18. Constelações
14h18
07 de novembro
Gotham City
JENNI REED
"Eles simbolizam uma bússola, significa que, não importa quão longe eu esteja, sempre acharei meu caminho de volta para casa."
Essas palavras do meu pai ecoavam na minha cabeça sempre que eu batia os olhos na tatuagem do pequeno pássaro azul no meu antebraço.
É um lembrete sutil de que voltarei para casa, por mais distante que isso possa parecer no momento.
Hoje faz exato um mês que estou em Gotham.
Nem nos meus sonhos mais desconexos eu imaginaria estar aqui.
E, olhando para trás, aconteceu tanta coisa nesses últimos 30 dias que eu estava com a sensação de serem muito mais. Meu irmão estava certo sobre o treinamento intensivo que recebi, pois, essa cidade não é para iniciantes mesmo.
Na última semana, me perguntei umas 468 vezes se fiz certo em ser uma empresária, porque tive que lidar com tanta papelada e tanta burocracia chata que já quis tacar fogo em qualquer coisa que envolvesse a Troffle.
Falta pouco para que eu tome posse oficialmente. Alguns acessos já deveriam ter sido liberados, mas como a empresa está sob investigação, acabou atrasando um pouco.
Para a minha sorte, Dick está liderando o caso, então fica muito mais fácil ter que responder assuntos burocráticos com uma pessoa que solta piadas e cantadas baratas a cada 3 frases.
Eu imaginava que ele fosse muito mais sério, mas desde quando fomos na pizzaria perto de Haven aquela noite, a minha imagem sobre ele mudou um pouco. Só que para melhor, se é que isso é possível.
Já assumi para mim mesma que tive uma queda instantânea por ele. E acho que tudo bem, é normal se sentir atraída por alguém logo de cara. O que não quer dizer que isso vá nos levar a alguma coisa, até porque eu definitivamente não posso me envolver com ninguém daqui. Então, estava levando esse nosso flerte – não sei se poderia chamar assim – numa brincadeira. E, com certeza, ele também.
Mas, sinceramente, a quem eu estava tentando enganar?
Meu Deus, Jenni. Se contenha.
Primeiro, porque tenho uma missão muito maior do que eu possa controlar. Segundo, se tudo der certo e eu não morrer durante o processo, preciso voltar para o meu universo. E terceiro, eu não poderia falar para Dick que não sou daqui. Ele falaria para o Batman, que falaria para o Superman, que falaria para a Mulher-Maravilha, que falaria para toda a Liga da Justiça, iam achar que eu era uma ameaça, forças governamentais e secretas viriam atrás de mim, e tudo iria por água abaixo.
Então, vou me privar das minhas próprias vontades.
Mas o que também não me impede de rir das coisas aleatórias que ele fala, das centenas de mensagens de textos que a gente vem trocando durante a última semana, da tentativa dele de me converter em uma swiftie e principalmente, a mais difícil de todas, de tentar não suspirar fundo quando ele manda um "só para saber se está tudo bem e ninguém tentou te matar nas últimas horas".
Droga. Isso vai ser difícil. Eu preciso me controlar.
E não ficar mapeando seu rosto lindo demais, como fiz hoje de manhã, quando entreguei os documentos que ele havia me pedido na intimação uns dias atrás. Era para ter sido só uma ida a delegacia, não ter durado nem 15 minutos. Mas ele teve que me chamar para tomar um café e ficarmos falando sobre as investigações dos Harpias. E sobre Blüdhaven. E sobre como ele ficou fofo tentando desviar do assunto quando eu mencionei Bruce Wayne e Batman na mesma frase. Nem vimos a hora quando emendamos o café num almoço. E continuamos a falar sobre Gotham, sobre os ensaios de Haven, sobre a vida e sobre de tudo um pouco.
É. Quando disse "difícil", acho que eu estava sendo legal demais comigo mesma. Vai ser quase impossível, isso sim.
Mas, agora, preciso me concentrar para, finalmente, colocar a mão na massa na busca dos códigos.
