Capítulo Dezenove
Theodoro Vinro:
Saímos do templo com o coração ainda pulsando pela adrenalina do combate. Simon estava montado em seu cavalo, que parecia inquieto, enquanto Fred, em sua forma majestosa de lobo, se ofereceu para que eu montasse em suas costas. Senti um misto de nervosismo e admiração ao subir em sua pelagem espessa. Fred era imenso, suas costas eram firmes e seguras, mas ainda assim, montar em um lobo desse porte era algo que desafiava qualquer sensação de segurança.
Seguíamos em direção ao local onde Madara nos aguardava, com a floresta se fechando ao nosso redor, cada árvore parecendo uma sentinela silenciosa. O silêncio era quebrado apenas pelo som dos cascos do cavalo de Simon e o leve farfalhar das folhas sob as patas de Fred.
De repente, o cavalo de Simon relinchou, seus olhos arregalados de medo, e Fred, instantaneamente em alerta, começou a correr. A floresta que antes parecia tranquila agora se transformava em um labirinto ameaçador, cada sombra parecia esconder um perigo iminente.
— Segure firme! — Simon gritou para mim, sua voz carregada de preocupação.
Eu me agarrei aos pelos de Fred com toda a minha força, meus dedos afundando na espessa pelagem, tentando encontrar algum controle em meio ao caos.
— É mais fácil dizer do que fazer! — respondi, minha voz saindo em um grito, abafada pelo vento que cortava meu rosto.
Montar em um lobo gigante não era nada como eu havia imaginado. Não havia sela, rédeas, ou qualquer controle. Fred era uma força da natureza, e eu estava à mercê dele e da situação. Cada salto e desvio era um teste à minha coragem, o medo apertando meu peito a cada instante.
Enquanto a floresta passava rapidamente ao nosso redor, com troncos borrados e galhos que pareciam mãos tentando nos agarrar, eu percebia que essa era, sem dúvida, uma das experiências mais aterrorizantes da minha vida. O desconhecido nos perseguia, e tudo o que podíamos fazer era correr, esperando que Fred nos levasse para a segurança antes que fosse tarde demais.
As árvores passavam rapidamente como vultos indistintos, as sombras se fundindo umas nas outras enquanto os ramos chicoteavam meu rosto e braços, deixando rastros de dor ardente. Minhas pernas latejavam ao agarrar as laterais do cavalo com meus joelhos, a tensão transformando cada músculo em puro fogo. Meus dedos estavam fechados em torno da pelagem de Fred em um aperto desesperado, mas, mesmo assim, escorregava a cada curva, a cada desvio brusco que ele fazia para nos manter em movimento.
O vento rugia em meus ouvidos, um grito constante e implacável, mas, sobre esse som ensurdecedor, eu podia ouvir os gritos alucinantes de quem nos perseguia. Eles estavam perigosamente próximos, tão perto que parecia que a qualquer momento sentiriam o cheiro do nosso medo. Eu não ousava olhar para trás; o terror de ver o que nos caçava era demais para suportar. O tempo se distorcia, perdendo todo o significado. Fred e o cavalo não diminuíam o ritmo, suas patas batendo no chão com força incessante, mas eu podia sentir o cansaço se acumulando em seus corpos. O suor escurecia a pelagem de ambos, tornando a montaria ainda mais escorregadia, cada movimento mais assustador do que o anterior.
Minhas pernas estavam entorpecidas, como se não fossem mais parte de mim, e minhas mãos, agora insensíveis, mal conseguiam manter o aperto. Eu era uma massa de tensão e pavor, movida apenas pelo instinto de sobrevivência.
E então, do nada, uma criatura negra e colossal surgiu dos arbustos à nossa direita, atirando-se sobre o cavalo com uma ferocidade primitiva. Suas mandíbulas estalaram com um som que fez meu sangue gelar. Era um cão de caça, mas não como qualquer outro que eu já havia visto. Era maior, muito maior, com olhos de fogo que queimavam com a escuridão da noite. O cavalo saltou para o lado, tentando desesperadamente evitar as presas da criatura, e por pouco não lançou Simon ao chão. Como que gritando de dor e medo, o cavalo bateu com uma das patas dianteiras, acertando o cão no peito e lançando-o para longe com um uivo agudo que rasgou o ar.
Mas não havia tempo para alívio. Os arbustos ao redor explodiram, revelando outros cinco cães monstruosos, seus corpos deformados e sedentos por sangue, caindo em nosso caminho como predadores sombrios. Eles nos cercaram rapidamente, rosnando com uma fúria quase demoníaca, mordendo as patas do cavalo e recuando apenas quando ele os chutava com força.
