Capítulo 3
Maya
O som estridente do despertador me arranca do sono. Sete horas em ponto. No Brasil, eu já estaria desesperada por estar atrasada para a aula, mas aqui, em Londres, tenho o luxo de mais uma hora. Graças a Deus.
Levanto de um impulso e vou direto para o banheiro. Depois de concluir minha rotina matinal, escolho um vestido tubinho laranja e um sobretudo branco. Para completar, calço um scarpin branco e amarro uma encharpe verde no pescoço, combinando com minha bolsa da Louis Vuitton. Deixo os cabelos soltos e adiciono uma tiara dourada no topo da cabeça. Uma make básica para evitar parecer um panda e, enfim, estou pronta.
Assim que abro a porta, outras três portas se abrem simultaneamente, revelando seus respectivos donos. Parece cena de filme. Respiro fundo e sigo para a escada, ignorando os olhares.
Na mesa do café da manhã, me sirvo calmamente até ouvir Kathryn falar:
— Luke, me passa a Nutella.
Automaticamente, levanto os olhos.
— Ei! Essa Nutella é minha! — protesto, puxando o pote para mim.
— Pena que eu não ligo. — Ela puxa na direção oposta.
E, de repente, estamos em um cabo de guerra. Então, por ironia do destino, a tampa "salta" e o creme de avelã voa direto no meu rosto.
O silêncio dura um segundo, até Kathryn, Luke e até mesmo Austin caírem na gargalhada.
— Tente não ser egoísta da próxima vez, mimadinha — Kathryn debocha, com um sorriso largo e provocativo.
Fecho a cara.
— Vai à merda.
Ela ri ainda mais. Com o sangue fervendo, subo para meu quarto e vou direto para o banheiro. Lavo o rosto e dou graças por o estrago ter sido só ali. Refazer a maquiagem já me toma tempo suficiente. Quando desço novamente, não há mais ninguém.
Sério que meu irmão simplesmente me deixou? Ele sabe que eu não faço ideia de como chegar à Escola de Artes! Austin merece um soco.
Suspiro e procurar o endereço pelo Google Maps. Tento pedir um Uber, mas ironicamente estão todos ocupados. Então, decido ir andando. Talvez encontre um táxi ou uma parada de ônibus.
O tempo está frio e me amaldiçoo por não ter escolhido um tênis ao invés do salto. Abraço o próprio corpo para me proteger do vento gelado e sigo andando.
Então, noto um carro idêntico ao de João — o que foi deixado com Austin — me seguindo. Só que esse é branco.
Meu coração acelera. Apresso o passo, imaginando todos os piores cenários possíveis. Ouço o carro parar e uma das portas serem abertas. Com o coração já na garganta e me tremendo inteira, começo a correr sem olhar para trás. Me desequilibro por conta do salto, mas não caio. Porém, esse breve tropeço foi suficiente para meu perseguidor me alcançar. Quando sinto suas mãos firmes segurarem minha cintura, me forçando a parar, grito loucamente:
— NÃO! ME SOLTA! SOCORRO!
Então, sou virada bruscamente e já estava prestes a me desesperar ainda mais quando percebo de quem se trata. Suspiro, aliviada. Mas logo a sensação de alívio dá lugar a ira.
— VOCÊ TÁ MALUCO?! — grito, inconformada. — EU ACHEI QUE ERA UM SEQUESTRADOR!
Luke começa a rir. Não penso duas vezes antes de desferir um tapa em sua bochecha direita.
Ele ergue as sobrancelhas e me encara, incrédulo.
— Você acabou de me dar um tapa?
— Sim — respondo, levantando o queixo.
— Eu só ia te oferecer uma carona, sua maluca!
— Prefiro ir a pé!
Dou-lhe as costas e sigo meu caminho, ignorando a ardência nos pés pelo salto. Prefiro isso a aceitar um favor do idiota que quase me matou de susto.
Talvez seja orgulho, mas pouco me importa.
***
Kathryn
Sempre fui apaixonada por motos. Meu pai, sabendo disso, me deu uma para usar aqui em Londres. Como não amar um homem desses?
