XXX. Broken in Ruins
Remus acordou sentindo-se bastante revigorado naquela manhã, como não acontecia há um tempo. Bocejou e alongou os braços após sentar-se sobre o colchão, observando os raios de sol adentrando a janela pela fresta da cortina.
A luz refletia no piso amadeirado e chegava até a cama, iluminando os cabelos loiro-escuros de Lupin com um brilho de dourado. Os fios estavam emaranhados numa grande bagunça, com pontas em várias direções.
Ele passou as mãos por seu rosto, espantando todo o sono que ainda restava. Sentia como se houvesse dormido um dia inteiro de tão exausto que estava quando deitou-se na noite anterior, sequer percebeu quando pregou os olhos. Fora um dia cansativo em uma falha procura por um novo emprego.
Já estava no aguardo de muito mais dias como aquele até conseguir. Parecia ainda mais difícil.
Um pequeno sorriso espontâneo surgiu por entre os lábios de Remus ao ver o enorme cachorro sentado ao lado da cama deitar a cabeça em seu colo. Olhou rapidamente para a porta, encontrando-a entreaberta.
— Bom dia, Padfoot — falou.
Sirius tomou sua forma humana e sorriu fraco para Remus, que encarou seus olhos fixamente.
— Bom dia, Moony.
— Há quanto tempo está aqui?
— Um tempinho, mas decidi te deixar dormir — Sirius respondeu, sentando-se ao lado do Lupin. — Dormiu bem?
Remus assentiu, sem desviar os olhos dos de Black. Tê-lo ali todas as manhãs era ao mesmo tempo estranho — pelo tempo que ficaram longe — e reconfortante.
Parecia que havia usado um vira-tempo e voltado para 1980, quando ele e Sirius acordavam um ao outro com o café da manhã pronto depois de um deles ficar de plantão para verificar os gêmeos durante a noite. Sempre sentiu falta daquela época, mas nunca se deixou admitir; era demasiado doloroso pensar nisso tendo em vista que Black fora condenado depois de trair os amigos e matar várias pessoas inocentes.
Pensava nisso todas as vezes que acordou no meio da noite com Canopus chorando sentindo falta de Sirius, ou Therion chamando-o com medo de uma tempestade.
Era bom saber que tudo foi um grande mal entendido e uma armação de Pettigrew, e podia reduzir a imensa culpa que sentiu nos últimos 12 anos por amar alguém que não merecia esse sentimento.
Embora, ainda achasse que deveria continuar a sufocar aquilo no fundo de seu peito, não importa o quão bem ele e Sirius estivessem antes de tudo e que a situação começasse a se resolver.
— Que horas são? — perguntou, a voz ainda rouca pelo sono.
— Dez e meia, eu acho — respondeu Sirius, e Remus arregalou os olhos. Ele deteve-o antes que se levantasse depressa, mantendo-o ali.
— Deveria ter me acordado antes, está tarde!
— Você estava exausto, precisava descansar. Por isso não te acordei.
Lupin suspirou. Ele não costumava dormir tanto, exceto depois da lua cheia.
— Não ouse estragar minha rotina, Sirius. Tenho muito o que fazer.
— É domingo, Moony! Você passou o dia inteiro procurando emprego ontem. Pode se dar ao luxo de descansar um pouco hoje, hm? — disse Sirius, segurando o rosto do outro entre suas mãos.
— Não quando tenho duas crianças para cuidar.
— Pode sim. Os meninos estão bem, não precisa se preocupar tanto.
Remus respirou fundo, segurando as mãos de Sirius que estavam em seu rosto. Analisou-o melhor, percebendo que ainda havia muitas olheiras sob os olhos cinzentos. Conhecia bem aquilo.
— Conseguiu dormir bem? — resolveu perguntar, mesmo que desconfiasse da resposta.
— Ainda não me acostumei a dormir numa cama confortável sem dementadores para todo lado — Sirius admitiu.
— Pesadelos com Azkaban?
Black não respondeu, mas nem precisou. Apenas pelo olhar, Remus pôde perceber que estava certo. O mesmo olhar que ele viu nos filhos por muito tempo desde que Sirius fugiu de Azkaban após noites repletas de pesadelos.
Eles realmente se pareciam demais.
— Sabe que pode me chamar se precisar — falou e esboçou um fraco sorriso compreensivo.
— Não precisa se preocupar, eu vou ficar bem.
Sirius não pensou em dizer que toda noite tinha pesadelos com o tempo que ficou preso e que muitas vezes ainda dormia na forma animaga, pois era a única maneira de sentir-se protegido a noite. Não agora.
Saber que tinha Remus ao seu lado para apoiá-lo já ajudava. Era o seu maior consolo nas últimas noites.
— Acordou os meninos?
— Não. Também deixei dormirem — respondeu e sorriu fraco. — Tenho quase certeza que eu receberia uma dezena de azarações se fosse acordá-los cedo em pleno domingo de férias.
— Não duvido — Lupin riu. — E eles estão um pouco mais propensos a terem explosões de magia ultimamente, pelo que Minerva teve o prazer de me informar, mesmo não sendo diretora da casa deles. Melhor não desafiá-los.
— E também precisam descansar, acho que tiveram uma noite bastante agitada.
Remus franziu o cenho, encarando Black levemente desconfiado.
— O que eles aprontaram?
Sirius abriu a boca para responder, mas não disse nada e coçou a nuca, desviando o olhar. Remus cruzou os braços, olhando-o seriamente.
Lupin conhecia ele o bastante para saber que estava escondendo algo.
— Não tente encobrir eles, Sirius.
— Que tal você se arrumar enquanto eu preparo o café da manhã? — Black disse e levantou-se, desviando do assunto.
— Sirius...
— Vai querer chocolate quente ou chá?
— Sirius Black!
— Chocolate quente.
Sirius saiu do quarto, deixando para trás um Remus bastante confuso e desconfiado. Lupin já devia ter imaginado que juntar Sirius e os gêmeos na mesma casa significaria muita confusão, exatamente como quando os garotos eram pequenos e eles moravam juntos.
