☠ XX - Conferência ☠
Os piratas não esperariam para sempre. Nadine tinha certeza disso quando os viu desembarcar, apesar da chuva tê-los pego de surpresa e de ainda não terem se afastado da praia. Na verdade, eles olhavam ao redor com desconfiança, tentando entender o lugar em que haviam ancorado. Nadine decidiu que aquela seria a melhor chance de surpreendê-los.
Uma ideia tinha se formado em sua mente para levá-los de volta à Libertália, e ainda que fosse uma ideia perigosa, altamente arriscada, também poderia ser a única a dar certo. Eles eram muitos, e a quantidade de poder que ela teria que usar poderia ser fatal, mas ainda assim, tinha que tentar. Nadine sentia a magia fluir por suas veias como nunca antes, como se todo o seu ser estivesse voltado para aquele único momento. Talvez desse certo.
— Vocês dois, distraiam-nos. Não deixem que eles se separem.
Os três estavam agora em um deque suspenso abandonado, protegidos da chuva e longe da vista dos piratas.
— O que você vai fazer? — quis saber Henrique. Para alguém que acabava de sair da chuva, ele suava muito.
— Sei de um feitiço que pode nos ajudar. Se der certo, todos nós estaremos de volta à ilha em um piscar de olhos, mas para isso preciso que eles fiquem juntos. É um feitiço muito complexo e precisarei me concentrar em um único ponto, então é melhor que não falhem.
Henrique lançou um olhar preocupado para os piratas.
— Eles são muitos. Tem certeza de que consegue fazer isso?
Nadine o encarou sombriamente.
— Tenho que conseguir, é a nossa única chance.
Ao seu lado, Oliver sacou sua adaga de bronze.
— Vamos lá! — gritou ele animado, como se estivesse indo a um parque de diversões e não para a morte certa. — Meu pai se orgulhará de mim!
— Oliver, espere!
Henrique correu atrás do menino, instruindo-o a ir pelo flanco direito, que julgava ser o mais vulnerável, e a atacar somente quando fosse necessário, o que não o agradou muito. Seu plano era simples: cercá-los como ovelhas pastoreiras — se é que piratas sanguinários armados pudessem ser comparados a ovelhas — e impedir que qualquer um deles se afastasse do bando, dando tempo suficiente para que Nadine executasse seu feitiço.
A garota assistiu enquanto eles partiam, tentando se concentrar apenas em seu poder. Imaginou que uma linha invisível a ligava à Libertália, e na mesma hora sentiu um leve puxão em seu umbigo. O lar a chamava de volta.
— Pai — clamou ela para as nuvens tempestuosas, os braços erguidos em súplica. — Se alguma vez precisei de seus poderes, essa hora é agora. Pelo sangue que corre em minhas veias e pela magia que me concedeu usar, ajude-me!
O céu pareceu responder com um trovão retumbante que fez tremer a terra, deixando no ar um cheiro metálico. Nadine decidiu tomar aquilo como um bom presságio e começou a entoar um cântico na língua antiga dos malgaxe, fechando os olhos para se concentrar somente no seu poder.
Enquanto isso, Henrique e Oliver estavam com problemas para manter os piratas no lugar. Pelo menos três deles se afastavam pelo flanco direito quando Oliver os surpreendeu com sua adaga.
— Acham que vão a algum lugar? — provocou ele, bloqueando a passagem.
O pirata do meio o encarou em descrença.
— Garoto, se não quiser morrer, é melhor que saia da frente. Nunca gostei de você mesmo, seria um prazer cortar essa sua língua irritante.
Oliver permaneceu no lugar sem se abalar. Apesar de pequena, brandia sua lâmina à frente como se ela fosse de grande ameaça, o que não convencia muito os piratas.
— Eu sou Oliver Bones, filho de Skyller Scar Bones, e vocês pagarão por terem traído o meu pai!
Os três entreolharam-se e caíram na gargalhada em seguida. Oliver não esperou que eles se recuperassem, partindo para cima como um mini furacão endiabrado. Em dois golpes rápidos, feriu uma coxa e um joelho, fazendo-os dobrarem-se de dor. O terceiro parou de rir no ato, seu semblante tornando-se sombrio ao desembainhar sua espada.
— Moleque atrevido! Acha que é páreo para nós?
Ele investiu contra Oliver, mas o menino era rápido e ágil, facilmente desvencilhando de seu golpe. Os outros ergueram-se, tentando acertá-lo também, mas Oliver costurava entre eles com facilidade, desviando de todos os ataques e ocasionalmente chutando em suas canelas, o que irritava os piratas e os desestabilizava.
