Capítulo 7- Festa de noivado
O fim de semana sempre era um momento feliz para Anne, porque ela aproveitava para descansar, colocar em dia suas leituras e maratonar suas séries favoritas. Mas o último tinha realmente sido um desastre. Primeiro começara com o jantar no apartamento de Gilbert, no qual descobrira a mentira que ele lhe contara sobre a questão de filhos, o que culminara em um fim de noite estressante. É claro que tivera aquele beijo, mas disso ela não queria se lembrar, porque a deixava inquieta de um jeito que era melhor nem pensar.
Depois ela passara a madrugada toda tão irritada com toda aquela história, que não conseguira dormir, e muito menos se concentrar no filme que estava passando na TV, porque Gilbert Blythe ocupara todos os espaços de sua mente, e não de um jeito bom. E ela descobrira em um espaço de dez minutos várias coisas que odiava nele. Como aquele sorriso irritante, que por mais que o deixasse diabolicamente atraente, a fazia ter ganas de estapiá-lo mais do que fizera na noite anterior, e aqueles olhos castanhos irônicos que podiam tirar o fôlego de qualquer garota com seu brilho intenso, a deixava tão incomodada que lhes colocaria uma venda se pudesse, somente para não senti-los observando-a como se quisessem dissecar a sua mente.
Como ficaria casada cinco anos com um homem que sabia mentir tão bem, quanto sabia usar seus lábios para beijar uma mulher, ela ainda não descobrira a fórmula. Mas não deixaria que ele a levasse na conversa de novo, tentando aceitar mais uma cláusula naquele acordo. Não teria filhos com ele nem que tivesse que usar cinto de castidade, e ele não sabia o quão obstinada ela podia ser quando colocava uma ideia na cabeça.
O domingo que era para ser um dia harmonioso, trouxe com ele o mau humor de Anne que estava nas alturas, e só piorou quando ela entrou na cozinha e Ruby que nunca deixava passar nada pelos seus olhinhos perspicazes, disse:
-Você está usando um anel de noivado?- Ao ouvir a pergunta da irmã, Anne teve vontade de arrancar os próprios cabelos por ter esquecido de tirar a joia quando entrara em casa na noite anterior. Mais um motivo para amaldiçoar Gilbert Blythe cem vezes por ter-lhe perturbado a paz e afetado o seu cérebro.
-É só uma joia sem importância. Gilbert me deu ontem apenas para que o pai dele acreditasse na ideia de que sou a noiva perfeita para o filho dele. - Anne respondeu dando de ombros, como se nada daquilo realmente importasse. Mas como sempre, Josie com sua arrogância extrema se aproximou, pegou a mão da irmã sem cerimônia, analisou a joia por alguns segundos e retrucou com a voz cheia de ironia :
-Se um anel de esmeraldas é considerado por você algo sem importância, é porque você realmente não entende nada de joias. Sabe quanto custa um anel desses?
-Não sei e não me importa. Por mim, não precisava ter anel nenhum.- Anne disse, sentindo que naquele dia, seu café da manhã já estava arruinado.
-Meu Deus! Esmeraldas. Que romântico!- Ruby exclamou, olhando para Anne de um jeito que fez a ruivinha enxergar estrelas nos olhos da irmã, e responder:
-Pare de criar ilusões na sua cabeça, Ruby. Gilbert não é nenhum príncipe encantado, para mim ele mais parece um ogro. - palavras mentirosas ela tinha que admitir, porque Gilbert era quase um modelo da Vogue, mas isso, ela não podia dizer em voz alta, no que sem saber Diana acabou concordando com seu pensamento quando disse:
-Ah, Anne. Também não exagera no seu desprezo pelo rapaz. Ele não tem nada de ogro. É educado, me parece muito inteligente, e é bonito até demais.
-E essa aí entende alguma coisa de homem bonito? Se ela sequer reconhece uma joia de verdade, acha que tem algum gosto aceitável para o sexo masculino? O tipo dela deve ser um daqueles nerds de óculos grossos, que sabe todas as fórmulas da matéria de química e que é tão militante quanto ela. - Josie disse cheia de desprezo, no fundo, morrendo de inveja por sua irmã tão insignificante ter chamado a atenção de Gilbert Blythe. Ela ainda não se conformava pelo rapaz não ter sequer lhe dado uma chance de lhe mostrar seu potencial. Poderiam ser uma boa dupla juntos, e ambos se beneficiariam daquele casamento como desejavam, mas a escolhida fora a Anne, e esse detalhe Josie não conseguia engolir de jeito nenhum.
-Você não sabe nada do que gosto ou deixo de gostar, uma vez que se importa apenas consigo mesma. Se quer tanto o Gilbert para você, porque não tenta a sorte? Se conseguir seduzi-lo e fazê-lo mudar de ideia a meu respeito, eu juro que o entrego inteirinho para você junto com esse anel que você parece cobiçar tanto. Agora me deixa tomar meu café em paz. - Anne respondeu, irritadíssima com a irmã, que a estava crucificando por uma escolha que nem fora feita por ela. Queria realmente que Josie conquistasse Gilbert, para que ela pudesse continuar sua vida como antes. E ela tinha certeza que Gilbert não teria problema nenhum em convencer Josie a lhe dar o filho que desejava, e sem entender porque aquela ideia lhe deu uma pontada no estômago.
Miraculosamente, ao invés de responder como seria do seu feitio, Josie saiu da cozinha pisando duro, e fazendo Anne respirar aliviada.
-Pelo menos admita que ele tem bom gosto. O anel é lindo, delicado e combina perfeitamente com você. - Diana disse, se sentando perto da irmã na mesa para observar a joia mais de perto.
-Foi o que ele me disse. - Anne falou com um suspiro.
-Então, já estão trocando gentilezas?- Diana disse com um sorriso, que imediatamente fez Anne responder:
-Não delira , Diana. Não há nada de gentil entre a gente, a não ser esse maldito contrato. Eu e Gilbert não nos misturamos, somos como água e óleo.
-Quem sabe ele não está apaixonado por você? Eu não acho que ele te daria um anel de esmeraldas à toa. - Ruby disse, entrando na conversa e usando sua teoria de leitora de romances em excesso.
-Querida irmã. Com o dinheiro que Gilbert tem, ele pode comprar quantos anéis de esmeraldas ele quiser que não fará nenhum arranhão em sua fortuna. Ele me deu esse anel, porque faz parte do contrato que me fez assinar . É só isso o que significa. - Anne disse, tentando fazer Ruby entender que o romance na cabeça dela não era real.