Black sempre estava brincando com os filhos e defendendo-os quando faziam muita bagunça, sobretudo depois que eles aprenderam a andar e começaram a espalhar seus brinquedos por toda a casa junto a muita sujeira do jardim. Não teve um dia que Remus não acabasse de cabelos em pé com a casa revirada aos avessos de tanta bagunça.
Mas, apesar de tudo, ele adorava aqueles dias mesmo assim, pois significava que ainda havia momentos de alegria em meio àquela guerra em que estavam.
Ele respirou fundo e enfim levantou-se de sua cama, seguindo para o banheiro e tomando um longo banho matinal. Após isso, arrumou sua cama e vestiu-se com roupas leves, olhando-se no espelho em seguida.
Sirius tinha razão por um lado: ele estava realmente exausto e algumas horas a mais de sono lhe fizeram bem. Talvez fosse bom reservar aquele dia totalmente para os filhos, aproveitar um tempo com eles.
Claro, depois de descobrir o que eles certamente andaram aprontando.
Remus seguiu até o quarto dos garotos para acordá-los e, ao abrir a porta, surpreendeu-se ao encontrar três garotos adormecidos sobre os cobertores e travesseiros no chão.
Canopus estava estirado de bruços em um canto, completamente apagado e agarrado a um travesseiro, com os cabelos bagunçados caindo por todo seu rosto enquanto ressonava baixo. Ao seu lado, estava Harry, virado de lado, com a cabeça apoiada no ombro de Therion e o braço sobre o garoto. Therion dormia tranquilamente junto de Potter, com parte do rosto enterrada em seus cabelos e sendo abraçado por ele.
Lupin não soube o que pensar. Ele havia deixado os filhos na cama na noite anterior, e agora de manhã os encontrava junto com Harry no chão. Em que momento ele chegou? Como ele foi para lá?
Aqueles garotos teriam muito o que explicar.
Adentrou o cômodo e abriu as cortinas, deixando a luz entrar no quarto. Therion, Canopus e Harry continuaram dormindo serenamente.
Remus cruzou os braços, balançando a cabeça negativamente enquanto os observava. Com sua varinha, ele apontou para o relógio, que começou a apitar.
Harry foi o primeiro a acordar, desnorteado e confuso, por um momento pensando ser o seu despertador que o acordava de manhã na casa dos tios. Ele apenas ergueu a cabeça com os olhos semicerrados, não enxergando com muito foco pelo sono e a falta de seus óculos.
Os gêmeos acordaram em seguida, resmungando baixo, tão confusos e sonolentos quanto Potter e bocejando. Harry, por reflexo, também bocejou.
Remus agitou a varinha e o som parou. Quando os garotos olharam em sua direção e o viram parado na porta com os braços cruzados e o olhar sério no rosto, sentaram-se rapidamente e exclamaram surpresos.
Potter tateou o chão ao redor a procura de seus óculos, ainda sem conseguir enxergar muito bem. Levou um tempo até encontrá-lo sobre a cama de Therion e colocá-lo no rosto, então olhando na direção do homem na porta.
Alguns instantes de silêncio se seguiram, e os três sabiam muito bem que aquele olhar de Lupin significava que estavam muito encrencados.
Harry ergueu a mão e acenou devagar, forçando um sorriso.
— Bom dia — disse, numa pequena tentativa de amenizar o clima.
— Olá, Harry — Remus respondeu. — Está um pouco longe de casa, não acha?
— Estou?
Lupin suspirou, tornando a balançar a cabeça.
— Bom dia, papai — os gêmeos falaram em uníssono, com sorrisos inocentes em seus rostos.
— Bom dia, meninos. Vocês têm cinco minutos para explicarem porque Harry está aqui e não na casa dele.
— Não podemos acordar primeiro? — indagou Canis. — É difícil raciocinar bem logo depois de levantar.
— Não tente me enrolar, Canopus.
— Harry vai morar com a gente — Therion disse, dando de ombros e voltou a bocejar. — O que tem de café da manhã hoje?
Remus piscou desconcertado e encarou os três, sem acreditar, franzindo o cenho confuso.
— Morar? Aqui?
— É — Canis respondeu.
— Vocês não podem simplesmente decidir que o Harry vai morar aqui.
— A casa é nossa também, não é? — Therion argumentou.
Remus apontou para eles, ainda com uma expressão séria.
— Levantem e arrumem tudo. Quero ver os três na mesa com uma boa explicação.
Ele deixou o quarto, e os garotos se entreolharam.
— Estamos muito encrencados? — Harry perguntou.
— Provavelmente — os gêmeos responderam.
— Mas é só explicarmos tudo e esperar ele se acalmar — disse Canis.
— E acho que Sirius pode ajudar. Ele também queria muito te ver — completou Therion.
Harry sorriu com a menção ao padrinho. Os três se levantaram e arrumaram a pequena bagunça de lençóis onde dormiram, para então saírem do quarto logo em seguida, ainda de pijama.
Os gêmeos guiaram Harry até a mesa de jantar, de onde puderam ver Remus próximo a entrada da cozinha falando com Sirius.
— Você deveria ter me avisado!
— Não precisa se estressar com isso, Moony. Me empresta sua varinha? — Remus jogou a varinha para ele com força.
— Como não? Se você sabia, devia ter vindo falar comigo.
— Eu não ia te acordar no meio da madrugada depois de um dia exaustivo só para dizer: "Remus, acho que nossos filhos fugiram de casa no meio da noite e trouxeram o Harry pra cá, mas não tenho certeza" — Sirius disse enquanto saía da cozinha segurando a varinha e fazendo pratos, copos e xícaras flutuarem até a mesa. — Olá, meninos. Bom dia, Harry!
Potter encarou Black admirado, o sorriso apenas crescendo em seu rosto ao vê-lo bem, muito melhor do que na última vez que esteve com ele.
