Onde está você?
— Borjan? — Chamei.
— Aqui, Lira! — Olhei na direção das árvores e vi sua silhueta no escuro. Acenava para mim.
— Por que está se distanciando tanto, Borjan? — Perguntei com certo divertimento.
Ele riu e adentrou entre as árvores. Não era de bom agouro que ele entrasse naquela floresta, podia não ser seguro para uma pessoa comum.
— Borjan, venha aqui! — Chamei já preocupada. — Não é seguro para você andar pela floresta.
Ouvi sua voz próxima, mas perdida na escuridão.
— Não se preocupe, Lira. Não estou longe. — Me tranquilizou.
Entrei entre as árvores. A floresta estava terrivelmente escura, e não o vi.
— Borjan? — Chamei tomada por um pouco de medo.
— Aqui! — Me chamou em um espaço à frente.
— Onde? Apareça aqui, Borjan. Isto é perigoso! — Ordenei.
— Estou logo à frente, Lira.
Girei em torno do meu próprio eixo. Estava escuro demais, como ele conseguira andar ali?
Acendi o fogo na mão para iluminar à minha volta, mas a escuridão parecia se alimentar das chamas, tamanha sua densidade. O fogo não iluminava mais que o raio de um metro.
— Borjan? — Chamei outra vez, já decidida a arrastá-lo de volta.
— Aqui. — Sua silhueta acenou logo à minha frente.
Caminhei em sua direção iluminando com o fogo na palma da mão, mas eu não chegava onde ele estava. Andava, andava e não chegava. Comecei a correr, mesmo assim não alcançava a silhueta.
— Borjan? — Gritei, já com os olhos cheios de lágrimas.
Nenhuma resposta.
— Borjan? — Repeti ofegante.
Sem resposta. E a silhueta desapareceu.
— BORJAN?! — Gritei desesperada. — BORJAN!? ONDE VOCÊ ESTÁ? — Gritei com voz embargada.
Não houve resposta. A escuridão à minha volta se tornou tão densa que já era palpável. Virei-me em uma direção que pensei ser o caminho de volta e comecei a correr. Nada mudava. Tudo igual. Não havia luz, não havia lua, apenas a escuridão que se tornou gelada e opressiva.
Uma gargalhada maligna ecoou nas trevas.
— Quem está aí? — Perguntei assustada.
A resposta para mim foi o silêncio esmagador.
Olhei para todos os lados e concluí que estava perdida. Literalmente perdida. Sem direção. Comecei a me mover cegamente no escuro, na esperança de enxergar, ao longe, alguma luz. Mais uma gargalhada demoníaca soou na escuridão.
Apaguei o fogo, com medo de ser facilmente localizada, e parei de andar. Apurei os ouvidos e escutei apenas minha própria respiração. Algo estava muito errado. Extremamente errado. A floresta devia ter sons. Avalon era repleta de sons, mesmo durante a noite.
As árvores, estranhas, pareciam me vigiar. Andei três passos e ouvi as folhas sendo esmagadas pelo meu peso. Voltei três passos e as folhas foram esmagas outra vez, mas o barulho ecoou mais tempo.
O ambiente ficou frio. Frio como a morte. Sim, eu conhecia a morte muito bem. Ouvi mais sons de folhas sendo esmagadas e me desesperei em silêncio. Eu não tinha andado.
O chão à minha volta tremeu. Um cheiro forte de carne podre preencheu o ar. E... Tomada pelo medo... Fiz o que era necessário. Acendi o fogo em ambas as mãos.
O susto foi tamanho que sequer consegui gritar. Eu estava cercada por cadáveres pútridos com cabeça de peixe, dentes protuberantes e afiados como os de uma fera. Havia pelo menos trinta desses seres.
Dei um passo para trás sob a luz de meus braços erguidos.
— Quem são vocês? — Perguntei em desespero.
Não responderam, apenas emitiram um som horrendo e se lançaram sobre mim, todos de uma vez.
A escuridão, agora, não era apenas escuridão, era uma parede se fechando sobre nós. Tentei usar o fogo para me defender, mas não adiantou. O monte de ossos e carne podre sobre pesava sobre meu corpo e meus movimentos ficaram limitados. Debati-me. Ousei me desviar das mordidas, mas uma delas atingiu minha perna. Abri minha boca para gritar, mas a carne podre e fedorenta a invadiu. Cuspi tudo para fora e cerrei bem os lábios, ainda sentindo o gosto terrível.
Meu ar se esgotava a cada segundo. A situação piorou quando começamos a ser tragados pela terra. O peso sobre mim acelerou o processo de enterro. Fechei os olhos e ouvi uma voz gritar do fundo de minha consciência.
"Sobreviva!" — Ela dizia.
Raios, não era eu, afinal, a Ira do Dragão?
Abri os olhos e senti o medalhão vibrar em meu pescoço. Acendi o fogo das mãos e me pus a esmurrar cegamente. Não adiantava muito, mas era um esforço válido.
Concentrei-me em meus pés e pela primeira vez os incendiei. Além de esmurrar, me pus a chutar sem muito sucesso. Não era o bastante, era peso demais para minha força. Eu precisava de mais fogo. Mais força.
Parei de me mexer e me concentrei. Senti meu coração bater. Senti, meu sangue fluir. Senti a terra à minha volta, cada vez mais dona de mim. E senti raiva, porque não era justo. Abri os olhos, mais que determinada, e ordenei que meu corpo se incendiasse. Mas o fogo se alimenta de ar, e meu ar já estava esgotando.
Concentrei-me na terra à minha volta e implorei mentalmente para que ela me emprestasse a força que eu não tinha. Deslizei minhas mãos até a altura de meu rosto, e elas vieram cheias de uma pasta fedorenta que devia ser sangue podre e algo mais.
Comecei a empurrar o peso acima de meu rosto com uma força sobrenatural que logo se esvaiu. Consegui abrir uma pequena brecha por onde o ar ruim entrou.
Era podre e malcheiroso, mas era ar. Bebi dois grandes goles de ar e tentei outra vez incendiar meu corpo. Finalmente consegui. Começou pelo rosto, onde o ar passava, e depois se alastrou de dentro para fora, empurrando tudo pela frente, arremessando aquelas carcaças infernais.
Meu fogo estava vivo e buscava ar. Selvagem, impiedoso e irritável.
Passei a me desenterrar do que havia sobrado sobre mim, queimando-os e empurrando, até me mexer completamente. Por fim me levantei.
Meu vestido se transformou em trapos fedorentos. O arranquei e fiquei apenas com a roupa de baixo, que era fina, mas cobria um pouco.
Olhei para meu corpo tomado pelo fogo e gargalhei, em uma mistura de loucura e alívio. Passei as mãos pelos meus cabelos e suas pontas eram chamas fluídas e palpáveis.
Olhei à minha volta. A escuridão ainda era densa. Pensei bem. Precisava sair dali. Devia haver uma saída. Enquanto eu pensava, raízes saíram do chão e agarraram meus pés, me derrubando e me arrastando de volta para o buraco, com toda a força.
Cravei meus dedos na terra e resisti. Minhas unhas quebraram e meus dedos se soltaram. Sob meu comando desesperado, meu fogo se alastrou pelas folhas secas... Mas a escuridão o sugou.
Eu precisava de um plano. Respirei fundo. E tive uma idéia.
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Demorei, mas voltei. Estava escrevendo muito.
Obrigada por acompanhar até aqui, seu apoio é importante para mim.
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