𝐗𝐈𝐕 ┇ a busca pelos sete fidalgos de telmar.
──────── CAPÍTULO QUATORZE
a busca pelos sete fidalgos de telmar.
QUANDO ERIS TERMINOU sua história, Edmundo e Lúcia estavam no mínimo surpresos. Caspian e ela haviam conseguido resgatar grande parte do legado glorioso dos Anos de Ouro em muito pouco tempo.
— A paz reina em toda a Nárnia. — foi o que Caspian disse, depois de apontar no mapa todos os lugares que foram anexados ao território do reino.
Lorde Drinian, que havia adentrado a cabine enquanto Eris contava a história, se aproximou mais da mesa para observar o mapa. Tinha o dobro da idade de Caspian, e não podia evitar sentir uma imensa admiração por todos os feitos que ele e sua rainha realizaram.
— Paz? — questionou Edmundo.
— Sim. Em apenas três anos. — confirmou o rei.
— E você conseguiu convencer Eris a se casar com você nestes três anos? — perguntou Lúcia, colocando uma mecha de seu cabelo castanho atrás da orelha.
O sorriso que Caspian abriu ao confirmar com a cabeça foi tão contente que garota não pôde evitar cobiçar um pouco daquela vida que ele e Eris estavam levando.
— Você está falando sério? — questionou Edmundo, em tom de descrença. — Ela aceitou se casar com você?
— É claro que Eris aceitou se casar comigo! — respondeu Caspian, falsamente indignado.
— Em minha defesa, eu perdi uma aposta. — a rainha disse, antes de lançar um olhar acusatório para Caspian. — E foi só porque alguém trapaceou.
O Grande Rei gargalhou alto com a lembrança. Ele havia de fato enganado a feiticeira para fazer com que ela aceitasse se casar com ele.
Aconteceu dois meses antes daquele dia, e foi tudo muito cômico: o rapaz passara quase todos os meses durante aquela viagem desafiando Eris a transformá-lo nas espécies raras que os dois vinham encontrando nas ilhas em que aportavam, desde répteis coloridos a feras fantásticas.
"Se você conseguir me transformar neste animal, te dou meu florete, se não conseguir, aceitará se casar comigo", disse ele na primeira aposta, e Eris conseguiu, como a poderosa Rainha Artesã que havia se tornado.
O pobre rei ficou sem seu florete preferido, sem sua jaqueta mais bela e, pelos deuses, até mesmo uma calça a artesã conseguira lhe tomar — os detalhes não importam.
Ele perdeu seis apostas até fazer seu desafio final, daquela vez dentro do navio. Vestido com um casaco grosso demais para alguém que viajava em alto-mar no verão, Caspian apostou pela sétima vez: "Se você conseguir me transformar em um rato exatamente igual a Ripchip, te dou o meu casaco. Se não conseguir, aceitará se casar comigo".
A feiticeira riu só de pensar que, depois de meses apostando com ele e conseguindo transformá-lo em seres enormes e complexos, com escamas com seis tons diferentes de verde, marrom e vermelho, ela não conseguiria transformá-lo em um rato.
Ergueu a mão e lançou o feitiço. Ela estava pronta para ver a imagem de Caspian se tornando um borrão, até reaparecer na forma de um roedor, mas nada aconteceu. O rei a encarou com um olhar sarcástico, e a Rainha Artesã tentou novamente. Nada. Tentou uma terceira vez, e o resultado não mudou.
Eris o encarou, completamente confusa, até que o rei desabotoou seu casaco, revelando a peça que vestia no lugar de sua camisa de algodão: uma túnica de cota de malha feita completamente por elos de ferro. O único material imune à magia artesã.
Naquele dia, a jovem não ganhou o casaco de Caspian, mas sim um reluzente anel de ouro, com um rubi oval em seu centro, que, por acaso, estava guardado justamente no bolso do casaco apostado. De alguma forma, Eris sentia que havia ganhado aquela aposta também.
— Eu venci de forma justa. — o rei se defendeu da acusação de sua noiva. — Não é culpa minha se você não estabeleceu as regras.
A artesã revirou os olhos para o rapaz, mas não conseguia fingir estar triste por ter aceito o pedido: não estava. Para falar a verdade, cada momento com Caspian, desde o fim da Revolução Narniana, lhe parecia o melhor dia de sua vida, até a chegada do dia seguinte.