-Bom , se não gostou do anel, porque ainda o está usando?- Diana perguntou, e Anne deu de ombro, mas a pergunta a perseguiu o dia todo.
A verdade era que gostara do anel. Quem não apreciaria algo tão lindo? Diana tinha razão, Gilbert tinha bom gosto. Pelo menos era algo positivo em meio a tantas outras coisas negativas que a faziam se antipatizar com ele. O valor era o que menos importava, e verde sempre fora sua cor favorita, além do azul turquesa. Mas ela também não podia esquecer porque ele o dera para ela, e esse fato a deixava incomodada assim como se lembrar do que sentira durante aquele beijo. Ela queria apagar aquela lembrança, mas seu cérebro estava a fim de torturá-la até que admitiu que Gilbert beijava bem, e que não fora nada desagradável ter aquela boca sobre a sua, mas não passava disso, porque seu desprezo pelo que ele era e o que estava fazendo com ela, era maior que qualquer outra coisa.
Assim, o domingo passou com Anne totalmente retraída, enquanto Josie lhe lançava olhares ressentidos e Diana e Ruby tentavam melhorar a situação levando a conversa entre irmãs para outro nível que não fosse o recente noivado da ruivinha. Quando o dia finalmente acabou, e Anne foi para seu quarto, ela rezou para que pudesse ter uma noite tranquila de sono, mas isso não aconteceu, e quando acordou no dia seguinte, sua segunda-feira também começou complicada.
O relógio despertou em seu horário habitual, mas como dormira mal, Anne demorou a acordar e quando abriu os olhos estava quase vinte minutos atrasada. Assim, ela se levantou rapidamente, praguejando baixinho pelo seu dia já começar turbulento. Deste modo, ela vestiu a primeira roupa que encontrou, escovou os dentes, prendeu os cabelos em um rabo de cavalo, passou pela cozinha, pegou duas maçãs na geladeira e as jogou dentro da bolsa, e por último correu até o seu ponto de ônibus, mas a van da faculdade já tinha passado.
Bufando, ela decidiu caminhar até lá, pois não teria outra alternativa. O pai tinha saído cedo para fazer uma entrega, e ela não tinha ainda sua carteira de motorista, o que lhe restava era uma boa caminhada por alguns quarteirões até chegar no campus onde estudava. Teria que explicar a razão de seu atraso, pois os professores eram bastante rigorosos com os horários que suas aulas se iniciavam, e não toleravam mais do que cinco minutos de ausência de um aluno.
Ela tentou caminhar o mais rápido possível, procurando se importar com a fria brisa que soprava e que a fazia tremer dentro de seu casaco de lã, mas a verdade era que estava detestando sentir o ar gelado contra a pele do seu rosto. Uma buzinada a fez se virar, e ver sua amiga Lindy que se aproximava em seu conversível vermelho que acabara de ganhar do pai.
Elas eram amigas desde o jardim de infância, estudaram a vida toda juntas, e só na faculdade foi que escolheram cursos diferentes. Enquanto Anne cursava Administração, Lindy fazia contabilidade, mas esse fato não as afastou , pelo contrário, continuavam tão amigas quanto antes, e a amizade que tinham era daquelas que durava a vida inteira.
-Ei, o que aconteceu? Dispensou a van para andar nesse tempo frio? Não sabia que era adepta a caminhadas radicais. - ela disse em tom de brincadeira, o que fez Anne franzir o nariz e dizer:
-Eu acordei atrasada e perdi a van. Meu pai não está em casa, então não tive escolha.
-Você podia ter me ligado.- Lindy disse abrindo a porta do carro.- Entra aí que eu te levo.
-Obrigada.- Anne respondeu, sentindo-se aliviada por não ter que caminhar os três quarteirões restantes.- Eu não te liguei, pois não sabia se Brian iria te levar. - Anne continuou, mencionando o nome do namorado de Lindy, a quem ela namorava desde o ensino médio.
-Brian foi para a faculdade mais cedo. Ele tem uma prova difícil e por isso, foi se reunir com seu grupo de estudos na biblioteca.- a garota morena explicou.
-Que sorte a minha.- Anne disse sorrindo para a amiga.
Enquanto a Lindy dirigia para a faculdade, Anne se perdeu em seus pensamentos, e a maioria deles tinha como tema principal seu eminente matrimônio e Gilbert Blythe. Quase sem pensar, ela passou as mãos pelos cabelos, ajeitando alguns fios ruivos que tinham escapado do seu rabo de cavalo, e ao fazê-lo, a luz fraca do sol que começava a aparecer no horizonte fez seu anel de noivado brilhar em seu dedo anular, atraindo o olhar de Lindy que disse um tanto surpresa por aquela novidade:
-Você está usando um anel de noivado?- Anne quase gemeu ao ouvir a pergunta da amiga, ao perceber que mais uma vez tinha se esquecido de tirar o anel que Gilbert lhe dera do dedo, e como não havia uma maneira de negar uma evidência tão óbvia , ela respondeu:
-Sim.
-Como você está noiva se nem namorado você tinha até alguns dias atrás?- Lindy perguntou novamente, achando toda aquela história fantástica demais.
Anne pensou um instante antes de responder o que a amiga queria saber, porque não desejava que ela soubesse que estava sendo obrigada a se casar com Gilbert por conta de uma dívida de jogo de seu pai. Lindy sabia de toda história de sua família, e principalmente sabia da batalha que Anne vinha travando a bastante tempo para ajudar Walter Shirley a se recuperar do vício, depois de quase levar seu pequeno negócio e todas as suas economias pessoais à bancarrota. A ruivinha não tinha coragem de contar que estava fazendo aquilo para salvar a pele de seu pai, depois de várias vezes dizer que nunca em sua vida se submeteria à vontade de um homem. Aquelas palavras estavam sendo pesadamente usadas pelo universo contra ela, e pior coisa do mundo era se sentir encurralada em um labirinto do qual não conseguiria sair sem efeitos colaterais. Lindy não a apoiaria naquela loucura, e para evitar perguntas demais ou uma situação embaraçosa, ela mentiu, sentindo seu coração pesado com isso, pois era a primeira vez que não era sincera com sua velha amiga:
-Eu não te contei, mas tenho me encontrado com uma pessoa há bastante tempo.
