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"Com os olhos brilhando em alegria, a pequena garota girou encantada, de braços abertos e coração palpitando, absorvendo cada detalhe que conseguia do parque itinerante. As luzes coloridas iluminavam o espaço, o som de risadas, conversas e zumbidos dos brinquedos preenchiam o local. A sonora gargalhada infantil era música para os ouvidos de sua mãe, uma música melancólica envolta em carinho e saudade futura. Enxugando os olhos discretamente, ela segurou firme a mão de sua filha, a qual se voltou para ela com um enorme sorriso com um dos dentes da frente faltando. Ela abaixou-se e esfregou seu nariz no dela, a escutando rir satisfeita antes de começar a puxá-la em direção à roda gigante.
Era tudo tão colorido e mágico. A garotinha mal conseguia ficar parada, seus fios acobreados escapando de suas maria chiquinhas e grudando em seu rosto gelado de suor. Fora um dia maravilhoso e ela mal poderia esperar para repeti-lo novamente com sua mãe. Encarou a mulher mais velha que a observava emocionada, não entendia o porquê de um olhar tão triste estar estampado no rosto de sua mamãe, era para ela estar feliz também, afinal, elas estavam juntas e em um enorme parque de diversões! Se aproximou rapidamente e a envolveu em um abraço apertado, escutando as batidas do coração forte de sua mãe ressoarem em seu ouvido.
- Te amo muito, mamãe.
Ouviu uma fungada alta e fechou os olhos quando sentiu pingos de água caírem no topo de sua cabeça. Logo sua mãe a beijou no local onde as lágrimas caíram e ela sentiu que algo estava muito errado quando se viu sendo empurrada para fora do carrinho.
- Nunca esqueça que eu te amo, estrelinha!
Gritou alto quando uma explosão na cabine acima inundou a roda gigante com fogo. Se viu caindo, tentando segurar o ar em busca de ajuda, perdendo a consciência antes de chegar ao chão..."
Eta acordou em um sobressalto, levando um mão ao peito ofegante em busca de ar. Tateou a cama em busca da presença da sua mãe, mas encontrou apenas o vazio. Inspirou fundo contando até dez, em seguida repetiu a contagem em modo regressivo, expirando lentamente. Não estava sozinha, não estava. Tentava a todo instante acreditar em suas próprias palavras, mas o frio que se espalhava como mofo por seu interior. Abraçou seus joelhos, escondendo o rosto contra suas pernas, caindo para o lado e permanecendo enrolada em si. Fechou os olhos fortemente a fim de evitar as lágrimas. Estava tão cansada. De chorar. De mentir. De deixar todos os seus sentimentos e medos trancados à sete chaves. Eta Hart queria apenas que o colchão a sugasse para outra realidade, uma na qual ela não sentiria mais nada. Seu corpo adormeceria tal qual sua mente e todos os seus receios e inseguranças simplesmente sumiriam. Como num estalar de dedos.
- Não adianta fugir.
Se encolheu quando escutou a voz já conhecida. Queria mandá-la ir embora, mas sabia ser impossível. Sua força havia sido drenada e sua genitora era irritantemente teimosa.
- Sei que está me escutando, então serei rápida. - a fala veio seguida de um exausto suspiro audível. - Não sei o que me levou a te deixar no futuro, não faço a mínima ideia dos motivos ou de como estava a minha mente naquele momento. Não estou procurando uma desculpa porque não conheço a história completa, somente a sua parte, estou apenas dizendo os fatos. E o maior de todos é que você não sabe o que pode ter levado sua mãe a sumir.
Eta queria gritar e dizer que ela poderia apenas ter cansado de ser mãe, que não a amava o suficiente para permanecer. Porém, com o resquício de memória ainda fresco em sua mente, sua língua adormeceu, seu corpo a impedindo de proferir palavras que não possuía certeza de serem verdadeiras ou não. Então permaneceu em silêncio, escutando o bater de um sapato contra o piso, um tac-tac-tac seco, quase como as batidas aceleradas do seu coração.
- Eu... - Piper parou, a insegurança quase indetectável em sua voz, mas presente para aqueles que soubessem o que procurar. - Eu não sou ela, mas fui em seu futuro e isso não é justo. Você merece sua mãe e eu mereço saber o que merda deu no meu eu futuro. Se eu morri, preciso consertar isso. Então estou indo atrás de respostas e sugiro que você faça o mesmo. - aconselhou, gemendo inconformada quando Eta não se moveu. - Você saiu de mim, caramba. Sei que pode fazer melhor do que isso.