— Por que não voltamos ao assunto, antes que entremos em mais uma discussão acerca da veracidade deste noivado? — sugeriu Eris, e o Grande Rei deu de ombros, convencido, como se soubesse que aquela indignação era apenas um teatro.
— Eu definitivamente quero saber como você conseguiu enganar Eris. — disse Edmundo, ganhando uma careta da amiga. — Mas ainda não compreendo o que fazemos aqui, já que não há guerras para lutar ou pessoas em perigo.
— Eu me pergunto a mesma coisa. — disse Caspian.
— E para onde estamos indo? — pergunto o Pevensie, e Eris e o Grande Rei se entreolharam. Ela fez um gesto com o queixo para ele, como se o incentivasse a falar alguma coisa, e o rapaz logo começou a contar sua história.
— Bem, vocês devem se lembrar do meu tio Miraz... Ao tomar o trono, ele tentou se livrar dos melhores amigos do meu pai, seus aliados mais fiéis. — o Grande Rei disse, e se virou para a parede atrás de si, onde estavam desenhados o rosto de sete homens, um em cada folha. — Eram os Sete Fidalgos de Telmar. Eles fugiram para as Ilhas Solitárias, e ninguém mais teve notícias deles.
Edmundo observou os desenhos: — E você acha que aconteceu alguma coisa?
— Não sei. — revelou Caspian. — Mas, se aconteceu, é meu dever descobrir.
— E o que fica a leste das Ilhas Solitárias? — questionou Lúcia, observando o mapa sobre a mesa.
— Águas não mapeadas. — respondeu lorde Drinian. — Lugares que mal dão para imaginar. Há contos de serpentes marinhas e seres ainda piores.
— Serpentes marinhas? — repetiu Edmundo, soando só um pouco menos descrente do que pareceu ao ouvir que Eris havia aceitado o pedido de Caspian. A artesã, por outro lado, fez um gesto típico narniano, que significava que ela tentava afastar seus maus pensamentos.
O capitão assentiu, inabalado pela descrença.
— Pois bem, capitão. — disse Caspian, pegando uma maçã da fruteira de mesa da cabine, e dizendo, antes de mordê-la: — Já chega de suas histórias.
— Se não me engano — começou Eris —, você também acreditava que Nárnia também era só uma história, telmarino.
— E você acreditava que eu nunca iria convencê-la a se casar comigo, narniana. — retrucou o rei, arrancando uma risada do trio que observava a cena.
— Touché, lorde Caspian. — disse a rainha. — Agora o que acha de mostrarmos todo o glorioso Peregrino da Alvorada para Lúcia e Edmundo?
— Claro. — disse Caspian, se aproximando da noiva e oferecendo seu braço para ela segurar, e a mesma o aceitou de bom grado. — Nos acompanhem, por favor.
Os dois irmãos seguiram o casal, Edmundo sem conseguir evitar o sorriso ao ver quanto eles pareciam bem juntos. Eris parecia reluzir de felicidade perto de Caspian, e o Pevensie não poderia desejar nada melhor para a amiga. Ela merecia.
E sobre o Peregrino da Alvorada, a feiticeira não estava errada ao chamá-lo de "glorioso". Era só aquilo que ele poderia ser, uma vez que o navio pertencia à Nárnia e existia em nome das aventuras dos líderes daquele grande reino.
O piso e as paredes de madeira eram tão bem encerados que brilhavam, os móveis tinham acabamento em ouro — todos combinando perfeitamente, como se tivessem sido desenhados por um só artista — e o navio era maior do que parecia, com quatro deques, sendo um deles dedicado especialmente à tripulação, bem abaixo do deque onde ficavam a cozinha e as cabines de Eris e Caspian.
Eris fizera questão de apresentar os Pevensie a cada um dos marinheiros, e cada um deles se sentiu lisonjeado pelo gesto.
Nas poucas horas em que Ed e Lúcia estavam no navio, puderam perceber o quanto a artesã procurava fazer todos ao seu redor se sentirem especiais. Não era de se surpreender que todos a olhassem com tanta admiração: era corajosa e selvagem quando se fazia necessário — como fora durante a guerra contra Telmar —, mas também era carinhosa e gentil.
