VI
- Conseguiu alguma coisa?
Charlotte indagou à Schwoz, o cientista negou com a cabeça de maneira cansada, há horas tentava descobrir a identidade do homem misterioso assim como rastrear o dispositivo que ele havia colocado no carrinho de Alia. A Page bufou impaciente, recolhendo seus pertences enquanto tentava pensar em algum plano B. Estava tão absorta que quase não notou o que segurava entre os dedos, uma fina pulseira de prata, o objeto levou uma sensação inquietante ao seu corpo, porém, logo a colocou em um bolso lateral da mochila e bloqueou o sentimento.
- Tenho que ir agora, meus pais vão viajar e querem falar sobre a minha mãe. - informou, a voz levemente entediada para não deixar transparecer sua impaciência, fechou o zíper da mochila e olhou preocupada para o amigo. - A Eta vai ficar o resto do dia no quarto e não posso levar a Alia sem gerar muitas perguntas, você poderia...
- Cuidar dela? - completou animado, virando-se para encará-la. - Com certeza! Posso fazer alguns testes?
- Não! - negou assustada, parando seu passo em direção ao elevador.
- Somente alguns testes basiquinhos.
- Nem ouse tocar nela, Schwoz, ou eu acabo com você. - ameaçou, ignorando a forma como ele murchou decepcionado. - Avisa ao Henry pra me ligar caso precise de algo, vou tentar voltar cedo amanhã.
O cientista fez um som de entendimento, voltando ao seu trabalho e ligando um monitor no quarto onde as duas crianças se encontravam. Ray havia saído para uma reunião com outros super-heróis e Jasper cuidava da loja na ausência de Piper. Charlotte apertou a ponte do nariz sentindo sua cabeça começar a latejar, haviam sido horas estressantes e sentia que Eta escondia algo importante deles. Tentaria encontrar uma maneira de levá-las para casa e deixar o futuro para o futuro, havia muita confusão no presente para precisar procurar por mais.
■ ■ ■ ■ ■
Henry balançava a pequena bebê de um lado para o outro, andava praticamente em círculos na sala de controle enquanto tentava fazê-la dormir. Alia choramingava, gargalhava e às vezes somente ficava olhando para o seu rosto sem fechar os olhos por nada. Sentia seu corpo pesar, suas pernas estavam doloridas da perseguição ocorrida mais cedo em uma patrulha, seu pescoço também dava sinais de que ele precisava urgente de um descanso e uma boa massagem. A última opção estava fora da realidade.
- Você podia me ajudar.
Ray ignorou a voz irritada de seu assistente, sua atenção presa na tela onde assistia a um filme. O Hart revirou os olhos para o comportamento do amigo, estava sozinho naquela missão. Jasper roncava em algum quarto vazio, Piper sumiu, Schwoz trabalhava em algo e Eta dormia tranquila em um sono bastante pesado. Pensou em ligar para Charlotte e detestava ter que fazer isso já que eram duas da manhã, mas a criança seria dela no futuro também e ele queria tanto dormir.
Caminhou em direção ao quarto onde Eta estava, a garota dormia esparramada na cama, braços e pernas jogados ao acaso, uma visão bem diferente do seu primeiro dia. Sorriu lembrando da irmã mais nova, Piper conseguia expulsar qualquer um que dividisse a cama com ela. Buscou o celular em uma prateleira, balançando Alia suavemente para que a mesma continuasse em silêncio. A bebê resmungou algo, o lábio inferior tremendo e causando uma pequena parada cardíaca em Henry por antecipação. O Hart saiu rapidamente do quarto, adentrando ainda mais a caverna e discando o número de Charlotte.
Já estava no quinto toque, na quarta chamada e nada dela atender. Alia piscava lentamente, mas era como se quisesse provar para ele que poderia ficar acordada e por isso ria de algo imaginário ou choramingava inconformada. Seu corpo pedia descanso, não podia sentar para não irritar ainda mais a bebê e nem deixá-la sozinha a menos que quisesse outra sessão de gritos. No sétimo toque, ao que pareceu ser uma eternidade depois, finalmente Charlotte atendeu.
