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XXXV. Comfort and safety

Harry estava muito confuso.

Ele respirava fundo e rápido, sentado no chão enquanto as lágrimas caíam de seus olhos e a água do chuveiro escorria por seu corpo. Sempre que fechava os olhos, a imagem do rosto de Therion tão próximo ao seu voltava a sua mente. Os olhos brilhantes o encarando com tanto carinho. A textura dos lábios dele sobre os seus. O toque de suas mãos em seu rosto.

Ah, Merlin! Harry havia acabado de ter seu primeiro beijo com um de seus melhores amigos!

Não que não quisesse beijar Therion. Ele queria, e muito. Aceitou por livre e espontânea vontade e voltou a beijá-lo logo em seguida. Se não quisesse, teria impedido que continuasse. Porém, isso deixou-o muito confuso sobre seus sentimentos e sobre si mesmo.

Pensou no que havia conversado com Canopus alguns dias antes, quando o garoto confessou para si que era gay. Disse que entendia Harry gostar do seu irmão… E de garotos.

Harry não gostava muito de pensar sobre gostar de garotos. Sempre pensava que se o fizesse levaria uma grande surra do tio, que já havia demonstrado antes seu desgosto por qualquer insinuação de relacionamentos homoafetivos. Queria evitar mais conflitos do que já gerava naquela casa sem muito esforço que o levassem a ser castigado.

Mas no fundo, tinha o conhecimento de que gostava. E também de que já havia se interessado por garotas.

Não sabia o que o deixava mais confuso: ter sentimentos pelo melhor amigo ou por um garoto.

Queria muito conseguir enfim entender tudo o que sentia, o que era… Mas também não queria estragar sua amizade. Therion era importante demais para ele.

Harry queria muito poder conversar com alguém naquele momento. Alguém que o ajudasse a ficar menos confuso e não fazer algo que afastasse Therion de uma vez por todas da sua vida.

Ele saiu do banheiro e correu para o quarto, vestiu seu pijama e encolheu-se em sua cama, escorado contra a cabeceira. Ficou sentado observando outra vez o desenho no caderno do pai, que chamou tanto sua atenção por lembrá-lo de Therion.

Adoraria que James estivesse ali para poder conversar consigo naquele momento. Então, enrolou-se com a jaqueta do pai, buscando um pouco de conforto ali.

No quarto à frente, Therion estava sentado em sua cama, encolhido e abraçando o próprio corpo com os olhos cheios de lágrimas, sentindo-se culpado por, talvez, ter feito algo que acabaria com sua relação com Harry. Ele havia gostado tanto, sentido-se tão bem, mas então… Viu o quanto Potter desesperou-se e ficou completamente perdido e confuso, fugindo para longe dele.

Ele ergueu os olhos para o irmão gêmeo, que estava abraçando-o de lado tentando confortá-lo.

— Eu sou um idiota.

— Costuma depender muito do momento.

— Canis!

— Estou brincando! — Canopus riu baixo, secando a lágrima que escorreu pelo rosto do irmão. — Não gosto de te ver chorar. Está tudo bem.

— Não, não está. Eu estraguei tudo!

— Um beijo não vai fazer o Harry deixar de ser nosso amigo, Therry.

— E-eu… Acho que Harry nunca mais vai querer olhar na minha cara. Eu vi, Canis! Eu o assustei, e-eu… Eu o deixei confuso e estraguei tudo!

— Eu posso conversar com ele, mas não pense assim… Não sabemos o que Harry está pensando. Ele pode só… Ter ficado ansioso demais.

— Eu sei do que estou falando.

— Therry…

Eu sei! E-eu… Eu senti! Ele…

Therion abaixou a cabeça e enterrou as mãos em seus cabelos, sentindo-a começar a doer e latejar. Seu desespero ao pensar que pode ter afastado Harry apenas piorava tudo, lhe deixava mal. O que quer que Canopus tenha começado a falar outra vez, não deu atenção ou ouviu direito.

Fechou os olhos com força e o beijo voltou a sua mente. Naquele momento, ele não conseguia pensar em mais nada. Seu coração batia tão forte, seu corpo parecia tão leve. Ele sentiu uma grande emoção dentro de si, uma explosão de sentimentos que corriam por cada célula de seu organismo. Foi como se pudesse sentir tudo de uma vez: os seus sentimentos, os de Harry, a energia correndo em suas veias.

Foi uma sensação e um sentimento forte demais. Muito maior do que qualquer coisa que já tenha sentido na vida

Aquilo era tudo o que mais queria e resistia arduamente para não fazer. Não queria que acabasse exatamente daquela forma: com Harry se afastando assustado.

Ele estava enganado por pensar em algum segundo que Harry também queria. Potter só o via como amigo… Apenas isso.

Olhar para Harry e perceber o quanto estava assustado e confuso pelo que aconteceu o quebrou. Não era o que queria que acontecesse.

— Therion! — Canopus exclamou alto, enfim conseguindo a atenção do irmão de volta. — Vai ficar tudo bem. Foi o primeiro beijo de vocês, é normal ficar um pouco nervoso.

— Por que você ficou também?

— Meu caso não deve ser usado de exemplo. Eu não quis beijar o Malfoy e com certeza isso não vai se repetir.

— Harry deve pensar o mesmo sobre mim.

— Talvez ele esteja mais confuso por acabar de beijar um garoto do que por não querer ter te beijado.

Canopus lembrava da conversa que teve com Harry há alguns dias. Diferente dele próprio, o garoto não parecia ter se entendido ainda naquela questão de gostar de outros garotos. Para ele era natural, mas entendia que não era o mesmo para todos.

— Diferente de nós dois, Harry não cresceu com alguém que sempre tenha dito que todas as formas de amor são válidas e que gostar de alguém nunca será errado, não importa o gênero.

— Acho que ele não gosta de mim assim.

— Tenho minhas dúvidas. Mas você enfim está admitindo que gosta dele não só como amigo?

Therion não respondeu. Ele vinha tentando negar a si mesmo, mas era impossível. A todo momento queria estar ao lado de Harry, segurar sua mão, abraçá-lo, descobrir como seria beijá-lo — e enfim descobriu, e era muito bom.

É, talvez ele realmente estivesse gostando de Harry há muito mais tempo do que queria admitir. Só um pouquinho.

— Se você for rir ou fazer alguma provocação, eu te mato.

— Vou me esforçar — Canopus respondeu, sorrindo levemente de canto. Ele bagunçou os cabelos do irmão. — Mas pode lamentar de amores que eu estou aqui, irmãozinho.

— Talvez eu goste dele… Um pouco.

— Um pouco?

— É complicado! Eu… Eu não quero que ele deixe de ser meu amigo e fique desconfortável por ter me deixado levar e meus sentimentos irem além da amizade…

Canis suspirou e tornou a abraçar o irmão de lado, sendo rapidamente retribuído.

— Eu sei… Vamos esperar um pouco. E o melhor que pode fazer é tentar conversar.

— Não sei como você consegue dar conselhos tão sensatos às vezes sendo tão cabeça-dura.

— Quietinho, Regulus — Canopus ordenou e prosseguiu: — Nesse tipo de situação, o melhor é resolver de uma vez antes que realmente fique ruim. Espera as coisas se acalmarem e conversa com ele. Foi exatamente o que eu fiz com Malfoy e deu tudo certo, resolvemos o assunto daquele beijo acidental rapidamente.

— Você e Malfoy se odeiam.

— Mas conversamos e entramos num consenso que não queremos que se repita e continuaríamos sendo como sempre. Você e Harry podem resolver o contrário.

Therion riu baixo. Não tinha tanta certeza de que Harry iria querer beijá-lo de novo.

Mas ele com certeza queria.

— E se ele nunca mais falar comigo?

— Então teremos uma conversinha muito séria que não vai acabar nada bem pra ele — Canopus disse firmemente. — Ninguém magoa o meu irmão e sai livre, nem mesmo o Harry.

Ele apertou o irmão naquele abraço, e Therion sorriu fraco, deixando as últimas lágrimas caírem em silêncio. Por mais que não quisesse imaginar Canopus fazendo algo contra Harry, às vezes apreciava quando ele agia daquele jeito de irmão protetor.

Therion também protegeria o irmão de todos que quisessem machucá-lo ou o magoassem. Eram gêmeos, sempre prontos para estar ali um pelo outro, não importa as implicâncias e pequenas discussões às vezes.

— Que tal você se preparar para voltarmos a sala e esquecermos um pouco isso para nos divertirmos um pouco com nossos amigos?

