você nunca vai fugir! | Part 01 /69/
“Você está linda com sangue
por todo o rosto.”
“Tenha medo... Isso mesmo,
porque você nunca vai fugir.”
“Se continuar alisando a barriga desse jeito e falando com essa voz gostosa com ele, vou mandá-lo estudar bem longe de casa. Não quero perder minha esposa...”
Eu suspirei ao ouvir aquelas palavras, respondi, na ponta dos pés e abraçando-o. Parecem anos distantes e não semanas. Me agarro a essas últimas lembranças com meu marido como se elas fossem escorregar por entre os dedos.
“Eu sempre vou te amar e querer perto, junto e dentro de mim. ”
Ele me agarrou pela cintura, tirou meus pés do chão, um sorriso enrugado iluminou seu rosto salpicado de sardas. Estávamos felizes, em desejo mútuo, era meu aniversário e eu estava extasiada, nós nos beijamos...
— Poppy, Gongju? — Joon chama, a voz me tirando dos devaneios. Evito torcer o nariz quando ouço ele me chamar de princesa pela sétima vez só nesta semana. Como uma palavra doce ganhou esse aspecto tão ácido?
— Sim, Sanchon?
— Coma. Você precisa comer, a sopa vai esfriar. É certo que a gravidez te deixou mais linda, mas se alimente... — ele informa com indelicadeza, pegando os pauzinhos para se servir de macarrão, batata, ovos e outros tipos de Banchan.
Um banquete de rolinhos, patê de peixe, espinafre, rabanetes, omelete, soju e variedades de carne suína e bovina é servido na mesa quadrada para dois; apenas me servi de sopa com kimchi e não consegui tocar mais no jantar.
Aos poucos os dias vão se transformando nesta espécie de pesadelo sarcástico. Sanchon ignorou totalmente o que eu disse sobre meu bebê, mas não pude ignorar nada do que ele me revelou, ou seus comentários pouco favoráveis, na verdade é quase como se meu tio não se importasse. Ele me presenteia com roupas, uma delas um quipão longo azul claro com bordados dourados em que estou vestida agora. Quando tento conversar, quando ele sente que a conversa está tomando um rumo perigoso e indesejado, muda de assunto; fala sobre a casa/templo em que estamos, sim, um templo budista adaptado para uma residência específica, ladeada pelo bosque amarelo, pelas montanhas e por um imenso rio dourado, perto de uma aldeia que ainda está ao longe.
Como um pouco da sopa de frutos do mar, engolindo o caldo, o frango e o macarrão.
Eu quero que as horas passem o mais rápido possível. Eu tenho até desejado que Dale apareça.
Devo lembrar constantemente que preciso me alimentar, se não por mim, pelo bem do meu bebê. Estou fraca, o sangramento nasal persiste e o médico de Sanchon disse que deve ser apenas efeito colateral devido ter "mudado" de país recentemente, porém eu o ouvi dizer em segredo que não tinha ideia do que estava acontecendo comigo, temia que fosse perigoso e continuaria fazendo tantos testes quanto possível.
Só de pensar em perder meu bebê me dá vontade de vomitar. Receio que o pacto de sangue seja o motivo do meu enfraquecimento gradativo, das minhas constantes dores de cabeça. Se perder o que tenho de mais precioso, então... Não sobrará muito de mim.
Entorno o copo com refrigerante de uva, bebendo até a última gota doce. Exploro a sala de jantar, tentando recolher o máximo de informação possível sobre o local onde estou, até ao mais ínfimo pormenor.
Yoona, uma das jovens empregadas (que me parece familiar mesmo que não lembre de tal rosto) e um guarda estão prostrados nas portas duplas. As luzes das lâmpadas modernas estão reduzidas, espalhando uma atmosfera romântica pelo cômodo. O aquário de águas-vivas cobre metade da parede direita, os corpos transparentes e de aspecto gelatinosos dançam lentamente, é relaxante observá-los, assim como as outras paredes gravadas por pinturas ornamentais que parecem ter sido... Retocadas recentemente porque brilham na luz baixa.
