04. Bem-vinda à DCC
17h59
07 de outubro
Gotham City
JENNI REED
Eu estava com dificuldade para abrir os olhos. A sensação que tinha era de que estava prestes a acordar de uma ressaca pesada. Não lembrava de ter bebido ontem à noite.
E para piorar, eu estava no chão, meu corpo todo tremia. Uma forte náusea fervia dentro de mim.
Um dos meus olhos se abriu, mas a minha visão estava completamente embaçada. Os apertei com força tentando acordar de vez e me levantar daquele chão frio. Minha visão ainda estava turva quando, dessa vez, abri ambos os olhos. Minhas pernas doíam e meus braços pareciam não ter forças suficientes para aguentar o peso do meu corpo.
Me deitei de costas e respirei fundo. A náusea ainda alertando um possível vômito que poderia estar próximo de sair.
Não sei quantos minutos se passaram nessa tortura, e a única razão lógica que se passava na minha cabeça para eu me encontrar naquele estado era de que tinha consumido alguma substância na noite anterior, ou fui drogada, ou fui sequestrada.
Passei as mãos rapidamente pelo meu corpo, buscando algum sinal de ferimento, mas não senti nada. Estava vestida com uma camiseta e, o que parecia, uma calça cargo com um cinto.
Vi um borrado fecho de luz sair pela persiana da janela do cômodo em que eu estava e logo juntei todas as forças que tinha para me levantar e entender o que tinha acontecido comigo.
Apoiei na parede mais próxima, pois minhas pernas ameaçavam me jogar de volta ao chão. Aos poucos, comecei a enxergar com mais nitidez e vi que estava em um cômodo com paredes pretas e grandes janelas de vidro no canto direito que iam do teto ao chão, grande parte das divisórias estavam cobertas com persianas. O pé direito era alto e fiquei me perguntando que lugar era aquele.
Atrás de mim tinha uma máquina de cor cinza escuro que parecia uma... cápsula humana? Meu Deus, onde eu estava? Por que eu não conseguia lembrar?
No chão, um pouco mais a frente da máquina, havia um capacete preto, um macacão, também preto, que parecia de um astronauta, duas luvas e uma outra peça de roupa fina que meu cérebro não conseguiu identificar rapidamente.
O que estava acontecendo? Quem me trouxe aqui?
Minha dor física começou a dar lugar ao desespero. Vi que a porta estava entre aberta e saí o mais rápido possível daquele lugar.
Alguém poderia estar do lado de fora, mas não consegui raciocinar antes para tentar me proteger. Passei por um corredor e vi outras duas portas fechadas, mas não me dei o risco de tentar abri-las. Eu só precisava sair dali, ligar para algum conhecido e pedir socorro.
Assim que saí do corredor, avistei uma sala ampla. Um sofá marrom escuro a minha esquerda com uma grande TV na parede. Assim como o outro cômodo misterioso, a parede inteira ao lado do sofá possuía janelas que também iam do teto ao chão. Eu estava no apartamento de alguém. Mas de quem?
A minha direita, vi um balcão preto extenso com um fogão de indução, alguns utensílios de cozinha devidamente organizados. Parecia uma cozinha americana planejada, haviam 6 banquetas que se encontravam do outro lado. Na parte final do canto direito do cômodo, tinham 3 poltronas e 2 puffs, também na cor marrom. A parede de janelas enormes também estava presente desse lado. Quem quer que seja o dono, não tinha muita criatividade para decoração.
Caminhei devagar até as janelas da parte direita da sala e olhando para os lados para ver se alguém aparecia. Identifiquei a porta de saída bem no meio do caminho, já preparando a minha fuga.
Quando cheguei próximo as janelas, olhei por debaixo das persianas e percebi quão alto era aquele apartamento.
Conseguia ver inúmeros edifícios espelhados e modernos em um horizonte próximo. O sol estava terminando de se pôr e o céu se mesclava em um tom alaranjado com rosa. No meu campo de visão esquerdo, avistei uma baía e alguns cargueiros ancorados ao longe.
Definitivamente, eu não estava em Los Angeles. Essa cidade parecia... Nova York? Talvez Chicago? Não tinha certeza. A única coisa que eu certamente precisava fazer, era sair correndo daquele apartamento.
A náusea começou a voltar e senti uma forte tontura, mas não tinha tempo para aquilo. Eu vomitaria na rua. Com certeza seria mais seguro que aquele lugar.
Fui para a porta de saída e, depois que a fechei, vi apenas outra porta, que deveria ser do apartamento vizinho, mas não tinha numeração. Olhei acima da que eu tinha acabado de fechar e possuía o número 28-A. Vigésimo oitavo andar?! Eu tinha planos para descer pela escada de emergência, mas não sei se meu corpo aguentaria 28 andares de escada.
