Cavalo de Fogo
Se havia ar ali e ele não se esgotava, isso significava que havia uma passagem em algum lugar. Meu fogo, na intensidade que eu o mantinha, teria consumido todo o ar, caso estivesse em um espaço completamente isolado.
Se o ar chegava ali, o vento também chegaria.
Em um novo ânimo chutei as raízes que me prendiam as pernas até estourá-las. Rapidamente me coloquei de pé, no processo me esquivando de outras raízes que me atacavam. Eu precisava sair do chão, mas não sabia voar e as árvores não eram confiáveis. Restava-me apenas uma opção.
Apaguei rapidamente o fogo de meu corpo e me concentrei. Puxei uma grande quantidade ar e comecei a lançar bolas de fogo no espaço à frente. Saíram esparsas, mas se uniram sob meu comando, e formaram um cavalo puramente feito de fogo.
Minhas energias acabariam mais rápido, eu sabia, sentia a fraqueza me dominar aos poucos. Mas era minha melhor estratégia.
Sem delongas, me desviei de uma raiz e saltei sobre o cavalo. Intimamente não tinha confiança sobre sua solidez, mesmo assim arrisquei. Felizmente foi uma ótima estratégia. Eu não sabia voar, mas o cavalo podia cavalgar no ar. Segurei forte em sua crina e o incitei a ir para frente, dois metros acima do solo. Eu me desviava dos galhos das árvores e elaborava uma maneira de fugir da escuridão.
Precisava de ajuda, uma ajuda que viesse de fora dali. Se o ar entrava e saía, eu tinha uma excelente opção. Sem parar de cavalgar, puxei ar, e soprei com força o nome de Gaothin. Como se gritasse em sopro. Repeti o processo duas vezes antes de me sentir tonta. Era esforço demais e nenhum treino.
Fiz meu cavalo subir acima das copas das árvores. Dali eu também não via mais que trevas. Gritei por Gaothin outra vez, sem resultado e a tontura veio acompanhada da visão escurecida. Não podia desistir. Pensei que talvez, se eu subisse o bastante, conseguiria passar do domo mágico e aquela espécie de feitiço acabaria.
Comandei meu cavalo para cima. E ele cavalgou na escuridão, me deixando tensa e feliz, era melhor tentar sobreviver que perecer sem lutar.
O cansaço me bateu com intensidade, mas eu não podia me entregar. Eu era melhor que a pessoa que desejava me fazer mal. Mais persistente. A mera menção em pensamento àquela pessoa já me enchia o coração de raiva e isso fazia com que meu cavalo galopasse mais e mais rápido.
Até que, mesmo parecendo improvável, saímos da escuridão tenebrosa e fomos recebidos pela clara escuridão da madrugada, quando as estrelas são mais brilhantes no céu. Vislumbrei abaixo e a massa preta estava perto demais. Incitei meu cavalo a ir para frente, sem destino certo, apenas fugindo das trevas.
O animal relinchou e correu pelo céu até conseguirmos nos livrar das trevas abaixo de nós.
Avistei a floresta escura, porém comum, que se estendia muito distante de onde galopávamos. Era uma região desconhecida. Olhei para trás e a massa negra parecia se esvair. Senti tontura outra vez. Meu medalhão brilhou. Não me seguraria por muito tempo, eu sabia.
Comecei a descer em direção ao solo, era melhor pousar no desconhecido que cair do céu. Chamei Gaothin uma última vez, já sem muita força e com quase nada de esperança. Abandonei meu corpo cansado sobre o dorso do cavalo. Eu chegaria bem até o chão, bastava que ele continuasse em linha reta. Mas, para meu azar, um vento forte e úmido começou a soprar.
E não bastasse o vento. Uma nuvem de chuva se aproximou em alta velocidade.
— Não! — Inutilmente gritei para a nuvem, talvez os Elementais do vento me ajudassem.
Foi uma esperança ridícula. Meu fogo, que já estava fraco, foi apagado. O cavalo sumiu. E eu despenquei do céu, completamente molhada e sem forças.
O medalhão brilhava, mas não havia nada que ele pudesse fazer. Cri. Fechei meus olhos e senti o frescor da morte que se aproximava. Eu ainda estava suja de cadáveres e sem uma vestimenta decente.
Não caí no chão, como previra, mas meu corpo se chocou com força contra as águas de um rio caudaloso. Senti que alguns ossos se partiram antes de eu afundar rápido demais. Impossibilitada de reagir e nadar, bati com a cabeça em uma pedra. Mesmo assim não desmaiei. Consciente, senti a dor aguda enquanto meus pulmões se enchiam de água.
Abandonei-me na correnteza e senti meu corpo bater em mais algumas pedras que produziram rasgos em minha pele anestesiada pela água. A correnteza ficou mais forte e turbulenta. Aproximava-me do fim do rio, onde a água desembocava em uma gigantesca queda.
Fechei os olhos rapidamente e pensei em vovô, em Borjan e em todos que eu amava e admirava. A lista crescera consideravelmente nos últimos tempos.
Quando fui lançada na queda sob o peso da água, vi o rio abaixo e soube que morreria. Com um fio de desespero tentei gritar. O grito não saiu. Em seu lugar, apenas uma tosse feia.
Obriguei-me a manter os olhos abertos para encarar a morte de frente. Eu era corajosa o suficiente para fazer isso.
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