-Por que não me contou? Não confia mais em mim.- Lindy disse, e Anne percebeu que ela ficara magoada, e se apressou em explicar:
-É claro que confio. Você é minha melhor amiga. Eu não te contei, porque eu não tinha certeza dos meus sentimentos por ele, e estava esperando que as coisas ficassem um pouco mais claras em minha cabeça para que eu pudesse te dizer.
-Pelo jeito as coisas se tornaram realmente sérias para que você aceitasse um pedido de noivado tão de repente. E olha esse anel, é esmeralda, não é?- A amiga olhava para seu anel tão impressionada que fez Anne se sentir mal por estar mentindo sobre algo tão sério.
-Sim, são esmeraldas.- ela respondeu sem graça.
-Então ele é rico?- Lindy perguntou, olhando-a com curiosidade.
-Pode se dizer que sim.- Anne engoliu em seco diante daquela resposta. Não podia dizer a Lindy que ia se casar com o magnata do petróleo ou a quantidade de perguntas que a amiga faria seria enorme. Lindy era o tipo de pessoa que gostava das coisas explicadas nos mínimos detalhes, e não abandonava um assunto até que tivesse todas as suas dúvidas eliminadas. Uma vez Anne lhe disse que ela estava fazendo o curso errado, e que ela seria uma excelente jornalista caso se dedicasse à área. A amiga apenas rira, jogara seus longos cabelos castanhos e encaracolados para trás, e respondera que estava muito satisfeita com o curso da faculdade que escolhera.
-Bem, esse anel deve ter custado uma fortuna. Em toda minha vida nunca vi uma esmeralda de verdade.- Lindy comentara e depois não tocara mais no assunto até chegarem na faculdade, o que deixou Anne mais tranquila em relação ao que tinham conversado no carro.
Ao entrarem no campus, a primeira pessoa que encontraram foi Cole Mackenzie. O rapaz fazia o mesmo curso que Anne, e também participava das passeatas que o grupo feminino do qual Anne fazia parte organizava ocasionalmente. O rapaz era um ativista de carteirinha, e estava sempre metido em algum tipo de projeto que visava melhorar o mundo ao seu redor tal qual Anne fazia, porém ele era mais engajado, e estava sempre a procura de algo que o inspirasse interiormente, além de ser um excelente ator e artista plástico.
-Anne, vamos ter reunião no sábado para nossa próxima passeata. Você está dentro ou não?- ele perguntou, trazendo folhetos nas mãos onde havia milhares de informações a respeito daquele evento.
-Cole, eu não sei . Preciso ver se terei tempo para isso. - Anne respondeu, louca para participar, mas como não sabia o que Gilbert tinha em mente para o próximo fim de semana, ela ficava completamente nas mãos dele, e odiava a sensação de impotência que isso lhe dava.
-Você nunca faltou a nenhuma de nossas reuniões. - Cole disse, olhando-a surpreso e de certa forma decepcionado, e isso doeu fundo em Anne que sabia do amor de Cole por aquele tipo de trabalho, e antes que pudesse responder, Lindy disse cheia de empolgação:
-É que antes ela não estava noiva.
-O que?- Cole olhou confuso para a amiga de Anne que tratou logo de provar o que tinha acabado de dizer:
-Dê uma olhada nesse anel.- ela apontou para a joia no dedo de Anne, que fez Cole arregalar os olhos, e dizer com a expressão chocada:
-Mentira! Isso é esmeralda não é?- Anne quase gritou. O que tinha de errado com todo mundo que dava tanta importância aquele anel dispendioso? Se fosse feito de plástico teria o mesmo efeito para ela, pois não significava nada tê-lo em seu dedo a não ser a assinatura de uma prisão de milhões de dólares onde seria colocada em breve. Estava começando a odiar aquela joia tanto quanto odiava Gilbert Blythe. Olhando feio para a amiga que a tinha entregado sem sua permissão, Anne respondeu em um tom seco:
-É sim. - depois se voltou para Lindy e disse- você tinha que contar, né?
-Eu não sabia que era segredo. Você não me disse nada.- Lindy falou em sua defesa.
-Deixa para lá. - Anne disse, bufando inconformada com a maneira com que Gilbert estava bagunçado sua vida.
- Você precisa nos apresentar seu noivo. Eu quero saber quem é essa divindade que te fez desencalhar. - Cole disse, tocando o rosto de Anne com carinho.
-Para, Cole.- Anne disse, começando a sorrir. Cole era uma das poucas pessoas que fazia seu humor melhorar quando estava estressada. Ele era um amigo realmente precioso.
-Agora me conta o que vai fazer com Phillip?
-O que tem ele?- Anne perguntou, começando a andar em direção à sala de aula.
-Você sabe que ele é amarradão em você.
-Phillip é apenas um amigo, Cole. Nunca tivemos nada.- Anne nunca dera esperanças para o rapaz, mas ele vivia convidando-a para sair. Anne nunca aceitara, porém ao invés de desanimá-lo, o rapaz parecia ainda mais determinado a conquistá-la.
-Ele gosta de você faz um tempão. Eu te disse isso várias vezes. - Lindy disse , parando no corredor onde separava a sala de Anne e a dela.
-Mas eu não gosto dele além da amizade que temos e isso é tudo. - Anne encerrou a conversa, pois não queria levar aquilo adiante.
-Tudo bem. Mais tarde conversamos e vou querer saber um pouco mais sobre esse noivado surpresa. -Lindy disse, antes de se encaminhar para sua sala de aula.
Anne suspirou ao ver a garota se afastar. Ia dar um enorme trabalho para despistar sua amiga daquela história toda. Lindy não deixaria aquele assunto morrer tão fácil, e ela precisava de um novo arsenal de mentiras se quisesse convencê-la de que ia se casar porque estava loucamente apaixonada. Não lhe agradava aquela situação, mas também como iria explicar o que estava acontecendo sem se sentir envergonhada por isso? Ela entrou na sua sala, foi direito para a carteira onde costumeiramente se sentava, e esperou que o rigor da aula a distraísse o suficiente para fazê-la não pensar em seus recentes problemas.
Ao contrário de Anne, o fim de semana de Gilbert tinha sido bom. Ele tinha conseguido impressionar seu pai com a noiva que arranjara sem grandes questionamentos. Passara o domingo em seu clube favorito junto com seus melhores amigos, jogando conversa fora, e se divertindo em várias atividades que haviam por ali, e consequentemente acordara com um humor incrível.