Sirius parecia um pouco menos cadavérico, embora ainda bastante magro e com olheiras sob os olhos. Os cabelos que antes chegavam à cintura após os anos preso em Azkaban agora estavam mais curtos, até pouco abaixo do queixo. As roupas de prisioneiro davam lugar a jeans preto e uma camiseta de alguma banda dos anos 70. Ele parecia relativamente bem.
Ele olhou para o afilhado, também não contendo seu sorriso. Ficava impressionado com a incrível semelhança entre o garoto e James. Era como estar vendo o amigo no quarto ano bem na sua frente. Sentiu muita falta do garoto e mal esperava a hora de vê-lo outra vez.
— Sirius! — Harry exclamou e correu para abraçá-lo.
Sirius ficou um pouco surpreso com a atitude, mas ainda assim, isso deixou-o extremamente feliz. Abraçou Potter de volta com força, enquanto era abatido pela emoção e nostalgia. Na última vez que abraçou o garoto, ele ainda era um bebê de apenas um ano de idade, antes de Hagrid levá-lo.
A sensação calorosa tomou conta de ambos naquele momento, imersos na emoção de estarem juntos outra vez.
Quando se afastaram, Sirius segurou o rosto de Potter. Os olhos verdes brilhavam com uma grande alegria que quase não conseguia conter em si.
— Como está, Harry? Está tudo bem? — perguntou um tanto agitado.
— Sim! — Harry respondeu, assentindo freneticamente com a cabeça. — Eu vou poder morar com você aqui agora!
— Será que podem explicar isso?! — Remus indagou confuso, franzindo o cenho enquanto olhava de Potter para os filhos.
Harry afastou-se de Sirius para ficar juntos dos amigos.
— Buscamos o Harry na casa daqueles trouxas terríveis essa noite — disse Therion.
— Ele vai morar com a gente agora.
— Vocês não podem sequestrar o Harry da casa dos tios e dizer que ele vai morar aqui!
— Por que não? — os gêmeos perguntaram juntos.
— Eles sabem que você está aqui, Harry?
— Deixamos um bilhete — ele respondeu, dando de ombros.
— Um bilhete?! Harry, eles são seus tutores, não pode ir embora assim só por querer! — Remus repreendeu-o. — Eu fico muito feliz em te receber aqui, poderia ficar o tempo que quisesse, mas não assim!
Os três garotos bufaram, cruzando os braços e fazendo biquinhos emburrados. Lupin pousou ambas as mãos na cintura, olhando para eles com seriedade, embora quase risse pela forma como pareciam muito Sirius e James quando ele vetava alguma ideia de pegadinha potencialmente perigosa e que poderia deixá-los muito mais encrencados do que receber uma simples detenção.
Sirius já desconfiava que Harry estivesse no quarto dos filhos quando os flagrou acordados a noite, mas não tinha total certeza. Ele não se importaria de ficar com o afilhado ali; porém, Remus estava certo sobre ele não poder simplesmente se mudar para lá do dia pra noite.
— Podemos falar com a irmã da Lily para avisar que o Harry vai ficar um tempo aqui — sugeriu Sirius.
— Mas o bilhete já deixou bem claro onde ele está — rebateu Therion.
— Me deixem ficar aqui, por favor, por favor, por favor — suplicou Harry. — Eu não quero voltar pra lá! Prometo que não vou atrapalhar em nada.
— Harry…
— Por favor…
— Remmy — Sirius chamou, tocando o braço de Lupin com carinho. —, os meninos deveriam ter falado conosco, é verdade, mas não vai ser um problema ter Harry aqui por alguns dias.
— Dias não, pra sempre — corrigiu Canopus.
— Canis, isso é um pouco mais complicado do que parece.
— Harry não pode simplesmente se mudar pra cá — reforçou Remus. — Até nós bruxos temos leis bastante rígidas quanto a lares e tutelas de crianças.
— Ele não vai sair daqui — Therion disse firmemente.
Remus respirou fundo, encarando os garotos, que pareciam bastante decididos. Voltou seu olhar para Sirius, que possuía certa esperança nos olhos e ele sabia bem o que queria dizer.
Após um longo suspiro, falou para eles:
— Você pode ficar, Harry.
Os garotos pularam de alegria e comemoraram, sorrindo felizes.
— Mas — continuou, e o sorriso dos garotos morreu rapidamente. — eu vou falar com os seus tios, Harry, e ver por quanto tempo eles te deixariam ficar. Depois, você irá voltar para casa.
— Não! — eles interviram imediatamente.
— Ele não pode voltar, pai! — exclamou Therion. — Eles são horríveis, sempre trataram o Harry mal.
— Mal é eufemismo, eles são cruéis! — Canopus falou.
— Como assim? — Remus e Sirius indagaram juntos.
— Meus tios nunca gostaram de mim, porque eu sou um bruxo — Harry respondeu, encolhendo os ombros.
— Ele dormia debaixo da escada até o primeiro ano, pai!
— Já colocaram grades na janela do quarto dele uma vez.
— Quase não o deixam sair e brigam com ele por tudo.
— Eles o deixam passar fome! — Therion segurou delicadamente os ombros de Harry. — Ele está até bem mais magro e pálido do que no último dia de aula, não vê?
— Não duvidaria que fizessem coisas piores que Harry ainda não tenha tido coragem de contar — completou Canopus, e Potter desviou o olhar, comprimindo os lábios nervosamente.
— O QUÊ?! — Sirius gritou.
— Isso é verdade, Harry? — Remus perguntou cautelosamente.
Harry assentiu e abaixou a cabeça, acanhado. Não gostava nem um pouco de pensar tudo o que sofria na casa dos Dursley.
Remus analisou o garoto e percebeu que, como Therion disse, ele realmente parecia bem mais magro que na última vez que o viu. Isso deixou-o furioso por dentro, ao mesmo tempo que desolado. Não fazia ideia que Harry sofria tanto.
