03. Eagle
Kyungsoo acordou assustado.
Seu corpo inteiro estava doendo, principalmente por dentro. Queria poder tomar seu banho matinal como sempre fazia, pois em seus dias no Palácio, Baekhyun sempre preparava. Mas dessa vez não seria assim, ele estava muito atrasado e seu marido havia se levantado mais cedo que ele, algo que poderia significar que havia cometido um erro justamente em seu primeiro dia como um ômega casado.
Sua vida agora seria muito diferente e ele tinha consciência disso. Pouco tempo antes de se casar, haviam lhe dito que alfas gostavam de sentir o próprio cheiro impregnado em seus ômegas, e seria bom que saísse do quarto da maneira que estava, usando roupas leves e que não abafassem o odor forte que ainda estava em sua pele.
O cheiro do sexo, o cheiro de Jongin.
Quando chegou à cozinha, o encontrou ali. O alfa notou sua presença rapidamente, mas ficou quieto esperando que Kyungsoo iniciasse qualquer diálogo.
— Me desculpe, meu marido, eu dormi mais do que deveria. — O príncipe se sentia muito culpado por isso, além de ser nítido que estava com medo da reação de seu marido, que tinha todo o direito de se desagradar.
Jongin se virou para ele.
— Sente-se, deve estar com fome.
Realmente estava, e ocupou um lugar à pequena mesa com bastante receio. Não sabia que tipo de alfa Jongin realmente era em seu íntimo, pois poucas pessoas tinham acesso a ele em seus ambientes pessoais. Não conhecia ninguém que frequentasse sua casa e muito menos alguém que pudesse se dizer seu amigo.
Amigos, essa era uma boa questão. Jongin tinha amigos? O General Kim Jongin tinha uma vida comum longe de seus afazeres como militar? Estava muito curioso sobre esse assunto, ao mesmo tempo que também estava com medo de possíveis coisas que pudesse descobrir.
Quando levou a primeira colher à boca, percebeu que, pelo menos, uma coisa sabia agora:
— O senhor cozinha muito bem, Ge... — O ômega se sentiu mal com a ideia de ainda chamá-lo assim, pois parecia se tratar de uma nomenclatura desadequada — Digo, meu marido.
— Obrigado.
Ele falava muito pouco e isso deixava Kyungsoo muito incomodado, queria poder ter longas conversas com seu marido e descobrir várias coisas sobre a pessoa que ele era, sobre seu passado e sua família. A única coisa que sabia era que ele era filho de Kim Jong Hyun, que havia sido o líder do exército imperial por longos anos antes de falecer em batalha.
Havia sido uma morte brutal, ele lutou mesmo ferido e foi trazido de volta para casa em um estado deplorável. As outras feridas chegaram a sarar dentro de pouco tempo, mas o corte profundo em sua perna infeccionou com o passar dos dois, e apenas uma solução foi encontrada. Era preciso amputar. Mas ele se negou permanentemente a viver sem uma de suas pernas, pois isso o impossibilitaria de lutar da maneira que sempre lutou, e por mais que muitos tivessem implorado para que deixasse a amputação acontecer, ele jamais deixou.
Faleceu quando já não suportava as dores diárias, e quando a infecção já havia tomado conta de quase toda sua perna, tornando impossível de que qualquer parte chegasse a ser salva.
Kyungsoo não sabia o quanto Jongin havia herdado de seu pai, mas pedia para que os deuses fossem bondosos com ele, e não precisasse passar por isso. Não chegava a ser otimista ao ponto de acreditar que viveria um romance com seu marido e que o amaria de todo o coração um dia, mas a ideia de vê-lo ferido após as batalhas parecia ser muito triste e cruel.
— Desculpe por não ter cozinhado. — O ômega pediu — Hoje é o nosso primeiro dia como casados e cometi esse erro.
— Não foi um erro, está tudo bem.
Balançou a cabeça afirmando e esperou que o Kim dissesse qualquer coisa a mais, mas ele não disse nada, o que não era nenhuma novidade, já que ele não dizia nada nunca, sempre resumindo tudo a frases pequenas, e arrancar sete palavras dele já chegava a ser coisa demais.
Quando terminou de comer e Jongin fez menção de levar seu prato, colocou a mão sobre a mão dele e o impediu disso.
— Deixe que eu lavo. — Se sentia nervoso com a ideia de que seu alfa estava fazendo tudo enquanto ele apenas dormia como se fosse um preguiçoso.
Aquilo parecia não fazer a menor diferença para o General. Kyungsoo queria poder organizar toda aquela cozinha de uma forma que conseguisse encontrar tudo depois, mas ainda não tinha certeza de que aquilo seria uma boa ideia, pois poderia ser que Jongin não gostasse de que mexessem em suas coisas.
Era seu esposo agora, aquelas coisas também pertenciam a ele?
— Estou indo para o quartel. — O alfa o avisou usando o mesmo tom de voz que usava o tempo todo. Estava começando a se tornar algo monótono. Kyungsoo se sentia um idiota por ter acreditado em algum momento que o General iria o tratar diferente e que em algum momento seria mais doce dentro de casa.