Naquele instante, ele estava tomando uma xícara de café na sala dos visitantes, fazendo pausa entre um contrato ou outro que teria que revisar, enquanto conversava com Moody que passara pelo escritório para ver o amigo com quem jogava uma partida de xadrez semanalmente.
-Como foi o jantar com seu pai?- o rapaz perguntou, fazendo Gilbert sorrir com a lembrança e responder:
-Muito bom. Meu pai e Anne se deram muito bem.
-Conseguiu finalmente agradar John Blythe?- Moody perguntou, usando a maneira irônica com a qual Gilbert às vezes se referia ao pai.
-Acho que dessa vez consegui finalmente surpreendê-lo.- Gilbert respondeu, adicionando açúcar ao seu café expresso.
-E seu relacionamento com Anne? Estão se dando bem?- Moody perguntou, cheio de curiosidade por saber como o amigo estava levando aquela história.
-Divertido - Gilbert respondeu com um grande sorriso.
-Como assim divertido?- Moody perguntou, intrigado com a resposta de Gilbert, cujo sorriso se ampliou, tomando conta de todo o seu rosto.
-Eu a beijei, e ela me deu um tremendo tapa no rosto.- Gilbert respondeu, se lembrando da expressão zangada de Anne que tanto o divertira no último fim de semana.
-E isso é divertido?- Moody perguntou, olhando para o amigo como se ele tivesse enlouquecido.
-Anne é uma das pessoas mais revigorantes que conheci nos últimos tempos. É eloquente, inteligente, e não finge nem um pouco que gosta de mim.- o rapaz explicou cheio de uma satisfação pessoal que fez Moody dizer:
-Mas isso devia dificultar a comunicação entre vocês, não melhorá-la.
-Não posso dizer que estamos bem, e Anne me irrita, você não sabe o quanto. - Gilbert disse suspirando:
-Agora não entendi mais nada.- Moody disse, tomando um gole de seu café.
-Não vê como isso torna tudo mais interessante? Ela descobriu que meu pai quer que tenhamos filhos, e jogou na minha cara que menti sobre isso. - Gilbert contou, sorrindo de novo.
-E você mentiu?- Moody perguntou, prestando atenção nas confissões do amigo.
-De certa forma. Não tive a oportunidade de falar com ela sobre a questão de filhos, mas meu pai fez esse favor para mim.- Gilbert disse, passando as mãos pelos cabelos, e só de se lembrar da cara furiosa da Anne o fazia rir. Ele não sabia bem porque irritá-la estava começando a ser uma de suas atividades favoritas, mas se ia entrar naquele casamento forçado, ele precisava ter um pouco de diversão, e aquela ruivinha ia lhe proporcionar exatamente isso.
-E o como ela reagiu?- Moody perguntou, cada vez mais interessado na conversa. Ele ainda não acreditava que Gilbert ia levar aquilo adiante. Aquela história era simplesmente absurda, mas o rapaz parecia disposto a ir até o fim com ela.
-Cara, ela ficou furiosa, tanto que jogou o vaso que trouxe da França na parede.- aquele fato ainda o irritava, mas apesar de ter perdido milhares de dólares e todo o tempo que passara procurando por aquela peça, Gilbert tentara colocar na cabeça que era apenas um objeto, e que no futuro tinha que se lembrar de manter sua coleção cara de arte longe das mãos da ruivinha geniosa.
-E você diz isso assim sem ficar bravo? Eu me lembro que passou meses atrás daquele vaso e pagou horrores por ele. Está mesmo bem com isso?- Moody perguntou, espantado com aquela informação.
-Bom, confesso que fiquei aborrecido, mas acabei encontrando um jeito de acalmar aquela garota impossível. - Gilbert sorriu ao se lembrar dos lábios de Anne sob os seus. Ela parecia um poço de mel no qual ele não se importaria em mergulhar muitas vezes.
-Pelo que me contou não surtiu muito efeito já que ganhou um tapa de presente . - Moody disse, ironizando a fala do amigo.
-Isso é o que você pensa. Eu vou domar aquela ferinha, nisso você pode confiar. - Gilbert rebateu com toda a autoconfiança do mundo. O botão Blythe conquistador já estava ligado de novo, e ele pretendia transformar aquele casamento em algo prazeroso para si mesmo. Anne achava que conseguia ser mais inteligente que ele, e já que estava em um jogo, ele ia entrar com tudo para ganhar. Ele teria tudo o que planejara para aquele casamento, e se Anne fosse esperta ela também teria.
-Gilbert,você ainda não percebeu, não é?- Moody disse, e Gilbert o olhou interrogativamente.
-O que?
-Você está com aquele olhar que conheço bem quando algo se constitui em um desafio para você. E essa garota já se tornou um desafio, não é?
-Não da maneira como pensa. Não vou me apaixonar. Fique tranquilo, Moody. - A autoconfiança de Gilbert era impressionante, mas a queda também poderia ser, se ele não tomasse cuidado, foi o que Moody pensou naquele momento.
-Não estou preocupado. Apenas tenho curiosidade de saber como seria ver meu amigo apaixonado.
-Moody, eu não me apaixono. Você sabe que minhas relações sempre foram mais de curtição. Amor é algo totalmente fora do meu mundo.- Gilbert respondeu. Ele realmente não acreditava em toda aquela baboseira romântica. Não fora feito para amar ninguém, o que lhe importava era o prazer pelo prazer, e se as garotas com quem se envolvia não entendiam isso , era um problema apenas delas.
-Se você diz.- Moody respondeu, evitando expor sua opinião sobre aquele assunto naquele momento.
O pai de Gilbert apareceu interrompendo momentaneamente a conversa que os dois amigos estavam tendo, e disse:
-Fui até seu escritório, mas a sua secretária disse que estava aqui.- John disse, indo até a cafeteira e se servindo de uma xícara de café.
-Precisa falar comigo?- Gilbert perguntou colocando sua xícara no pires em cima da mesa.
-Sim. Eu queria perguntar se sua festa de noivado pode ser realizada neste sábado, pois irei viajar novamente e volto daqui a apenas quatro semanas.
-Preciso confirmar com a Anne, mas por mim não tem nenhum problema.
-Ótimo. Diga a ela que não se preocupe com nada, pois eu vou providenciar tudo e a festa será em minha casa. Ela pode convidar quem quiser, além da família dela, é claro. - John falou, bebendo seu café quase tudo de uma vez.
-Quantas pessoas teremos como convidados?- Gilbert quis saber.
-Pensei em cinquenta . Não será nada grandioso. Quero fazer apenas uma festa familiar para que todos se conheçam, e você apresente Anne para os nossos amigos.
