31° Uma vida
O dia seguinte amanheceu nublado, com o céu cinza e ameaçando chuva, mas a atmosfera na casa de campo era acolhedora. Na varanda, toda a família estava reunida ao redor da mesa de café, desfrutando de uma refeição farta, com pães frescos, queijos, frutas, e cafés fortes que exalavam o aroma típico da manhã italiana. O riso e as conversas fluíam com naturalidade, criando um ambiente de alegria e calor humano. Milena estava sentada ao lado de Enrico, ouvindo os comentários descontraídos de seus parentes, quando o ambiente foi interrompido por um empregado da casa que se aproximou, visivelmente preocupado.
— Senhor Lorenzo, desculpe interromper, mas há um problema no estábulo — disse o empregado, com uma expressão de urgência. — Uma das éguas está com dificuldades para parir o potro, e o veterinário da cidade não pode chegar a tempo. A situação está ficando grave.
Lorenzo olhou rapidamente para o empregado, claramente preocupado. A tensão no ar era palpável enquanto ele tentava entender a gravidade da situação.
— O senhor Giusepe não vai chegar a tempo? — perguntou Lorenzo, claramente preocupado. — Precisamos de alguém que saiba o que está fazendo!
Nesse momento, Enrico, que estava sentado ao lado de Milena e acompanhava a conversa, se levantou com uma expressão tranquila, mas firme. Ele olhou para Lorenzo e os outros familiares, antes de se dirigir ao empregado.
— Eu posso ajudar. Sou veterinário, e tenho experiência com partos de animais. — disse Enrico, com a voz calma, mas decidida.
Milena olhou para ele, surpresa pela proposta, mas ao mesmo tempo, tocada pela disposição de Enrico em se oferecer para ajudar. Os olhos dela encontraram os de Enrico, e ela sentiu um misto de orgulho e admiração por sua atitude.
Lorenzo olhou para Enrico com uma expressão de alívio, e um sorriso se formou em seu rosto.
Gabriel, que observava tudo atentamente, deu uma risada leve e comentou com um tom de brincadeira, mas também admirado:
— Parece que o Tenente não está aqui apenas para resolver questões militares, mas também para lidar com emergências do campo..
— Bem, onde eu posso ser útil, Gabriel, eu me ofereço. Vamos lá, tenho a sensação de que vamos precisar de uma boa dose de paciência e habilidade.
Milena sorriu, orgulhosa, mas também um pouco preocupada com o que estavam prestes a enfrentar.
— Vamos, Enrico. Cuide de tudo, como sempre faz — disse ela, incentivando-o, mas também curiosa sobre como ele lidaria com a situação.
Lorenzo fez um gesto, convidando Enrico a seguir com o empregado, e a família se levantou da mesa, acompanhando a movimentação. Enrico seguiu o empregado até o estábulo, com Milena ao seu lado, sentindo a tensão no ar e a expectativa de todos.
Quando chegaram ao estábulo, a cena era tensa. A égua estava deitada, com sinais evidentes de desconforto, enquanto o potro parecia em dificuldade para nascer. O ar estava pesado com a preocupação de todos, mas Enrico assumiu o controle da situação rapidamente. Ele falou com calma, como se estivesse em seu consultório, explicando o que faria e pedindo que os outros ficassem tranquilos.
— Vamos precisar de tranquilidade aqui. Me ajudem a manter a calma da égua, e eu vou dar início ao processo — disse Enrico com autoridade, enquanto se agachava perto da égua para avaliar a situação.
Milena ficou observando, impressionada com a confiança dele. Enrico parecia estar em seu elemento, e a situação que poderia ser angustiante foi sendo controlada aos poucos, com a habilidade dele. Ela sentiu orgulho de vê-lo trabalhar com tanta destreza.
O ambiente estava tenso no estábulo. A égua, suada e inquieta, estava deitada no chão, ofegante, com sinais claros de dor. O ar estava pesado, mas Enrico permaneceu calmo, movendo-se com a confiança e experiência de alguém que já havia lidado com situações semelhantes. Ele olhou para a égua, avaliando sua condição, e falou com a calma de quem sabia exatamente o que fazer.
