Bônus 2: E se...?
― Camila, levanta! Você vai se atrasar!
Ela revirou na cama ao ouvir o grito da mãe, desejando ter aqueles cinco minutinhos que pareciam ser tão preciosos – mas a verdade é que causavam mais sono ainda.
A rotina voltava hoje, as aulas começariam e finalmente seria o último ano na escola. Em breve estaria em outro lugar, bem longe, sendo uma famosa escritora de livros de terror, seu gênero favorito.
A porta foi aberta de uma vez e ela sentiu algo pular na cama, devia ser Sloane, sua Golden Retriever.
― Camila, sério? Vamos, mamãe vai ficar uma fera.
― Não quero.
Alice, sua irmã mais velha, puxou seu cobertor e então abriu as cortinas. Não tinha mais jeito de escapar.
― Bom dia, boneca. Primeiro dia de aula do seu último ano na escola, vamos. ― Disse e deu dois tapinhas na perna dela.
― Alice, você é uma vadia.
Sloane se aconchegou nos braços de Camila, procurando o carinho da mãe. Ela tinha quase dois anos, havia ganhado em seu aniversário do seu pai, e era, sem dúvidas, seu grande amor. Quem diria que Golden Retrieves poderiam ser grandes companheiros?
― É hora de ir para a escola, vamos. Você tem quinze minutos.
Camila fechou os olhos quando a irmã saiu do quarto, batendo a porta com força, querendo dormir novamente. Mas Sloane não deixou. A adorável cadela começou a lamber seu rosto, como se fosse um alarme para impedi-la de dormir.
― Ok, garota, eu já entendi. Você ganhou.
Levantou rápido, fez suas higienes, tomou banho e vestiu sua tão adorada farda. Ela poderia não gostar muito de estudar ou ir à escola, mas saber que teria treino era uma das suas poucas alegrias. Talvez fosse seu espírito brasileiro dançante, não sabia dizer, mas dança era uma das coisas que ela mais amava fazer.
Desceu para o segundo andar, ainda sendo acompanhada por Sloane, e cumprimentou os pais.
― As aulas mal começam e você já tem ensaio? E com essa minissaia? ― Seu pai perguntou, quase engasgando com o café.
Camila revirou os olhos e deu um beijo rápido na bochecha do pai.
― Algumas coisas não mudam mesmo, né, pai? ― Ela perguntou, provocando-o.
Camila comeu rapidamente na companhia da família quando a buzina tão conhecida tocou. Seu pai arqueou a sobrancelha e sua mãe deu um sorrisinho de lado.
― Andrews está aqui. ― Alice disse depois de conferir pela janela.
― Hora de ir. ― Ela pegou a mochila, acenou rapidamente para todos e deu um beijinho em Sloane. ― Até mais tarde.
Camila correu até o carro e sorriu abertamente ao ver Sean, seu namorado. Ah, sim, Sean Andrews, o garoto mais lindo que ela já havia visto. Ele era carinhoso, a tratava como uma rainha, compreendia todas as suas loucuras e ainda era talentoso, estava prestes a ser consagrado como quarterback do Fayron Furious, time de futebol da escola. Eles eram o casal perfeito, como todos diziam.
Ele a abraçou com força quando eles se viram. Mas quando Camila tentou beijá-lo, ele enterrou seu rosto no pescoço dela.
― Você é a líder de torcida mais linda que já vi, sabia?
E então a deu um selinho rápido.
Homens...
― Sempre tão carinhoso. ― Ela sorriu.
Apesar de ter uma boa reputação na escola, Camila nunca quis namorados. Ela o amava, isso era fato, mas as vezes pensava que funcionavam melhor como amigos. Isso porque eram amigos de infância, juntamente com aquele garoto problema que morava há poucos quarteirões da sua casa. Mas ninguém falava mais sobre isso.
― Hoje saberei se consegui minha vaga. Tudo depende da convocação do treinador.
― Ah, sério? Tenho certeza de que você será o quarterback, amor. Você é o melhor jogador daquela escola.
― Haverá novos meninos, Mila. De outras escolas, isso pode fazer com que o treinador demore mais tempo.
Ela segurou seu rosto com as duas mãos.
― Você é o melhor, Sean. Nunca esqueça disso.
Ele assentiu e a abraçou novamente. Quando o garoto soltou um gemido de medo, ela franziu a testa.
― Meu Deus, seu pai sempre vai ser ciumento?
A garota se virou e viu o pai, segurando uma caneca, observando-os através da janela da sala.
― Sim. Ele não muda mesmo.
― Vamos embora logo, então.