Na parede atrás de Sanchon há prateleiras cheias de pedrinhas e uma estátua prateada de um monge budista que vi em algum lugar. Miniaturas douradas de Buda também reluzem em uma pequena mesa cercados por incensos em forma de flor de lótus. Titio não é iconoclasta, mesmo o templo tendo passado por reformas, readaptado em uma casa convencional, ainda exala os detalhes da religião; respeitados em todos os cantos, das maçanetas até as janelas, o piso encerado, o silêncio quase absoluto, o corredor xamânico... É um templo antigo! O que significa que Samchon é dono há pelo menos alguns anos, embora Joon tenha fornecido informações importantes sobre onde estamos não quer dizer nada, existe milhares de lugares assim na Coreia.
Por que Appa nunca me trouxe aqui? Por que Joon esperou todos esses anos para me trazer...?
O colar de Harin de repente pesa uma tonelada no meu pescoço. Appa não me queria nos templos, Appa sequer conseguia entrar em um templo budista depois do que aconteceu com sua irmã...
Harin
Nunca soube muitas coisas a respeito dela, mas sei que foi encontrada em um antigo templo nas montanhas, perto do vilarejo e dos rios. Ela foi achada morta, abusada em um lugar como esse.
Morta e abusada.
Um ruído de choro escapa dos meus lábios quando meus olhos pousam sobre Sanchon. Ele não seria capaz de algo tão perverso, não... Seria terrível até para ele.
Existem outros templos localizados em lugares parecidos, é só uma coincidência horrível.
Mas seria novidade se ele gostasse da irmã da mesma maneira que gosta da sobrinha...?
“Este colar pertencia à minha irmã e eu só poderia dá-lo a alguém que amo tanto.”
— Não! — a palavra escapa dos meus lábios.
Sanchon me encara, os olhos estreitos e escuros esbanjando delicada frieza e uma astúcia severa.
— Tá tudo bem?
— Hmmmm O senhor, você não me contou como conseguiu me trazer aqui, sabe eu não me lembro de nada. — desconverso, sentindo o calor subir pela espinha.
A testa dele enrrugou, deixou os hashi sobre o prato e rescosto-se na cadeira. Joon me olha como se pudesse ler minhas verdadeiras intenções, sem hesitar e limitando-se os olhos aos meus ele contou tudo, a voz suave e baixa: disse que me resgatou através de um submarino do governo coreano e depois me levou para uma ilha adquirida por seu pseudônimo italiano, não muito longe do forte. E de lá pegamos um helicóptero que nos levou até o jato do cônsul coreano na França.
— Tive que consumar diversas alianças com o governo, conseguir o submarino para meus propósitos não foi fácil. De modo geral precisei lidar e calcular problemas intransponíveis, faria tudo de novo para tê-la aqui. Depois daquela ligação Poppy eu poderia ter enlouquecido, só sabia que precisava te salvar, te levar de volta para casa.
Balanço a cabeça e enfatizo:
— Não. Sanchon, eu deixei claro na ligação. Minha única intenção ao ligar foi pedir para que libertasse a Julianne e depois, queria sa-salvá-lo porque meu marido iria matá-lo! E você sabe. Ele vai matar! ELE, ele vai te matar!
Os olhos negros voltaram-se para minha mão, o rubi da aliança destacado, com um movimento escondo atrás dos pratos.
— Matar? — Joon alonga o sorriso forçado, carregado de um azedume. — Isso se eu não matá-lo antes. Eu fiz o que tinha que ser feito, eu sou o seu guardião, Poppy! Eu te protejo desde os meus vinte e poucos anos!
Guardião? O ar chega me falta, a tontura estranha e a esperada pontada de dor de cabeça nubla meus pensamentos.