Ele sempre fez de tudo para dar uma vida relativamente boa para os filhos. Trabalhou incansavelmente, passando por todo tipo de humilhação e desaforo nos empregos que conseguia por ter licantropia, aguentando um longo sofrimento, apenas para não deixar que faltasse comida na mesa. Venceu seu orgulho toda vez que percebia que não conseguiria se manter por muito tempo e pedia auxílio ao pai, para que os filhos não tivessem fome e pudessem ter uma cama sob um teto para dormir.
Mesmo que não tivessem luxos, ele fez o melhor que pôde e ficava satisfeito de saber que os gêmeos tiveram uma infância feliz consigo. Vez ou outra apertava um pouco mais nas contas para poder oferecer a eles um agrado maior que eles preferissem.
Esperava que Harry estivesse seguro e sendo bem tratado. Tinha uma ideia de que a relação dele com os tios não era fácil, mas não imaginou nem metade de tudo aquilo.
Fervia internamente, com raiva. Ele sempre fez de tudo pelos filhos. Por que os Dursley não se esforçaram para dar o mínimo que Harry precisasse? Como puderam tratá-lo daquela forma? Ele era só uma criança!
— Você nunca mais vai pisar naquela casa — garantiu com a voz firme, tentando controlar falhamente a irritação.
— Não vou precisar voltar?
— Se depender de mim, não — Sirius quem respondeu, com a voz séria e carregada de raiva. — Como puderam fazer isso?! Bem que James disse que a irmã da Lily não parecia uma boa pessoa. Era para você estar seguro com eles!
— Por Merlin… Harry…
— Vou poder morar aqui então? — Potter perguntou, um pequeno sorriso começando a surgir em seu rosto.
Remus assentiu rapidamente, e o sorriso do garoto aumentou. Harry o abraçou, e ele retribuiu com força.
Se soubesse exatamente o que acontecia, tentaria ajudá-lo antes. Não conseguia imaginar o que mais Harry poderia ter sofrido naquela casa, mas ele nunca mais deixaria que passasse por isso. Havia jurado a si mesmo no ano anterior, quando decidiu aceitar o trabalho em Hogwarts, que o protegeria, e manteria essa promessa.
Faria o seu melhor para deixá-lo bem e que fosse muito mais feliz ali do que com os tios.
Remus estava realmente furioso com os Dursley, assim como Sirius.
Sirius fervia de raiva. Durante todos aqueles anos em Azkaban, tinha esperança que os filhos e o afilhado estivessem seguros. Quando Hagrid o levou, havia lhe garantido que Dumbledore o levaria a um lugar seguro, mas isso nunca aconteceu. Sentia raiva por terem mentido para si, por Harry ter sofrido tudo o que sofreu, e dele mesmo por não conseguir protegê-lo disso.
Sentiu-se, no fundo, também culpado por isso. Como padrinho, era seu dever proteger Harry. James confiou em si para isso e havia falhado.
— Isso não vai ficar assim! — esbravejou e virou-se para sair.
— Sirius! — Therion impediu-o e segurou-o pelo braço. — Sair daqui e atacar os Dursley não vai ajudar nem um pouco. Eu adoraria fazer isso, mas seria uma péssima ideia e sua condenação foi justamente por assassinar trouxas!
— E agora vou dar um bom motivo para essa condenação.
— Não é culpa sua e ir atrás deles agora não vai resolver nada. Harry está aqui!
Sirius olhou para o filho, que possuía uma expressão neutra no rosto, mas seus olhos falavam por si só. Respirou fundo, tentando acalmar os nervosos acalorados pelo momento.
Therion sentia como Sirius e Remus estavam bastante irritados com tudo. Ele mesmo ficava ao pensar em tudo que Harry sofreu, mas também sabia que nem sempre deixar-se levar pela raiva era uma boa ideia. Ele e o irmão eram ótimas provas disso.
— Se fizer isso, vai voltar para Azkaban.
— É… Está certo.
— Quando não estou?
— Menos, Reggie. Parece a sua mãe falando.
O garoto franziu o cenho pela forma como foi chamado.
— Não podemos ignorar isso. Não se trata uma criança desse jeito! — Remus disse com a voz banhada de irritação após afastar-se de Harry.
— Papai, nós tiramos o Harry de lá justamente por isso. Ele vai ficar bem melhor aqui — disse Canis, aproximando-se do pai. — Vamos só deixar ele bem longe deles. Eles nem vão se preocupar de não ter o Harry por lá.
— Eu não quero que vocês se encrenquem por minha culpa. Só não me deixem voltar pra lá — disse Harry num tom ainda mais suplicante.
— Os Dursley nunca mais vão chegar perto de você — Remus disse firme, segurando o rosto de Harry delicadamente. — Eu prometo, okay? Não vou deixar eles te machucarem.
Potter assentiu com a cabeça, sentindo o peito aquecer com aquela promessa. Estar seguro longe dos tios é tudo o que ele mais queria.
— Me diz que pelo menos vocês não vieram voando — Remus disse aos filhos.
Os gêmeos sorriram torto, já sendo resposta o suficiente.
— Vocês poderiam ter sido vistos!
— Era o jeito mais rápido de chegar até lá e trazer o Harry — Canis respondeu, dando de ombros.
— E de serem vistos por trouxas e violarem o Estatuto Internacional de Sigilo em Magia.
— Se tivéssemos sido vistos, já teríamos recebido uma intimação do Ministério. Eles são bem rápidos — disse Therion.
— O importante é que conseguiram não ser vistos e Harry está aqui, seguro — falou Sirius e mais uma vez abraçou o afilhado. — Ah… Como eu quero acabar com aqueles…
— Sirius…
— Eu sei! Eu sei! Mas posso pelo menos sentir raiva deles — ele suspirou e apertou Harry em seus braços. — Vamos cuidar de você, okay?
— Obrigado — Harry agradeceu, enterrando o rosto no peito do padrinho enquanto o abraçava com força. Seus olhos começaram a marejar.
— O que mais eles fizeram com você?
Harry não respondeu, apenas encolheu-se nos braços de Sirius. Therion percebeu como Potter sentia-se tenso e mal com a pergunta, e ele sabia como o amigo não gostava de pensar nos tios. Tinha certeza que ainda não sabia de muita coisa que podia ter acontecido.