Do outro lado, Henrique não estava tendo a mesma sorte. Cinco deles o cercaram em um semicírculo, todos empunhando espadas maiores e mais letais do que a sua. Sabia que jamais os derrotaria em uma disputa corpo-a-corpo, então resolveu que sua melhor chance seria enrolá-los.
— Escolheram um péssimo dia para curtir a praia — ele disse, indicando a chuva que caía ao redor sem piedade. — Eu daria a meia volta se fosse vocês, o seu barquinho deve estar tão velho e cheio de cracas que a chuva logo irá dissolvê-lo.
— Meça suas palavras, rapaz — ameaçou um deles, dando um passo em sua direção. — Já enfrentamos tempestades piores e perdemos navios melhores, porque nos importaríamos com tão pouco? Além do mais, sempre se pode tomar um outro navio.
Ele abriu um sorriso cruel para os companheiros, que gritaram em concordância.
— Eu não teria tanta certeza assim. Você já deu uma olhada nesta cidade? — Henrique apontou para a fileira de prédios que se estendia infinitamente. — Sabe o quanto ela é protegida? Talvez pudessem invadir com facilidade Port Royal ou alguma outra cidade do Caribe antigo, mas vocês não estão mais no século XVIII. Essas espadas mofadas serão pulverizadas quando se depararem com as armas da polícia moderna.
Por um instante, suas palavras pareceram surtir efeito. Os piratas entreolharam-se, amedrontados diante do desconhecido. Mas então o pirata do meio acenou em descrença.
— Vão mesmo acreditar no que o verme diz? Não vêem que está apenas tentando nos desestabilizar?
Os outros gritaram em concordância, agitando suas espadas para frente de forma ameaçadora. Henrique começava a se preocupar de verdade. Se Nadine não se apressasse com o feitiço, ele estaria morto em instantes. Em um gesto de coragem, ergueu sua própria espada, encarando-os como um cervo solitário diante de um bando faminto de leões.
— Se acham que terão alguma chance...
O primeiro golpe cortou suas palavras. Henrique aparou a lâmina, dando um passo atrás. Logo, uma enxurrada de investidas o cercou por todos os lados. Henrique desviou, aparou, cortou, pulou, mas acabou sendo atingido no ombro esquerdo e na coxa direita. Em dois segundos estava na areia, arquejando de dor. Sua espada foi chutada para longe, deixando-o à deriva de cinco feras selvagens.
— Então, o que estava zunindo antes? — zombou o mesmo pirata que o derrubou, o mosquete em mãos, pronto para ser disparado. — Ah, não importa. Será um prazer despachá-lo para o inferno.
Henrique apertou os olhos, mas tudo o que veio da arma foi um clique seco. Ao abri-los, encontrou seu algoz enfurecido, amaldiçoando o mosquete em suas mãos.
— Maldita chuva! Maldito pedaço de metal inútil!
Henrique começou a rolar para o lado, mas antes que pudesse se erguer, tinha uma nova lâmina em seu pescoço.
— Não tão rápido, filhinho — disse o pirata com um sorriso cruel. — É falta de educação sair antes de acabarmos com você.
Foi então que o milagre aconteceu: o rosto do pirata contorceu-se em um misto de surpresa e dor e ele tombou para o lado, inerte. Recortada pela chuva, uma silhueta feminina puxava sua adaga de volta.
— Espero que não seja tarde para me juntar à festa.
Henrique olhou estupefato enquanto Elisa estendia-lhe a mão. Estava tão atordoado que só reparou na presença de Omar um segundo depois. O restante dos piratas recuou um passo, tentando se recompor de sua primeira baixa.
— Desde quando você mata piratas?
— Desde... dez segundos atrás?
Um potente trovão rasgou o céu da manhã, fazendo o chão tremer com o seu impacto. A chuva continuava a açoitar sem piedade, mas uma aura arroxeada que não tinha nada a ver com a tempestade começou a envolver a cena de luta, o que não passou despercebido a Omar.
— O que ela está fazendo? — gritou em desespero, apontando um dedo para o quiosque onde Nadine executava sua magia.
De olhos fechados e braços estendidos, a garota concentrava-se ao máximo, envolta pela mesma névoa roxa que os circundava, parecendo irradiar a partir dela. Cada músculo estava rígido, e seu esforço era tanto que um filete de sangue descia pelo nariz, o que fez Henrique franzir a testa em preocupação.
— É um feitiço para nos levar de volta à Libertália — explicou ele, olhando para Elisa de soslaio. Mas a garota não pareceu se abalar com aquilo.