— Guardião? — replico, fechando os olhos e esfregando a testa, tudo que consigo fazer além de gemer com a dor. Tudo começa a... Girar.
— É. Seu guardião, eu sempre fui e quando Kang morreu ele queria que eu fosse seu protetor e não aquele sardento ! Dale nunca, jamais será seu protetor. É melhor que pare com essa...
— Eu não... Não posso...
Abro os olhos, mas minha visão fica embaçada, distorcida por sombras negras orbitantes.
O que faço é tentar ver minha mão, mas quando olho para minha tigela de sopa vejo... Vermes... Vermes se contorcendo, vermes no lugar do macarrão.
Eu os comi? o arroz virou larvas gordurosas e pegajosas, o resto da mesa me dá dor no estômago, eu tusso querendo vomitar. A Ânsia sobe pela garganta.
— Poppy?
Besouros grandes, minhocas, baratas fedorentas rastejando para fora dos pratos, lesmas do tamanho de uma bola de basebol enroladas na toalha de mesa, formigas, formigas gigantescas e pequenas aranhas roendo o rabanete, rastejando para fora da casca das nêsperas.
— O quê é isso?? O que tá acontecendo?!! — esfrego os olhos com força.
Como se fosse ilusão de ótica, um truque de mágica ou brincadeira, não vejo mais nenhum inseto na mesa. Nada nojento, tudo do jeito que estava antes, quente, cheiroso e delicioso.
— Poppy o que foi?
— Eu... Eu vi...
Sinto a cor sumir do meu rosto, um arrepio percorre minha espinha e todo o meu corpo treme quando meus olhos veem os do Tio Joon. Não mais ele, mas algum tipo de besta, seus globos oculares ficaram pretos, sua boca pinga sangue e todo o seu rosto bonito é coberto de tatuagens, tatuagens marcadas à fogo que contam algum tipo de história doentia. A katana opalescente na testa. Estou ficando louca? Não sei o que está acontecendo, pulo da cadeira, me abraçando com as próprias mãos. O aquário com águas-vivas dançantes escureceu, todas mortas. A empregada e o guarda são caveiras ambulantes e os budas na mesa olham para mim, gargalham de mim.
— O que você fez comigo? O QUE VOCÊ COLOCOU NA MINHA Comida??!!!! — As palavras saem da minha boca sem nenhum esforço. Joon, ou seja lá o que ele se tornou, se levanta após a acusação, as roupas leves e casuais que usava se transformaram em uma espécie de manto preto tremeluzente. suas unhas gotejam sangue e ouço um coração, um coração que não é o meu batendo acelerado.
“morte, morte, morte. Ceifador, ceifador, ceifador, amaldiçoado, Maldição”
Sussurros o cercam, risadas, gritos e pedidos de misericórdia. Joon retruca com os lábios num sorriso sangrento, cheio de malícia escapando na ponta da língua:
— Você é linda Poppy, mas está começando a me irritar... Ahh querida eu não fiz nada. Você está vulnerável, se eu quisesse fazer algo com você agora, se eu quisesse te machucar eu não iria te drogar... Por que iria?
— Me deixe ir!!!! Me deixe ir!!!
— Poppy! Poppy volte aqui!!!!
Tarde demais. Eu fujo, Yoona tenta me segurar e eu empurro-a para longe, nem o guarda consegue me deter.
Corro pelo corredor tampando as orelhas para não escutar nada além do coração acelerado pulsando na minha barriga. Entro no quarto, bato a porta. O mundo desmoranando aos meus pés.
Encolhida na cama. Meus olhos fechados, meus cílios molhados, o único som audível é o meu choro, meus sussurros. Acaricio a barriga, acalmando os chutes do bebezinho, dizendo que no final tudo vai ficar bem, vou levá-lo de volta para o conforto.
Vamos voltar para casa.