-Parece ótimo para mim. - o rapaz concordou.
-Então, confirme com sua noiva e depois me avise. Agora preciso voltar ao trabalho. Até mais Moody, até daqui a pouco filho. - John disse se encaminhando para a porta.
-Parece que teremos mesmo um noivado você está convidado, meu amigo., Gilbert disse com um sorriso divertido.
-Obrigado, Blythe. - Moody disse, terminando seu café.
Enquanto isso, Gilbert pegava seu telefone para enviar uma mensagem para Anne, mas então desistiu, pois uma ideia interessante surgiu em sua mente, e quanto mais pensava nela, mas interessante lhe parecia, e se tivesse sorte, Anne também iria se surpreender. Assim, ele voltou para seu escritório, pegou as chaves do carro, avisou sua secretária que estava saindo, e logo se dirigiu ao seu destino com um grande sorriso no rosto.
Ao mesmo tempo em que o dia parecia estar sendo extremamente proveitoso para Gilbert, Anne não parecia compartilhar dessa mesma opinião. As aulas da faculdade naquela manhã estavam sendo extremamente enfadonhas, e cansada como estava por não ter descansado o suficiente durante a noite, Anne não conseguia se concentrar como deveria, pois tudo o que estava em sua mente era uma cama confortável e silêncio para que pudesse dormir várias horas sem interrupção. Quando finalmente a última aula foi encerrada pelo seu professor de estatística, Anne foi a primeira a se levantar e caminhar para a porta, se despedindo rapidamente de seus amigos.
Lindy veio logo atrás dela, pois lhe daria carona para casa, enquanto que Cole também as seguiu, pois estava indo na mesma direção. Ao alcançarem o portão principal, a amiga lhe deu um cutucão e perguntou:
-Aquele cara lindo acenando para você é o seu noivo?- Anne olhou para a direção em que Lindy apontava e quase congelou ao ver Gilbert parado do outro lado, encostado em seu Lamborghini, tentando chamar sua atenção.
Deus! Aquele homem não tinha senso de oportunidade. Por qual razão ele tinha aparecido ali sem avisá-la? Anne olhou para todos os lados, mas não enxergou nenhuma saída para aquela situação, pois não tinha como fingir que não o tinha visto, e assim teria que ir falar com ele mesmo contra sua vontade. Se seu dia tinha como piorar, acabava de acontecer naquele instante.
-Aquele terno que ele está usando é Armani, e você disse que ele era apenas rico. Olha para aquele carro. Se eu trabalhasse a vida toda, não conseguiria juntar dinheiro suficiente para comprar algo assim.- Lindy comentou, claramente impressionada pela presença de Gilbert em frente a faculdade de ambas.
-Agora você virou especialista em roupas masculinas? Como sabe que o terno que ele está usando é Armani. - Anne disse de mau humor, tentando esconder o óbvio.
-Você se esqueceu que meu pai é alfaiate? Conheço mais de tecidos do que de qualquer outra coisa na minha vida, e aquele é com certeza um Armani.- Lindy afirmou, deixando Anne sem graça por ter se esquecido daquele fato.
-Desculpe perguntar, Anne. Mas aquele não é Gilbert Blythe, filho do dono das empresas petrolíferas mais importantes do país?- Cole a questionou, enquanto ela via sua esperança de nenhum de seus amigos ter reconhecido seu noivo morrer lentamente. Será possível que não havia um só lugar onde aquele rosto não era conhecido? Sem alternativa, ela respondeu:
-É sim.
-Sua bandida! Como me escondeu essa informação? Então está noiva de um dos homens mais gatos e milionários do país, e não me contou nada? Quero saber de toda essa história, não vou deixar que me esconda mais nada dessa vez. - Lindy disse, olhando-a de um jeito que fez Anne pensar se seria melhor ficar e enfrentar sua amiga e seu enorme questionamento, ou se deveria caminhar em direção ao homem que a esperava pacientemente do outro lado da rua. Ela optou pela segunda opção, pois não estava preparada para contar tudo o que a amiga queria saber naquele momento, e especialmente naquele dia, por isso disse:
-Outro dia a gente conversa. Acho melhor ir falar com ele. - e assim se despediu dos amigos, e caminhou em direção a Gilbert, sentindo-se completamente insegura e furiosa, por ele tê-la colocado naquela situação, enquanto todos os olhares do campus estavam sobre ela e sobre o rapaz que lhe sorria como se ela fosse sua princesa de conto de fadas. O cinismo daquele homem era gigantesco. A poucos dias nem se conheciam, e agora ele agia como se fosse a coisa mais natural do mundo aparecer na porta de sua faculdade como se tivessem combinado aquilo anteriormente.
Gilbert viu Anne caminhar em sua direção, pisando duro e com os olhos faiscando, e se divertiu imensamente por dentro. Ele sabia que ela ficaria brava, e foi justamente por isso que ele viera, pois queria ver como ela se comportaria em público ao vê-lo em frente à faculdade dela logo na saída, e acertara em cheio sobre o comportamento dela. Para colocar mais lenha na fogueira, ele disse:
-Oi, gatinha. Você está linda essa manhã.
-Cala a boca, Blythe. Eu quero saber que ideia foi essa de aparecer aqui sem avisar?- Anne perguntou, sem conseguir ignorar o fato de que os cabelos de Gilbert brilhavam ao sol, enquanto seu sorriso debochado o deixava mais charmoso do que nunca. Que aquele homem era gostoso, ela não podia negar, mas nem que ele fosse o próprio Apolo reencarnado, ela conseguiria desprezá-lo menos.
-Se eu dissesse que fiquei com saudades da minha noiva, você acreditaria?- ele disse, rindo ainda mais ao ver os olhos azuis de Anne cheios de ira, enquanto ele lhe admirava a silhueta esbelta em suas roupas despojadas. Nem que ela tentasse, conseguiria ficar menos bonita. Aquela garota era uma beldade e nem percebia os olhares masculinos sobre ela quando passava, e era justamente por essa sua falta de consciência do que provocava no sexo oposto que a tornava tão encantadora.
-Conta outra, Blythe. Você veio aqui por qualquer outro motivo que não sou eu. Agora me diga logo o que quer, pois preciso ir para casa. - ela disse com a voz dura, enquanto tentava ignorar o perfume dele delicioso, e a lembrança daquele beijo enquanto ele movimentava os lábios para falar com ela.