Olívia me disse que mais tarde eu conseguiria conhecer parte da equipe que vai nos ajudar na missão. Tínhamos uma reunião marcada nos Laboratórios S.T.A.R no fim do dia e ela arranjou uma desculpa, caso alguém de fora perguntasse, que seria sobre o auxílio que os Laboratórios dariam para retorno da Troffle, mas não era bem isso, exatamente.
Depois do almoço com o Dick, voltei para o meu apartamento e fui direto para a Sala Operacional para repassar algumas das instruções que meus pais deixaram para a busca dos códigos.
Separei algumas coisas para conversar com Olívia e a equipe e como poderíamos iniciar essa procura. Peguei os 3 dispositivos que, quase perdi a vida tentando encontrá-los, e que agora o objeto era apenas um. As 3 peças encaixadas formavam uma espécie de controle com visores na superfície e, pelas instruções dos meus pais, serviam para escanear os códigos encontrados.
Esses códigos estavam presentes em um mapa digital em pontos aleatórios pelas cidades de Gotham e Blüdhaven. Sendo 27 aqui e 10 na cidade vizinha. Contudo, essas localizações também estavam codificadas e, eu precisaria de ajuda da equipe da Olívia para decodificar o mapa da localização dos códigos.
Haja esconde-esconde. E haja tanto código!
Quando o fizéssemos, conseguiríamos conectar os mapas digitais no dispositivo e ele rastrearia a rota exata até eles. Poderiam estar em museus, parques, lojas e até supermercados. Levantamos todas as possibilidades.
Estava prestes a fechar o computador e ir me arrumar quando percebi que tinha esquecido de copiar alguns arquivos da pasta "Códigos", até que vi um vídeo que eu não me lembrava de ter assistido antes. Eram tantos que, provavelmente, devo ter deixado passar um ou outro.
Coloco para reproduzir e vejo a habitual gravação dos meus pais sentados no sofá no apartamento em que estou. Minha mãe começa a dar as instruções dessa vez e aumento o volume quando ela menciona as palavras "O primeiro código".
"Encontrar o primeiro código está mais fácil do que você imagina. Deixamos esse como uma demonstração para você testar as usabilidades do dispositivo que os rastreia."
No vídeo, ela levanta a mão com exatamente o mesmo dispositivo que estou segurando nesse momento.
"Ao fundo da Sala Operacional, há uma porta oculta que é destravada quando você passa com o dispositivo ligado sobre ela. A porta abrirá automaticamente após alguns segundos e você verá um amplo cômodo que pode servir para o que você quiser. Deixamos como costumávamos usar, que era mais um espaço para treinos físicos, mas sinta-se à vontade para modificar como desejar.
Assim que abrir, você facilmente encontrará o código, pois ele está em um lugar onde sempre imaginamos te ver. Sei que esse seu sonho ficou para trás, mas também sei que você o guardou com carinho no coração."
Sigo rapidamente para o fundo da sala, como ela instruiu e ligo o dispositivo. Passo sobre a parede tão rápido que não tenho certeza se funcionou. Repito o movimento e, no meio do caminho, ouço o som de uma porta destravar.
"Jenni, sabemos que é uma missão urgente e de alto risco, mas não se esqueça de se cuidar. Tente tirar um momento para você sempre que for possível. Esperamos que esse espaço te ajude a desacelerar quando for preciso."
E então, a voz da minha mãe para de ecoar pelos altos falantes. O vídeo acabou. A porta do novo cômodo se abriu completamente. E o meu queixo cai.
As luzes no teto e na parte superior das paredes começam a acender. Mas não são luzes quaisquer. São estrelas. Centenas, talvez milhares delas. Constelações.
O cômodo era todo preto, seria uma escuridão total se não fosse pelos micros pontinhos brancos que formavam estrelas do universo acima de mim e iluminavam todo o lugar. Era lindo.
Assim que entro complemente no espaço, percebo quão grande era. Praticamente um outro apartamento. Enorme. Como se o que eu estava morando já não fosse grande o suficiente.