Quando a tour chegou ao fim, Lúcia deixou o grupo para observar o mar do mastro mais alto que pôde escalar, e Caspian logo fora chamado para ajudar um grupo de marinheiros em alguma coisa.
O rei se despediu de Eris dando um beijo no dorso de sua mão, lhe arrancando um sorriso tímido — melosos, foi o que Ed pensou — e assim que se afastou, a artesã se virou para o amigo.
— Vamos. Tem mais um lugar que eu queria mostrar a você. — disse ela, o levando para uma porta no chão do convés, na ponta da proa. Ela a abriu rapidamente e entrou, sendo seguida pelo amigo.
Edmundo perdeu o fôlego quando se pôs ao lado da feiticeira: eles estavam na boca do dragão da proa, o mar brilhando poucos metros abaixo deles.
— É o meu lugar favorito de todo o navio. — disse Eris, observando a expressão deslumbrada do Pevensie. A jovem inclinou a cabeça para trás, sentindo o vento tocar sua pele, algumas mechas se soltando de sua trança e flutuando no ar.
Os dois ficaram em silêncio por alguns minutos, ouvindo apenas as ondas batendo contra o casco do navio em seu ritmo lento, até que a rainha dizer:
— Senti sua falta, Ed.
O garoto sorriu: — Também senti a sua.
— Quanto tempo passou para você no seu mundo? — questionou Eris.
— Menos de um ano. — respondeu Edmundo. — Tenho dezesseis anos agora.
A rainha riu pela forma como o garoto parecia orgulhoso de sua nova idade, e contou: — Fiz dezoito pouco depois de vocês irem embora. Agora tenho vinte e um. Caspian fez vinte e dois há alguns meses.
— Nem posso acreditar que você e Caspian vão mesmo se casar. — comentou o amigo. — Quer dizer, eu esperava que isso acontecesse, mas é como se vocês tivessem virado adultos de verdade. Vocês parecem, sei lá... Maduros. Se estivéssemos na Inglaterra, vocês parariam de se sentar com Lúcia e eu nas mesas de festas para se sentar com os meus tios.
— Eu não faço a mínima ideia do que isso significa. — Eris disse, e Edmundo riu.
— É que nas festas de família tem a mesa das crianças e a mesa dos adultos. — ele explicou. — Lúcia e eu ainda nos sentamos na mesa das crianças. Mas você e Caspian são adultos agora, então se sentariam na outra mesa.
— Acho "adulto" uma palavra assustadora, mas sim, nós precisamos amadurecer muito para merecer o trono. Nunca estivemos tão felizes, mas foram tempos cansativos. Tivemos que desembolar um novelo inteiro de intrigas políticas dos reinos humanos, resolver conflitos com outras espécies... Devo ter envelhecido dez anos só para resolver o problema com os gigantes. Se não tivesse o dom de transformar a aparência das coisas, você veria dezenas de rugas e fios brancos em Caspian e eu.
— Mas você parece ter lidado com tudo isso muito bem. — comentou Ed.
A artesã deu de ombros: — Caspian é um rei inteligente.
— Claro, Eris, era do Caspian mesmo que eu estava falando. — Edmundo começou, sarcástico. — Não da Mestre-Espiã e membro interina do Conselho de Guerra dos Rebeldes, ou da maior feiticeira do século, nem da guerreira lendária que lutou na Segunda Batalha de Beruna... Pare de dar todos os créditos para o telmarino só porque você o acha bonitinho.
— Edmundo! — Eris disse, indignada, e o amigo riu. — Eu sei o meu valor, está bem? Mas não teria conseguido fazer metade das coisas que eu fiz sem a ajuda de Caspian.
— Na minha opinião, a única coisa que você não conseguiria ter feito sem Caspian seria noivar com ele. — disse o Pevensie. — Inclusive, eu ainda quero saber como ele conseguiu passar a perna em você para que você aceitasse esse noivado.
— A condição que eu impus a Caspian para de fato me casar com ele foi a de que nunca, em hipótese alguma, ele conte a alguém como conseguiu isso. — a rainha revelou, divertida. — Ele conseguiu um noivado, mas se quer um casamento, é bom ficar de boca fechada.