As lágrimas escorreram pelo rosto de Harry sem que ele permitisse, e ele fechou os olhos com força, tentando pensar apenas na sensação acolhedora e calorosa do abraço de Sirius e não no inferno que era sua vida com os Dursley.
— Não precisa falar agora. Nós temos tempo para isso — Remus disse ao perceber que o garoto começou a chorar silenciosamente e se aproximou, pousando uma mão nos ombros de Sirius e outra nos cabelos escuros de Harry. — Está seguro agora.
— Obrigado, obrigado, obrigado — Harry começou a agradecer uma vez atrás da outra.
— Já dissemos, Hazz… Você é da família — Canopus disse.
— E sempre vamos estar aqui para te ajudar e te acolher — Therion completou.
Os gêmeos também se aproximaram e abraçaram Potter. As lágrimas apenas se intensificaram, mas um pequeno sorriso surgiu por entre seus lábios graças ao grande conforto de sentir-se acolhido. Ele gostava de ser daquela família, ser realmente apreciado, amado como ele é de verdade.
E todos ali estavam a postos para cuidar e protegê-lo de tudo, custe o que custar. Harry também estava disposto a fazer de tudo por eles, com todas as suas forças.
Remus e Sirius se entreolharam, numa curta conversa silenciosa. Ambos estavam bastante preocupados com Potter e tudo que havia ocorrido nos últimos anos longe deles. Black sabia muito bem, por experiência própria, o que era viver um terror com uma família que somente o fazia mal e abusava de todo o seu psicológico, tudo o que isso podia causar, por mais bem que a pessoa possa parecer.
Orion e Walburga Black nunca foram os melhores exemplos de pais e tutores. Sirius sofreu muito em sua casa, desde pressões constantes para ser o primogênito perfeito e exemplo da família Black a castigos severos por não cumprir as expectativas ou por alguma atitude rebelde. Muitas das maldições que ele recebeu ao longo da vida vieram dos próprios pais, sobretudo sua mãe, que certamente era muito mais rígida e estava constantemente castigando-o por algo. Não queria pensar no afilhado passando pelo mesmo com aqueles trouxas.
Não desejava o terror que sofreu em sua infância a ninguém, nem o menor dos castigos. Seu único apoio, por muito tempo, foram o irmão e o tio, que estavam ali para ajudá-lo a levantar-se e sobreviver.
Agora ele estava ali pronto para ser o apoio que Harry precisava, e Remus também. Os dois não precisaram falar para entrarem num acordo, apenas uma intensa troca de olhares: eles cuidariam de seus garotos, os três.
— Vem, Harry. Vamos comer, você deve estar com fome — Remus disse num tom calmo e cuidadoso com o garoto, afastando-o devagar de Sirius e dos garotos. Ele secou as lágrimas do garoto, que apenas concordou com a cabeça.
Harry foi levado até a mesa, e Sirius tratou de levar todo o café da manhã até lá e preparar muito mais. Remus ajudou-o, enquanto os gêmeos sentavam-se junto de Potter.
O garoto retirou os óculos para secar as lágrimas que molhavam seu rosto. Olhou ao redor com a visão bastante embaçada, não conseguindo perceber muitos detalhes do lugar. Dali tinha uma boa vista da entrada e da sala de estar ao longe, e a casa parecia bastante aconchegante.
Ele sentiu a mão de Therion ajudando a secar suas lágrimas e voltou seus olhos na direção dele, mesmo que não pudesse diferenciar muitos de seus traços. Realmente possuía uma péssima visão sem aqueles óculos.
— Falei que daria tudo certo — disse num sussurro.
— Agora você oficialmente é um morador dessa casa — Canis disse. — Já podemos arrumar um quarto só pra você.
Harry riu baixo.
— Acho que não me incomodaria de dividir com vocês, não quero causar muito trabalho.
— Três é demais. Já me basta o Therion.
— Ei!
— Mas você será sempre muito bem vindo no nosso quarto e nós no seu. Para sua sorte, o quarto do Sirius é bastante grifinório, perfeito pra você!
Therion revirou os olhos, empurrando o ombro do irmão.
— É do mesmo tamanho do nosso, talvez até maior, e vai ser todinho seu. Um espaço só pra você. Sirius pode ficar no chão da sala ou no sofá, como um bom cão de guarda. Ele já dorme na forma de cachorro mesmo — prosseguiu Canis e deu de ombros. — E assim, menos tempo para eu ficar sobrando com vocês dois.
Harry e Therion empurraram o garoto juntos desta vez, ambos com os rostos vermelhos de vergonha, enquanto Canopus ria.
Sirius e Remus saíram da cozinha com pratos cheios de bacon, ovos e panquecas, sorrindo de leve ao ver os garotos juntos e rindo.
— Cadê meus óculos? — Harry perguntou, tateando a mesa após já sentir-se melhor e secar o rosto molhado.
— Bem na sua frente. Você realmente não enxerga nada sem eles, não é? — Therion disse rindo, pegando os óculos e colocando no rosto de Potter.
Harry balançou a cabeça negativamente, concordando com o Black. Sorriu de leve ao ver o rosto do outro com mais nitidez.
— Acho que talvez precise de novas lentes, mas meus tios não vão me levar ao oftalmo de novo. Já foi difícil minha professora convencê-los a me levar na primeira vez.
— Nós podemos fazer um check up completo e ver isso — Remus disse ao ouví-lo. — Tudo bem se eu te levar ao St. Mungus?
— Que lugar é esse?
— Um hospital bruxo.
— Eu não estou doente…
— Somente para saber se está realmente tudo bem com você, depois de tudo — Lupin falou com cautela para o garoto, que ficou um pouco receoso ao ouvir sobre o lugar. — Os bruxos podem se fazer de fortes, mas precisamos cuidar da nossa saúde tanto quanto os trouxas. Só por precaução… Me preocupo sabendo que seus tios não cuidavam bem de você. E pode examinar seus olhos caso precise de lentes novas para os óculos.