O medo copioso, a loucura que se manifestou ameaça arrebentar novamente, contudo me forço a focar nas profundezas daqueles olhos amarelos semelhantes à ouro, naquela voz penetrante que traçou em meus lábios, em minha alma o mais profundo significado do amor.
“Você é minha melodia, Dale.”
“Eu te amo.”
Cidades em chamas, inundações e escombros. Destruição profunda. Carros e caminhões colidindo. O mundo e sua catástrofe adormecem em meio a todo esse caos. A loucura adormece.
“ Eu também te amo meu leão.”
“ Eu não só te amo. Te amo é limitado demais minha Papoula. Eu vivo por ti.”
Meu coração e meus pensamentos seguem uma rota de fuga. Tento me munir. Resgato as lembranças mais doces e selvagens: Bailes, tempestades, penhasco e falésias; masmorra, borboletario, jardins e mar. Nosso casamento, nosso beijo, nossas músicas. Nossos jantares e sabores... nosso sexo feroz e arrebatador.
“Então uma palavra significa o que eu sinto, Siena. ” “Eu Siena você.”
Engulo a dor. Vença, seja forte. Minhas pálpebras pesadas entreabrem, acho que o rubi da minha aliança de repente reluziu quando pronunciei:
— Eu Dale você, para sempre.
— Senhorita! Senhorita Hu Park.
Desperto com batidas fortes na porta. O rosto pressionado contra os travesseiros.
Saio da cama lembrando do que aconteceu, do meu ataque. Mordo a língua para não xingar quando olho o relógio na parede, só faz meia hora desde o jantar. Não é o dia seguinte!
— Senhorita...
Abro a porta e encontro Yoona segurando uma xícara e uma caixa no antebraço.
— É Sra Macay, sou casada. —Respondo sem querer parecer rabujenta, mas minha voz sai cansada e sem humor.
— Ahh... — Ela pisca os olhos puxados, fitando-me por um longo segundo. Estranhamente famíliar. Talvez ela esteja assustada pensando se a louca poderia atacá-la depois de empurrá-la para tentar sair da sala de jantar mais cedo. Mordo o lábio, desconfortável pela minha atitude.
— Perdão. O Sr. Hu Park ordenou que trouxesse este chá Tisane.
— O que é isso? — indago reconhecendo a caixinha de madeira que ela segura.
— Bem... Acho que é um presente para Sra.
Ela me entrega a caixa. Meu sangue esquenta. Seguro a xícara de chá e antes que Yoona vire às costas eu falo alto:
— Me desculpe, não tive intenção de empurrá-la no jantar.
— Não se preocupe. — ela sorri e acrescenta mordaz: — Joon não lhe envenenou, se é isso que pensa. Eu ajudei na cozinha, não tinha nada de errado com a comida.
— Ah. Obrigada!
Fecho a porta sentindo uma sensação ruim.
Dou de ombros e coloco a xícara sobre a escrivaninha do quarto. Sento-me na poltrona e com a caixa de madeira no colo respiro fundo.
Appa usava a caixa para guardar seu cachimbo favorito. A caixinha retangular de madeira escura com as iniciais gravadas, SHP: Sakura Hu Park.
A filha de Appa que morreu no incêndio.
Giro a fechadura da caixa. Estremeço da cabeça aos pés ao abri-la. É uma carta. Uma carta assinada pelo meu pai.
“ 13/06/2014
Minha querida, pequena e amada filhinha, se está lendo essa simples carta... Infelizmente, Appa não está mais ao seu lado.
Muito jovem fui obrigado a escolher um caminho de tristeza, crueldade e desesperança, isso não me exonera de forma alguma, mas no momento em que escrevo esta carta sou um homem muito melhor por ter uma garota como você. O nirvana está nos teus olhos tão redondos que agora me olham cheios de curiosidade. Brincando com suas bonecas no meu escritório já posso vislumbrar a jovem mulher que vai se tornar.