-Que recepção mais calorosa, querida. Acho que precisamos repetir o beijo de sábado a noite para amolecer esse seu coraçãozinho de pedra.- ele disse, vendo o rosto de Anne mudar de expressão no mesmo instante.
-Você nunca mais vai me beijar, entendeu? Posso ser obrigada a me casar com você, mas não sou obrigada a suportar seu toque ou o seus beijos. Então, esqueça isso e me deixe em paz. - ela disse em um tom baixo, pois não queria ser motivo de comentários dentro da faculdade onde qualquer fofoca pegava fogo em instantes.
-Você é mesmo uma ferinha enjaulado, não é? Nunca está de bom humor?- o rapaz perguntou, observando cada movimento dela. Desde o deslizar de seus dedos nervosos pelos fios que lhe escapavam de seu penteado natural, até a maneira como ela mordia seu lábio inferior que indicava sua inquietação interior. Ela era linda, e apesar de irritá-lo até o fundo de sua alma, ele não se cansava de constatar esse fato.
-Depende da companhia, e a sua realmente não me agrada. Vai me dizer ou não por que veio até aqui? Já perdi minha carona por causa dela, e vou ter que caminhar até ponto de ônibus que não fica exatamente ali na esquina para poder ir para casa. Então, por favor, não me faça perder mais tempo.- ao invés de responder o que Anne perguntara, Gilbert a agarrou pela cintura, e a trouxe para mais perto de seu corpo, o que fez Anne perguntar cheia de indignação:
-Ei, o que você pensa que está fazendo? Eu disse que não quero que me toque.
-Tem um cara quase te engolindo com os olhos, e quis mostrar que você não está disponível. - Anne olhou por sobre o ombro, e viu Phillip olhando-a com a expressão magoada, e respondeu ao tornar a encarar Gilbert:
- Você não é meu dono, Blythe.
-Mas sou seu noivo e logo serei seu marido. Por isso tenho que eliminar a concorrência. - ele disse, trazendo-a ainda para mais perto.
-Quer me soltar? Não te dei o direito de me abraçar assim.- Anne disse de forma ríspida, tentando não olhar para os lábios dele tão próximos, e ignorar a razão de seu coração estar disparado.
-Quer mesmo que eu te solte?- o rapaz perguntou, louco para repetir a experiência do fim de semana, percebendo que a cintura de Anne era tão fina que encaixava direitinho em suas mãos.
-Por favor, diz logo o que o trouxe aqui, pois tenho muita coisa para estudar e preciso ir para casa.- Anne desconversou, evitando responder a pergunta que ele lhe fizera antes, pois realmente a confusão de sentimentos que ele lhe causava a deixava claramente fora do eixo. Nunca se irritara com alguém daquela maneira.
-Meu pai quer que a festa do noivado seja feita no próximo sábado na casa dele, e pediu para me perguntar se está tudo bem para você?- ele disse por fim, pois já a tinha provocado demais.
-Tudo bem. Era só isso? Vai me deixar ir agora?- Anne perguntou, louca para se livrar do rapaz e da situação constrangedora que ele lhe causara.
-Entra no carro que vou te levar.- ele disse, finalmente a deixando sair de seus braços.
-Não precisa. - ela respondeu, aliviada por
ele tê-la soltado.
-Precisa sim. Não me custa nada. Vamos. Entre no carro.- Anne ia recusar, mas acabou aceitando, estava cansada e esperar pelo ônibus que demoraria a passar só a atrasaria ainda mais, por isso entrou no carro de Gilbert e permaneceu em silêncio até que ele a deixou na porta de casa.
-Entregue, gatinha. - Anne revirou os olhos e ele continuou.- Meu pai disse para você convidar quem quiser.
-Está bem.- ela respondeu, sem encará-lo.- Devo vestir algo especial?
-A festa é informal. Vista o que a fizer se sentir bem.- ele respondeu, sabendo que mesmo que ela vestisse trapos ainda sim continuaria linda.
-Preciso entrar. Obrigada pela carona.
-Até nosso noivado. Te pego às 8 horas.
-Certo. -Anne respondeu, se despedindo com um aceno de cabeça, e entrando em casa no momento em que Gilbert fez uma manobra com o carro e sumiu na esquina.
O resto da semana transcorreu de forma tranquila para Anne, que ainda assim se manteve ocupada o tempo todo. Fizera isso de propósito para não pensar demais, e entrar em pânico pela festa de noivado, assim como para fugir de Lindy que parecia olhá-la com certa desconfiança. Anne a teria convidado para o seu noivado, se não fossem as circunstâncias de toda aquela situação complicada.
Como não tinha uma roupa adequada para aquele tipo de festa, Anne pediu a Diana que a acompanhasse até o shopping na sexta-feira para ajudá-la a encontrar um vestido que não fosse sofisticado demais, mas ainda assim elegante. A irmã a levou a uma loja que conhecia e onde uma de duas amigas trabalhava, e apesar de não estar acostumada a usar as roupas que vendiam ali, a ruivinha acabou se apaixonando por um vestido azul marinho, tomara que caia, justo na cintura, e de saia sobreposta curta até os joelhos. Ele vinha acompanhado de um bolero que a protegeria do ar frio caso precisasse, cujo tecido combinava perfeitamente com seu cabelo ruivo.
No sábado, com a ajuda das irmãs, ela se arrumou para a grande noite, e até Josie que visivelmente estava morrendo de inveja de Anne, deu um palpite ou dois a respeito da aparência da ruivinha. E quando finalmente ficou pronta, ela gostou do que viu, pois seu reflexo no espelho mostrava uma garota diferente da que estava acostumada a ver no seu dia a dia, mas sem exageros e de muito bom gosto. Graças à Diana que realçara seus pontos fortes de maneira sutil, mostrando a ela que havia uma garota refinada por trás de seu jeans, camiseta e tênis all star.
Gilbert veio buscá-la no horário combinado, e levou um pequeno susto ao vê-la produzida daquela maneira. Ele vagamente cumprimentou Walter com um aperto de mão rápido, falou com mais entusiasmo com Diana, tratou Ruby com delicadeza, e falou com Josie estritamente o necessário. Ele não gostava da maneira como ela o olhava, e por isso manteve distância da loira por pressentir que ali estava alguém em quem não devia confiar.
Quando ficou sozinho com Anne em seu carro, enquanto as outras três irmãs se acomodavam no carro de Walter, Gilbert disse, olhando-a com admiração:
-Você está incrível essa noite.