— Vamos, querida, respire fundo. Você vai ficar bem — ele murmurou, acariciando o pescoço da égua, tentando tranquilizá-la. A voz suave de Enrico parecia ter um efeito imediato, já que a égua imediatamente começou a relaxar um pouco, embora ainda demonstrasse sinais de desconforto.
Enrico se ajoelhou ao lado dela, retirando um par de luvas e começando a se preparar para o procedimento necessário. Ele se virou brevemente para o empregado e para os outros, explicando o que faria, para que todos estivessem cientes do processo.
— Precisamos de calma e paciência. A égua está em trabalho de parto, mas o potro está em uma posição difícil. Vamos precisar de ajuda para manter a calma dela, e vou verificar a posição do potro — ele explicou.
Com a ajuda do empregado, Enrico posicionou-se ao lado da égua, procurando sentir a posição do potro com as mãos. A égua relinchou suavemente, seu corpo se contraindo com mais força. Enrico, com precisão, usou as mãos para avaliar o tamanho e a posição do potro, tentando identificar se ele estava preso ou mal posicionado.
— O potro está com a cabeça virada para o lado — disse Enrico, a voz tranquila. — Vamos precisar manobrá-lo para que ele possa nascer com segurança. Isso pode ser um pouco difícil, mas é possível.
Ele pediu ao empregado que ajudasse a segurá-la de forma firme, mas gentil, enquanto ele começava a manobrar o potro com cuidado. Enrico aplicou pressão suavemente, alinhando o corpo do potro para que ele passasse pela pelve da égua. A dor de parto da égua se intensificou, mas, com sua experiência, Enrico foi capaz de aliviar um pouco da pressão, ajustando a posição do animal.
A égua deu um relincho baixo, mas Enrico não perdeu a calma. Ele sabia que era crucial manter o ambiente o mais tranquilo possível, para que a égua não se agitasse ainda mais. Ele usou a mão para sentir os movimentos do potro e, com um esforço delicado, conseguiu começar a puxá-lo para fora. O processo era lento, mas cuidadoso, cada movimento era preciso e medido.
Com uma última puxada suave, Enrico conseguiu trazer o potro à luz. Ele estava enroscado nos sacos amnióticos, mas logo Enrico os rompeu com uma tesoura estéril, e o potro, finalmente, foi completamente liberado. Ele deu um pequeno relincho, ainda sem forças, mas já respirando.
Enrico rapidamente limpou as vias respiratórias do potro, passando um pano limpo pelo nariz e pela boca para garantir que ele pudesse respirar adequadamente. O pequeno potro, ainda tremendo, começou a se mover lentamente, tentando se levantar.
A égua, agora mais calma, se ergueu lentamente, olhando com instinto para o filhote, que estava se esforçando para se levantar. Enrico observou o processo, aliviado, com um sorriso suave no rosto.
— Você fez bem, querida — disse ele, acariciando o pescoço da égua. — Agora é só dar a ela algum tempo para se recuperar e deixar o filhote se fortalecer.
Lorenzo, os empregados, e Milena e estavam observando tudo em silêncio, maravilhados com a habilidade e confiança de Enrico. O alívio era visível nos rostos deles. O potro estava vivo, e a égua, embora cansada, estava bem.
— Foi impressionante, Tenente — disse Lorenzo, com um sorriso de gratidão. — Você salvou a vida dos dois. Não sei o que faríamos sem sua ajuda.
Enrico olhou para o potro e a égua, já descansando ao lado de sua mãe. Ele deu um sorriso tranquilo, limpando as mãos com um pano estéril.
— Não foi nada. Só fiz o que qualquer veterinário faria — respondeu ele modestamente, embora a satisfação em seu olhar fosse clara.
Milena, que estava ao lado, observou com admiração, sentindo um novo nível de respeito e carinho por Enrico, vendo-o não apenas como um tenente, mas também como um homem de grande habilidade e compaixão. Ela se aproximou dele, tocando seu ombro com um sorriso.
— Você foi incrível — disse ela, com uma voz suave, mas cheia de gratidão.
Enrico olhou para ela, um sorriso tranquilo se formando em seus lábios.
— Eu só fiz o que precisava ser feito. O que importa é que todos estão bem agora.