Linda. Gentil. Corajosa.
No dia que te encontrei soube que vale a pena viver a vida que vivo, vale a pena todas as minhas ações para te proporcionar toda felicidade que você precisa.
Tenho esperança. Sorrio mesmo acreditando que não viverei muito para vê-la independente. Ando preocupado ultimamente, faço de tudo para te ver saudável; meu irmão cuida dos seus médicos, terapeutas, Joon mostra que se preocupa tanto quanto eu... E apesar de ser um homem misterioso, com seus segredos e estando no caminho dele, procuro evitar suspeitas, pois confio nele. Enfim, enquanto estiver vivo, eu trabalho, e vou trabalhar mais para vê-la se casar, ter um filho, talvez? Desejo que realize todos os seus sonhos.
Tenho muitas coisas para falar, daria um milhão de cartas, mas só quero registrar aqui o meu amor incondicional por você. É a filha que sempre sonhei, eu te dei um nome, você me deu a cura... Poppy, minha pequena, Poppy. Eu tatuei seu nome no peito e vou leva-lá pela enternidade.
Nunca se esqueça que, mesmo não estando fisicamente ao seu lado, sempre vou estar contigo em pensamento e que meu amor por você é capaz de viver para sempre.
Com amor, seu Appa. ”
Lágrimas mancham o papel. Acho que estou esquecendo a voz do meu pai, acho que não lembro mais se ele tinha duas pintas na testa que ficavam levantadas quando estava bravo ou rindo. E a risada? Era tão calma ou mesmo profunda e rouca? Ele era doce, talvez muito preocupado, porque tudo nele era bom e demais para mim. Nossos detalhes felizes se perdem pouco a pouco num borrão, minha cabeça foi dominada por lembranças ruins e as boas nada mais são do que lembranças imprecisas se perdendo em um oceano. Memórias cruéis nunca morrem, elas retornam para tentar assombrar de vez em quando.
Eu não aceito isso. Eu vou empurrá-lo para dentro do coração, eu releio, releio e releio a carta que Appa escreveu carinhosamente para mim. O pico de conforto desmanchado após reler a última frase. A nova realidade parece tão pior quanto antes. Gostaria de gravar estas palavras no meu coração, mas irei lê-las até gravar um pouco delas na alma. Minha saudade é tanta! Cadê o homem que eu poderia recorrer sempre? Eu perdi o meu pai, meu real protetor... Eu perdi o anjo guerreiro que lutou por mim.
Appa sonhava que sua filha fosse corajosa e é isso que serei, Corajosa.
***
Selo a carta com um beijo, dobro e coloco de volta na caixa. Não há presente melhor do que esta carta do Appa, ele escreveu e guardou para que eu pudesse ler. Sanchon não tirou esta oportunidade de mim. Talvez seja um ardil, mas meu peito dói por estar tão desconfiada, estou caminhando lentamente na linha tênue do desrespeito. Mas como eu não poderia? Só de olhar para o rosto dele me lembro... Aqueles pesadelos e depois dele ter se declarado para mim... Não há provas! Não tem prova...
Bebo um gole do chá, está gelado! Nem sequer vi a hora passar, sei que tio Joon está acordado. Me sinto mal por estar pensando coisas horríveis de um homem que até ontem eu adorava. Necessito conversar melhor com ele.
Arrumei meus cachos despenteados com os dedos, calcei as sapatilhas e saí do quarto.
A casa/templo é bem iluminada e tem apenas um andar, mas é possível perder-se porque é tão espectacular em geometria, espaçosa e deslumbrante que chega a ser quase surreal nos detalhes, nos níveis de cor e na escolha da madeira. Estão disponíveis vários quartos, quartos que provavelmente eram dormitórios de monges, todos readaptados. Pinturas e espaços dedicados ao budismo e ao deus da montanha Sanshin foram bem preservados.