Therion assentiu, afastando-se do irmão e secando o rosto molhado. Ele saiu do quarto e olhou por alguns instantes para a porta de Harry, que estava fechada.

Tomou um banho e vestiu um pijama, descendo para a sala de estar junto com o irmão. Merliah, Hermione e Rony estavam entretidos numa partida de dominó deitados no chão, já todos com seus pijamas.

Merliah, que estava agarrada ao seu gato, jogou a última peça e comemorou animada sua vitória na partida.

— Desisto! Só você tá ganhando — resmungou Rony.

— Aceite a derrota, Rony. Eu sou mestra nesse jogo — ela ergueu os olhos para os amigos. — Venham jogar também!

— Prepare-se para perder! — Canopus disse.

Os cinco entraram em uma nova partida.

Harry demorou mais um tempo para aparecer. Ele desceu as escadas devagar e seguiu até os outros, forçando um sorriso e tentando parecer bem e que não estivera chorando ou surtando em seu quarto há pouco, tendo uma grande reflexão e crise existencial. Seu olhar imediatamente cruzou com o de Therion, e seu rosto ficou vermelho de maneira quase instantânea.

O coração de ambos começou a acelerar, aquele turbilhão de emoções mais uma vez.

A mente de Potter quase entrou em curto circuito ao encarar o Black, e ele rapidamente desviou o olhar. Therion engoliu em seco ao observá-lo, sentindo o coração apertar.

Harry sentou-se entre Hermione e Rony, sob o olhar atento do Black, ainda sem conseguir processar exatamente o que estava fazendo, muito confuso com o que havia acontecido.

Therion fechou os olhos e levou as mãos às têmporas, enquanto o irmão jogava entre eles seu baralho de snap explosivo para todos jogarem.

Merliah semicerrou os olhos, encarando-os desconfiada, e puxou Canis pela manga da camisa.

— O que rolou com o casalzinho que não admite que são casal? — perguntou sussurrando.

— Algo bem forte… Tem que pedir a Therion te explicar os detalhes.

— Vai deixar a fofoca pela metade?!

— Liah, depois! — Therion falou.

— Não era para você ouvir!

Eles começaram a jogar, e a todo momento os olhares de Harry e Therion acabavam se encontrando.

Sirius e Remus foram até eles e observaram um pouco afastados todos se divertindo. Black prestou atenção em como o mais novo dos filhos passou parte do jogo respirando fundo e levando as mãos a cabeça, o que não era a primeira vez que o via fazer.

O lembrou de seu irmão. Ele fazia muito isso, principalmente quando estava muito nervoso. Não demorou a perceber que Therion deveria estar igual, mas não sabia o que teria o deixando inquieto, nem se já havia conquistado abertura o suficiente para perguntar.

Também percebeu como, mesmo tentando aparentar normalidade, Lupin sempre dava pequenos saltos ou fazia uma leve expressão incômoda quando alguma das cartas explodia, discretamente levando uma mão ao ouvido. Sinal claro de que sua audição começava a ficar mais sensível com a aproximação da lua cheia, mas que tentava esconder.

— Está tarde. Acho melhor todos dormirmos, hm? — Sirius falou, aproximando-se do grupo de jovens.

— Ah, Sirius! Não seja estraga prazeres, estou quase vencendo! — Canopus resmungou.

— Amanhã de manhã você pode vencer quantas partidas quiser.

— Papai — o garoto choramingou, olhando na direção de Remus.

— Sirius tem razão. Já tivemos uma longa festa hoje, hora de descansar — Remus concordou, agradecendo Sirius mentalmente.

Não quis atrapalhar o jogo e diversão deles, mas o som das explosões das cartas estavam incomodando seus ouvidos. Estavam muito mais sensíveis, ele ouvia tudo com muito mais intensidade que o normal — e sua audição já era naturalmente mais sensível por causa da licantropia.

Therion olhou para o pai e depois para o irmão.

— Melhor acabar o jogo mesmo, Canis. As explosões estão incomodando o papai.

— Ah… Estamos entrando na semana da lua cheia — lembrou Canopus. — Desculpa, papai.

— Está tudo bem, Canis. Não incomoda tanto assim, já estou acostumado — Remus tranquilizou-o.

— O que… O que isso tem a ver com a lua cheia? — Harry perguntou.

— A audição dos lobisomens fica mais sensível perto da lua cheia — Hermione respondeu. — Merlin! Você não fez a redação do Snape?

— Não. Ele nem era nosso professor da matéria.

— E eu já convivo com isso há 30 anos, então não é uma grande questão. Vamos nos aprontar para dormir — Remus falou.

Canopus guardou seu baralho e as peças de dominó, e logo todos começaram a se organizar em meio aos travesseiros e lençóis sobre o tapete para dormir.

Harry engoliu em seco quando o gêmeo mais velho se deitou e percebeu que o espaço restante ficaria ao lado do outro, que estava bebendo um grande copo d'água ao lado de Sirius, que levou para ele. Respirou fundo, tentando não entrar em pânico ou pensar naquele beijo de novo.

Therion deitou-se e olhou hesitante para Harry.

— Não vai deitar, Harry? — Remus perguntou. — Quer alguma coisa?

— N-não, não quero nada — disse. — Er… Obrigado por hoje, de novo.

— Tudo pelo seu dia — Sirius disse e beijou a testa do afilhado. — Boa noite.

— Boa noite.

Harry respirou fundo mais uma vez e deitou-se ao lado de Therion, ficando rapidamente de costas para ele e de frente para Canis. Therion comprimiu os lábios, apenas observando as costas de Harry viradas para si. Acabou por encolher-se debaixo do cobertor, puxando-o até sua cabeça.

Todos se desejaram uma boa noite e Remus e Sirius deixaram-nos sozinhos, subindo até o quarto deles. Black ficou olhando para o céu pela janela, enquanto Lupin tomava o seu banho.

Quando Remus voltou vestido com sua roupa de dormir, encontrou Sirius na janela segurando duas fotografias, com uma expressão pensativa.

— Foi bom ver Harry feliz hoje — Black comentou de repente.

— Sim — Remus respondeu, se aproximando de Sirius. — Ele pareceu bem mais animado hoje. Estamos fazendo um bom trabalho.

— Me senti um pouco mais leve de poder dar isso a ele… Se Regulus estivesse aqui, eu com certeza faria algo ainda maior.

Lupin sorriu fraco e compreensivo, chegando ainda mais perto e levando delicadamente uma de suas mãos até o rosto de Sirius.

— Pensou muito nele hoje também, não foi?

— Sim… Tentei não deixar isso me atrapalhar e focar no Harry, mas… Difícil não pensar no meu irmão quando hoje também é aniversário dele.

— Não precisava. Tenho certeza que Harry entenderia se você não estivesse 100% bem por causa disso.

Sirius comprimiu os lábios, respirando fundo. Ele e Remus baixaram o olhar para uma das fotografias em suas mãos. Era a primeira vez depois de muitos anos que Lupin via alguma imagem do caçula dos Black.

O irmão de Sirius sorria timidamente, sentado no sofá da sala de estar da casa dos Potter, sendo abraçado pelos ombros por ele, que estava com um grande sorriso, enquanto segurava um presente embrulhado junto ao corpo. Do seu outro lado, James Potter abraçava sua cintura e ria. Remus estava ao lado de Sirius, bagunçando os cabelos do Black mais novo. Logo atrás, Karina pendurava-se nas costas do sofá para abraçar o pescoço do jovem Black por trás junto do irmão gêmeo, Killian, e de uma jovem garota de cabelos loiros muito claros, a melhor amiga do centro daquela foto, Pandora.

Uma das últimas vezes em que estiveram todos eles juntos reunidos. 31 de julho de 1977, aniversário de 16 anos de Regulus Black.

Exatamente três anos depois daquele dia, estava nascendo Harry James Potter. Agora, ali estavam eles, 17 anos após aquela fotografia olhando diretamente para ela e outra tirada na mesma data, há poucas horas.

Sirius também segurava uma das fotos tiradas da câmera mágica instantânea dos gêmeos durante a festa. Harry em pé atrás de seu bolo de aniversário, tendo a cintura abraçada por Therion e Canopus com os braços sobre seus ombros. Sirius e Remus estavam logo atrás abraçando-os juntos. Hermione, Merliah e Rony também estavam junto a eles compondo a foto.

Black e Lupin eram os únicos pontos em comum em ambas as imagens, quase duas décadas de diferença entre cada uma delas. As últimas pessoas que restaram vivas da primeira foto.