Eles observaram juntos o potro dar seus primeiros passos vacilantes, enquanto a égua o observava com carinho. Um momento de tranquilidade se seguiu, preenchido pelo som do vento nas colinas e pela sensação de que, por mais desafiadora que fosse a vida, sempre havia espaço para o cuidado e a compaixão.
O silêncio se estendeu por alguns instantes, enquanto todos na pequena equipe observavam o potro tentando se levantar e se aproximar da mãe. O ar estava mais leve agora, a tensão havia se dissipado, e o alívio era palpável. A sensação de satisfação compartilhada pelo trabalho bem feito pairava no ar, trazendo um equilíbrio para aquele momento de preocupação.
Milena, com o sorriso ainda no rosto, olhou para Enrico, seus olhos brilhando com uma mistura de admiração e carinho. Ela não podia deixar de notar como ele parecia confortável e seguro em qualquer situação, fosse no campo de batalha ou em um estábulo, sempre pronto para agir com calma e precisão. Ele não era apenas um homem de ação, mas alguém que sabia cuidar com verdade.
— Enrico — ela disse, quebrando o silêncio, sua voz suave, mas cheia de emoção —, você é realmente incrível. Não sabia que tinha esse dom também.
Ele riu levemente, a humildade evidente em sua resposta.
— Não é dom, Milena. É apenas conhecimento. Eu passei muitos anos trabalhando como veterinário, e isso me ensina a manter a calma e pensar rápido em momentos como esse. Quando a vida de um ser vivo está em risco, não há tempo para hesitar.
Milena sentiu o coração bater mais forte ao ouvi-lo falar com tanta paixão e convicção. Ele estava realmente dedicado ao que fazia, e isso a impressionava profundamente. Ela se aproximou um pouco mais, tocando sua mão suavemente.
— Você me impressiona a cada dia, Enrico.
O sorriso dele se alargou, e ele segurou sua mão com mais firmeza, seus olhos expressando um carinho profundo.
— Só faço o que está ao meu alcance para ajudar, Milena. E sempre estarei ao seu lado, em qualquer situação, seja aqui, na guerra, ou em qualquer outro lugar.
Enquanto o potro começava a andar um pouco mais firme, Lorenzo e o empregado que ajudara na estabilização da égua se aproximaram, observando com uma expressão de contentamento.
— De fato, Tenente — disse Lorenzo, a voz cheia de gratidão. — Você demonstrou não só coragem, mas também um grande coração. A família inteira está impressionada.
Milena olhou para o pai e para os outros, notando a aprovação em seu rosto. Ela nunca tivera dúvidas de que Enrico seria bem aceito pela família, mas ver a admiração genuína deles por ele só reforçava o quanto ela o respeitava.
— É bom ver tudo se ajeitar — disse Enrico, dando um último olhar para a égua e o potro, agora ambos mais tranquilos. Ele olhou para Milena, seu olhar suavemente fixado nela. — Agora, podemos aproveitar o resto do dia, sem preocupações.
Ela assentiu, sorrindo. O peso da situação havia se dissipado, e agora havia espaço para aproveitar o momento juntos. Eles se afastaram suavemente, deixando os outros conversarem enquanto o novo potro explorava o campo com os primeiros passos tímidos, ao lado da mãe.
O resto do dia seguiu tranquilamente, com todos aproveitando a tarde no campo. As conversas flutuaram entre risadas e histórias antigas, e Enrico se sentiu aos poucos mais integrado à família de Milena, não só como o "tenente", mas como alguém que se importava verdadeiramente.
Milena, por sua vez, sentia que sua vida estava mudando de maneira que não poderia ter imaginado. Cada pequeno gesto de Enrico, sua dedicação e compaixão, estavam fazendo com que ela visse o futuro de maneira mais clara. Ele era alguém que não só poderia suportar os desafios da vida ao lado dela, mas também dar a ela a segurança de que, em qualquer momento, ela teria alguém para contar.
Naquela tarde, enquanto o sol começava a se pôr sobre as colinas verdes e a brisa fresca do campo soprava suavemente, eles se sentaram juntos, em silêncio, aproveitando a companhia um do outro, sem pressa, simplesmente deixando que o tempo passasse em seu próprio ritmo.
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