Eta ouviu os passos se afastarem e quando escutou apenas o silêncio, rolou de costas, observando a porta por onde Piper saiu sem saber muito bem o que sentir. Ainda estava com muita raiva, a mágoa do abandono não sumiria a partir de um pedido de desculpas indireto. Mas de uma coisa a mais velha estava certa, ela precisava de respostas, talvez assim pudesse dar uma pausa no furacão que assolava sua mente. Com uma determinação nova, pulou da cama e endireitou os ombros, era hora de saber a resposta para o que a atormentava e sabia muito bem por onde começar.
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- Você quer o quê?!
Henry apertou o braço de Charlotte a fim de impedi-la de gritar mais quando viu Eta se encolher. A Page respirou fundo e cruzou as mãos em frente ao corpo, encarando a mais nova com seriedade.
- Eta, não podemos nos envolver no futuro dessa maneira.
Eta bufou irritada, surpreendendo a versão mais nova de seus pais. Henry se sentiu novamente entrando nos anos sombrios de Piper, mas guardou aquela opinião para si a fim de evitar mais confusão.
- E isso já não é se envolver? - gesticulou ao redor, apontando para Ray e Schowz que os observavam com interesse e Piper que fingia estar mais interessada no programa de TV que passava em um dos monitores. - Mãe, não há mais nada que possamos fazer. Meus pais sabem o que está acontecendo, eu tenho certeza disso.
Henry e Charlotte trocaram um olhar duvidoso, mas o Hart logo se aproximou e envolveu o antebraço dela com cuidado, a puxando de lado para conversarem a sós. Eta entendeu o pedido e saiu da sala com uma expressão fechada que fez Piper piscar atuardida.
- Eles já devem estar procurando por ela, Char. - declarou o óbvio, notando o quão nervosa ela estava. - Só vamos... sei lá, acelerar o processo.
- Se ela falar o ano do qual veio só precisamos fazer as contas para saber quando a sua irmã engravidou. - apontou irritada, se desvencilhando dele e dando alguns passos para mais longe de seus amigos curiosos.
Henry a encarou confuso, não compreendendo onde ela queria chegar.
- E?
- E se tiver sido em um ano próximo? - perguntou cuidadosamente, até porque a idade de Eta era distante da de Alia.
- A Piper não seria tão imprudente. - garantiu, encarando a irmã que estourava uma bolha de chiclete completamente alheia ao seu surto. - Ela só tem quinze anos!
- É a Piper. - Charlotte declarou, tentando não soar tão realista, mas eles precisavam levar em consideração tudo o que poderia estar acontecendo ou vir a acontecer.
Piper poderia ser extremamente inteligente e madura quando necessário, mas ainda era uma adolescente inconsequente que testava os limites a todo instante. Henry pareceu pensar o mesmo, já que praguejou frustrado:
- Que merda.
- Olha a boca. - avisou em automático, olhando ao redor para ter certeza de que Eta estava longe, assim como Alia, que dormia tranquila em um berço ao lado de Schwoz.
Sorrindo sarcasticamente, o Hart se corrigiu:
- Que incrível, então!
Charlotte revirou os olhos para seu tom, evitando uma resposta que coçava na ponta de sua língua e voltou à conversa anterior.
- Precisamos de ajuda.
- Mas...
- O Elio já percebeu que a Eta não vai encontrar ele, nesse momento deve estar informando seu eu futuro e não sei o que ele pode fazer. - declarou preocupada, naquele instante eles poderiam estar tramando algo terrível ou fazendo algo horrível com quem quer que eles estivessem mantendo como refém.
- Precisamos saber a data e chamar os pais dela. - apontou, se aproximando quando ela começou a balançar a cabeça em negação. - Char, é nossa única chance.
Ela sabia que ele estava certo, tinha noção de que era a única maneira de tentar colocar sua vida de volta nos trilhos. Porém, era extremamente arriscado e poderia trazer consequências negativas para o futuro deles. Respirando fundo, Charlotte fechou os olhos, falando o mais baixo possível para que apenas ele a escutasse.
- Se tudo ir para os ares ou se eu perder aquela bebê, Henry Hart.
Henry rapidamente a puxou para um abraço, inclinando a cabeça para sussurrar em sua orelha.
- Nossa filha sempre vai ser nossa, Charlotte. - a sentiu tensa sob seu aperto, não soube distinguir se era pelo fato de estarem abraçados na frente de todos ou pela implicação de um futuro entre os dois que ele tratou de declarar como certo. - Eu prometo. - afastou-se rapidamente, a observando cruzar os braços em desconforto antes de completar. - E a Eta também.
