I
Era uma noite nublada em Swellview; um vento frio passeava pelas ruas parcialmente desertas fazendo seus poucos pedestres estremecerem, a luz amarelada vinda dos postes iluminava parcos locais, tornando o clarão luminoso vindo de um dos becos algo difícil de ser ignorado. Tão súbito quanto apareceu, o clarão se extinguiu, como os últimos resquícios de uma chama antes de se apagar no vazio. Acostumados com tudo o que acontecia naquela cidade, os que se dignaram a olhar para o beco logo retornaram aos seus afazeres, não notando que o clarão havia vindo de um portal e que desse portal tinha saído uma pequena figura que aparentava estar completamente perdida.
A pequena humana não parecia ter mais do que treze anos, ela olhava ao redor sentindo seu nariz pinicar e seus olhos arderem, em seus braços se encontrava outra pequena criatura enrolada em uma manta azul. A garota olhou para a bebê adormecida em seus braços e a apertou fortemente quando um sopro de vento gelado as atingiu, com passos hesitantes saiu para fora do beco. A rua deserta, a noite escura e o tempo frio traziam a sensação de desalento, de desesperança. Não sabia onde estava e a única certeza que tinha era a de que deveria encontrar um local para se esconder, não poderia deixar que ele conseguisse colocar as mãos em sua irmã.
Um suspiro trêmulo escapou por seus lábios, seus fios acobreados grudavam em seu rosto banhado de suor apesar da temperatura. Começou a caminhar, seus tênis surrados manchando-se a cada poça de lama em que pisava sem perceber. A bebê se remexeu inquieta, estava começando a despertar de seu sono forçado e ela torcia para que quando acordasse não resolvesse chorar. Dobrou uma esquina, saindo em uma rua mais iluminada e movimentada, ignorava alguns olhares desconfiados e continuava a andar de cabeça erguida à procura de uma possível ajuda. Estava começando a desistir quando viu duas pessoas saírem de um prédio residencial, eles se implicavam e riam alto.
A garota paralisou, não poderia pedir ajuda à eles, era colocar em risco sua vida inteira, então começou a andar lentamente para trás sem nunca tirar seus olhos dos outros dois que se aproximavam aos poucos completamente alheios à sua agitação. Eles estavam vestidos para uma missão, ou seja, a haviam acabado e agora estavam a caminho de casa. Ela inspirou fundo e se preparou para seguir na direção oposta, porém, outro chamativo e súbito clarão quase a fez perder as forças. Virando-se nervosa, sentiu seu corpo fraquejar quando avistou uma figura alta sair do mesmo beco que ela havia saído minutos antes.
Apertou a bebê em seus braços, a pequena escolheu aquele instante para acordar e começar a chorar. O choro infantil chamou a atenção do homem que se moveu mais rapidamente em sua direção, não possuía muito tempo, as rodas do tempo não estavam ao seu favor. Ali, em meio ao sufocante desespero, ela fez sua escolha. Voltou-se para os outros dois que estavam prestes a entrar em uma van e correu, seus passos rápidos e vacilantes enquanto o choro aumentava a cada segundo. Recebeu olhares confusos e desconfiados quando os encontrou, olhou para trás notando que o homem estava perto e a súplica muda que lançou aos que estavam à sua frente foi o suficiente para eles compreenderem.
Assim que eles se prepararam para lutar, ela sentiu seu corpo pesar, fechou os olhos quando sua visão embaçou, entregando a bebê para algum dos dois e logo sentindo braços a rodearem quando seus sentidos começaram a falhar. Em poucos segundos foi tomada pela escuridão, não havia mais nada a ser feito.
■ ■ ■ ■ ■
Charlotte balançava a bebê levemente em seus braços, a minúscula pessoa a encarava com uma clara curiosidade no olhar, parecia não ter mais do que quatro meses. Acariciou a bochecha redonda com o nó de seus dedos, um sorriso banguela apareceu no rosto da mesma, ela era tão indefesa e brilhante, não conseguia parar de encará-la. Ela a lembrava uma prima sua quando era menor, o rosto redondo e a pele em um tom mais claro que o castanho de seus olhos.
- Será que ela vai acordar logo?
Henry perguntou um pouco ansioso, ele entrava na sala de cinco em cinco minutos para saber notícias da garota adormecida. A Page levantou-se e se aproximou da maca, ela parecia relaxada apesar de sua aparência, como se não descanse há tempos.
- Acho que ela ainda vai dormir um pouco mais.
Respondeu ao amigo, sem parar de analisar as feições da mais nova. Ela tinha o cabelo em um tom mais fechado de ruivo, a pele clara deixava evidente as olheiras e os arranhões, assim como a mancha roxa esverdeada no lado esquerdo do queixo. Franziu o cenho preocupada, ela parecia tão nova, e pelo o que seus amigos contaram, muito assustada.
- O que fazemos com ela? - Henry expressou o que também martelava em sua mente.
- Não podemos fazer nada enquanto ela não acordar. - acomodou a bebê de forma que ela ficasse um pouco mais inclinada. - E ainda temos ela.
O Hart abriu um pequeno sorriso quando escutou o barulho infantil que a bebê provocou ao tentar falar. Ela mordia a própria mão, seus olhos vagando ao redor do ambiente como se procurasse algo.
- Por que não podemos ter uma noite comum?
Charlotte riu do tom meio exasperado dele, então entregou a bebê para o amigo antes de afirmar.
- Normal nunca foi parte da nossa rotina. Vou ver se o Schwoz já deu sinal de vida.
Acariciou os fios ondulados da bebê antes de sair da sala. Henry permaneceu no mesmo lugar, com a garotinha curiosa em seus braços e olhando preocupado para a outra que continuava imóvel na maca. A respiração dela estava calma e ritmada, os monitores ao seu redor permaneciam estáveis e torcia para que o remédio que Charlotte tinha ministrado fizesse logo efeito. Queria muito saber quem eram elas e porque fugiam de um homem estranho, e essas eram somente o começo de suas perguntas.
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