— Encontrei essa foto do aniversário do Regulus em Godric's Hollow nas coisas de James. Espero que Harry me perdoe por querer ficar com essa.

— Ele vai entender — Remus disse e beijou o rosto de Sirius, que passou um dos braços ao redor de sua cintura e continuou a encarar a foto do irmão.

A semelhança entre eles era quase inacreditável de tão grande. Os mesmos cabelos escuros, embora os do Black mais novo fossem mais ondulados; os mesmos olhos azuis-acinzentados; o nariz fino e maxilar marcado. Regulus possuía uma marca de nascença, na leteral do rosto próximo ao olho esquerdo que Remus já havia visto também em Walburga, mas Sirius não a possuía, porém essas pequenas diferenças entre eles eram quase insignificantes, ninguém diria que não eram irmãos, e talvez até pudessem confundi-los.

James costumava brincar que Regulus era o irmão gêmeo de Sirius que chegou dois anos atrasado.

Regulus sempre foi o que Sirius talvez seria se fosse mais como seus pais queriam. Uma versão melhor que seria o orgulho Black que ele não foi.

Ser um orgulho Black custou-lhe a vida e a chance de ser feliz. Sirius não pode salvá-lo, assim como não fez com Karina e James. Mas aquela culpa era ainda maior, pois ele teve a chance e a rejeitou, deixando-se levar pela mágoa e amargura.

Sirius não tinha mais o irmão, mas cuidaria da sua nova família como não não pôde fazer com ele. Fazer o melhor por Harry era algo que sentia que precisava fazer não só por James, mas também por não querer falhar como falhou com Regulus.

Não permitiria que o afilhado sofresse o mesmo destino. Faria de tudo por ele, absolutamente tudo.

Por ele, pelos filhos e por Remus.

— Venha, vamos dormir — Remus chamou. — Amanhã ainda precisarei trabalhar e você vai precisar de energia para vigiar seis bruxos de 14 anos até a hora do almoço.

— Tem certeza de que quer ir? Está chegando a lua cheia, seus ouvidos já estão sensíveis. Logo os outros efeitos vão ficar mais fortes — disse com preocupação.

— Pelo menos por mais alguns dias. E vou ter tempo o bastante para pensar como deixar os meninos em casa. Não quero que eles venham comigo e se machuquem de novo… Nem deixar Harry sozinho porque vocês vão estar comigo.

— Você ainda tem medo por causa da Casa dos Gritos?

— Vocês demoraram até estarem completamente recuperados, Canis podia ter morrido… Não quero correr esse risco.

Sirius suspirou, olhando compreensivo para Remus enquanto guardava as fotos e seguiam para a cama. Ele sabia o quanto Lupin ainda era afetado pelo medo de machucar os filhos de novo caso se descontrole demais na lua cheia, mesmo que estejam nas formas animagas.

Remus estava tão cansado que caiu no sono em poucos minutos, aconchegado nos braços de Sirius e deitando a cabeça em seu peito.

Foi um dia longo.

***

A luz já adentrava fracamente pela janela, mas os seis jovens bruxos continuavam a dormir no chão da sala de estar quando Sirius e Remus estavam preparando o café da manhã. Cada um espalhado de alguma forma.

Canopus estava de bruços, abraçando seu travesseiro. Ao lado, Merliah estava de lado com os braços estirados para frente, uma das mãos caída sobre a cabeça do amigo. Hermione já havia se livrado de metade do cobertor, de costas para Stuart. Rony estava completamente estirado, com o cobertor embolado aos seus pés.

Por mais que tenha deitado o mais afastado que podia de Therion, durante a noite Harry inconscientemente acabou ficando de frente para ele e mais perto, com um dos braços sobre ele, abraçando-o levemente, enquanto o outro tinha o rosto enterrado próximo ao seu pescoço.

Remus já havia saído quando eles começaram a acordar. Rony e Hermione foram os primeiros, embora não tivessem forças para mover-se além de bocejar e olhar para o teto. Foram seguidos por Canis, que resmungou baixo enquanto empurrava os braços de Merliah, que acordou em seguida.

Harry acordou pouco depois, percebendo após alguns instantes que estava abraçado a Therion. Imediatamente o nervosismo começou a se fazer presente, mas ele não teve coragem de se afastar rapidamente, pois não queria acordá-lo.

Ele respirou fundo algumas vezes, afastando seu braço devagar e alçando os óculos largados ao lado no chão, colocando-os em seu rosto. Observou o rosto de Therion a sua frente, sem mover-se mais, paralisado.

Quando o Black estava por fim acordando, ele se moveu inquieto, levando as mãos à cabeça. Estava doendo outra vez, com milhares de pensamentos confusos e sem sentido. Harry então afastou-se, mas ainda continuou o encarando, um pouco preocupado.

— Essa confusão logo cedo… — ele murmurou, massageando as têmporas.

Therion não conseguia organizar os próprios pensamentos, um pouco confuso e desnorteado. Era comum sentir-se assim logo ao acordar, mas parecia pior.

Sirius surgiu pouco depois com um sorriso calmo no rosto.

— Bom dia!

— Bom dia — todos disseram em uníssono, um pouco sonolentos, enquanto se sentavam.

— Ai… Minha cabeça está explodindo… — Therion murmurou baixo, com as mãos na cabeça e a abaixando entre os joelhos.

— Nem bebemos nada além de cerveja amanteigada e você está de ressaca? — Merliah provocou e riu baixo, com a voz carregada de sono.

— Dois de cada vez indo se preparar para o café da manhã. Podem usar o banheiro do meu quarto e do Moony — Sirius falou. — Theo, vá primeiro, no meu quarto. Banheira, banho quente… Vai ajudar.

O olhar do garoto rapidamente foi para Harry ao lado, que o encarava, mas desviou o olhar logo em seguida e se levantou. Levantou-se também e começou a caminhar devagar até a escada, logo sentindo as mãos de Sirius delicadamente em seus ombros.

— Tente relaxar, acho que vai ajudar a dor passar.

Ele olhou para Sirius, franzindo o cenho. Apenas assentiu e subiu para o quarto do pai, indo até o banheiro e não demorando a entrar na banheira que havia ali, água quente como recomendado.

Mais tarde, estavam todos tomando café da manhã juntos. Harry a todo momento voltava seu olhar para Therion, mas logo desviava, enquanto os outros ao redor conversavam sobre assuntos aleatórios. Não se falaram entre si, mas sempre acabavam se entreolhando.

Hermione, Merliah e Rony permaneceram ali até a hora do almoço. Passearam pelo vilarejo por um tempo, aproveitando as últimas horas até se despedirem e aguardarem a próxima chance de se reunirem. Remus almoçou em casa com eles, como faz em alguns dias da semana em que não possuía muito trabalho.

Rony voltou para casa pela lareira. Antes de ir, abraçou Harry para se despedir.

— Eu te mando uma carta depois, perto da Copa. Vou falar com meu pai para irmos pela mesma chave de portal! — ele disse.

— Tudo bem. Tchau!

Weasley seguiu até a lareira com sua mochila e pegou um pouco de pó de Flu.

— A Toca! — disse e jogou o pó sobre os pés, sumindo entre as chamas verdes.

Remus levaria Merliah e Hermione até Londres pela lareira, guiando Granger até a estação de metrô para ir para sua casa e Stuart até a joalheria. Ele preparou-se para ir, verificando se estava tudo bem com todos.

Depois que saíram, Harry voltou para o próprio quarto, onde ficou sentado na cama. Ainda muito pensativo e confuso, ele pegou o novo caderno que ganhou de presente e começou a desenhar. Isso sempre o ajudou a espairecer e relaxar.

Assim os dias foram se passando. Harry conversava um pouco com Canis, com Sirius principalmente, mas evitava ficar muito tempo com Therion. Sempre que o fazia, seu rosto ficava vermelho como tomate ao pensar no beijo.

Enquanto a semana seguia, a cada dia que Remus voltava do trabalho parecia mais exausto. Ia dormir mais cedo, completamente cansado, e todos evitavam fazer barulhos altos e incômodos. Pela primeira vez, Potter conseguiu observar e perceber de perto os efeitos da licantropia em Lupin e notar que muito do que ele tanto estranhava em Hogwarts em sua saúde eram apenas os sinais de um licantropo perto da lua cheia.