Havia móveis cobertos por panos e a minha direita tinham aparelhos de academia, bonecos de luta e alguns outros acessórios. Ao fundo, vi poltronas grandes e uma espécie de telão com um projetor que ficava no teto. Parecia um... cinema dentro de casa?
Fico incrédula com o espaço e me dou conta do porquê nunca ter visto o meu vizinho do apartamento da frente. Porque eu não tenho um vizinho. O andar é todo meu.
Balanço a cabeça e me pergunto se era isso que meus pais faziam quando não estavam em casa. Estavam em outro universo decorando um apartamento para a filha morar no futuro durante uma missão mortal.
"Adoraríamos vê-la conosco descobrindo estrelas por aí..." A voz da minha mãe veio à minha mente como uma lembrança.
Passo os meus olhos pelo teto artificialmente estrelado e logo percebo o que ela quis dizer sobre eu facilmente encontrar o código.
Estava bem no meio da constelação de Capricórnio, e que irônicamente é o meu signo.
No centro do triângulo achatado que as estrelas formavam, havia os seguintes números: 0147380. Passo o dispositivo sobre eles e rapidamente aparece a mensagem: CÓDIGO 01 ENCONTRADO. Em seguida, outra mensagem: FÓRMULA ENVIADA PARA O SERVIDOR CENTRAL.
Saio daquele espaço estrelado imediatamente, vou em direção ao computador principal na Sala Operacional e abro o servidor. Uma área chamada "CÓDIGO HOUDINI" apareceu automaticamente, e antes não víamos essa parte. Clico em cima e uma fórmula matemática aparece. Era uma equação para ser resolvida.
Então era isso que os códigos faziam. Eles escondem equações que precisam ser resolvidas para chegarmos em um resultado. E são 37 resultados que, no fim, serão 1 só. O código fonte que Bruno tanto me falou.
Agora, precisarei da ajuda de cientistas de verdade para resolver a equação desse primeiro código. Bom, teremos mesmo muita coisa para falar na reunião de hoje.
Uma pequena empolgação surge no meu peito e abro um sorriso. Foi o primeiro deles. Tudo bem que ainda faltam 36, mas o primeiro passo já foi dado. A missão finalmente começou. Vai dar certo. Meu mundo vai ser salvo. Eu vou voltar para casa.
★
18h02
Laboratórios S.T.A.R. de Gotham City
— ...e eles vão conseguir te ajudar com isso. Mas era de se esperar que seria algo assim. — Olívia dizia alguma coisa sobre a equação que encontrei por detrás do primeiro código.
Estávamos andando pelos corredores dos Laboratórios S.T.A.R. e pareciam infinitos. Aproveitei para atualizá-la sobre a minha primeira descoberta.
Primeiro, ela me deu uma bronca, como sempre. Depois, quando expliquei que o código estava no meu apartamento, ela se acalmou e suspirou de alívio por, dessa vez, não envolver explosões, nem criminosos e muito menos voar até uma ponte.
Olívia parecia tão empolgada quanto eu, apesar de ter reclamado umas 5 vezes de que tinha trabalhado demais essa semana e que não via a hora de focar apenas na missão comigo pela Troffle. Ela já estava repetindo informações que eu já sabia quando fui distraída por uma mensagem de Dick.
Tento conter o riso, mas obviamente falhei.
— O que foi? — Olívia questiona e me olha com um certo olhar de julgamento. Ela também parecia cansada.
— Nada, só lembrei de uma coisa aleatória. — Guardo o celular no bolso da jaqueta.
— Engraçado. Esse seu "nada" vem te fazendo sorrir igual uma boba a semana inteira quando você olha o celular. — Ela diz enquanto entramos no departamento de ciências tecnológicas.
Sinto meu rosto corar e tento disfarçar mudando de assunto.
— Você deve estar imaginando coisas. Então, você disse que as equações possuem um resultado certo, mas precisam fazer cálculos das variáveis...
Estávamos chegando em sua sala, mas Olívia para no corredor e me encara com as mãos na cintura.