-Obrigada. - Anne respondeu sem grande entusiasmo.
-Você parece nervosa.- ela assentiu com muito custo, e não usou a própria voz para descrever como se sentia, pois não queria que seu futuro marido tivesse acesso a essa parte sua que era extremamente vulnerável. Seus sentimentos e pensamentos eram somente seus, não queria partilhá-los com ninguém, principalmente com Gilbert que poderia usar qualquer coisa que ela dissesse a seu favor.
-Vai dar tudo certo, você precisa apenas relaxar.- Anne assentiu novamente, mas se manteve calada diante das palavras do rapaz, pois não sentia que conseguiria relaxar em uma situação como aquela.
A casa de John era ainda mais suntuosa e impressionante que o apartamento de Gilbert, e não negava a riqueza se seu dono. Era em um estilo antigo com acabamento de madeira e uma grande varanda na frente de onde deveria ser incrível a visão do pôr do sol. A garagem era imensa, e o jardim foi o que mais encantou Anne. Havia tanta variedade de flores que ela conseguiu se ver perfeitamente dormindo e acordando com aquela paisagem incrível da sua janela. Era uma pena que tanta beleza viesse de uma casa onde nunca teria prazer em morar, se tivesse que dividi-la com um homem que no momento era a causa de seu maior infortúnio.
Assim que entraram, John veio cumprimentá-los, e Anne sentiu uma onda de afeição pelo pai de Gilbert, com quem se simpatizara logo de cara . Era nítido o amor que ele tinha pelo rapaz, mas Gilbert parecia tão indiferente a ele que chegava a dar pena. O tipo de relacionamento que pai e filho tinham era nitidamente frio. Não por parte de John, que parecia fazer de tudo para se aproximar do filho, que colocava uma barreira entre eles, impedindo que o homem mais velho se aproximasse demais.
-Boa noite, minha querida. Está ainda mais bonita que o último fim de semana.- John disse, beijando-a no rosto.
-Obrigada. Esse é meu pai Walter, minhas irmãs Diana, Josie e Ruby.
-Muito prazer. - John disse, voltando sua atenção para o pai de Anne a quem apertou a mão com firmeza. - E vocês são tão bonitas quanto Anne.- ele completou, deixando um beijo suave no dorso das mãos de cada uma das três irmãs. - Por favor, fiquem à vontade, e quanto a você,,Gilbert, acho que está na hora de apresentar Anne para nossos amigos.
-Está bem, papai. - Gilbert respondeu, e apesar de agir de forma obediente, Anne pôde perceber um certo brilho de irritação dentro dos olhos castanhos que contrastava enormemente com a postura calma do rapaz.
Ele circulou com ela por entre os grupos de pessoas, e gentilmente a apresentou a todas elas. A inibição inicial que Anne sentira ao entrar naquela casa enorme, e seu receio de não se encaixar em um ambiente luxuoso foram aos poucos se dissipando, e logo ela se viu conversando com várias pessoas de forma totalmente natural e relaxada, e só percebeu isso quando Gilbert lhe perguntou:
-O que gostaria de tomar, Anne?
-Um refrigerante, por favor.
-Espere aqui um instante que vou buscar.- Gilbert respondeu, a deixando em companhia de uma senhora que estava lhe contando sobre sua última viagem à Grécia. Sem que pudesse evitar, seus olhos seguiram Gilbert e somente naquele instante foi que percebeu como ele estava bonito.
Ele tinha trocado sua calça social por um par de jeans preto, e a camisa de mangas compridas cinza estava dobrada até o cotovelo, lhe dando um ar mais jovial do que seus ternos diários bem cortados. Os cabelos sempre arrumadinhos foram deixados com um aspecto bastante natural onde seus cachinhos desarrumados davam a Anne a ideia de um garotinho muito levado, pronto a realizar milhares de travessuras.
Havia muitas mulheres jovens na festa que não tiravam os olhos de seu noivo. Aquilo deveria ser um comportamento feminino comum a Gilbert que caminhava pelo ambiente como se fosse um rei entre seus súditos, tamanha a confiança que exibia em cada gesto não calculado. Ser esposa de um homem que parecia esbarrar no próprio orgulho todos os dias, seria um enorme problema para Anne que detestava tudo o que Gilbert representava, dinheiro, poder, arrogância, mas infelizmente teria que achar uma forma de conviver pacificamente com aqueles pontos que via como negativos em seu futuro marido, já que escapar daquele casamento se tornara uma missão impossível.
Quando Gilbert voltou com sua bebida, eles ouviram a voz de John dizer, posicionado no meio da sala:
-Pessoal, quero agradecer a presença de todos aqui nesse dia especial, e queria pedir um brinde aos noivos que são a principal razão de estarmos aqui hoje. Em breve, Anne entrara em nossa família como esposa oficial de Gilbert, o que me deixa imensamente feliz por meu filho ter encontrado alguém tão especial para dividir sua vida daqui em diante. Por isso, quero te dizer, Anne. Seja bem vinda à família.
Anne disse um obrigada quase inaudível, enquanto milhares de aplausos se seguiram após o discurso de John. Então alguém disse:
-Aos noivos!- e outra voz gritou:
-Queremos um beijo.- e outras se seguiram depois dela pedindo a mesma coisa, o que fez Gilbert perguntar baixinho:
-Você se importa?
-Acho que não temos alternativa, não é?- Anne disse sem graça. Não queira que Gilbert a beijasse, especialmente em público, mas também não queria fazer uma cena em frente de pessoas que mal conhecia, por isso deu sua permissão silenciosamente, e respirou fundo antes que o rapaz tocasse sua boca com a dele, e quando ele o fez , seu coração se acelerou de tal forma que ela teve que se segurar nele para não perder o equilíbrio. As mãos dele automaticamente se fecharam em sua cintura, e apesar do beijo não ser tão intenso quanto o primeiro, a deixou de pernas bambas mesmo assim. Gilbert Blythe definitivamente beijava bem demais, e ela teria que tomar cuidado para não se envolver no jogo dele ou acabaria magoada no final.