Fred, sentindo a iminência do perigo, uivou ferozmente, seu som ecoando pela floresta como um desafio. Meu coração disparou, e sem pensar, alcancei minha mochila, meus dedos tremendo enquanto pegava o livro que escondia ali. Ao abri-lo, as páginas brilharam com uma luz intensa, e eu gritei, minha voz carregada de desespero e determinação.
— Espírito da terra!
O chão sob nós começou a tremer violentamente, e raízes espessas e retorcidas irromperam do solo, como serpentes famintas, em direção aos cães. As criaturas uivaram, tentando escapar das raízes que as envolviam, mas o poder do espírito era implacável, e a terra, sob meu comando, não deixaria que fugissem facilmente.
Os cães saltaram, suas mandíbulas enormes estalando perigosamente a centímetros dos meus pés. Eu mal conseguia acreditar na rapidez com que se moviam, a selvageria estampada em seus olhos ardentes. Meu coração disparava no peito, cada batida ecoando como um tambor de guerra. Então, por entre as sombras das árvores, eu o vi—a figura esquálida e imponente sobre um cavalo negro, um contraste sinistro contra a escuridão da floresta. O cavaleiro se movia com precisão calculada, e meu sangue gelou quando ele levantou um grande arco, uma flecha com uma ponta brilhante já preparada.
O alvo não era outro senão Fred.
— Fred! — gemi, o desespero sufocando minha voz. Eu sabia que era tarde demais para um aviso. — Tenha cuidado!
O livro em minhas mãos brilhou intensamente, como se reconhecesse o perigo iminente. Senti as folhas das árvores ao redor sussurrarem, como cúmplices silenciosos. Então, com um estalo seco, um grande galho se soltou de uma árvore acima e caiu, atingindo o cavaleiro bem no braço no exato momento em que ele soltava a corda. O silvo da flecha cortou o ar, passando assustadoramente perto da minha cabeça antes de se cravar em um pinheiro. Uma teia venenosa se espalhou rapidamente pelo tronco, deixando uma marca negra e envenenada onde a flecha acertara.
Fred, com seus reflexos aguçados, virou rapidamente a cabeça em direção à ameaça, seu olhar fixo no caçador. O inimigo, porém, não se intimidou. Já com outra flecha na corda, ele se preparava para disparar novamente. Com um relincho estridente, Fred saltou sobre os cães, suas patas imensas flutuando no ar por um momento que pareceu eterno. O cavalo de Simon empinou ao mesmo tempo, tentando evitar os dentes ferozes dos cães que se contorciam no chão.
Quando finalmente aterrissamos, o chão pareceu estremecer com o impacto, mas não houve tempo para descansar. Fugimos com toda a velocidade que Fred e o cavalo de Simon podiam reunir, deixando para trás o caos das bestas furiosas.
Mas os cães não desistiram tão facilmente. Ladros furiosos e dentes afiando o ar atrás de nós, senti a ameaça constante em nossos calcanhares. De repente, outra flecha passou com um silvo mortal ao meu lado, e ao olhar para trás, vi o cavaleiro sombrio ainda nos perseguindo através das árvores, pronto para disparar novamente.
Fred, percebendo o perigo, mudou abruptamente de direção, quase me lançando ao chão, enquanto mergulhava mais profundamente na floresta. Aqui, as árvores eram verdadeiros monstros, seus troncos tão próximos que parecia impossível passar sem se chocar contra eles. Tivemos que desviar bruscamente, ziguezagueando entre as sombras, cada movimento uma luta para manter o equilíbrio e a velocidade.
Cada segundo era uma batalha entre o medo e a sobrevivência, e eu sabia que o destino pendia por um fio, tão frágil quanto o galho que salvara nossas vidas momentos antes.
Os cães finalmente recuaram, mas seus uivos ainda ecoavam na floresta, um lembrete constante de que o perigo estava longe de ser superado. De vez em quando, eu conseguia vislumbrar seus magros corpos negros, movendo-se como sombras através do mato, rápidos e silenciosos, sempre à espreita. O cavaleiro que nos perseguia havia desaparecido de vista, mas eu sabia que ele ainda estava por perto, espreitando como um predador paciente.