— Jenni, você não pode contar a ele. — Seus olhos pretos me fitavam com firmeza.
Eu sei exatamente do que ela está falando, mas me faço de desentendida. Tem tanta gente sonsa nesse mundo se dando bem, por que eu não poderia usar desse artifício também?
— Como você sabe que é um "ele"?
Ela revira os olhos e respira fundo.
— Não apenas sei que é um ele, como sei quem é ele, o seu nome, o sobrenome e até mesmo o codinome. — Olívia endireita a postura para combinar com sua expressão séria.
Exalo um suspiro e meus ombros cedem.
— Eu sei. Faz parte das regras, eu não vou falar. — Digo em um tom firme.
— Olha, eu não tenho nada a ver com quem você fica ou deixa de ficar aqui, mas...
— A gente não tem nada. — A interrompo.
Olívia arqueia uma das sobrancelhas claramente não acreditando no que eu disse.
— Que seja. Independente da pessoa, tente separar as coisas. — Ela olha rapidamente a porta de sua sala e volta a me encarar. — É claro que pode sair e ficar com quem quiser, mas lembre-se de que você está em missão. E que precisa voltar para casa.
Apenas assinto e meus lábios comprimem involuntariamente.
Parece até que ela leu os pensamentos que venho dizendo a mim mesma nos últimos dias. Acho que eu só precisava ouvi-los em alto e bom som.
Olívia volta a se dirigir para a porta da sala e eu a sigo. Até que ela para novamente antes de abri-la.
— Agora, sobre a reunião, ainda faltam 2 pessoas chegarem. — Ela semicerra os olhos e massageia a têmpora, como se estivesse lembrando de suas anotações mentais. — Como eu disse, teremos uma equipe reduzida nesse começo, mas serão de grande ajuda.
— Certo. Não se preocupe, tenho certeza de que serão. Você disse que tinha uma equipe de 13 pessoas, é isso?
— Sim, hoje teremos apenas 5 e... Ai, meu Deus! — Agora uma de suas mãos foi parar na testa e sua expressão parece preocupada. — Eu quase me esqueci, foi uma correria tão grande de ontem para hoje, mas um dos meus cientistas foi realocado em outra missão e eu...
A porta da sala de Olívia se abre no mesmo instante e ela se afasta um pouco para trás.
E eu pisco uma. Duas. Três vezes para ter certeza do que estou vendo. Da pessoa que estou vendo quando a porta se abre por completo.
— Jenni? — A sua voz continuava a mesma, só que mais grave. Mais forte.
Inconfundível.
Inacreditável.
Engulo em seco e de repente, parece que uma escuridão toma conta dos meus olhos e a única coisa que vejo é o seu rosto sereno me encarando com um sorriso leve.
— Timothy? — É tudo o que a minha voz falha consegue dizer.
Sim. Timothy. Um dos meus melhores amigos da infância. Desde que tínhamos 10 anos. Que se tornou o meu namorado quando fomos estudar na faculdade de física – que eu larguei depois para cursar música. E que o nosso relacionamento não durou nem um ano porque éramos pessoas emocionalmente complicadas demais para fazer dar certo. O único cara que eu realmente amei. Bem aqui. Na minha frente.
Os cabelos encaracolados.
Os olhos cor de mel.
Ele cresceu?
Calma.
O que ele está fazendo aqui? Como isso é possível? Como?
Puta que pariu!
— Bom, é... — a voz de Olívia soava distante para mim — era isso que eu tinha para te dizer...
Sim. Eu acho que vou desmaiar. Não. Eu tenho certeza.
Eu vou desmaiar.
BLOQUINHO DE NOTAS:
A Jenni menciona esse querido no capítulo 3. Só dando uma lembradinha mesmo, porque faz um tempinho kkkkkk
Essa semana vai ser um pouco diferente, tenho dois capítulos para postar antes do que sai no próximo domingo. Postarei entre terça e sexta.
Quis adiantar porque está chegando em uma das minhas partes favoritas da história hehehe.
É isso, obrigada por acompanherem, vcs são tudoooo 🥹
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