Ele não passava mais tanto tempo com Therion, mas via agora o garoto e o irmão trabalhando em conjunto com Sirius para cuidar de Remus. Tentou ajudar como podia, aprendendo mais sobre aquela rotina pré lua cheia.

Remus dormia mais cedo e acordava com mais olheiras. Seus pratos durante as refeições estavam muito mais cheios que o normal — que já era muito mais que o dos outros no cotidiano. Fazia algumas coisas em casa um tanto inquieto, sempre ocupando-se com alguma coisa. Conseguia sentir o cheiro de coisas que estavam a quilômetros dele e ouvir cada mínimo passo na casa. Dependendo do momento e da proximidade, ele conseguia até mesmo ouvir os corações batendo.

Ouvir 7 batimentos cardíacos a sua volta quando estavam todos juntos na sala de estar a noite lhe fazia necessário muita calma e paciência.

Harry enfim percebeu porque sempre antes de "ficar doente" em Hogwarts Remus focava em assuntos teóricos que mantinham a aula mais silenciosa, raramente fazia as refeições no salão principal e ficava a maior parte do tempo em sua sala. Era para evitar o excessivo barulho e bagunça da multidão de alunos.

Quanto mais próximo da lua cheia, mais as características lupinas de Remus se afloravam. E depois de 30 anos, ele já havia se acostumado e aprendido a lidar, mas ainda não era fácil. Na época que era estudante, mais jovem, era certamente muito pior.

No período que estudava em Hogwarts, Remus sempre passava as semanas de lua cheia enfurnado no canto mais silencioso da biblioteca com seus livros. Atualmente, em casa, Sirius e seus filhos tentavam recriar essa atmosfera para deixá-lo confortável.

Canis e Therion nunca ficavam tão comportados quanto em semana de lua cheia.

Quando chegou o dia de fazer compras, os gêmeos insistiram em ir ao mercado junto com Harry para não cansar ainda mais o pai. Lupin escreveu uma grande lista de compras para eles, e assim saíram de casa os três juntos.

— A audição do Remus esses dias quase assusta — Harry comentou.

— Por isso que tentamos deixar a casa o mais silenciosa possível e não falar nada que ele não deva ouvir — Therion falou.

— Acho que era mais difícil quando éramos pequenos. Nós não entendíamos e fazíamos a maior bagunça… — Canopus disse. — Começamos a nos comportar mais quando fomos crescendo e percebendo, e ele nos contou que ouvia tudo com muito mais intensidade.

— Remus sempre foi aberto com vocês sobre a licantropia?

— Bom… O máximo que ele sentia que deveria — Therion respondeu, voltando seu olhar para Potter. — Aprendemos muito mais com nossos livros. Começamos a estudar sobre licantropia quando entendemos porque papai sempre ficava doente…

— E cuidar dele nas luas cheias?

— Sim… Da melhor forma que conseguimos. Mas… Papai nunca gostou de nos preocupar com isso, você já deve ter percebido.

Harry comprimiu os lábios e assentiu, encarando os olhos de Therion. Via em seu olhar que era um assunto delicado e como se preocupava com Remus. Ele tem feito de tudo pelo pai na última semana, mesmo que claramente também não estivesse bem, sempre se queixando de dores de cabeça, principalmente quando estava perto de Harry, ou do próprio pai durante a noite quando ele olhava para a lua pela janela.

Potter lutou a semana inteira contra a vontade de abraçar Therion quando percebia que ele estava mal. Ele queria, mas ao mesmo tempo… Estava tudo muito confuso.

Therion sabia disso… E doía.

E Canopus percebeu o clima de estranheza desde o fim do aniversário de Harry. Ele tentava amenizar tudo, estando tanto ao lado do irmão quanto de Potter. Não iria forçar Harry a conversar sobre o que houve, mas estava pensando quando poderia tentar falar com ele.

Detestava ver o irmão mal por gostar de Harry e pensar não ser recíproco. Mas ele via que era… Tinha quase certeza absoluta disso.

Quando chegaram ao mercado, os três pegaram cestas e começaram a pegar as coisas da lista. Dividiram-se para cada um pegar uma parte das compras e agilizar tudo. Também pegaram algumas coisinhas a mais, pois eles mesmos queriam tentar preparar o jantar daquela vez para deixar que Remus descanse.

A probabilidade dos gêmeos destruírem a cozinha era grande, mas Harry possuía uma habilidade culinária muito maior e os ajudaria nisso.

— Tinham que colocar o molho de tomate tão alto? — Harry resmungou olhando para o topo das prateleiras.

Ele deixou sua cesta no chão e ficou na ponta dos pés para tentar pegar o produto na prateleira mais alta. Bufou frustrado quando não conseguiu alcançar, xingando baixinho quem quer que tenha organizado aquelas prateleiras.

Após minutos de uma falha tentativa, Harry resolveu apelar para medidas alternativas não convencionais para trouxas. Ele olhou ao redor para verificar se havia mais alguém no corredor ou câmeras, não encontrando mais ninguém a vista nem uma câmera em sua direção.

Pegou sua varinha do bolso discretamente. Tentou uma última vez alcançar ficando na ponta dos pés, sem sucesso. Então esticou sua varinha, pronto para tentar usar um feitiço de convocação.

Nunca havia treinado aquele feitiço, mas os gêmeos não o faziam parecer difícil.

Estava prestes a usar o feitiço, quando uma mão surgiu por trás dele e pegou o molho de tomate, e ele sentiu alguém atrás de si. Alguém com um perfume conhecido de flores e ervas que não saía de seus pensamentos.

Ao virar-se, deu de cara com um par de olhos azuis-acinzentados que brilhavam como estrelas.

— Magia no meio de um mercado trouxa, Mini Prongs? Que ousado — Therion falou com um sorriso de canto.

— Eu não consegui alcançar. Infelizmente, não tive um surto de crescimento igual você e Canis esse ano — respondeu, pegando o molho e guardando na sua cesta. — E eu seria discreto.

— Muito discreto um garoto com uma varinha no meio de um mercado.

— Seria rápido. Pelo menos aqui eu tenho a sorte de ser um vilarejo lotado de bruxos e posso usar magia.

Therion riu baixo, não julgando a lógica de Potter. Era realmente vantajoso morar numa região com muitos bruxos como Rowen's Valley ou Godric's Hollow, onde eles sendo menores de idade não precisariam ter muito medo de serem pegos usando magia, sabendo que o Ministério não identificaria quem a fez, apenas onde.

Ele e Harry permaneceram parados frente a frente, com os olhos fixos um no outro. Havia uma certa tensão ali, existente desde o aniversário de Potter sempre que acabavam tão próximos sozinhos. Não disseram mais nada, apenas se encarando.

Há poucos instantes Black havia visto Harry tentar falhamente alcançar o produto na prateleira alta antes de pegar sua varinha. Foi uma cena adorável, bastante fofa para ele até, que não conseguiu evitar um pequeno sorriso em seu rosto. Harry conseguia ser adoravelmente fofo as vezes, como quando suas bochechas ficavam vermelhas e ele sorria timidamente por algo que tenha dito.

Naquele momento, o rosto de Harry ficou vermelho, por não conseguir evitar olhar para os lábios do outro e pensar naquele beijo. Fazer isso o deixava nervoso e confuso demais para conseguir lidar.

Therion então se afastou, coçando a nuca e abaixando o olhar, e ele suspirou. Potter poderia muito bem seguir andando naquele momento e tentar controlar o coração acelerado ou a respiração pesada, mas não pôde deixar de ver o garoto balançar a cabeça, como se algo incomodasse.

Ao mesmo tempo que queria correr, ele não conseguia deixar de pensar e se preocupar. Merlin! O que era exatamente tudo aquilo que estava sentindo?

— Pegou tudo da sua parte? — Therion perguntou cautelosamente.

— Sim, peguei tudo. E Canis?

— Indo para o caixa.

Eles seguiram para o caixa sem dizer mais nada. Saíram do mercado com várias sacolas, mas ainda não seguiram caminho de volta para casa, Canopus seguindo na frente.

— Para onde vamos? — Harry perguntou.

— Açougue — Canis respondeu. — Vamos comprar muita carne para o papai poder comer a semana inteira, quer ele queira ou não.

— E você vai aproveitar a chance para conversar com o seu namoradinho trouxa.

— Obviamente.

Eles adentraram o açougue e rapidamente encontraram Elliot no balcão, ajudando a família, que era dona do lugar. O garoto sorriu amigavelmente para os três.

— Hey, Elli! — Canis o cumprimentou.

— Oi, Canis!