Charlotte desviou o olhar para baixo, piscando rapidamente para impedir as lágrimas. Seu coração batia descontrolado e a cada segundo ela sentia que estava prestes a se separar do próprio corpo. Tentava a todo custo se recompor.
- Ela precisa da mãe. - declarou firmemente, fazendo daquela sentença seu foco principal naquele instante. - Aquela criança precisa de uma casa e de uma infância normais.
- E quem não precisa? - Henry soltou em um resmungo, os olhos vidrados no vazio como se estivesse pensando em tudo pelo qual já passou.
Charlotte deu um passo a frente, cobrindo a mão dele com a sua e tendo uma pequena reação por parte dele. Henry a observou com cuidado, tentando em vão aliviar a expressão de angústia em seu rosto.
- Você vai ficar bem. - garantiu, torcendo para que no fim ele realmente fosse ficar.
- Nós vamos. - apertou a mão dela uma última vez, uma promessa silenciosa sendo compartilhada por um olhar antes deles se separarem. Henry se virou para os amigos, que voltaram a atenção para outro lugar como se nunca estivessem de olho nos dois. - Schowz! Precisamos abrir o portal.
O cientista pulou de seu lugar e correu para dentro do corredor.
- Vou atrás da Eta. - Charlotte avisou ao passar por ele.
- 2034. - Piper declarou em voz alta, fazendo Charlotte parar no meio do caminho e Henry piscar confuso para ela.
- Hum?
- Não vou entrar em detalhes. - ignorou seu irmão, focando o olhar em Charlotte e Schowz, que havia retornado com o portal. - Mas abra para o ano de 2034.
- Piper...
- Muito perto, eu sei. - interrompeu a amiga preocupada, encarando rapidamente seu irmão que a observava com um semblante incerto. - Uma grande burrada pelo visto. Mas há tempo de consertar.
Charlotte se forçou a não comentar, Piper sabia muito sobre seu futuro e as consequências que isso poderia trazer eram assustadoras. Pela suas contagens ela deveria ter 16 ou 17 anos quando engravidou de Eta, o que poderia estar acontecido dali a no máximo dois anos. Ela possuía razão, era muito perto. Schwoz rapidamente ligou a máquina e começou a procurar sinais do ano de 2034. Enquanto esperavam passavam pelos mais variados graus de nervosismo. Ray tentava se distrair com um chat em grupo com outros super-heróis, mas sua atenção era sempre atraída para o redemoinho que preenchia o portal; Piper polia as unhas com uma lixa em uma violência que fez seu irmão se aproximar e se apoiar no painel de controle atrás dela, o Hart mais velho a observava com cuidado, porém, soube que sua presença fez efeito assim que ela passou a lixar as unhas de modo mais devagar; Schwoz estava concentrado em encontrar uma conexão e Charlotte pegou Alia no colo, ninando a bebê que havia acordado e se mantinha em silêncio, a pequena parecia sentir que algo grande estava prestes a acontecer.
Após longos e angustiantes minutos, Eta adentrou a sala de controle no instante em que Schwoz fez uma conexão e duas pessoas saíram rapidamente do portal. O homem, alto e com uma barba rala cobrindo o rosto, olhou ao redor boquiaberto, porém, logo encontrou seu eu mais novo e os dois se encararam em uma mistura de choque e curiosidade. A mulher, com cachos volumosos e uma expressão nervosa, passou os olhos por todos, levando uma mão ao coração e respirando aliviada quando notou a presença de suas duas filhas. Eta começou a chorar imediatamente, demorando poucos segundos para reagir e correr até eles. Seus pais a seguraram forte quando ela os alcançou, sussurrando palavras de conforto para a mais nova enquanto a enchiam de carinho. Charlotte deu alguns passos em direção à eles, notando o quão agitada Alia estava começando a ficar assim que notou a presença de seus verdadeiros pais.
- Obrigada.
Sua versão do futuro murmurou em meio às lágrimas quando a bebê se jogou em seus braços. Charlotte apenas assentiu sem jeito e deu espaço para que a pequena família tivesse seu reencontro. Alia sorria alegremente, rindo dos beijos de seus pais e se aconchegando no colo de sua mãe quando ela a segurou forte contra seu peito. Os quatro permaneceram abraçados, com os rostos escondidos e com palavras de conforto sussurradas passando entre eles. Por fim, a versão do futuro de Henry levantou a cabeça, encontrando a todos com um olhar determinado. O Hart mais novo cruzou os braços, observando sua versão mais velha à espera do próximo passo que não tardou a aparecer quando ele declarou:
- Eu tenho um plano.
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