Eles se afastaram, e quando olhou nos olhos de Gilbert viu uma chama desconhecida queimar ali. Ela não podia saber que naquele momento o rapaz também estava perturbado, bem mais do que admitiria. Da mesma maneira que ela se perdera naquele beijo, ele se envolveu na doçura dela, na suavidade daqueles lábios que o faziam desejar poder continuar aquele momento em outro lugar. Ao perceber o perigo de seus pensamentos, Gilbert disse:
-Vou pegar uma bebida para mim.- e enquanto ele se afastava, Anne deu uma olhada ao seu redor a procura de sua família, e encontrou Diana e Ruby em companhia de seu pai conversando com John, e Josie que estava em acompanhada de um rapaz com o qual Anne antipatizou logo de cara, mas afastou aquela sensação, pois mesmo que pudesse dizer isso a Josie, a irmã não que lhe daria ouvidos.
Assim, ela caminhou meio incerta pela festa, sentindo uma imensa necessidade de ficar sozinha. Tantas coisas estavam acontecendo na vida dela, deixando-a totalmente desestabilizada. Tudo o que desejava era um pouco de coerência para sua cabeça e para seu coração. Se pudesse voltaria a um mês antes quando era apenas uma garota preocupada com seus projetos e se formar com ótimas notas na faculdade. Agora seu futuro parecia tão obscuro que a deixava angustiada. Anne pensou no jardim da casa que a encantara tanto, e decidiu dar uma volta lá fora, para tentar trazer um pouco de tranquilidade para sua alma.
Uma vez no jardim, o aroma adocicado das flores chegou às suas narinas, deixando-a em puro êxtase por alguns segundos. Era como estar caminhando por um mundo encantado onde nada poderia magoá-la, onde tudo era bonito e sem as complicações da vida moderna. O barulho de passos estranhos a fizeram se virar, interrompendo a sua paz momentânea, e logo se viu frente a frente com o rapaz que estivera conversando com Josie momentos antes.
-Então, a noivinha do meu primo se cansou da festa, ou devo dizer se cansou da farsa?- imediatamente Anne deu um passo para trás, pressentindo o perigo nas falas do rapaz e respondeu:
-Como se atreve a falar comigo nesse tom? Eu nem sei quem você é. - Anne disse de forma ríspida, fazendo rapaz sorrir e responder:
-Eu sou Billy, primo de Gilbert. Parece que temos uma tigresa dentro desse corpo delicado.- o rapaz lhe lançou um olhar que a fez se arrepiar de nojo, e o desejo de fugir daquela situação a fez dizer:
-Acho que é melhor eu entrar.- mas quando deu um passo em direção a porta, o rapaz a segurou pelo pulso e a trouxe para perto enquanto dizia :
-Por que a pressa? Podemos nos divertir muito juntos. - Anne sentiu seu nojo aumentar e respondeu:
-Me solta ou eu vou gritar.
-E quem vai te ouvir? A música está alta, as pessoas estão conversando, e se observar bem, esse lugar fica um pouco afastado da porta de entrada, então, duvido que alguém preste atenção no que estamos fazendo aqui.- ele aumentou a pressão em seu pulso, e apesar da dor, Anne não reclamou, pois se recusava a demonstrar fraqueza diante daquele rapaz insolente.
-Você não me conhece e não sabe do que sou capaz. John Blythe e eu somos grandes amigos, e ele vai acreditar em tudo o que eu disser, portanto, se insistir no que tem em mente, posso te garantir que isso vai sair muito caro para você. - Anne estava blefando, mas Billy não teria como saber disso, e para livrar dele, ela diria qualquer coisa naquele momento.
Billy a encarou com um olhar de dúvida, mas para seu alívio ele a soltou, e quando parecia que o rapaz ia lhe dizer qualquer coisa, Gilbert surgiu em seu campo de visão e perguntou ao ver a expressão tensa de Anne;
-Está tudo bem por aqui?
-Calma, priminho. Só estávamos nos conhecendo melhor. - Billy disse com seu sorriso sarcástico tão característico de sua personalidade cínica.
-E o que te interessa conhecer a minha noiva?- Gilbert perguntou, se posicionando protetoramente atrás de Anne.
-Apenas fiquei curioso, nada de mais. - o rapaz respondeu, colocando as mãos no bolso de sua calça social.
-Quero que fique longe dela, entendeu?- Gilbert disse, com seu olhar fuzilando o primo que respondeu com outro de seus sorrisos odiosos:
-Perfeitamente. Até logo, Anne . Foi um prazer conhecê-la. - Billy disse, e então se afastou,deixando Anne em companhia de Gilbert.
-Você está bem?- ele perguntou, e a preocupação na voz dele quase a fez chorar, mas Anne fez um esforço enorme para se controlar e respondeu:
-Estou sim. Vamos voltar para a festa.- Anne disse com um sorriso fraco. Não queria contar o que Billy tinha feito, pois algo lhe dizia que aquilo era algo que Gilbert não deixaria passar em branco, o que estragaria a festa que John tinha preparado para eles com tanto carinho.
Eles ficaram mais algum tempo na festa de John, até que Anne disse a Gilbert que estava cansada e queria ir para casa. Seu pai e suas irmãs já tinham ido embora a algum tempo, e assim Anne sentiu que já podia ir sem levantar suspeitas de seu noivo que ficara abalada com o incidente que acontecera com Billy.
Assim que Gilbert estacionou o carro em frente da residência dela, o rapaz se virou para se despedir e viu uma marca vermelha no pulso de Anne que não notara antes, e perguntou:
-O que aconteceu com seu pulso?
-Não aconteceu nada.- Anne respondeu e Gilbert intuindo que ela estava mentindo, tornou a perguntar:
-Foi o Billy?- Anne não respondeu, fazendo Gilbert praguejar baixinho e rosnar:
-Eu juro que vou matar aquele desgraçado!- Assustada com a reação de Gilbert, Anne se apressou em dizer:
-Está tudo bem, vamos esquecer isso. Preciso entrar agora. - ela soltou o cinto de segurança, e quando ia abrir a porta do carro para entrar, Gilbert segurou em seu pulso machucado, o acariciou de leve, e deixou um beijo suave no local enquanto dizia:
-Boa noite.
O coração de Anne veio parar na garganta com aquele gesto inesperado, mas se controlou a tempo de responder:
-Boa noite. - e assim entrou em casa, ainda confusa com tudo o que tinha acontecido naquela noite, mas como não queria perder mais horas de sono como acontecera nos últimos dias, ela simplesmente se deitou na cama, apagou o abajur, e se entregou ao cansaço que a fez adormecer profundamente.
Olá, pessoal. Espero que gostem desse capítulo, ficou grande, mas espero que mesmo assim a leitura seja agradável e os incentive a me deixar seus comentários e seus votos para que eu saiba o que estão achando dessa minha nova história. Obrigada por lerem. Beijos.
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