— Passando de babá a atendente hoje?

— Ethan está na casa de um amigo, e eu não posso ficar sem trabalho para fazer — disse, suspirando exausto. — O que irão querer?

— Carne? Estamos num açougue.

O garoto riu.

— É um termo bastante abrangente, Canis. Precisa ser mais específico sobre o tipo de carne e quanto vai querer. E já aviso que estamos sem costelas.

— Harry, você que sabe lidar com estabelecimentos trouxas — Canopus sussurrou para o amigo.

— Quanto exatamente Remus vai comer?  — perguntou no mesmo tom.

— O equivalente para alimentar metade da mesa da Sonserina? — Therion sugeriu, e Harry arregalou os olhos. — Um terço, talvez…?

— Vamos alimentar um lobo ou uma alcatéia inteira?!

— Ele precisa de muita energia!

Harry não questionou, embora estivesse surpreso. Ele fez o pedido e viu Elliot anotar.

— Vão fazer um churrasco pra família toda?

— Meu pai está doente. O medibru… Médico recomendou comer muita carne, sabe? Ficar mais forte… — Canis falou. —  Melhor sobrar do que faltar.

— Ah, sim. PAI, PREPARA 4 QUILOS DE… — o garoto sumiu por uma porta atrás do balcão.

— Você sabe cozinhar carne, não sabe?

— Mais ou menos… Mas se Remus vai comer igual vocês comiam em Hogwarts, não vai precisar ficar nem cinco minutos no fogo.

Após alguns minutos, Elliot voltou com tudo o que pediram.

— Melhoras para o seu pai.

— Obrigado — Canopus falou e sorriu para ele. — Depois nos falamos. Você ainda está me devendo um passeio na sua bicicleta.

— Pode me cobrar depois.

Therion e Harry suspiraram e seguiram para fora do estabelecimento antes de Canopus parar de flertar com o garoto no balcão para enfim voltarem para casa.

***

— Conseguiram fazer o jantar sozinhos sem destruir minha cozinha? — Remus indagou, parecendo impressionado, sentado à mesa.

— Eu ajudei eles, Moony — disse Sirius.

— Não muda muita coisa, Pads.

Sirius olhou indignado para Lupin enquanto sentava-se ao seu lado e servia o próprio prato.

— Aproveite, papai. Fizemos tudo para o senhor — Canis disse. — Muita carne bem mal passada, como o vovô Lyall estava fazendo para mim e Therry quando estávamos com ele.

— Ele e minha mãe faziam muito para mim quando era mais novo… — Remus disse enchendo o seu prato. — Não precisavam comprar tanta carne.

— Precisávamos sim. Agora temos dinheiro para comprar toda a carne que o senhor sentir vontade de comer — Therion disse.

Lupin forçou um leve sorriso e começou a comer. Por mais que não quisesse admitir, seu paladar apreciou muito aquela refeição. Pensar em seu apetite muito mais carnívoro, principalmente em época de lua cheia, o lembrava ainda mais de sua condição.

Já eram quase três décadas convivendo com a licantropia, mas ainda não era fácil para ele. E confessava que, sempre tão preocupado com o bem estar dos filhos em primeiro plano, negligenciou bastante sua saúde.

Não que se arrependesse propriamente. A saúde de Therion e Canopus era muito mais importante que a sua. E agora, a de Harry também.

Ele percebeu que Potter agia um tanto estranho desde seu aniversário, sempre pensativo demais e inquieto. Estava observando atento junto de Sirius.

Remus tomou um banho e deitou-se na cama pouco tempo após o jantar, completamente exausto. A lua cheia seria na noite seguinte, e ele já havia se dispensado do trabalho há dois dias até a próxima semana, quando estaria recuperado.

Havia um pequeno detalhe sobre semanas de lua cheia que Lupin nunca deixara os filhos descobrirem. Por mais cedo que fosse dormir, estava longe de ter boas noites de sono. Sempre acordava de madrugada suado, ofegante e assustado depois de muito se mexer inquieto em meio a pesadelos.

Infelizmente, Sirius ao seu lado não foi o suficiente dessa vez para conseguir dormir bem sem sonhar com o dia, quando tinha 4 anos, em que acordou com um pequeno barulho minutos antes da lua cheia atingir completamente o céu e percebeu que não estava mais sozinho em seu quarto como seus pais havia o deixado.

— Calma, Remmy… Está tudo bem — Sirius sussurrou enquanto abraçava Lupin, que havia acabado de acordar de um pesadelo mais uma vez.

Remus não disse nada, apenas se aconchegou nos braços do Black, tentando regular a respiração descompassada e deixando algumas lágrimas rolarem por seu rosto.

Sirius o apertou em um abraço forte, acariciando seus cabelos delicadamente e tentando transmitir o máximo de conforto que pudesse. Ele sabia dos pesadelos de Lupin próximo a lua cheia desde que ainda estudavam, e doeu muito não poder estar ali para confortá-lo nos últimos anos. Tudo o que Remus precisava agora era de um abraço como o que ganhou de sua mãe enquanto chorava por toda a dor e desespero que sentia após ser atacado.

A primeira semana de Remus em Hogwarts foi de lua cheia. O pequeno e jovem lobisomem de 11 anos quis chorar durante toda a viagem de trem e o primeiro jantar, com a cabeça explodindo com o barulho alto demais de toda a multidão de alunos, terrível para seus ouvidos sensíveis. Sirius ficou bastante intrigado ao vê-lo tampando as orelhas durante todo o jantar e a grande expressão de alívio ao chegar no quarto silencioso que dividiam com James e Peter, e ele ouviu por 10 anos Lupin chorar após acordar de um pesadelo em toda véspera de lua cheia, desde aquele primeiro ano, quando se conheceram.

Depois de descobrir a razão para os pesadelos do amigo, Black sempre tentava consolá-lo. Não se achava tão bom nisso, mas fazia o melhor. Nunca gostou de ver Remus daquela maneira.

Se Sirius pudesse, ele mataria Fenrir Greyback com suas próprias mãos por causar tanta dor ao seu Remus todo mês desde o dia que o mordeu para se vingar do pai dele.

Ali entre os braços do Black, ambos sentado na cama e com a cabeça aconchegada em seu ombro, Lupin estendeu o próprio braço e arregaçou a manga longa da blusa que vestia. Seus dedos deslizaram pela grande cicatriz com a marca de uma mordida, sentindo como se queimasse em sua pele e ainda fosse recente. Sempre se pegava observando aquela cicatriz naquele período.

Uma de suas primeiras cicatrizes, o início de tudo. Nunca conseguia esquecer ou não pensar no dia de seu ataque quando chegava perto da lua cheia.

— Está tudo bem — Sirius sussurrou mais uma vez.

Ouvir aquilo enquanto sentia o calor daquele abraço era o maior conforto que Remus podia ter agora.

Sirius segurou sua mão e depositou um breve selar ali, e depois mais outro naquela cicatriz e em outras que possuía no braço e no rosto. Um ato carinhoso e singelo, apenas para confortar Remus, mostrar que estava ali e o adorava acima de tudo, com todas as suas cicatrizes.

Infelizmente, Remus não era o único a sofrer com cicatrizes naquela noite.

Em outro quarto, Harry se remexia em sua cama, inquieto. Estava tendo um sonho muito estranho. Um casarão, uma cobra, um senhor, dois homens ajoelhados e uma voz horripilante. A luz verde era certamente o mais reconhecível de tudo. A mesma luz que atormentava os pesadelos de Harry por muito tempo.

Ele acordou exatamente como Remus há pouco. Suado, ofegante e assustado.

Sua cicatriz estava doendo. Doendo muito. Era uma dor intensa, muito mais forte do que qualquer coisa que já sentiu. Ele levou a mão à testa e choramingou baixo, enquanto seus olhos começavam a encher-se de lágrimas.

Permaneceu ali sentado e encolhido em sua cama, atormentado por aquela dor tão forte, até não aguentar mais. Não queria ficar sozinho. Não queria suportar tudo sozinho como sempre fez.

Ele saiu do seu quarto cambaleante, um pouco desnorteado não só pela dor, mas por estar sem seus óculos, com a visão bastante turva. Não pensou, apenas deixou seu instinto guiá-lo até o quarto a frente, devagar.

— Harry? Está tudo bem?

— Therry… Minha cicatriz… Está doendo muito.

Therion levantou-se de sua cama num pulo, aproximando-se de Potter e segurando seu rosto com cuidado. Não havia nada de anormal visível em Harry ou sua cicatriz, mas não duvidava da dor que ele estava sentindo e o abraçou.