Comecei a apertar rapidamente o botão do elevador, com medo do meu sequestrador sair pela porta do apartamento a qualquer momento. Não demorou muito até chegar e me joguei contra o espelho olhando para o teto enquanto a porta se fechava sozinha. Apertei o 00 e respirei fundo. Eu estava no último andar.
Em questão de segundos, já me encontrava no térreo, mas tive que equilibrar enquanto caminhava até a portaria, pois o enjoo ainda me acompanhava. Pensei se não seria melhor avisar o porteiro de que não sabia onde estava, e que o dono do apartamento 28-A tinha me levado a força até lá. Mas seria melhor eu conversar com algum conhecido primeiro.
Levei as minhas mãos até os bolsos laterais da calça e estavam vazios. O mesmo para os bolsos da parte de trás.
Puta merda. Tinha perdido o celular ou deixado no apartamento. Eu não voltaria para lá, o dono já poderia ter percebido a minha escapada.
Me aproximei da guarita da portaria e vi um homem de meia idade no interior mexendo nos canais de um rádio antigo.
— Com licença. — Bati na porta, mas não tinha certeza se ele havia me escutado, minha voz parecia abafada até para mim. Bati mais uma vez.
— Pois não? Em que posso ajudá-la? — Ele logo abriu a porta e se ajeitou na cadeira em que estava sentado.
— Eu... É... Eu posso usar seu celular por um minuto? Acabei de perder o meu, prometo ser rápida.
O homem grisalho deve ter percebido minha cara de sofrimento ou desespero, pois no mesmo segundo, tirou o aparelho de seu bolso, o desbloqueou e me entregou.
— Claro, sem problemas.
— Obrigada. — Lancei um sorriso fraco o agradecendo.
Digitei o número de Pixie numa velocidade tão rápida que precisei checar se o número estava correto. Levo o celular até a orelha e não demorou mais que 3 segundos para que eu pudesse ouvir a mensagem "Desculpe, não foi possível completar a sua ligação. Verifique o número e ligue novamente."
Sabia que tinha digitado errado. Minhas mãos tremiam. Tentei mais uma vez, mas escutei a mesma mensagem. Verifiquei a rede do celular do porteiro e estava com um bom sinal. Será que eu tinha esquecido o número da minha melhor amiga? Só havia outro número que sabia de cor desde sempre. Não queria incomodá-lo, mas não via outra saída.
Terminei de digitar o número de Bruno torcendo para que ele pudesse atender, mas para meu desespero, ouvi a mesma mensagem automática. Conferi número por número na tela do celular e repeti baixinho comigo mesma cada um. Estavam certos. Por que eu não conseguia completar nenhuma daquelas ligações? Onde eu estava?
Senti minhas mãos suarem e minha respiração começou a falhar.
Devolvi o aparelho celular ao porteiro que prontamente abriu os portões para que pudesse sair. Acredito tê-lo escutado perguntando se a ligação deu certo, mas eu não tinha fôlego para respondê-lo.
Estava na calçada daquele edifício que parecia um condomínio de luxo e comecei a andar pela rua tentando reconhecer em que cidade eu estava. Só depois de alguns minutos percebi que fazia frio e ventava um ar seco. Me encolhi cruzando os braços contra o peito.
Quando cheguei no cruzamento ao fim da rua, vi uma viatura de polícia parada no farol aguardando o semáforo ficar verde. A vontade que tinha era de ir até eles e denunciar o que estava acontecendo comigo. Talvez pudessem contatar minha amiga ou meu irmão.
O sinal abriu e vi a viatura avançar pelo cruzamento, até que meus olhos pararam na estampa do carro e, como se eu tivesse levado um choque de alta intensidade, li o que estava escrito: GOTHAM P.D.
Instantaneamente, uma onda de calor capaz de dissipar o frio do quarteirão inteiro tomou conta do meu corpo. Percebi o sangue subindo pelo meu pescoço a ponto de sentir o gosto em minha boca.
As memórias começaram a voltar como flashes. Parecia que a minha mente estava passando por uma forte tempestade, e a cada segundo, um raio atingia o meu cérebro.
Avistei uma banca de jornal do outro lado da rua e atravessei o cruzamento correndo, ouvindo algumas buzinas e gritos de reclamação pela minha imprudência.
Na parte da frente da banca, havia uma placa escrito FIQUE EM DIA COM GOTHAM – BANCA DOS SYLVER. Acho que a garota que estava focada na tela de seu celular, atrás do balcão, deveria ser uma Sylver, mas ela pareceu não notar a minha presença. Ela não aparentava ter mais de 20 anos de idade.
Na primeira prateleira estavam as edições do dia do jornal The Gotham Times. A primeira coisa que conferi foi a data, ainda era o mesmo dia que eu tinha deixado Washington D.C., no meu mundo.
A primeira manchete do jornal destacava a falência de uma empresa de tecnologia.