— Vocês estão loucos? — berrou Omar contra a chuva. — A ilha será destruída, se voltarmos agora vamos todos morrer!
Antes que Elisa pudesse impedi-lo, Omar começou a correr em direção ao quiosque, empurrando alguns piratas pelo caminho, pronto para interferir no feitiço. No entanto, entre a profusão de pernas, braços e espadas, ele sentiu uma fisgada em suas canelas, desabando direto ao chão. Omar olhou para cima, tentando localizar seu abatedor, mas tudo o que encontrou foi a figura mirrada de Oliver.
— Não vou deixar você atrapalhar dessa vez!
Entrementes, Henrique e Elisa se aproximaram correndo. Todos os piratas da área estavam caídos, desacordados ou gemendo de dor, o que impressionou Henrique.
— Oliver? Como fez isso?
O garoto deu de ombros, sem desgrudar os olhos de Omar.
— Eles não são muito espertos. E eu disse que daria orgulho ao meu pai.
Os piratas que ainda estavam em pé andavam confusos, tentando entender o que estava acontecendo. Alguns tentavam voltar ao navio, com a esperança de escapar pelo mar. Mas já era muito tarde. A magia roxa de Nadine envolvia a todos como um imenso casulo de energia, brilhando intensamente. Sua força era tão grande que silenciou por completo a tempestade lá fora, os isolando do que quer que acontecia na praia.
O que aconteceu a seguir foi literalmente um borrão roxo de energia e calor, e antes que se dessem conta, foram arrastados por uma força esmagadora a uma velocidade impossível. Quando finalmente a magia cessou, seus corpos desabaram em uma enseada rodeada de floresta. O sol brilhava acima imperioso, como se nunca houvesse tido qualquer resquício de tempestade.
— Conseguimos? — vacilou Henrique, virando enquanto forçava suas pernas para se levantar. Seus olhos procuraram por Nadine, mas quando a viu, o sangue gelou em suas veias.
O corpo da feiticeira jazia inerte nas areias quentes da praia, congelado na mesma posição em que conjurara sua magia. Um líquido escuro e viscoso escorria de seu nariz e orelhas.
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Zaki soube que Nadine aprontaria alguma coisa desde quando acordou de manhã. Tudo parecia exatamente normal na vila, mas havia algo impregnado no ar. Ele podia sentir aquela aura de magia os envolvendo como um fino véu delicado, imperceptível a olhos comuns, mas tão forte e real como a ligação que os unia.
O jovem malgaxe preferiu não dizer nada a sua avó. Fazia três dias que o incêndio sobrenatural quase os destruira e todos ainda estavam muito ocupados com a reconstrução do lugar. Skyller havia convocado uma reunião de emergência com Makanda e a alertado sobre a trégua de sete dias, o que lhes dava apenas mais quatro para se preparem para a nova batalha. Porém, desde que sofrera um motim por parte de seus homens, Skyller parecia mais perdido do que nunca. Estavam com dificuldades em manter o restante dos piratas alinhados, e mesmo com o forte em sua potência máxima, ele teria que recorrer, mais uma vez, à ajuda dos malgaxe para sair vitorioso.
Como se não bastasse, a questão do filho perdido consumia sua alma. Mais de uma vez, Skyller pensou em abandonar tudo para desbravar o mar em busca de Oliver sozinho, tendo Makanda que assumir o papel de trazê-lo de volta à realidade, fazendo-o enxergar que perder seu líder às vésperas de uma guerra não faria qualquer bem ao povo de Libertália.
Por tudo isso, Zaki estava sozinho na enseada quando viu tudo acontecer: um borrão de energia roxa atingiu o solo com a potência de mil raios, deixando várias palmeiras torradas ao redor da praia. A magia de Nadine formava uma espécie de casulo, que se dissolveu como algodão doce na água assim que tocou nas areias da enseada, revelando a silhueta de pelo menos uma dezena de piratas desmaiados. Os amotinados. Os pelos dos braços de Zaki se eriçaram. Ele nunca havia sentido uma força tão poderosa quanto aquela antes, uma magia que nem mesmo sua avó seria capaz de realizar.
Assim que o feitiço cessou, todo o seu assombro e admiração foram substituídos por medo. Os corpos caídos ao chão começavam a se remexer, ainda muito zonzos para se levantar, mas um deles permanecia imóvel. Seu coração ficou apertado quando ele percebeu que não conseguia sentir a presença de Nadine.
Zaki correu em direção ao corpo, e assim que viu o estado em que se encontrava, sentiu que um punhal de gelo atravessava suas tripas. Caiu de joelhos, debruçando-se sobre o corpo inerte, tentando limpar o sangue daquele rosto que ele tanto amava, enquanto lágrimas lavavam-lhe a face.