Ao chegar na escola, tiro o capacete e observo o lugar. Enorme, artístico, incrível. Assim que desço, ajeito minha jaqueta de couro e viro para entrar na Academy of Art Da Vinci.
E, como um castigo do universo, esbarro na última pessoa que queria ver.
— Você adora esbarrar em mim, né? — digo, sarcástica.
— Na verdade, estou começando a achar que você adora se colocar no meu caminho.
Ele cruza os braços e sorri torto. Reviro os olhos.
— Melhor tentar jogar esse charme barato para outra, porque comigo não rola. — Pisco para ele antes de empurrá-lo e seguir para o portão principal com meus cabelos chicoteando no ar.
A escola me surpreende a cada passo. Há aulas de teatro, música, canto, dança, pintura, escultura e luta. Sempre gostei de dançar, então já sei o que fazer.
— Olá — escuto uma voz.
Me viro e encontro uma mulher linda, de pele negra e cabelos cacheados presos em um rabo de cavalo elegante.
— Eu sou Shirley, professora de dança. Está interessada em se juntar à minha turma?
— Kathryn — me apresento. — E sim, estou interessada. Adoro dançar.
Shirley sorri e anota algumas informações.
— Você já falou com o diretor?
— Ainda não.
— Fale com ele e depois já pode se juntar a nós.
Concordo e sigo meu caminho até esbarrar — propositalmente — na patricinha que divide a casa comigo. O gritinho que ela solta é ridículo.
Rio maldosamente e sigo para a diretoria.
Na porta, vejo Luke, Austin e Maya chegando de diferentes corredores.
Ótimo.
O diretor é um homem alto e careca, simpático até.
— Fico feliz que tenham se juntado à Academy of Art Da Vinci. Já conheceram o lugar?
— Um pouco — respondo por todos.
— Caso queiram um tour, posso encarregar alguns alunos. O prazo para inscrições nas aulas é até sexta-feira. Sejam bem-vindos.
Agradecemos e saímos.
***
Maya
Ando pelos corredores quando um som me chama a atenção. Olho para a sala de música e vejo um grupo cantando. A harmonia é quase angelical.
— Você deve ser uma das novatas.
Viro a cabeça e me deparo com um garoto moreno, de olhos claros e absurdamente lindo.
— Sim — respondo, sentindo um leve frio na barriga.
— Sou Rick. Prazer.
Ele estende a mão e sorrio.
— Maya.
Ao tocar sua mão, ele me encara e eu sustento o olhar.
Mas então uma voz anasalada interrompe o momento:
— Rick! Finalmente te achei, amor!
A Barbie em pessoa surge e se joga nele. O beijo intenso me faz desviar o olhar, constrangida.
— Maya, essa é Mery, minha namorada.
— Oi — forço um sorriso.
— Oi — ela me olha de cima a baixo, torcendo o nariz.
— Bom, tenho que ir. Até mais, Maya.
Rick beija minha bochecha antes de sair, deixando-me desconcertada, e Mery me fuzila com os olhos.
— Maya, né? — Ela nem espera minha resposta. — O Rick é MEU namorado. Se eu fosse você, tomaria cuidado. Posso fazer da sua vida um inferno.
Se ela pensa que vai me intimidar, está muito enganada. Cruzo os braços e sorrio, divertida.
— Quer um conselho, Mery? Não se meta comigo. Ou eu é que farei da sua vida um inferno.
Dou as costas e saio.
No estacionamento, Austin me espera.
— Maya, eu...
— Sente muito por ter me deixado?
Ele suspira.
— Sim. Desculpa. Por um momento, me distraí e esqueci de você.
— Tudo bem. Mas agora me deve uma bolsa da Chanel.
— Tá. - ele revira os olhos, o que me faz sorrir.
Quando chego em casa, ligo para Laura e Beatriz, mas ninguém atende. Jogo o celular na cama, bato palmas e apago as luzes.
Fecho os olhos. Amanhã será um novo dia.
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