— A edição do dia está 1,50 dólares. — Disse a garota Sylver sem tirar os olhos do celular e interrompendo a minha leitura.
— Hum... não vou levar. Obrigada.
A garota não olhou para mim e tampouco respondeu.
Voltei a caminhar pela rua prestando atenção à minha volta. Era horário de pico. O trânsito começou a aumentar e o fluxo de pessoas nas ruas também.
Esperei o farol do cruzamento abrir e atravessei de volta para a calçada do edifício que havia saído há alguns minutos.
Meus pensamentos ainda estavam a 500 quilômetros por hora, mas me sentia mais calma com a memória voltando.
Eu cheguei em Gotham. A missão. É tudo real.
A voz de Bruno veio em minha cabeça como se ele estivesse falando comigo naquele momento para que eu pudesse lembrar. "Assim que chegar, você pode perder a sua memória por um breve momento, pode levar somente algumas horas ou talvez dias. Não se preocupe, em no máximo dois ou três dias você volta ao normal." Ele me disse em um dos treinamentos de instruções que tivemos no último ano. "Náuseas, tonturas e enxaquecas também podem ser perceptíveis."
É claro. Eu estava sentindo tudo aquilo ao mesmo tempo quando passei em frente ao prédio novamente, e lembrando de que o apartamento em que eu estava, deveria ser o meu enquanto estivesse aqui. Em uma das instruções dizia que a cápsula chegaria no universo de destino em um local previamente mapeado e preparado para receber o viajante.
Alguém preparou aquele apartamento cafona para mim.
Passei pela entrada novamente, mas percebi que o porteiro havia mudado. Provavelmente era troca de turno. O que estava agora era ligeiramente mais jovem que o anterior, ele usava óculos e tinha um bigode espesso em seu rosto.
— Senhorita, poderia se identificar, por favor? — O novo porteiro chamou.
— Jennifer Reed, apartamento 28-A. Sou nova aqui.
— Ah, claro! Senhorita Reed. Seja bem-vinda. A senhorita Lynn avisou que você chegaria hoje no período da noite. Desculpe pedir a identificação. Protocolos, sabe como é.
Senhorita Lynn. Caroline Lynn. Fui instruída a procurá-la assim que chegasse, mas ela já estava aguardando por mim. Fiquei me perguntado se ela morava naquele apartamento.
— Não se preocupe, senhor... — Falei tentando ler o nome bordado em seu uniforme.
— Ford. Saimon Ford, mas todo mundo aqui me chama só de Ford. — Ele respondeu ao perceber que eu tentava ler seu nome.
Assenti e segui andando pela portaria em direção ao hall de entrada.
— Ah, senhorita Reed — Ford veio em minha direção segurando um envelope preto, como se tivesse esquecido de me entregar antes – Já ia me esquecendo, a senhorita Lynn deixou isso para você. Disse que são as instruções do apartamento. E qualquer dúvida que tiver sobre o condomínio ou sobre o bairro, é só me chamar. Mais uma vez, seja bem-vinda.
— Obrigada. E pode me chamar de Jenni. — Sorri de volta e continuei o caminho até o elevador.
Enquanto subia até o 28º andar, olhei para o envelope em minhas mãos. Não parecia ser uma carta ou um guia do imóvel, pois pesava mais que isso.
Em breves segundos, a porta do elevador se abriu e andei até a porta do... meu apartamento.
Que estranho pensar que há poucas horas eu estava em outro universo, com Bruno, com o time da NASA. E agora estou aqui, encarando a entrada da minha nova casa. Parecia que ao abrir a porta, eu oficializaria tudo aquilo, começaria uma nova vida. Uma vida que eu precisava manter para salvar muitas outras.
Coloquei a palma da mão direita na maçaneta e, no mesmo instante, ela liberou uma ligeira luz prateada e a ouvi destravar. A porta se abriu com o meu simples toque? Essa é nova.
Assim que entrei, me certifiquei de que não havia ninguém naquele lugar além de mim. Abri as portas que passei pelo corretor anteriormente e, um dos cômodos era um banheiro e o outro era um quarto com uma cama, armários e escrivaninha, também possuía as típicas janelas enormes daquele apartamento.
— Praticamente uma casa de vidro. Não sei se gosto disso. — Disse para mim mesma em voz alta.
Sentei-me na beirada da cama e abri o envelope que ainda estava em minhas mãos.
Era uma caixa e dentro dela havia um celular, um dispositivo que eu não consegui reconhecer, mas me lembrou um game boy – certamente não era isso, por razões óbvias – uma chave vermelha, um cartão de crédito e... uma carta.
No envelope da mesma, tinha o pássaro azul que meu pai desenhava para mim em seus recados.
Senti meu coração começar a acelerar e quando a abri, reconheci a letra da minha mãe. Realmente eles pensaram em tudo, em cada minucioso detalhe para que aquele plano desse certo.
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