— Minha garota teimosa... o que foi que você fez? — sussurrou ele, a voz alquebrada.
Henrique tinha sido o primeiro a conseguir ficar de pé e aproximou-se deles devagar, engolindo em seco.
— Zaki? Ela está...? — disse ele, não conseguindo completar a frase.
Logo Elisa, Oliver e Omar juntaram-se a ele, formando um semicírculo fúnebre ao redor do corpo, mas Zaki mal os notou. Só conseguia enxergar Nadine a sua frente e só conseguia pensar que não podia suportar perdê-la. A discussão que tiveram antes de sua partida doía-lhe na alma. Não conseguindo controlar o choro, ele inclinou-se sobre ela, apoiando a cabeça em seu peito. A batida era fraca e quase imperceptível, mas de algum jeito estava lá. O coração ainda batia. Zaki secou suas lágrimas, agarrando-se à esperança que agora o invadia.
— Ela está viva!
Antes que pudesse notar, Makanda estava ao seu lado, analisando a situação com uma calma impenetrável. Os piratas da encosta já estavam em pé e olhavam uns para os outros, tentando entender o que tinha acontecido.
— Zaki, leve-a para dentro e prepare uma bacia com água morna — ordenou ela sem se alterar. — Nadine ultrapassou todos os limites da magia, mesmo para uma híbrida. É um milagre que ainda esteja viva.
Zaki pegou-a no colo com cuidado e, um segundo depois, tinha desaparecido com ela para o interior da cabana.
— Ela vai ficar bem? — arquejou Elisa.
Makanda fixou seus perturbadores olhos negros nela, mas antes que pudesse dizer algo, um dos piratas aproximou-se do grupo empunhando uma espada. Estava encharcado da cabeça aos pés e tremia como vara verde, mal conseguindo sustentar a arma a uma altura mortal.
— Ei, velha! Por que estamos aqui de volta? — seu tom claramente tinha a intenção de ser ameaçador. — Como ousa interferir, bruxa maldita!
Makanda o olhou sem expressão alguma. Alguns outros piratas vinham se juntar a ele, com a mesma expressão mista de assombro e confusão.
— Foi um erro terem deixado a ilha. Vocês foram reclamados de volta.
Mal se aguentando em pé, o pirata ergueu sua espada para a feiticeira.
— E você será reclamada ao inferno! Vamos colocar essa vila maldita abaixo!
Makanda agarrou a espada com força incomum, fixando nele um olhar frio e cortante. Se é que era possível, o homem começou a tremer ainda mais.
— Ninguém tocará na minha vila enquanto a trégua firmada entre Fox e Skyller estiver em vigor. Agora saiam daqui antes que eu perca a paciência.
O pirata sentiu algo quente descer por entre as pernas. Perdendo a pouca dignidade que lhe restava, deixou a espada cair e saiu em disparada para o interior da floresta. Os outros seguiram o seu exemplo.
— Bem, vejo que o perigo já passou — disse Omar em tom displicente. — Eu já vou indo então...
Elisa o agarrou pelas costas da camisa antes que ele pudesse escapar.
— Você não vai a lugar algum. Nós dois ainda temos muito o que conversar.
O garoto gemeu à contragosto.
— Vamos entrar, todos — convidou Makanda. — Nadine precisa de cuidados especiais, não há tempo a perder.
Oliver e Omar seguiram a feiticeira, mas notando que Henrique hesitava, Elisa virou-se para ele.
— O que foi?
— Preciso encontrar John Fox.
— Agora?
— Já perdi muito tempo...
Elisa olhou-o longamente com uma expressão preocupada.
— Você não pode só deixar isso pra lá?
Henrique passou a mão pela tatuagem em seu braço.
— É o meu destino, Elisa.
Por um instante, Elisa pensou em contar-lhe a verdade, em dizer que a profecia na verdade se referia a ela e a sua família e que ele não precisava se prender a um plano de vingança sem sentido traçado por uma mulher que estava morta há tantos anos. Mas ao olhar em seus olhos, viu algo neles que a paralisou. Eles tinham um brilho doentio de cobiça que a fazia temer por ele. Talvez não fosse só pela vingança ou a profecia em si. Talvez ele quisesse apoderar-se do tesouro.
Então Elisa fez algo que não tinha planejado: abraçou-o apertado, como se aquela fosse a última vez em que o veria.
— Boa sorte — sussurrou em seu ouvido, plantando um beijo em sua bochecha.