O ômega afirmou que havia entendido.
— Quando volta para casa? — Acabou perguntando e se arrependeu no momento em que notou que parecia eufórico e ansioso para saber — Digo, vai comer em casa ao meio-dia ou só retornará à noite?
Jongin só voltava para casa à noite, esse sempre foi o seu costume e pensou mesmo em mantê-lo.
— Virei para casa ao meio-dia.
O ômega pareceu satisfeito com isso e apenas observou as costas de seu marido enquanto ele partia. Estava vestido da mesma maneira de sempre e Kyungsoo calculou quanto tempo demoraria para que ele estivesse longe o suficiente. Sentia uma vontade imensa de mexer em suas coisas e descobrir se o alfa só tinha hanfus daquela cor, entretanto, sabia que seu cheiro ficaria em tudo o que tocasse, e o Kim iria descobrir que andou bisbilhotando e talvez não gostasse.
Esse era o problema de estar casado com alguém tão estranho e distante, nunca sabia o que podia e o que não podia fazer.
Já Jongin seguia sua manhã assim como todas as outras e fingia não saber o motivo dos soldados estranharem tanto a sua presença ali. Além disso, seus narizes se mexiam diante do cheiro específico que ele estava exalando. Como Kyungsoo não acordou, ele acabou tendo uma manhã um pouco mais corrida e não conseguiu tomar banho direito, por mais que fosse uma regra muito específica do quartel.
Quando entrou em sua sala, não se sentiu surpreso por encontrar Park Chanyeol ali.
— O que está fazendo aqui? — Mas o Park estava surpreso por vê-lo — Acabou de se casar, deveria estar em casa com seu ômega e não neste lugar.
— Não tenho tempo para pausas.
Chanyeol poderia o conhecer melhor do que qualquer pessoa em todo o império, entretanto, ainda conseguia se surpreender com algumas de suas atitudes, e uma delas certamente era aquela. Jongin era uma pessoa difícil e com regras extremas aplicadas a si mesmo.
Mas tudo tinha limite.
— Não é uma "pausa". — O outro tentou explicar — É um casamento, ele é seu esposo agora, e deveria dar um pouco mais de atenção a ele. Você é muito estranho, e por um momento cheguei a pensar que sequer se daria ao trabalho de consumar seu casamento, claro, diria isso se não o conhecesse tanto assim e não estivesse sentindo esse cheiro tão explícito. Não tomou banho?
O Kim cheirou a própria pele.
— O cheiro de ômegas virgens se impregna com força depois da primeira relação. — Chanyeol explicou — Imaginei que não soubesse disso, você nunca faz sexo com ômegas, muito menos com um que seja virgem. O tão honrado General Kim, acho engraçado que toda essa fama de alfa honrado se deva muito ao fato de que você fode com betas na maioria das vezes.
O Kim não iria deixar aquela conversa se prolongar mais, pois sabia se tratar de um dos assuntos favoritos de seu amigo. Park Chanyeol era uma pessoa alegre, sorria atoa e falava pelos cotovelos, o total oposto de seu melhor amigo, mas a vida havia os aproximado desde a infância e não os separou mais, de um modo que Chanyeol estava incluso em praticamente todos os seus planos mais importantes e confiava nele como não confiava em mais ninguém.
— Estive pensando em uma maneira melhor, mais segura. — Quando retornou para um assunto "antigo", o Park sabia exatamente do que ele estava falando — Vou usar meu casamento com o príncipe como uma ponte de ligação, mas ele não deve ser usado de maneira nenhuma, não quero que se machuque.
Chanyeol suspirou.
— É a família dele, vai se machucar de qualquer maneira. — O alfa de cabelos castanhos o respondeu, a verdade era que as coisas estavam se arrastando e ele não queria mais perder tempo. Jongin era calmo e calculista, enquanto Chanyeol sentia uma ânsia demasiada pela ação — E pode ser que ele também esteja...
— Ele não está envolvido em nada. — O cortou imediatamente — Kyungsoo é um ômega indefeso e incapaz de algo do tipo, ele ama o pai, ama o seu país e ama o povo, ele não faria nada de ruim para ninguém.
Jongin não costumava defender as pessoas assim e muito menos usar tantas palavras em uma frase só, o que já tornava aquilo um argumento válido de alguma maneira. Ômegas eram bem mais fáceis de serem lidos, além de serem considerados a casta mais inocente e frágil.
Claro que nem todos os julgamentos poderiam ser tão precisos e que todo mundo estava sujeito a cometer erros e traições.
— É, imagino que deva amar muito o país. — Chanyeol comentou com uma leve risadinha — Para ter se casado com você apenas para te "sossegar e satisfazer", ele deve gostar muito do povo, ou no mínimo ser um filho muito obediente.
O Kim revirou os olhos.