— Parece que nem tudo mudou. Você continua mandando, e ele continua obedecendo...
— Pelos deuses, Edmundo, parece que a cada dia que se passa você fica pior! Quando envelhecer, vai virar um bolo gigantesco de sarcasmo, tão grande que nem conseguirá atravessar a porta. Então, quando morrer, seu corpo se dissolverá em um milhão de piadinhas amarguradas, e ninguém vai rir de nenhuma delas. — falou a feiticeira, e o amigo gargalhou alto.
— Se essa é a vida que Aslam me reservou, então a viverei com prazer. — retrucou ele.
Os dois riram, contentes por ter aquela conexão instantânea novamente. Edmundo sentia falta de estar com alguém que tinha o mesmo humor ácido que o dele, alguém para contar seus segredos sem medo de ser defino por eles. Amava seus irmãos mais do que tudo, mas não sentia o conforto que sentia com Eris para falar todas as suas bobagens sarcásticas e cinismos.
— Mas vamos, me conte: o que você vem fazendo, quando não está ocupado sendo maldoso com garotas capazes de transformá-lo em insetos para seu primo colecionar? — perguntou Eris. — Encontrou alguém para você?
Edmundo logo ficou sério: — Bem que eu queria... Tudo o que eu venho fazendo é tentar me alistar no exército para a Grande Guerra. Fazer alguma coisa grande. Mas não fui aceito em nenhum dos exames, por causa da idade.
— Para que mais uma guerra, Ed? — questionou a amiga.
— Não sei... Todo o legado que Pedro e eu conquistamos aqui em Nárnia foi através de batalhas. Viemos aqui para lutar contra uma feiticeira má, passamos mais de quinze anos sendo os maiores guerreiros do reino e depois nós só voltamos para Nárnia para outra guerra. Então lá estou eu, na Inglaterra novamente, sem sequer a companhia de Pedro e Susana, e sem importância alguma. Sinto que, se eu defender meu país, vou ser alguém novamente, sabe? Serei importante.
A feiticeira o encarou, séria.
— Você já é alguém, com ou sem batalhas. Não será "importante de novo" — ela fez aspas com as mãos, como se a ideia lhe fosse ridícula. — morrendo em uma guerra, Edmundo.
— Eu não estou indo para a guerra para morrer. — Ed se defendeu.
— Por favor, você me contou sobre como as guerras são no seu mundo. Tem aquelas... Coisas explosivas, armas que matam à distância, e Aslam não vai para lá, rugir para os exércitos inimigos para salvá-lo. Não venha me dizer que vai ser a mesma coisa do que por aqui. Sei que nós dois conquistamos nossos tronos através de guerras, mas há outras formas de conquistar honra.
O amigo suspirou: — Por Aslam, Eris, odeio toda essa sabedoria mística que adquiriu enquanto eu estive fora.
— Ah, querido, então você vai odiar conviver comigo. — brincou a artesã. — Porque eu fiquei mais sábia, mais bonita, mais inteligente e mais habilidosa. Serei seu maior pesadelo.
— Estou percebendo. — disse o Pevensie, mas não parecia nem um pouco contrariado por aquilo. — E você, Eris? Conseguiu encontrar mais feiticeiros do seu tipo, depois do fim da guerra?
A amiga abriu um sorriso triste, ao negar com a cabeça.
— Nenhum. Temo que eu seja a última artesã. Mas ouvi histórias sobre outros tipos de feiticeiros. Feiticeiros que eram estrelas, antes de assumirem a forma humana e praticarem magia. Embarquei nesta aventura com Caspian com a esperança de encontrar algum deles no caminho. Descobrir mais sobre magia, se posso fazer algo além do que aprendi sozinha.
A verdade era que Eris estava quase desesperada para encontrar algum manipulador de magia.
Fazia quase um ano que Caspian e ela estavam a bordo do Peregrino da Alvorada e ela ainda não havia encontrado sequer um sinal de que poderia existir um feiticeiro à frente. Tinha evoluído muito com seus poderes, principalmente quando se tratava do cansaço, mas sua magia era restrita ao que ela já sabia fazer quando era apenas uma garota escondida em Telmar, e alguns truques a mais.