— Não sou fã de hospitais… — Harry encolheu os ombros.
— Não precisa se não quiser.
— Tudo bem, eu vou. Mas… Não precisa ser hoje, não é?
— Não, não precisa — Remus disse compreensivo e fez um leve carinho nos cabelos de Harry. Potter balançou a cabeça concordando e voltou a olhar para a mesa. — Vamos comer. Pode pegar tudo o que quiser.
Harry assentiu, e viu os gêmeos já começando a se servirem. Ele olhou para eles, antes de também começar a se servir e comer, enquanto Sirius lhe entregava uma xícara de chocolate quente.
Remus puxou uma cadeira para sentar-se, mas então olhou para Sirius. O Black olhava para o afilhado e os filhos juntos com um brilho triste em seus olhos. Eles se conheciam o suficiente para perceber os pequenos detalhes de preocupação, culpa e dor no olhar do outro.
Quando Sirius desviou o olhar, Therion olhou em sua direção, sentindo sua cabeça voltar a doer depois de muito tempo e um aperto angustiante no peito.
— E-eu… Eu volto logo — Sirius disse e forçou um sorriso fraco, logo deixando o cômodo e seguindo para às escadas.
Lupin seguiu-o com o olhar, sentindo o coração apertado no peito e que Sirius não estava bem.
— Fiquem aqui. Eu preciso conversar um pouco com ele — disse aos garotos e não demorou a ir também.
— O que houve? — Harry franziu o cenho. Os gêmeos deram de ombros, continuando a comer. — Sirius está bem?
— Para um ex-presidiário, ele está ótimo — disse Canopus com indiferença.
— Vai ficar tudo bem — Therion disse calmo para tranquilizar Potter, mesmo que soubesse que era o exato oposto. Ele olhou na direção por onde o pai e Sirius foram. — Logo eles voltam. Só… Devem estar pensando em tudo, não se preocupe.
— Quer geleia? — Canis pegou o pote de geleia e estendeu para Harry, que pegou-o de bom grado.
Enquanto os garotos permaneciam na mesa de jantar saboreando seu café da manhã, Remus seguiu Sirius até o quarto do Black, onde encontrou-o de costas para si, suspirando e passando a mão pelos cabelos nervosamente. Ele fechou a porta do quarto e se aproximou do homem devagar.
Sirius respirou fundo, sentindo os olhos queimarem, a garganta e o peito doerem, sufocado pela própria dor e culpa. Ele ouviu o som dos passos atrás de si e da porta se fechando, e cerrou os olhos com força.
— Sirius, o que houve? — Remus perguntou cuidadosamente, num tom calmo e preocupado, logo atrás do Black. — Sei que não está bem.
— Não, não estou — Sirius admitiu. Detestava admitir isso tanto quanto Remus, mas aquilo estava doendo demais para suportar sozinho.
— Quer conversar e contar o que está acontecendo? — Lupin tocou carinhosamente o ombro de Sirius, que logo levou a mão até a sua e virou-se de frente para si. Os olhos do Black estavam marejados e tristes.
— Aconteceu que eu vi que sou um péssimo padrinho e falhei com o James — confessou, com a voz carregada de culpa e tristeza.
— Por que pensa isso?
Sirius afastou-se de Lupin e sentou-se em sua cama, encolhendo as pernas e abraçando os joelhos enquanto escorava na cabeceira. Algumas lágrimas começaram a escapar dos olhos acinzentados, e ele permitiu que caíssem por seu rosto. Estava sentindo-se péssimo, inútil.
Não merecia ser padrinho do Harry. Não merecia os seus filhos. Ele falhou miseravelmente no seu papel com eles, longe por 12 longos anos em que deveria ter estado ao lado daqueles garotos que precisavam tanto dele.
Ele tentou não pensar nisso, esquecer de tudo. Ignorar todos os pesadelos com Azkaban, com as memórias terríveis da Guerra, com a casa onde nasceu. Mas não era fácil e não poderia,isso não apagaria o que houve.
Queria apenas tentar viver ali ao lado dos filhos e de Remus, reaproximar-se deles; porém, o passado não ia embora.
Ele viveu nas últimas semanas, durante o dia, uma perfeita ilusão. Ali estava, de volta ao seu lar, mais uma vez ao lado das pessoas que mais amava e mais importavam, como se o tempo não tivesse passado. Imaginava como seria se nada tivesse acontecido e os três continuassem vivendo juntos; Remus consigo ajudando-o a cuidar da casa e dos seus filhos, vendo os garotos crescerem e indo estudar em Hogwarts, para depois voltarem nas férias e eles aproveitarem. Tentou recriar os laços com os gêmeos, mesmo sabendo que não seria fácil.
Mas à noite, os pesadelos voltavam. E agora, ele percebia que eram reais e não adiantava se iludir que tudo estava bem, porque não estava. Ele havia falhado com todos.
Remus sabia muito bem como era a sensação. Ele sentia a mesma coisa, a mesma culpa, desde o momento em que acordou na floresta e viu o filho caído, machucado e banhado de sangue, bem ao seu lado, após uma lua cheia.
— Eu deveria cuidar do Harry, proteger ele — Sirius começou a falar. Remus sentou-se na beirada da cama, ao seu lado, ouvindo tudo. — James confiou em mim! Quando me escolheu como padrinho, ele me confiou a vida do Harry, confiou que eu o protegeria se algo acontecesse, e eu não fiz isso. Ele sofreu anos passando por sabe-se lá mais o quê naquela casa.
— Não tinha como você fazer nada, Sirius. Você estava…
— Preso, em Azkaban — completou, dolorido.
— Você não tem culpa — Remus apressou-se em falar.
— Naquela noite, eu não devia ter deixado o Hagrid levar ele. Deveria ter pego o Harry e voltado para cá, trazido ele para onde realmente estaria seguro, conosco. Eu confiei que Dumbledore o deixaria seguro e olha o que aconteceu! Harry era minha responsabilidade. Mas eu falhei e ainda me deixei levar pela raiva e caí na armadilha daquele rato imundo e… E...