— Não fale como se eu fosse um monstro. — Quis se defender de algum modo, mas a forma como Kyungsoo o olhava a maior parte do tempo, parecia que era mais ou menos assim que seu esposo o via — Além disso, ele está bem.
— Ele te chama de senhor?
— Chama.
— Então tem medo de você. — O Park não sentia receio nenhum de ser bastante direto com Jongin — Sei que ser assim faz parte da sua personalidade e não vai mudar da noite pro dia, mas tente ser um pouco mais simpático com o príncipe, estar perto dele ou coisa do tipo.
Jongin não estava muito animado com a ideia de receber um sermão justamente da pessoa a quem mais reclamou coisas em toda a sua vida. Chanyeol sempre havia sido o imprudente e o errado, e agora agia como se fosse um verdadeiro monge e que soubesse exatamente como deixar um ômega feliz.
— O que sabe sobre casamentos?
— Meus pais eram casados. — Tocou naquele ponto porque sabia se tratar de algo delicado para o Kim — Vi de perto como é ter que conviver com um ômega e é muito diferente de apenas dar ordens, assim como muitos casamentos nesse país devem funcionar. O trate bem, Jongin, só isso.
Era fácil falar.
Era fácil apenas concordar com isso.
Mas a questão era que não sabia como ser "a pessoa doce" que Chanyeol passou a manhã inteira comentando e o fazendo falar sobre. Para ele, o fato de estar gastando seu tempo indo para casa ao meio-dia para ver Kyungsoo e lhe fazer companhia enquanto comia já significava muita coisa.
Ele era ocupado demais e descer minutos, talvez mais de uma hora, a apenas estar em casa com ele, já era mais do que as outras pessoas costumavam ter de si.
Quando chegou, encontrou o ômega muito distraído nos fundos da casa, ele estava andando pelo jardim e sentindo o cheiro das flores, além de estar com um sorriso enorme em seu rosto. Pensou em o chamar imediatamente, mas acabou dando a si mesmo a oportunidade de o observar. Queria analisar quem aquele rapaz era, entretanto, acabou notando coisas a mais.
Seu esposo era um ômega muito bonito. Seus longos cabelos brilhavam com a luz fraca do sol, seus olhos grandes eram chamativos e continham algo parecido com uma alegria sem motivo, como se momentaneamente lhe bastasse apenas a calmaria de estar no meio das flores e seu corpo era pequeno e cheio de curvas nas medidas certas.
Kyungsoo o excitava assim como poucos ômegas conseguiram fazer durante toda a sua vida.
— Kyungsoo.
O menor o olhou imediatamente e se sentiu um pouco envergonhado por não ter notado seu marido ali, por mais que sua presença fosse a mais marcante que já conheceu. Estava distraído com seus próprios pensamentos e construindo um mundo que ele sabia que só existiria dentro de sua cabeça.
Um mundo em que seu alfa chegaria em casa com um sorriso enorme e dizendo o quanto sentiu sua falta a manhã inteira. Claro que Jongin jamais faria isso, muito menos a parte de sorrir, pois se tratava de algo que nunca havia visto, e agora só sabia que ele tinha todos os dentes porque sentiu com a própria língua na noite passada.
Algo que o deixava com vergonha sempre que o olhava.
— Ah, meu marido, fico feliz que esteja de volta. — Foi o que disse assim que estava perto o suficiente — Eu já preparei sua comida e espero que goste, esqueci de perguntar se tem algo em específico que não coma ou que tenha alguma alergia.
— Não.
Jongin era um soldado, soldados comiam qualquer coisa e Kyungsoo sabia disso, ele só estava perguntando para parecer um esposo cuidado. Também sabia que futuramente teriam filhos, filhos estes que também seriam soldados e teria que os obrigar a seguir essa mesma dieta a vida toda, mesmo que eles também fossem ser príncipes e príncipes tivessem o privilégio de comerem apenas o que queriam.
Não seria esse lado da família que dominaria, certamente.
— Então, nós...
Mas Kyungsoo não conseguiu passar por ele, pois Jongin o segurou pela cintura e barrou seus passos. O ômega usava um hanfu azul celeste de tecido muito delicado e também fino, de modo que conseguia sentir todo o calor do Kim em sua pele. Se virou para olhar seu rosto, e ele o encarava da mesma maneira que o olhou na noite passada.
Enquanto aquilo acontecia.
— O que foi?
— Posso tocar em você?
Demorou alguns segundos, mas Kyungsoo balançou a cabeça afirmando que podia, e o pequeno espaço de tempo que Jongin precisou para chegar até seus lábios haviam sido mais do que suficientes para que o ômega sentisse seu estômago borbulhar.
Não em que momento exatamente havia passado a ter aqueles sentimentos, mas desejou que Jongin o beijasse assim todas as vezes que voltasse para casa. Não havia sido preciso muitos dias junto dele para se dar conta de que sentir sua língua dentro da boca era uma coisa da qual gostava e se sentia quente quando o alfa o apertava pela cintura do mesmo modo que estava apertando agora.
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