E ainda tinha o paradoxo que os artesãos enfrentavam: quanto mais poderoso um artesão se tornava, mais sensível ao ferro ele ficava. Com a dimensão de seus poderes, ela nem precisava tocar o metal. Se ficasse cercada por muito ferro sua magia ficava confusa e fraca, e ela temia que seus poderes a deixassem na mão em alguma emergência.
— Encontrar um feiticeiro para ajudá-la seria incrível. — Ed comentou. — Aposto que você faria todo o tipo de coisa.
Os dois continuaram conversando, Edmundo contando sobre as novidades de Pedro e Susana e a viagem que fizeram para fora do país, e sobre o verão tedioso que ele e Lúcia vinham passando na casa dos tios, os pais de Eustáquio.
Contou sobre como achava o primo o menino mais chato de toda a Europa — por mais que a amiga não conhecesse o continente — e os dois logo entraram em uma conversa singular sobre os animais nos quais Eris poderia transformar o menino.
Os dois já estavam ficando cansados de ficar de pé na ponta da proa, quando Eris falou:
— Certo, agora vamos. Caspian deve estar começando a praticar luta, e agora que você voltou, tenho certeza que ele vai querer um duelo. Se você quiser, posso te transformar em um enxame de abelhas durante a luta, para que você ganhe. Podíamos apostar alguma coisa dele antes... Um casaco, talvez, e ele perderia por medo de ser picado.
Edmundo riu, mas pareceu admirado: — Você consegue transformar uma pessoa só em mais de um animal agora?
— Sim. — respondeu Eris, orgulhosa. — Mas só com insetos. Eles tem mais senso de coletividade do que os outros animais, então funcionam como um só corpo. Eu passei um bom tempo estudando animais para melhorar minhas transfigurações.
Os dois amigos deixaram a boca do dragão, voltando para o convés, e Edmundo descobriu que Eris estava certa: Caspian estava duelando com um marinheiro habilidoso, o som das espadas sendo abafados pelos gritos da torcida.
O marinheiro deveria ser dez centímetros mais alto do que o Grande Rei e pelo menos vinte e cinco quilos mais pesado, e mesmo assim o rapaz o venceu com facilidade, tomando sua espada e encerrando a luta.
Assim que ele encontrou sua noiva, acompanhada pelo Rei Justo, ele abriu um sorriso ladino, apontando a espada para o garoto:
— E você, Ed? O que acha de um duelo? — questionou, e Eris encarou o amigo, como quem dizia um convencido "eu te avisei".
— Claro, por quê não? — foi o que Edmundo respondeu, antes de receber a espada que Caspian havia tomado do oponente anterior.
Os dois começaram o duelo, que durou mais do que o esperando. Era necessária muita habilidade para lutar com qualquer um dos dois, cuja memória muscular sempre voltava aos tempos de guerra, com golpes firmes e reflexos rápidos e inteligentes.
Edmundo precisou se abaixar agilmente quando Caspian levou a lâmina de sua espada na direção de seu pescoço, o garoto se levantando e chocando o fio de sua espada contra a do oponente uma, duas, então três vezes, antes de copiar o movimento anterior do rei, levando sua espada na direção do pescoço do telmarino, que também se abaixou com agilidade, para não levar uma ferida permanente.
Houve mais choques, saltos e giros, antes dos dois terminarem o duelo com a lâmina de Ed ameaçando o abdômen de Caspian, que, por sua vez, tinha a espada na garganta do jovem inglês.
Os marinheiros que assistiam a luta batiam palmas, enquanto o Grande Rei levava a mão ao ombro do Pevensie.
— Ficou mais forte, meu amigo. — elogiou Caspian, parecendo orgulhoso.
— É o que parece. — respondeu Edmundo.
Lorde Drinian, que havia assistido tudo do leme, tentou evitar a expressão de admiração para os dois jovens, antes de dizer: — Certo, marujos! Agora vamos, de volta ao trabalho!
Os marinheiros reclamaram apenas uma ou duas vezes antes de retomarem suas atividades costumeiras, Caspian e Eris deixando Edmundo para conversarem com o capitão.
O Pevensie se reuniu com a irmã mais nova, e os dois ficaram conversando até Eustáquio — que fora apelidado pelos marujos como "o Menino Histérico" — surgir no convés, desta vez consciente.