Enquanto passávamos sob os ramos de um carvalho gigantesco, Fred, subitamente, derrapou para parar. O movimento foi tão abrupto e violento que ele empinou com força, e antes que eu pudesse reagir, fui lançado de suas costas. Minhas mãos, que estavam firmemente agarradas à sua pelagem, foram arrancadas de sua proteção. Senti meu estômago subir à garganta enquanto voava por cima de sua cabeça, tudo acontecendo em um piscar de olhos. Meu corpo foi jogado com brutalidade contra um emaranhado de ramos interligados. O impacto tirou o fôlego dos meus pulmões, e uma dor aguda irradiou por entre minhas costelas, arrancando lágrimas dos meus olhos.
Com um rosnado selvagem, Fred continuou a correr, e o cavalo de Simon seguiu logo atrás, galopando com determinação. Por um breve momento, nossos olhares se encontraram, e vi Simon me olhar de relance, seus olhos transmitindo uma mensagem silenciosa: fique em silêncio. Eles desapareceram rapidamente na penumbra da floresta, os cães em suas sombras, caçando-os incansavelmente.
Segundos que pareciam horas se passaram, e o mundo ao meu redor parecia congelado no tempo. O som de cascos ecoou novamente, e vi, através das folhas, o cavaleiro sombrio em seu cavalo negro. Ele passou exatamente por onde eu estava caído, desacelerando por um segundo que me pareceu interminável. Meu coração quase parou, cada batida ressoando em meus ouvidos como um tambor de guerra. Eu sabia que ele estava prestes a me ver. Com mãos trêmulas, alcancei o livro em minha mochila, pronto para conjurar um feitiço que pudesse me proteger.
Mas, antes que pudesse fazer qualquer coisa, um uivo excitado de um dos cães cortou o ar. O cavaleiro virou-se na direção do som, seus instintos assumindo o controle. Ele esporeou seu cavalo para frente, sem perceber minha presença, e continuou a caçada por entre as árvores. O som dos cascos e dos uivos foi gradualmente diminuindo, até que a floresta foi envolta em um silêncio assustador.
Por um momento, fiquei ali, imóvel, com o livro ainda apertado em minhas mãos, meu corpo tremendo de alívio e medo. O perigo havia passado, pelo menos por enquanto, mas o pavor da caçada ainda pulsava em minhas veias, uma lembrança vívida de quão perto eu estivera da morte.
O silêncio finalmente caiu entre os galhos, e meu coração, antes disparado pelo medo, começou a se acalmar, embora ainda houvesse uma inquietação sutil em meu peito. Enquanto eu refletia sobre como descer dos ramos entrelaçados que haviam amortecido minha queda, um brilho suave surgiu diante de mim. Meu olhar se fixou na luz, e, ao estender a mão, percebi que era o cavalo espiritual que havia retornado à sua forma pequena e translúcida. Ele flutuava diante de mim, uma presença etérea em meio à escuridão da floresta.
Os outros dois espíritos que estavam dentro da minha mochila resmungaram algo incompreensível, suas vozes pequenas, mas carregadas de preocupação. O cavalo espiritual balançou a cabeça lentamente, como se confirmasse as palavras dos companheiros.
— Pegaram o Fred e o Simon — murmurei, a constatação pesada como uma pedra no meu peito.
O cavalo espiritual assentiu com um movimento gentil, seus olhos refletindo a mesma preocupação que eu sentia. A notícia, embora esperada, ainda era um golpe. Fred e Simon estavam em perigo, e o peso dessa realidade começava a se infiltrar em minha mente. Eu sabia que não poderia ficar ali, escondido entre os ramos, por mais seguro que aquele lugar pudesse parecer. Precisava agir, encontrar uma maneira de resgatar meus amigos antes que fosse tarde demais.
Com um suspiro profundo, reuni minha coragem e comecei a descer da árvore, sabendo que o caminho à frente seria repleto de perigos, mas determinado a fazer o que fosse necessário para salvá-los.
Quando meus pés finalmente tocaram o chão, ainda sentindo o peso do que estava por vir, uma voz suave e carregada de sarcasmo soou muito perto de mim.
— Bem. — A voz disse, fazendo minha pele arrepiar. — Isso foi interessante.
Eu congelei, meus olhos se arregalando enquanto tentava localizar a origem da voz. O tom era calmo, quase casual, mas havia uma ameaça implícita que fez meu coração disparar novamente. Eu não sabia quem estava ali, escondido nas sombras da floresta, mas uma coisa era certa: eu não estava sozinho.
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Gostaram?
Até a próxima 😘
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