Sirius encolheu-se e escondeu o rosto entre os joelhos, deixando-se chorar. Ele queria tanto poder mudar tudo o que houve, tanto. Ser um bom pai, um bom padrinho; não aquela pessoa inútil que traiu a confiança do melhor amigo ao falhar daquela maneira. Era um sentimento que consumia Black desde sua alma todo o seu ser.
— Eu falhei com eles e perdi tudo… — lamentou. — Perdi toda a vida dos meus filhos e do Harry, não pude ajudá-los… Killian estava certo.
— Por Merlin, Sirius! — Remus exclamou.
— Ele disse que eu condenaria a vida de todos que importam pra mim, como toda minha família… Como meu irmão… Ele estava certo.
— Não, não estava! E ele não falou sério, só estava exaltado, com raiva e com medo da Guerra.
— Com tanta raiva que foi embora e sumiu, talvez nem esteja mais vivo — Sirius comentou e riu sem emoção, erguendo o rosto para Remus, manchado pelas lágrimas que não paravam de cair. — Onde quer que esteja, deve estar rindo de mim por ter razão. Matei a irmã dele, o meu irmão, o James, a Lily... Acho que meus filhos têm motivos mais que suficientes para me odiar.
— Sirius...
— Talvez você não devesse ter impedido o Canis de usar a Maldição Cruciatus em mim.
— Sirius, está ouvindo o que está dizendo?! — Remus questionou completamente abalado e surpreso com as palavras do outro.
— Você não ouviu seus filhos dizendo o quanto você desgraçou a vida deles. Eu apenas os faço mal…
Remus comprimiu os lábios quando não conseguiu mais conter as próprias lágrimas, tentando inútilmente não chorar. Doía demais ver Sirius tão quebrado e vulnerável, sofrendo com uma culpa que não era dele, e saber que ele tentava guardar tudo isso dentro de si.
Sirius estava completamente despedaçado depois de todos aqueles anos preso em Azkaban, mas custou a admitir isso. Era quase uma maldição de família; sofrer, mas nunca deixar-se parecer fraco, sempre com a postura erguida… Assim que um Black deve ser, não demonstrar nenhuma dor, apenas força.
Mas ele não tinha mais força alguma para se sustentar. De repente, estava desabando em ruínas e não sabia se conseguiria reconstruir tudo outra vez.
Se ele tivesse agido com menos impulso, se tivesse pensado melhor, talvez as coisas não estivessem daquela maneira. Tudo estaria bem.
Lupin aproximou-se mais dele, rodeando-o com seu braço e trazendo-o para um abraço. Sirius abraçou-o e enterrou o rosto em seu peito, chorando tanto ou até mais que no dia que reencontrou-o naquela casa. Remus também chorava, compartilhando da dor do Black.
Naquele dia de lua cheia, na Casa dos Gritos, quando chegou apressado, pôde ouvir a voz de Canopus gritar com Sirius. Não ouviu tudo, mas o que ouviu foi o suficiente para perceber o quanto o garoto estava extremamente abalado e descontrolado e que isso refletiria em sua magia.
Ele esperava muitos feitiços, mas, certamente, não imaginou que Canis seria capaz de lançar uma Maldição Cruciatus. E aquela era uma das culpas que carregava, por não ter percebido antes que o filho estava tão carregado com toda a situação de Sirius que naquele instante estava explodindo.
O garoto se parecia mais com Sirius do que gostaria. Eles eram ótimos em guardar todo o sofrimento para si até não suportarem mais e tudo eclodir de inimagináveis formas, como uma bomba-relógio. Lupin já presenciou isso de perto mais de uma vez.
Remus tinha que admitir que tinha um pouco disso também, mesmo que não fosse algo bom. Ele fazia de tudo para não preocupar ninguém.
Lembra-se muito bem de um dia, no quarto ano em Hogwarts, quando viu Sirius brigar seriamente com o irmão caçula pela primeira vez. Black andava sofrendo tanto com a forma que sua família o tratava e tentando guardar tudo isso, que naquele momento, simplesmente explodiu e gritou tanto que seu irmão foi para a própria comunal chorando.
Pouco depois, o próprio Sirius chorava encolhido em sua cama. Ele quem o consolou, enquanto James verificava o outro Black.
Houve outros momentos semelhantes, todos terríveis e sofridos. Remus odiava isso.
— Não é culpa sua, okay? — murmurou baixinho para ele. — Você também foi a vítima nessa história.
— Eles me odeiam e com razão. Harry deveria me odiar também.
— Não acho que seja ódio agora, só… Ressentimento. Foram anos difíceis para todos nós — explicou. — O único culpado por tudo é o Peter. Somente ele.
Sirius não disse nada, e Lupin continuou.
— Eu entendo o que você está sentindo, mas vai ficar tudo bem. Harry está seguro conosco, vou levá-lo a um medibruxo e ele vai ficar inteiramente bem. Nós vamos cuidar dele e ajudá-lo — falou. — E sobre os meninos… Vamos superar tudo, juntos, okay? Eu vou conversar melhor com eles. Sabíamos que nada seria fácil a partir de agora.
— Eu fiquei 12 anos longe deles…
— E agora vai ficar muitos anos ao lado deles. Não vou te deixar sozinho de novo! Vou te ajudar, é para isso que estou aqui.
— Como consegue ainda estar comigo depois de tudo? — Sirius ergueu a cabeça e encarou Lupin, que olhou-o de volta, em silêncio.
Remus não respondeu a pergunta de imediato. Ele apenas encarou aqueles olhos inundados, enquanto os seus próprios transbordava lágrimas. Era algo que não conseguiria dizer em voz alta, ainda não. Se dissesse, tinha certeza que se arrependeria depois; não por ser mentira, mas por revelar algo tão profundo que guardava consigo há tanto tempo.
Não conseguiria dizer que, depois de todos aqueles anos, ainda o amava. Tão forte que isso o destruía sempre que se lembrava dele.
Ele amava Sirius Black mais do que seu coração podia suportar.