Entraram no Jeep de Sean e seguiram em direção a Fayron Frankfurter School. Alguns diziam que aquela era a escola dos adolescentes mais problemáticos de Jacksonville, mas haviam controvérsias – apesar de coisas bem interessantes terem acontecido por aqueles corredores. Mas tinham jovens talentosos, afinal, e times esportivos de causar medo em qualquer outro da cidade, até mesmo do estado.
Quando Sean e Camila saíram pelo estacionamento de mãos dadas e entraram na escola, todos pareciam parar para vê-los. Já fazia mais de um ano de namoro, mas ainda assim sentia um frio na barriga ao receber toda aquela atenção. Era por causa do seu namorado, ela sabia disso, ela era apenas uma líder de torcida, nada mais. Queria terminar o ensino médio em paz, queria ser uma garota normal, mas aqueles holofotes a incomodavam.
― Oi, gata. ― Emily, melhor amiga de Camila, disse assim que eles chegaram perto dos armários.
― Ainda bem que voltou. Senti sua falta. Como foram as férias?
― Nada demais. As mesmas coisas de sempre. ― Ela sorriu leve para o garoto. ― E aí, Sean.
― Oi, Emily. Como anda a preparação para o campeonato?
― Tudo certo. Sou um Michael Phelps versão feminina.
― Legal. Ei, linda, nos vemos mais tarde, ok? ― Ele deu um beijo rápido na bochecha de Camila e saiu andando.
Quando Camila olhou para Emily, vestida com o casaco dos Dolphins, ela quis morrer.
― Não fale nada.
― Não vou. ― Emily riu. ― Eu só... Meu Deus. Como é que você foi ficar logo com esse palerma?
― Ele é legal para mim, Emily. Nós somos bons um para o outro. Além do mais, não vou deixar que a sua rixa com ele influencie no nosso relacionamento.
― Não foi rixa. É que ele é muito fresco.
― Você jogou um sapo nele, Emily! ― Ela gritou, relembrando o trote do ano passado.
Emily gargalhou. A garota era rebelde, já era conhecida, e mesmo que o destino tentasse moldá-la, nada tiraria aquilo dela. Havia se tornado amiga de Camila por conta de uma briga entre líderes de torcida e nadadoras dos Dolphins, por causa da academia da escola. Quando foram forçadas a ficarem juntas na detenção, descobriram ter muitas coisas em comum.
― Ok, posso ter passado dos limites. Mas ele é muito idiota, Camila, não te trata mal, eu sei, porém também não é o tipo de cara pra você. É como se você pudesse escapar dele a qualquer momento e ele realmente quisesse isso.
― O que está tentando dizer?
― Nada. Nada. ― Ela suspirou. ― Já ficou sabendo?
― Do que? ― Camila perguntou, curiosa. Claro que ela não resistia a uma fofoca.
― Meu Deus, você não sabe mesmo. Bem, vou contar porque a qualquer momento você vai saber, então. ― Disse. ― Ele voltou. Alex Lawson. Ele saiu do Bankes, parece que por insistência do pai, e agora veio estudar aqui. E de brinde ainda trouxe um amigo babaca dele.
Camila engoliu em seco, sentindo as pernas enfraquecerem só de ouvir aquele nome.
A amizade entre eles acabou aos treze anos, no dia de sua festa, quando Alex assumiu seu amor e ela disse não, por medo. Os três, ela, Alex e Sean eram melhores amigos, inseparáveis. Para Camila era como tivesse os dois irmãos que nunca teve, e nunca se sentira tão protegida do que quando estava com eles. Tinha sido praticamente destinada a Sean desde que se entende por gente, mas quando Alex lhe deu seu primeiro beijo... a história mudou.
― Você está bem com isso? ― Emily perguntou, acordando-a do devaneio.
― Uhum. Estou ótima. Que bom que ele está vindo.
― Você tem certeza mesmo que tá tudo bem?
― Emily, já fazem alguns anos, todos nós mudamos. Alex não é mais o mesmo, nem eu.
― Você sabe que ele vai ser escalado para o time e que tem grandes chances de ser o novo quarterback ao invés de Sean, não é?
Ela sabia. Ah, e como ela sabia.
Bem em seu coração, Camila sabia que Alex era um jogador infinitamente melhor que Sean, mesmo que tivessem crescido junto nos campos, mesmo que tivessem sido treinados juntos. Mas jamais seria capaz de assumir aquilo.
― Isso não vai acontecer. Sean vai conseguir, eu sinto isso.
Emily ia falar, mas parou ao ver – e sentir – a energia caótica que adentrou a Fayron no exato momento. Alex Lawson entrava exalando confiança e beleza em uma só tacada.