Harry rodeou os braços em torno da cintura do outro, abraçando-o forte, com o rosto enterrado em seu pescoço. Pôde sentir mais uma vez aquele perfume de perto, o aroma doce e tranquilizante que sempre deixava-o mais leve, junto ao calor do Black. Havia sentido falta daquele calor nos últimos dias.

Canopus arqueou a sobrancelha, confuso, enquanto deixava seu livro de lado. Ele desceu de sua cama e encarou o irmão, tendo uma conversa silenciosa por seus olhares. Viu imediatamente a preocupação de Therion com Harry.

Ele também estava bastante preocupado.

— Desculpa incomodar vocês no meio da noite, mas…

— Não se preocupe, Harry — Canis disse, calmo e compreensivo.

— Está tudo bem — Therion completou em seguida.

— A cicatriz doer não é algo bom, não deveríamos…

— Não vamos incomodar o papai agora. É véspera de lua cheia.

— Eu só… Não quero ficar sozinho — Harry disse. Ele encarou Therion, observando os olhos acinzentados de perto e forçando sua visão para conseguir focar neles. — Posso dormir aqui?

— Claro.

Enquanto Canopus pegava um copo d'água para Potter, ele ficou junto de Therion na cama de baixo da beliche, os dois abraçados. Não importava o quão confuso estivesse, o Black ainda era um de seus maiores confortos e refúgio ali. Ele enterrou o rosto no ombro do outro e permaneceu daquela maneira.

Aquela foi mais uma das vezes em que Harry e Therion dormiram e acordaram pela manhã abraçados. Diferente da manhã seguinte ao seu aniversário, Potter não se afastou rapidamente daquela vez, porque os braços do Black parecia um  lugar muito mais seguro agora.

***

Canopus estava em sua forma de cão, encarando a paisagem com a cabeça apoiada na janela, com Harry ao seu lado fazendo carinho a sua cabeça.

— Se quiser ficar assim pra sempre, não vou reclamar. Sempre quis um cachorro — Harry disse.

Canis rosnou para ele.

Estavam sozinhos no quarto de Potter. Na verdade, sozinhos em casa.

Era noite e a lua cheia brilhava no céu. Remus havia saído várias horas antes junto de Sirius e Therion até uma floresta nos limites do vilarejo, não muito longe da estrada que levava até Godric's Hollow. Era um lugar mais seguro para se transformar, além de que o porão da casa ainda estava lotado de entulhos e muito provavelmente escondendo alguns bichos-papões, o que tornava o local bastante inviável.

Livre, também machucaria menos a si mesmo e poderia se recuperar mais rápido. Além de que não queria correr o risco de não estar preso o bastante e acabar escapando.

Os gêmeos queriam muito ir com ele ambos juntos. Foi exatamente por isso que se transformaram em animagos, para poder acompanhar o pai nas luas cheias.

Mas Remus estava bastante afetado com o ocorrido na Casa dos Gritos. Não queria que se repetisse.

Canopus viu o irmão encolher-se triste no sofá enquanto Remus negava veementemente que os acompanhassem. Sabia o quanto queria estar com Lupin, pois não pôde nas últimas duas vezes. Ele ao menos o acompanhou uma vez, mesmo que ferido e com dor, ficando horas perdendo sangue, cada vez mais fraco.

E ele também sabia que essa era exatamente a razão para o pai não querer que fossem. Por tê-lo visto tão machucado após uma lua cheia e ainda se culpar por isso. Por sua causa… Porque ele escolheu acompanhá-lo aquela noite inteira apesar de saber da seriedade de seus ferimentos, que eles não iriam parar de sangrar ou começar a se curar até receber tratamento com pó de prata, o que demorou muitas horas para acontecer por escolha sua.

Assumia aquela culpa, porque não se arrependia e faria tudo novamente. Por Remus, valia a pena.

Mas a preocupação de Lupin consigo quadruplicou. Sabia que não o convenceria a deixá-lo ir tão cedo.

Therion havia se recuperado mais rápido. Já não sentia mais tantas dores quanto o irmão. Além de ser minimamente mais controlado. Ele conseguiria convencer, e Canis ajudou.

Se não poderia ir, ao menos que o irmão pudesse ter uma chance de também estar junto de Remus com sua forma animaga. Ficou ali observando a lua cheia surgir, transformado para se sentir próximo a eles e fazendo companhia a Harry.

Ele acabou por voltar à sua forma humana e gemeu dolorido, levando as mãos às costas. Estava melhorando muito suas transformações, mas ainda tem sido meio incômodo quando tentava. Talvez precisasse de mais uma semana para ficar inteiramente recuperado como o irmão.

Harry olhou para o amigo. Por mais parecido que fosse fisicamente com Therion e olhar para ele rapidamente o fizesse lembrar do outro, havia algo que não o deixava mais confundi-los. Reconhecia facilmente que ali era Canis e não o garoto que o fez se questionar tanto nos últimos dias.

— Dói ficar mudando de forma?

— Não exatamente, depende. A primeira vez, quando me transformei, ali doeu pra caralho — respondeu. — Nas vezes depois disso, foi estranho, mas não doeu. Agora… As condições não ajudam, mas eu continuo treinando minha transformação para ficar melhor nisso.

— Poderia vir quando Remus me levar naquele hospital bruxo. Você não vai poder esconder pra sempre que ainda sente dor.

— Claro que posso. Logo, logo estarei novinho em folha de verdade. Já estou muito bem e em ótima forma, é mais incômodo… Fiquei quase 12 horas com arranhões de lobisomem sem nenhum cuidado e andando por uma floresta. Preciso de mais que 30 dias para ficar bom.

— Você estava horrível.

— Eu sei — riu baixo. — Mas você finalmente decidiu ir ver um medibruxo?

— Remus queria me levar… Melhor não adiar mais. Não deve ser tão ruim quanto hospitais trouxas.

— Você já foi muito a hospitais?

— Mais ou menos… — Harry respondeu vago, desviando o olhar. — A última vez foi porque quebrei a perna.

— Como você quebrou?

— Escada.

Canopus franziu o cenho e fechou a cara.

— Uma escada chamada Dursley?

— Uma escada de verdade — disse Harry. — Bem… Com o Duda no meio do caminho. Ele veio correndo me enchendo o saco, eu me irritei, ele colocou um pé antes do último degrau…

— Mas que filho da puta...

— Pelo menos não precisei limpar a casa o mês inteiro e pude dormir na sala. Não conseguia entrar no armário da escada com a perna engessada e as muletas.

— A cada dia eu penso mais em visitar seus tios e seu primo na minha forma animaga.

— Estou bem agora e prefiro esquecer deles. Se depender de mim, nunca mais volto para aquela casa.

— Eu não vou permitir que volte! — Canopus disse convicto. — Olha tudo que faziam com você! Quantas vezes foi parar no hospital por culpa de algum deles?

Harry não respondeu aquela pergunta. Desceu o olhar para o seu caderno de desenhos no colo e voltou a deslizar a ponta do lápis pelo papel.

— Por Merlin, Harry!

— Agora eu tenho vocês — Potter disse. — Isso é o importante pra mim. Me sinto muito mais em casa aqui e tento só… Não pensar muito nos Dursley.

— Mas ainda pensa às vezes, não é?

— Difícil esquecer depois de crescer naquela casa, mas sempre ser tratado como um fardo que eles seriam obrigados a carregar até eu ficar de maior e eles poderem me chutar de lá — suspirou. — As vezes, vendo como se preocupam tanto comigo aqui… Penso como seria se eu tivesse crescido com vocês… Com o Remus, você… O Therry…

O coração de Potter saltou ao falar de Therion. Imaginar poder ter passado boa parte da sua vida ao lado dele… Ah, parecia muito bom.

Como teria sido se invés de ser levado até os Dursley, Dumbledore tivesse deixado-o com Remus junto dos gêmeos? Sabia que haveria dificuldades, por causa da licantropia de Lupin, mas ele sempre pareceu fazer de tudo para ver os filhos bem, e faria o mesmo consigo, como já estava fazendo agora.

Ele cresceria minimamente feliz, com dois grandes amigos ao seu lado. Poderia brincar, ganhar presentes no seu aniversário, receber abraços quando estava triste, ter alguém cuidando de si quando estivesse doente. Tudo parecia que seria bem melhor.