Henrique sentiu-se embriagado por aquele gesto, mas quando deu-se por si, ela já o havia soltado. Por um instante apenas ficou perdido em seu olhar, tentando memorizar cada traço de seu rosto em sua mente.
— Cuide bem de Nadine — disse, improvisando um sorriso.
— Farei o que puder. Embora ela já tenha um cuidador dedicado.
Ele assentiu vagamente antes de deixá-la. Elisa ficou observando enquanto Henrique desaparecia no horizonte como uma miragem que se derretia no ar. Não conseguia deixar de sentir o coração apertado.
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Nas entranhas da ilha existia um lugar onde nenhum ser vivo ousava chegar. Envolto por uma névoa espessa, parecia eternamente congelado no tempo. Se alguma criatura perdida por acaso viesse parar ali, morreria com o frio intenso que permanentemente pairava no ar. Era um lugar lúgubre, selado por uma abóbada de carvalhos distorcidos, seus troncos formando figuras terríveis de morte e rostos congelados em expressões de pânico e sofrimento, mergulhando-o em trevas eternas. O chão transpirava com uma umidade sobrenatural, tornando o ambiente ainda mais inóspito.
Apesar de nada vivo poder se proliferar ali, duas figuras espectrais flutuavam por entre a névoa. Desceram circulando pela abóbada vagarosamente, seus longos mantos misturando-se e confundindo-se como se fossem uma coisa só. Quando finalmente tocaram o solo pantanoso, encararam-se solenemente em uma disputa tácita.
O primeiro, em um manto negro e expressão severa, abriu a boca, revelando horríveis dentes serrilhados.
— Eles estão de volta — sentenciou ele em uma voz metálica que poderia fatiar a névoa. — Finalmente cruzaram a linha. Como se sente tendo perdido para mim mais uma vez, Sumé?
O outro o encarou com uma expressão de profunda tristeza. Seu manto branco rodeava-o em uma aura semiapagada, como se lhe custasse manter seu brilho.
— Ainda não acabou. Eles ainda podem fazer a coisa certa, Zumé.
A gargalhada malévola de Zumé cortou o ar.
— Ainda com esperanças, depois de todo esse tempo? Não se lembra de quando o garoto Omar chegou aqui, violando nossa maldição? Ele deveria ter sido o último.
— Henrique e Elisa não são como ele.
— Confraternizando com piratas? Não seja tolo, eles querem o que todos os outros querem. Posso ver a alma do garoto daqui, está envenenada com a mesma sombra de ambição, de cobiça que todos os outros.
— Mas Elisa é diferente. Mesmo você não pode negar isso.
— Era o que você dizia de Haya também, e olhe para a sua preferida agora. Continua enterrada nas sombras de seu passado negro, tão dedicada a sua amargura que é incapaz de vislumbrar algo em seu futuro. Ela sabe que há muito deveria estar morta.
— Ela tem o sangue de William Kidd. Se alguém pode acabar com isso, é um de seus descendentes.
— Um maldito pirata! Igual ou pior a todos os outros, independente do que diga essa besteira de profecia. Mas foi isso que você disse a Nadine quando conseguiu me afastar dela, não é? Disse o que pensam aqueles tolos malgaxes, que Haya poderia ser a salvadora. Mas sua protegida não poderá fazer nada por eles, ela foi muito longe dessa vez clamando pela minha ajuda e usando o poder proibido.
— Ela clamou pela ajuda do pai, não necessariamente você. Não é culpa dela não saber distinguir as duas partes.
— Uma tola ignorante, é nela que deposita sua confiança? Depois de hoje, sua alma está mais envenenada do que qualquer outra. Renda-se a mim, Sumé, quanto antes fizer isso mais cedo estaremos livres desse purgatório infectado. Lembre-se de como era antes. Podemos alcançar o paraíso uma vez mais.
O manto de Sumé brilhou uma última vez, abrindo-se como asas de chumbo sobre o espírito mirrado de Zumé.
— Ainda não acabou. O paraíso pode esperar.
Em um rugido de fúria descontrolada, Zumé mergulhou para a luz e um redemoinho alvinegro subiu em direção à cúpula da abóbada de carvalhos, dissolvendo em escuridão os dois espíritos rivais.
Ahoy, marujos, como vocês estão?
Estou muito feliz hoje porque Libertália entrou para a lista de destaques do mês do perfil @FantasiaLP!!!
Obrigada por cada voto e cada comentário, vocês me incentivam a seguir em frente <3'
E o que dizer do capítulo de hoje? O que será que essa história ainda nos reserva?
Bons ventos e até breve ;)
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