Ele não havia vestido as roupas que Eris tinha pedido para lhe entregarem, mas ao menos estava seco, e havia parado de gritar, o que, para Ed e Lúcia, que passaram todo o verão suportando seus berros estridentes, parecia uma vitória.
— Já vi que estão falando besteira, vocês dois. — disse o menino, assim que alcançou os primos. Edmundo, que segurava um copo de água para se refrescar, se perguntou se sua irmã desaprovaria se ele jogasse o líquido no primo, a fim de afugentá-lo.
— Está se sentindo melhor? — perguntou Lúcia.
— Estou, mas não graças a vocês dois. — respondeu o primo. — Sorte que eu tenho uma saúde de ferro.
— Ah, Eustáquio, você está uma simpatia, como sempre. — disse o rato Ripchip, pendurado na corda de um mastro próximo ao grupo. — Vê se não desmaia novamente...
— Eu não desmaiei! — Eustáquio se defendeu. — Só estava absorvendo o choque.
— Todos nós o vimos absorvendo o choque direto do chão... — comentou Edmundo.
O Menino Histérico fez uma careta, e então disse: — Mamãe diz que eu tenho uma percepção apurada, por causa da minha inteligência privilegiada.
Ed, que havia levado o copo de água à boca, quase se engasgou com o líquido, e até mesmo Lúcia, que vinha se esforçando para ser gentil, precisou lutar contra o riso.
Ripchip encarou o autoproclamado menino mais inteligente da Inglaterra com cansaço:
— Este aí ainda vai nos colocar em apuros.
— Eu vou te mostrar os apuros quando chegarmos à civilização e eu contatar o consulado britânico para mandar prender vocês todos por rapto! — retrucou Eustáquio, ofendido, caminhando com passos pesados para se por longe daquele grupo.
O menino, que apesar de muito inteligente, não olhava por onde andava, e acabou trombando no Grande Rei Caspian, que tinha uma expressão irônica em seu rosto.
— Rapto, é? — questionou ele. — Engraçado, pensei que tínhamos salvo sua vida.
— Oh, por favor! Vocês me trouxeram para cá contra a minha vontade! — exclamou Eustáquio. — E para um navio que não segue nem um pouco as restrições de higiene! Está cheio de animais! — ele apontou para Ripchip, e depois para o minotauro que mais cedo havia defendido a Rainha Artesã de suas ofensas. — Este barco mais me parece um zoológico ambulante!
Eris, que havia acabado de se por ao lado de Caspian, perguntou: — O que é um zoológico?
— Essa lunática não sabe o que é um zoológico? — Eustáquio questionou.
Sorte a dela não saber o que era um zoológico. Teria ficado horrorizada se soubesse da existência de um lugar onde os animais ficavam enjaulados para serem expostos para os humanos. Qualquer narniano teria ficado horrorizado, para falar a verdade.
O Grande Rei, que já não estava andando paciente nos últimos tempos, se aproximou o máximo o possível do menino, e disse:
— Escuta aqui, seu moleque, se você chamar minha noiva de lunática mais uma vez...
Ele se calou imediatamente quando Eris tocou seu ombro, tranquilizando-o, e os dois se comunicaram pelo olhar, em uma conversa muda que parecia algo como "ele é só uma criança", seguido por "uma criança chata", que era devolvido com um "você deveria ser a criança mais legal de Telmar, não é, lorde Caspian?" e antes que qualquer um deles pudesse dizer alguma coisa — em voz alta, daquela vez, um marinheiro gritou:
— Terra à vista!
Eustáquio foi esquecido imediatamente: tanto Caspian quanto Eris correram até o leme, tentando ver o horizonte, e, bem ao longe, conseguiram ver a fraca silhueta de construções de pedra.
— Por Aslam. — murmurou Caspian. — São as Ilhas Solitárias.
── NOTAS.
UM. ︴caso vocês ainda não tenham percebido, a diferença principal entre "príncipe caspian" e "a viagem do peregrino da alvorada" é que em peregrino da alvorada caspian e eris flertam o tempo todo como se não houvesse amanhã, é isto.
©︎DEVILEVIE, 2021.
────── evie.
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