olhando debochado, mas logo rindo.
— Eu sou o mais velho, me deixa dar uns conselhos 'pra me pagar de sábio, ow!
— Sim, ó, Mestre Jung-Shifu.
— Cala a boca, Nayeon!
🐯🤞🐰
Os irmãos estavam na sala, numa árdua competição no vídeo-game. Donghae os observava do outro sofá, tomando café, assustado com os filhos competitivos que se xingavam e faziam de tudo para trapacear.
— Meu Deus, vocês são monstrinhos! — ele comentou, se levantando para abrir a porta já que a campainha havia tocado. — Opa, filho, como você 'tá? — ele deu um abraço e abriu passagem para que o garoto entrasse.
— Oi, tio. O Kook 'tá aí? — perguntou Hoseok, tirando os sapatos.
— 'Tá sim. Jung- puta que pariu tira o pé da cara da Nayeon, Jungkook! — o pai correu para o sofá, dando tapas leves nos dois filhos. — Perderam a cabeça, foi? — perguntou rindo. — Filho, o Hobi 'tá aí.
— O hyung? — o mais novo virou-se para trás, vendo o melhor amigo apoiado na parede com os braços cruzados. — Vamos lá em cima, Hobi.
Os dois subiram a escada em silêncio, entraram no quarto e Jungkook trancou a porta, indo se sentar na cama ao lado do mais velho.
— Então? — perguntou, segurando as mãos, nervoso.
— Você 'tá bem? Faltou a aula e não falou nada 'pra nenhum de nós, então imaginamos que você quisesse ficar sozinho. Ficamos preocupados, mas te respeitamos. Entretanto, eu não iria conseguir dormir sem saber como você 'tava.
Jungkook, sem dizer nada, abraçou o amigo. E ali o apertou, forte, o puxando para mais perto, até que estivessem deitados, ainda daquela maneira. Hoseok tinha um cheiro de perfume masculino consideravelmente forte, mas sabia que o melhor amigo era sensível a cheiros fortes, então usava o mínimo que conseguisse, mas isso não impedia que ele fosse tremendamente cheiroso.
O Jeon afundou o nariz nos cabelos do outro, cheirando e deixando beijinhos por todo o couro cabeludo, enquanto sentia cosquinhas em seu pescoço ao que o mais velho passava o nariz por ali.
— Eu 'tô melhor agora, obrigado. — finalmente respondeu, dando outro beijo no cabelo do amigo.
— Não precisa agradecer, formiguinho. — Hoseok sorriu e deu uma piscadinha para Jungkook, que se contorceu rindo e virou a cabeça para o outro lado. — Credo! Não aguenta uma piscada do teu "marido", é?
— Quieto. — o mais novo o apertou, tapando sua boca com a mão livre. — Nem mais uma palavra sobre isso.
— Você que manda, chefe. — deu um tapinha na coxa do outro.
— Ya, Hoseok!
Jungkook conversou com o melhor amigo sobre tudo. Hoseok era seu porto seguro desde sempre, sendo seu conselheiro e cuidador. Também era o mais cuidadoso com o Jeon, com certo instinto paternal, por mais que fossem melhores amigos. Pôs todas as cartas na mesa, chorou mais, ouviu, entendeu, e mais que tudo, se resolveu consigo.
'Tava tudo bem ser tão rápido, assim como estaria se fosse devagar.
Hoseok o lembrou de que a aposta era só uma brincadeira, e que ele não deveria, jamais, a colocar acima da própria saúde mental, mas o mais novo apenas respondeu que definitivamente nem se lembrava da aposta quando estava com o seu amor.
Sim, amor, porque Jungkook amava Taehyung.
Antes de sequer reconhecer seus sentimentos, vinha o amor fraternal. Porque ele era família, era lar, e então o amor eros. O que sentia por ele ainda tinha os dois amores, e continuaria tendo.
Mas tirando os títulos, era amor. Simplesmente amor.
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