- O que é?
A voz grogue e rouca soou junto com um farfalhar de tecidos, ela provavelmente estava se aconchegado ainda mais entre as cobertas. Henry se sentiu indignado por ela poder estar dormindo.
- Sua filha não dorme por nada, ao contrário da mãe, pelo visto.
Não quis soar tão rancoroso, porém a falta de sono sempre tirava o seu melhor. Escutou um longo suspiro por parte dela e pelo ruído podia deduzir que ela havia desistido de continuar deitada.
- Eu não quero discutir a essa hora da madrugada, Hart.
A sentença firme não o abalou.
- Então me ajude a fazer ela dormir e você pode voltar pra seu sono sem preocupação.
- Você não sabe o quanto eu demorei pra cair no sono por conta das minhas preocupações.
- Pelo menos você dormiu, ao contrário de mim que estou há horas acordado.
- Você fala como se fosse o único que merecesse um descanso. - rebateu impaciente.
- Eu passei horas lutando contra um vilão idiota, tive uma discussão a tarde com a minha adorável namorada que acabou tirando toda a minha paciência e nem consegui concluir o trabalho que é pra amanhã. - sentiu seu sangue fervilhar, se encontrava tão cansado e irritado que tomaria qualquer rumo para dar vazão aquelas sensações. - Tudo isso só foi hoje e eu ainda tive que passar o dia preocupado com duas crianças que não deveriam estar aqui!
- Faça-me um favor, Henry, e vê se olha pra algum lugar além do seu umbigo e perceba que o mundo não gira ao seu redor. - o tom ácido o fez se encolher internamente, porém não conseguia concordar com ela. - Não é só você que tem problemas e preocupações, não é só você que luta contra o crime...
- Mas sou eu que vou até o crime. - afirmou indignado. - Sou eu que corro o risco, que fico cara a cara com quem pode me machucar seriamente, sou que que acordo todos os dias com medo do que pode acontecer ou quem eu posso encontrar, e sou eu...
- Você não é o único! - o grito impaciente o assustou. - Você não é o único que levanta toda manhã com medo de não voltar pra casa ou de perder quem ama. Não estou dizendo que o seu trabalho não é perigoso ou importante, foi uma escolha difícil entrar nesse mundo e é ainda mais difícil continuar, mas não aja como se fosse o único que tem algo a perder, como se fosse só você que tem o direito de se preocupar.
Fcehou os olhos com força, buscando apoio em uma parede fria, a força na voz de Charlotte o atingiu como um soco direto em seu estômago. Alia se remexeu inquieta, querendo uma atenção que no momento ele não podia e, sinceramente, não queria ter que dar. Do outro lado da linha uma garota apoiava a testa em seus joelhos, tentando controlar seus batimentos e sua respiração, lutava contra o arder em seus olhos que eram a antecipação de lágrimas que não queria derramar.
- Estou indo ficar com ela.
Avisou em um sussurro apressado, encerrando a ligação e se preparando para sair. Suas mãos tremiam levemente, detestava brigar com Henry, discussões sempre apareciam em algum momento, mas as brigas que estavam tendo aumentavam a frequência em uma velocidade estressante. Não sabe quando o clima entre eles começou a mudar, parecia que qualquer motivo bobo podia desencadear anos de assuntos entalados. Ela o amava, ele era seu melhor amigo, mas existiam certos pontos nessa amizade que guardava somente para si, sabia que seria desastroso verbaliza-los.
Trocou a calça do pijama por uma de um tecido mais quente, vestiu um moletom que estava jogado em uma cadeira e começou a procurar seus tênis. Quando inclinou o corpo para amarrar os cadarços, um aroma amadeirado invadiu seus sentidos, aproximou a manga do moletom e notou que o cheiro vinha da peça de roupa. Suspirou frustrada, aquele moletom era de Henry e detestou o fato daquele cheiro suave ajudar a acalmá-la. Após se arrumar apressadamente, correu escada abaixo à procura da chave do carro de seu pai. Só esperava que ao chegar na caverna Henry não quisesse mais brigar.
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