Quando ele passou, seus olhares rapidamente se encontraram. Dizem que o tempo costuma parar, algo que acontece apenas na ficção, mas naquele universo, naquela realidade, aquilo realmente aconteceu. O tempo parou em uma fração de segundos quando eles se encararam.
Camila achou que estivesse ficando louca, mas conseguia ver uma infinidade de universos no olhar de Alex. E em todos, havia um final só.
O contato se quebrou quando ele continuou a caminhar, voltando a ignorá-la.
― Você vai ter que aguentar uma barra, hein?
― Cala a boca. ― Camila resmungou.
As duas ainda viram Ethan Johnson, grande amigo de Alex, aluno novo na escola, de mãos dadas com Meghan Prescott, sua namorada. Eles eram bonitos juntos, Emily e Camila haviam concordado nisso, e por mais que fossem um casal legal, eram o oposto um do outro. Era uma energia confusa de explicar. Enquanto Ethan era idiota, Meghan era um doce e além da capitã das líderes de torcida, era grande amiga de Camila.
Camila seguiu seu dia normalmente, foi para o treino, passou um tempo na academia, e ainda aproveitou para conferir os novos livros que haviam chegado na biblioteca – isso sem ninguém saber. Teria apenas as três últimas aulas do dia, teria que aguentar física e matemática antes de ter a tão maravilhosa aula de literatura.
Estava na sala, bem cedo, e quase pensou em ir embora ao ver Alex, já usando a jaqueta do time, sentar no outro extremo da sala. Ele ainda a ignorava, era melhor assim. Tentou se acalmar quando Judith, sua professora favorita, entrou.
― Bom dia, estudantes. Bem-vindos de volta. Como se foram de férias? Espero que bem. ― Ela escreveu seu nome no quadro e fez uma breve apresentação.
Camila anotava tudo, animada, mas ainda sentia a energia dele. Mesmo que se ignorassem ela sentia que ele a observava. Não sabia como, mas ele definitivamente a observava.
A professora falou sobre sua metodologia, como suas aulas e provas funcionavam, e então a parte mais importante.
― Sempre passo um trabalho focado em um livro para o final do semestre. Para mim, é mais importante do que a prova e, definitivamente, o que levo mais em conta. Sei que alguns realmente precisam disso. Sim, sou conhecida como terror dos atletas ― Ela disse, e alguns riram. Judith era conhecida, muito conhecida. ― Tomem isso como uma oportunidade para se darem bem.
Ela segurou um livro nas mãos. Eu senti meu coração acelerar.
― Romeu e Julieta, versão original. Vocês lerão a tragédia e farão um trabalho trazendo a história para os dias atuais. Juntem-se em duplas, já quero começar a dar algumas dicas.
Camila terminou de fazer as anotações e antes que pudesse escolher sua dupla, alguém sentou ao seu lado. O arrepiou na nuca entregou quem era antes que ela visse. Quando seus olhos se encontraram aos dele, engoliu em seco, sentindo seu coração acelerar.
― Oi, Hayes.
― Tem certeza que sentou no...
― Sim, tenho muita certeza. ― Ele respondeu, a interrompendo. ― Seremos dupla, vá aceitando.
― Mas por que? Você me odeia.
― Eu não te odeio, mas também não gosto de você.
― Então?
Ele respirou fundo como se estivesse falando com a criatura mais tonta do universo.
― Posso não gostar de você, mas estaria mentindo se dissesse que você não é a pessoa que mais ama literatura que já conheci. Você é boa em escrever. E, como já deve saber, preciso ter boas notas, dependo disso para uma bolsa de estudos.
― E por que eu te ajudaria?
Ele sorriu leve, daqueles que deixava Camila completamente desconcertada.
― Se me ajudar, se fizermos isso juntos, eu desisto da vaga de quarterback e deixo seu namoradinho em paz.
― O que? ― Ela riu leve. ― Você está mesmo tão confiante assim?
― Vamos lá, Camz ― Usou o apelido que há tanto tempo ela não ouvia. ― Nós sabemos que eu serei escolhido ao invés dele, são só os fatos. O que me diz? Vamos fazer isso?
Ela pensou, pensou e pensou. Mas não havia outra resposta. Nem nessa realidade e em nenhuma outra.
Eles viviam e reviviam aquela história de amor em diversos universos, em várias vidas e épocas. Era algo gostoso e divertido de se ver. Especialmente para mim, confesso.
No entanto sempre seriam eles. Alex e Camila, Camila e Alex. Não importava o que acontecesse.
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