Já ouviu tantas vezes os gêmeos contarem histórias da infância com Remus e o quanto ele sempre cuidou deles, como fez de tudo para crescerem felizes e saudáveis. Harry queria muito ter isso também.

Lupin sempre esteve ao lado de Therion e Canopus, os ajudando em tudo. Ele assim também teria alguém para conversar e que o apoiasse quando se sentisse confuso, para lhe dar conselhos e ajudá-lo a se entender.

— Teria sido divertido se você tivesse crescido conosco — Canopus comentou, sorrindo fraco. — Com certeza aprontaríamos muito juntos.

— Remus precisaria de muita paciência, então.

— Mas talvez as coisas com Therion fossem um pouco diferentes, hm? Ou eu teria que ver desde criança vocês se tornando esse grude que quase parece um casal?

Harry corou, desviando o olhar, envergonhado. Ele abraçou seu caderno, onde há pouco fazia mais um desenho de Therion, um dele olhando as estrelas, como o que viu no caderno de seu pai.

Canis percebeu o rosto vermelho de Potter e riu baixo.

— Ele me contou sobre o beijo.

— Imaginei que saberia. Vocês são gêmeos, nunca escondem nada — murmurou, sem encarar o Black.

— Quer conversar sobre isso? Parece bem melhor do que falar daqueles imbecis que você chama de tios.

Harry ficou em silêncio por um tempo. Ele queria muito falar sobre isso com alguém, mas justamente com o irmão gêmeo de Therion não parecia fácil. Contudo, em contrapartida, Canopus parecia disposto a ouví-lo e ajudá-lo a entender o que estava acontecendo há um certo tempo. Talvez fosse sua melhor opção para desabafar agora.

Respirou fundo, criando coragem e voltando os olhos para Canis.

— E-eu… Eu não sei o que dizer ou pensar exatamente… Estou muito…

— Confuso?

— É. Com certeza, muito confuso — admitiu. — Eu nunca… Tinha beijado alguém antes.

— E o primeiro foi meu irmão, que lindo! Foi o primeiro dele também.

— Canis!

— Só estou tentando aliviar o clima — Canis disse e riu baixo. — Você saiu correndo como se tivesse visto um fantasma e ficou bem afastado do Therry. Ele ficou bastante chateado.

— É que eu… Merlin, eu nem sei! Na hora eu fiquei assustado, eu acho. Nunca esperei que um dia fosse… Beijar um garoto… Muito menos meu melhor amigo.

Harry encolheu os ombros, abaixando a cabeça. Aquilo estava o corroendo por dentro há dias. Ao mesmo tempo que queria estar com Therion, ele não entendia o que estava acontecendo consigo e como chegou ao ponto de querer tanto beijar o amigo.

Pensar em tudo isso o assustava pra caralho, porque nunca se deixou pensar e refletir sobre isso.

Ele já ouviu mais de uma vez o quanto ter esse tipo de sentimentos por outro garoto era estranho, nojento, reprovável… Talvez isso que tenha bloqueado sua mente para perceber o que estava sentindo. Não queria pensar que o que tinha com Therion era errado.

Além de toda a confusão sobre ele mesmo. Era tudo tão complicado…

— Não há nada de errado nisso, não precisa ter medo — Canis falou calmamente.

— Não foi o que ouvi quando me aproximei demais do único amigo que tive antes de Hogwarts — Harry confessou. — E-eu… Eu tive… Uma queda por ele… Paixonite boba de criança que não deveria existir. Acho que deixei muito na cara, e… Tio Valter não gostou tanto disso. Fiquei dois dias trancado no armário da escada sem poder vê-lo…

— Ah, Harry… Até eu e Therion já tivemos nossas pequenas paixões infantis por amigos quando mais novos. Não é nada anormal. O que não deveria acontecer é você ser julgado e castigado por isso! Seus tios… Eles são grandes babacas!

Canopus cerrou os punhos, tentando conter a sua raiva pela "família" trouxa do amigo, por terem feito ele sofrer tanto apenas por ser quem é.

Harry sentiu seus olhos marejarem. Aquela era a triste história de uma de suas primeiras paixões inocentes de infância que não acabou nada bem. Também foi o primeiro amigo que ele teve na vida, um novo garoto de sua escola que havia acabado de se mudar para o bairro e, por alguma razão, quis se aproximar dele e ignorar todas as provocações de Duda. Ele mesmo optou por se afastar no fim das contas após tudo que ouviu do tio.

Naquela época, ele sentiu-se horrível por perder a única amizade de verdade que teve na vida e por pensar que era uma péssima pessoa por sentir seu coração bater um pouquinho mais rápido perto dele.

Nos últimos tempos, tem negado a si mesmo que o que Therion o fazia sentir era mil vezes mais forte e colocado na mente que era apenas um amigo muito próximo. Gostava de como ele o fazia se sentir bem e demonstrava isso, pois possuía tal liberdade com ele. Estava apenas se enganando e não pensando sobre as dimensões disso.

Foi um ato involuntário que Harry só percebeu que estava fazendo nas últimas semanas, quando outros ao redor perceberam antes dele próprio o que estava iniciando.

Perceber que estava sentindo algo por um garoto que era seu amigo e com um sentimento muito mais forte dessa vez o deixou em completo surto. Estava em pânico.

E o pior: os Black e Lupin eram sua chance de ter uma família de verdade, enfim. Ele poderia estar prestes a estragar tudo se interessando por Therion mais do que deveria.

— Eu nunca me deixei pensar muito sobre isso... Sobre me interessar não só por meninas — admitiu. — Eu provavelmente apanharia se sequer pensasse em beijar um garoto quando morava com eles.

— Harry...

— E Therion é meu amigo. Eu não deveria querer beijar ele. M-mas... Mas nunca me senti tão bem com alguém como quando estou com ele e isso está me matando.

Harry fechou os olhos e as lágrimas começaram a cair.

— E-eu só... Não sei o que pensar sobre ele, sobre mim...

— Está tudo bem, Harry.

Canopus aproximou-se mais dele, passando o braço por seus ombros e o abraçando de lado para confortá-lo.

— Como você consegue lidar tão bem com isso?

— Para mim, não é algo exatamente complicado...

— Você assumiu pra mim que era gay com tanta facilidade e naturalidade... Sei lá! Nunca se sentiu confuso quando percebeu isso?

— O primeiro garoto que eu gostei foi um vizinho também bruxo quando estávamos morando em Gales — Canis começou a contar. — Eu tinha acho que… Nove anos? Acho que isso. Ele tinha onze, era verão e estava prestes a ir para Hogwarts. Nós sempre ficávamos brincando na rua e, Harry… Ele era o garoto mais lindo que eu já tinha visto na vida.

— E você surtou como eu agora?

— Na verdade, não. Mas ainda espero que ouvir sobre isso te ajude de algum jeito.

Harry ergueu os olhos para Canopus mais uma vez. Ele sorriu levemente para si, um sorriso amigável e de conforto. Conseguia perceber no rosto e nos olhos de Canis que ele estava mesmo tentando ajudar e confortá-lo.

— Eu só pensava que... Gostava muito dele, de quando estávamos juntos, o achava realmente incrível. Foi, como você descreveu, uma paixão inocente de criança, mas que depois me ajudou a entender que eu só gostava de garotos — continuou. — E eu disse tudo que pensava pra ele.

— Merlin…

— É… Essa parte foi um pouco constrangedora, eu confesso — riu. — Ele pensou que eu só estava brincando. Mas bem… Sempre fui uma criança espontânea demais sem filtro algum do que falava.

— Você é assim até hoje.

— Harry, se eu dissesse exatamente tudo o que penso, seria bem pior, acredite.

— Não duvido — Harry disse e riu baixinho. — Mas… Não se sentiu estranho por isso?

— O mais estranho nisso é uma criança de nove anos se declarando pra outra. Papai riu por isso, mas ele sempre deixou bem claro que estava tudo bem eu gostar de qualquer pessoa, não importa se seria um garoto ou uma garota. E nós bruxos aceitamos isso bem melhor até… Menos famílias muito tradicionais. Acho que seria bem diferente se crescesse com os Black realmente.

— Então você só… Sempre soube que era gay?

— Eu apenas percebi que sempre que alguém me chamava a atenção era um garoto. Se isso tem uma nomenclatura correta… — Canis deu de ombros. — Então, é, eu meio que sempre senti isso. Não é nada de outro mundo, é só… O que eu sou. Uma parte de mim.

Harry respirou fundo. Ele queria se entender tão facilmente quanto o amigo.