— Porque eu já falhei demais com você a partir do momento que acreditei naquela armação... — Remus respondeu com a voz falha. — Porque… Porque e-eu…
Sirius permaneceu com os olhos presos nos de Lupin, aguardando que completasse sua resposta. Mas ele não conseguiria completar exatamente como queria.
— E-eu… Eu confio em você — disse, por fim, o que não era uma mentira. — Me desculpa mesmo por não estar ao seu lado antes, mas… Agora eu estou aqui e não vou te deixar.
— Eu fiquei tanto tempo sozinho naquela cela, só… Só remoendo essa culpa por tudo que aconteceu. Toda a minha família, os meus amigos, as pessoas que eu amo… Destruí tudo.
— Não destruiu — Remus disse. — E você não está sozinho. Vamos reconstruir tudo de novo…
Black segurou o rosto de Remus entre ambas as mãos, ainda com as lágrimas encharcando sua pele. A emoção em seu peito era tanta que quase não conseguia conter.
Por mais de uma década ele esteve sozinho, jogado dentro de uma cela suja cercado por dementadores e lamuros de sofrimento dos outros prisioneiros, quase sendo levado à loucura. Talvez tenha realmente ficado um pouco louco, impossível sair daquilo com a mente inteiramente sã e sem abalos. Azkaban o destruiu de diversas maneiras.
Durante todo aquele tempo, não viu esperança para si. Ainda carregava uma parcela da culpa por tudo, mesmo não sendo o principal causador de toda a tragédia que o perseguiu ao longo de sua vida. Havia sofrido muito, e quando pensou que tudo estava melhorando, desabou de vez e ele se viu naquela situação deplorável sem seus filhos, sem seus amigos, sem Remus.
Junto a dor, carregou o arrependimento por muitas coisas que não fez ou que faria diferente. Despedir-se de Therion e Canopus, não entregar Harry, ser ele próprio o Fiel do Segredo, dizer a Remus tudo o que sentia e o quanto era importante tê-lo em sua vida, ajudar seu irmão, chegar a tempo para salvar Karina, passar mais tempo com o tio… Tantas coisas ele queria ter feito para impedir todo aquele sofrimento.
Sirius perdeu muitas coisas num curto espaço de tempo. Primeiro seu tio, a quem ele sempre viu como um pai. Depois, a mãe de seus filhos estava morta em seus braços, e ele demorou muito tempo para tirar aquilo de sua mente. Então, também perdeu seu irmão mais novo, a quem ele também poderia ter salvo se tivesse se esforçado e deixado o ressentimento de lado. E logo em seguida, encontrou o corpo do seu melhor amigo aos seus pés em Godric's Hollow e perdeu os filhos na mesma noite.
Uma coisa atrás da outra. Em pouco mais de um ano, ele perdeu absolutamente tudo. E teve tempo suficiente para remoer aquela dor em Azkaban.
Seu único consolo era ter esperança de que seus filhos e Harry estavam seguros, que Remus estaria bem e cuidando dos gêmeos. Tentou a todo custo não pensar na pior das hipóteses, na qual seus bebês acabariam nas garras da família Black; ficou no otimismo de todos estarem bem.
Infelizmente, mesmo que o pior não tenha acontecido a seus filhos, ninguém estava bem como ele queria que estivesse.
Agora, ao menos, estava de volta e Remus estava ao seu lado. Ele estava ali. Isso é tudo o que Sirius precisava naquele momento.
— Obrigado, Remmy… Obrigado… — agradeceu num sussurro sôfrego, juntando suas testas.
— Eu estou aqui — Remus repetiu para Sirius. — Vamos seguir em frente e resolver tudo juntos, está bem? Eu, você, Therry, Canis, Harry… Todos juntos agora.
— Eu só queria a nossa família de volta… — Sirius admitiu. — Como antes...
— Você já tem.
As lágrimas do Black se intensificaram, e Remus tratou de rapidamente secá-las com cuidado, com os olhos fixos nos do outro.
— Nada do que aconteceu foi culpa sua. Você não é como sua família e, com certeza, não está nos destruindo — disse num tom mais baixo. — Precisamos de você... Eu preciso... Estamos aqui, juntos.
Eles uniram suas mãos e entrelaçaram seus dedos, ainda secando as lágrimas alheias e acariciando levemente o rosto. Parecia uma grande necessidade sempre estarem assim juntos, cuidando um do outro, servindo de apoio.
Remus podia sufocar todos os seus sentimentos, mas não conseguia ficar longe de Sirius, nem mesmo se quisesse. E Black também precisava sempre tê-lo por perto, era a sua tranquilidade e o suporte que necessitava.
Nos momentos em que Sirius mais precisava, Remus estava lá. Sempre esteve. Ele o motivava a seguir adiante, a ser melhor do que as expectativas deturpadas de sua família. Quando se viu completamente sem chão, ele estava lá para reerguê-lo. Isso foi o que o conquistou ao longo do tempo.
Sirius precisava de Remus, e Remus precisava dele. E agora nada os impediria de continuarem juntos sendo o apoio que o outro precisa.
Estavam em ruínas, mas iriam reconstruir tudo de novo pedra por pedra, dia após dia... Lua por lua.
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Olá, meu amores!
Tudo bem?
Demorei, mas voltei!
Era para sair att dupla, mas não consegui terminar outro cap, então fica pra próxima rsrsrs
Capítulo meio sad, mas importante para mostrar um pouquinho mais de como o Sirius está se sentindo e o desenvolvimento do nosso Wolfstar amado 🥺🥺
Agora Harry tá oficialmente morando com eles e poderemos dizer com muito gosto que ele vai ser muito mimado 🤧
Família reunida e juntinha 🙌🙌
Veremos bastante deles agora todos juntos até a volta às aulas e quero mostrar muita coisa. Aguardem!
Já antecipo a vocês um Feliz Ano Novo e que 2022 seja um ótimo ano para todos!
Em breve retorno com mais um capítulo!
Até a próxima!
Beijinhos,
Bye bye 👋😗
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