O cheiro de mirra, cintronela e incenso de mel alivia qualquer sentimento negativo... Ou pelo menos deveria. Ouço os sussurros coreanos dos ninjas vindo de fora, pelo tanto que conheço deles são uns notivagos. Me pergunto se Sanchon está junto deles, mas vou direto para a porta do quarto onde ele fica, não muito longe do meu.
— San... — giro a maçaneta da porta, eu deveria bater, mas foi um gesto totalmente habitual.
Tampei a boca para não gritar, por apenas uma frecha da porta eu consegui vê-lo nú, nú como veio ao mundo! Bem, não totalmente porque ele estava de costas conversando no telefone, mas o suficiente para ver as tatuagens de dragões, seres mitológicos, números e mitos inteiros cobrindo suas costas musculosas, as nádegas e terminando na parte posterior das coxas.
Encosto-me na parede rezando para que ele não tenha me notado. Aperto os olhos querendo apagar a imagem que acabei de ver. Eu nunca tinha visto ele despido, pelo menos não me lembro. Na Yakusa as tatuagens são consideradas assinaturas de respeito, significam muito mais que lealdade a máfia. Appa tinha tatuagens na metade do peito e eu considerava bastantes. Não é qualquer membro da máfia que pode ser tatuado, o mestre da tatuagem é quem escolhe o homem digno daquelas tatuagens, cada uma com seus significados... E para Sanchon ter tantas, tantas assustadoras...
A katana. Ceifador. Amaldiçoado.
— É óbvio que vou evoluir com eles. Ele ainda está resistindo? Os Macays são fortes, mas somos o que somos e fazemos o que fazemos. Desmonte-o, estou ordenando que você frature, fragmente e quebre em partes como um manequim até que ele não passe de um pedaço raquítico e inutilizável de ser humano. Sim... Eu vou permitir isso também, a cereja do bolo. E a puta ruiva?
Engulo em seco, prendendo a respiração. Ele está falando sobre James e Julianne. Eu conheço Sanchon, pensei que o conhecia como ninguém.
Ele é um homem terrivelmente mau, capaz de atrocidades desumanas. Ouvi escondido no escritório de Appa e li os inúmeros números de mortos nos jornais, as histórias macabras que só aqueles que o conheceram como ceifeiro e foram seus ninjas poderiam espalhar. Joon matou um político, estripou um político e foi seu crime mais notório. Ele torturou homens sempre ofertando o suicídio " enforque-se ou morra pela katana". Aqueles que foram tentados a morrer pela katana se arrependeram depois, gritando até perderem as cordas vocais, sofrendo por horas a fio. Às histórias não terminam por aí... Mas crimes sexuais? Nunca descobri nenhum, talvez porque Appa abominasse esse tipo de crime, Joon soube escondê-lo bem, talvez porque não quisesse meu conhecimento sobre... Claro, ele nunca teve namorada por mais do que alguns meses, mas nada me preparou para esse momento, para essas palavras sadicas que saem de sua boca:
— Se eu me importo? Tenho a cara de que me importo? — ele ri desdenhoso — trinta homens não seriam suficientes para domar essa puta. Um estupro coletivo ainda não seria suficiente para acalmá-la, eu não me importo, mas não quero que comece agora. Quero que ela morra da pior maneira possível. Mulheres como ela merecem até mais de um estupro. Tenho tudo que preciso, posso passar o resto da vida com a mulher que amo por aqui, em breve ela vai me satisfazer como desejo também, mas admito que ficaria descontente se não assistisse aos momentos finais daquela trequinho... Faça como eu digo, continue martirizando-a, deixe-a em agonia que uma hora ela vai parar com esse show, se não parar... eu vou assistir o final triunfante que estamos preparando o quanto antes, mas só eu, só eu vou arregaçar a garganta e ceifar a vida desta maldita como ela merece. Eu não perco por nada, serei o primeiro a desfruta-lá!
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