— Acho que o Therry levou mais tempo pra perceber. Depende muito da pessoa.

— Therion também é… É gay?

— Não é a mim que você precisa perguntar isso, Harry — Canopus falou. — Mas entendo que esteja confuso. Você saiu de uma casa cheia de homofóbicos para uma com vários gays e está descobrindo que está apaixonado pelo melhor amigo.

— E-eu não estou apaixonado!

— Mas sente algo, não sente?

Harry não respondeu. O silêncio já era uma resposta.

— E você está entendendo agora o que sente e suas preferências.

— É tão confuso... — Potter falou. — Eu não sei se consigo entender tão fácil. Como eu faço isso? O que teria que fazer pra enfim entender se só estou me enganando demais ou... Que talvez eu seja gay também?

— Não é como se você fosse responder um questionário mágico que no final fosse te responder... Hm, acho que há 62% de chance de você ser homossexual, uhul!

— Então espero a resposta magicamente vir a minha cabeça?

— Acho que você está pensando demais, Prongs. E eu entendo que seja difícil por ter ouvido daqueles filhos da puta que gostar de outro garoto seja errado. Uma hora você vai se entender, mas pense apenas... Você está gostando de um garoto, quer muito beijar ele e não há nada de errado porque é tão comum quanto seria se fosse com uma menina.

Harry choramingou baixo. As vezes pensava que realmente queria beijar Therion de novo e não sabia o que pensar ou que ele própria pensaria sobre isso.

— Sinceramente, o único hétero nessa casa deve ser o Sirius — Canopus falou. — E nenhum de nós irá te julgar por qualquer coisa que seja. Não cabe a ninguém querer se meter sobre com quem você quer ficar ou não.

— Nem por eu talvez ter gostado muito de beijar o Therry...?

— Não. E estou aqui com você, hm? Tudo bem não se entender do dia pra noite, mas pode sempre vir falar comigo — Canis disse, aproximando-se mais de Potter. — Só saiba que… Não precisa ter medo, nem por você, nem pelo Therion.

— Ele deve estar me odiando por sair correndo…

— Na verdade, ele acha que você o odeia por ter te beijado e te deixado tão confuso.

— Eu não o odeio por isso! E-eu… Eu queria isso!

— Então diga a ele.

— Como…? — Harry indagou, num tom quase desesperado.

— Isso é com você, mas deve conversar com ele. Falar o que quer que esteja pensando ou sentindo. Pode parecer confuso, mas apenas… Diga. O que vier à sua mente.

— Como eu posso falar com ele? E-eu… Nem sei o que falar ou o que estou sentindo! E-eu…

Canopus abraçou Harry, que apertou os braços ao seu redor rapidamente. Afagou suas costas, confortando-o e permitindo que deixasse as lágrimas caírem em seu ombro.

Potter afundou-se naquele abraço, deixando-se ser invadido pela sensação de conforto e segurança. Aquilo era realmente o que estava precisando agora. Alguém para abraçá-lo e ouvi-lo desabafar sobre o que estava sentindo. Estava precisando de algum apoio.

Canis podia não ser o tipo de pessoa fácil de lidar, mas algo que ninguém deveria questionar é o quanto ele se dedica por sua família, pelas pessoas que ama e confia. Harry era parte de seu círculo familiar agora, e estaria ali quando ele precisasse, exatamente como faria com o irmão e Remus.

A vida antiga de Harry deixou cicatrizes físicas e emocionais. Ele estava se encontrando a cada dia naquela família e agradecia imensamente cada vez que eles demonstravam apoio e quebravam suas inseguranças causadas pelos tios. Estavam o ajudando a ter confiança de ser quem era com pequenos atos como aquele, lhe dando o apoio que precisava para se entender e nunca havia recebido.

— O que eu posso te dizer agora, Harry… É que meu irmão gosta muito de você e se importa contigo. E ele vai entender tudo o que você disser, não precisa ter medo — Canopus falou num tom baixo. — E se precisar de um abraço depois que conversar com ele… É só me chamar.

— Obrigado, Canis — Harry agradeceu e ergueu o rosto para o amigo. — Você está me ajudando muito agora.

— Esse é o trabalho de um amigo.

— É bom ter você como amigo.

— Somos Marotos, hm? Marotos sempre se ajudam — disse Black erguendo a mão para cima.

— Sim… Somos Marotos. — Harry sorriu e bateu sua mão contra a dele.

Potter abraçou o amigo mais uma vez, sentindo-se muito melhor do que estava há alguns minutos.

— Relaxe e depois converse com o Therry sobre tudo. Tenho certeza que vai fazer muito bem vocês se resolverem.

— E-eu... V-vou tentar.

— Vai ficar tudo bem, Prongs. Você está seguro aqui e não precisa ter medo.

Harry sorriu fraco, usando a manga sua blusa para secar o rosto molhado pelas lágrimas.

— Você sempre me chama de Prongs. Posso começar a te chamar de Padfoot?

— Se fizer isso, eu te empurro dessa janela.

— Deveria seguir os próprios conselhos e conversar mais com o Sirius.

— Eu sou o conselheiro aqui. E a situação é bem mais complicada.

— Você me ouviu até agora… Posso te ouvir também sobre isso.

— Algum dia, Prongs… Não hoje. Que tal me mostrar todos os desenhos que você fez do meu irmão?

Harry escondeu o rosto vermelho contra seu caderno e empurrou Canis de leve pro lado. Black riu, passando o braço sobre os ombros de Potter e bagunçando seus cabelos.

— Vamos lá, Prongs!

— Que tal você ir paquerar seu namorado açougueiro?

— Infelizmente, ainda não posso chamá-lo de namorado. Mas vou encontrá-lo depois de amanhã e se depender de mim e ele quiser, eu vou beijar aquele garoto o dia inteiro. E você pode tentar beijar meu irmão de novo.

Potter empurrou o amigo da janela para dentro do quarto.

— Era para estar me ajudando, não fazendo eu sentir ainda mais vergonha! — exclamou, fungando.

— Equilíbrio da amizade, Prongs… Ai…

Harry conteve um sorriso. Conversar com Canis realmente o fez muito bem e o ajudou bastante a pensar.

Ter alguém ao seu lado para apoiá-lo e abraçá-lo quando precisava era muito bom.

— Estou com fome, Padfoot. Podemos comer algo na cozinha?

— Não me chame de Padfoot! — Black exclamou num tom irritado.

— Tudo bem, Padfoot.

— Só não te jogo dessa janela pelo Therion e porque também estou com fome, e você cozinha muito melhor.

Harry riu baixo, saindo da janela e estendendo a mão para ajudar Canis a ficar de pé.

— O primeiro que chegar a cozinha escolhe o que comer!

Canopus empurrou Potter, que cambaleou e apoiou-se na cama, e correu para fora do quarto.

— Se eu cozinho, eu escolho! — Harry falou alto e correu atrás dele, logo o vendo descer escorregando pelo corrimão.

Os dois riram.

Canis conseguiu trazer rapidamente o sorriso de volta ao rosto de Harry, depois de deixá-lo sentindo-se mais leve e confortável após uma boa conversa. Ele era realmente um bom amigo.

Exatamente como Prongs e Padfoot eram bons amigos um para o outro, sempre se apoiando quando não estavam bem e trazendo o conforto, segurança e alegria que precisavam.

Algumas coisas nunca mudam, apenas se adaptam ao longo do tempo.

—————————————

Olá, meus amores!
Tudo bem?

E voltamos com tudo!
Mais uma att para vocês, com desenvolvimento da amizade dos Prongsfoot Juniors 😭😭

Essa conversa do Harry com o Canis foi super importante pra eles e pro Harry. Me deixou de coração quentinho escrever e imaginar o Canis apoiando o Hazz 🥺🥺

E tivemos uma migalhinha Wolfstar. Eu ia trazer mais, mas achei que seria um bom momento encerrar com Harry e Canis representando James e Sirius novamente 🥺 Prongs e Padfoot 🥺

Introduzi agora um pouco mais da licantropia e do quanto afeta o Remus e mostrarei mais depois.

Serasi nosso Deerwolf vai conversar logo sobre o beijinho? Veremos!

Adendo sobre a citação do Regulus: O Regulus canonicamente nasceu em 1961, mas não existe data exata. Eu decidi ser o mesmo dia do Harry na fic por alguns significados e referências que isso trás.

Espero que tenham gostado! Não esqueçam de comentar bastante, tá bom?

Até a próxima!
Beijinhos,
Bye bye 👋😘


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