Vinte e cinco
Não tenho um pingo de vontade de sair da cama. Cássia e Madalena trazem meu café e eu o como a pulso. A única coisa em que consigo pensar é em mamãe, em Saori e o plano.
Talvez tenha ido por água abaixo, dúvido muito que Christopher vá atender um pedido meu, mesmo que seja um baile.
Diana entra em meu quarto com rapidez, seus cabelos pretos estão em um coque apertado para trás.
- O príncipe deseja sua presença na sala de pintura -- ela fala.
O que Christopher quer de mim? Ser grosso de novo, ou jogar na minha cara o quanto ele me amou e como retribui da forma mais doce e nada infiel.
Ainda sim, ele é o príncipe, vi a raiva de Christopher, sua fúria era assustadora.
Não quero aumenta-la.
- Claro -- cuspo levantando da cama.
Minhas criadas preparam um banho e me arrumam com agilidade. Visto um tomara que caia com um tom vermelho chamativo.
Nunca enjoei da cor, todas Pedras usam sua cor como representatividade.
Meu cabelo é preso em um coque com arranjos de flores brancas em cada lado.
Saio do quarto e encontro Tobias na porta, me esperando como sempre.
- Como está? -- ele pergunta tocando em meu ombro.
- Pronta para continuar -- digo levantando o queixo.
Ando em direção ao corredor, o sol ilumina passando pelas grandes janelas do palácio. Sinto o cheiro das flores daqui mesmo. Pelo menos o dia está ótimo.
- Soube que o príncipe saiu da festa cedo também -- Tobias comenta - Aconteceu algo entre vocês? -- pergunta me fazendo parar.
- Não se preocupe Tobias -- falo - Já nem me lembro do baile -- minto.
Chego a porta e bato devagar, ela se entreabri em uma das batidas.
Christopher deixou a porta encostada, ele está com uma camisa social branca e uma calça preta suja de tinta azul. Entro e ele se vira, está pintando um lindo oceano.
- Me chamou? -- pergunto e ele ergue as sobrancelhas, dessa vez não com curiosidade, mas vejo raiva em seus olho.
- Ainda não te perdoei pelo que fez -- ele fala com sua voz grave - Não sei se conseguirei esquecer.
Me aproximo arrastando meu vestido longo pelo chão.
- Não peço que me perdoe -- falo. - Não mais -- completo.
Christopher finge desinteresse em minhas palavras. Conheço bem o príncipe, ele nunca deixa de ligar de algo.
- Eu o amava antes de amar você -- digo. - Meu coração se dividiu em dois, estava me despedindo da minha outra metade -- digo abaixando a cabeça.
Christopher se vira e pincela em seu quadro, está terminando uma onda.
- Já tinha escolhido você Christopher -- falo.
Ele volta a me encarar com a sobrancelha erguida.
- Quero lhe informar que o baile será depois de amanhã -- ele fala sério.
Pela primeira vez não consigo ler seus olhos. O que foi que eu fiz?
- Ainda vai ter? -- pergunto.
- Eu ainda a amo Rose... -- ele fala - Mas não sei se sou correspondido -- comenta.
- Sabe muito bem do que eu sinto por você -- digo com furia. - Como pode duvidar? -- pergunto.
- Já me disse isso uma vez Rose -- ele fala se levantando - Já deixou claro que só a minha coroa te interessa, pensei que tivesse mudado -- comenta.
- Sabe de uma coisa? -- pergunto me aproximando bem dele.
Sinto seu calor, sua respiração tão complicada quanto a minha.
- Eu realmente não mudei -- digo e ele me encara com toda a sua ira - Pessoas não mudam Christopher, elas se completam. -- falo o encarando nos olhos. - Você me completou, não está muito seguro de seu potencial? -- pergunto a ele.
Fuzilo com meu olhar, lançando toda a força do vermelho da minha lente de minério.
- Enquanto ao baile -- digo. - Muito obrigada alteza -- sorrio em provocação.
Me viro para sair do cômodo, Christopher pega meu pulso como se eu fosse uma pena me fazendo parar. O encaro novamente dessa vez sou eu que estou com raiva.
- Me perdoe pelo modo que te tratei -- ele fala fazendo carinho no meu braço.
Ele roça seus dedos em minha pele, a raiva desaparece com um passe de mágica dos seus olhos.
- Espero que também possa me perdoar -- digo me livrando de seu toque.
Seu olhar esconde algo, uma tristeza profunda. Uma culpa por algo que ainda não sei.
Saio da sala e ele não me impede novamente, sinto que ele volta para a sua tela. Tobias estava na porta e me encara preocupado, com um olhar de interrogação.
- Vamos -- falo abrindo um sorriso pequeno para acalma-lo.
Ele retribui e me segue até o salão da rainha.
Me pergunto o quanto ainda terei que mentir para Christopher, o quanto terei que tirar dele.
Não posso apoiar um assassinato, mesmo que me entregue um coroa, é muito por pouco. Se ele descobrisse que eu teria algo envolvido com a futura morte de seu pai, não me perdoaria, eu não o perdoaria se fosse comigo.
Já está feito, não posso mudar uma rebelião, não posso mudar o que já está planejado.
Aonde eu estava com a cabeça? Em que eu fui me meter?.
Dominique está no salão escrevendo uma carta. Ela sabe quem sou, mais uma coisa para me preocupar.
- Bom dia Rose -- ela fala sorrindo para mim.
Um sorriso amigável porém assustador, Dominique se levanta fazendo seu vestido cinza amarelado balançar.
- Fico feliz em vê-la -- continua.
- O que você quer? -- pergunto levantando o rosto para ficar em sua altura.
Ela só é uns poucos centímetros mais alta que eu, quase imperceptível.
- Não sei o que aconteceu ontem, mas você ganhou o show de talentos -- ela fala andando pela sala.
- E? -- pergunto.
Isso é ótimo.
- Quero que negue a recompensa -- ela fala.
Negar uma boa grana, um excelente território de mineração. Seria o mesmo que rejeitar o que salvaria a minha família.
Uma risada irônica solta da minha garganta.
- Seus segredos estão em minhas mãos Rose -- fala enquanto verifica as unhas compridas. - Quer mesmo arriscar? -- pergunta.
- Você não tem provas -- provoco.
Agora é a vez dela ri. Sua risada é fina e ardilosa, me encara como se fosse uma assassina.
- Mandei uma de minhas criadas vasculharem seu quarto -- ela diz se aproximando - Encontrei uma de suas lentes -- fala.
- Posso muito bem dizer que você armou para mim -- falo alargando o sorriso dela.
Meu estômago se revira um pouco.
- Não se pedirem um exame de sangue -- ela diz - Um teste de DNA para comprovar se é mesmo filha dos Rubi -- fala.
Uma acusação desse tipo só se resolve assim, com um teste para comprovar. Seria bem mais fácil se eu tivesse nascido do ventre de minha mãe.
- Negue a recompensa e quero que me ajude com uma coisinha -- ela fala - Não vou abrir a mão de uma coroa -- termina.
- O que quer? -- pergunto deixando uma fagulha de raiva transparecer.
Dominique percebe e ri, está debochando da minha pessoa.
- Me ajude a conquistar o príncipe Ônix -- ela fala - Nós duas podemos ser princesas Rose -- fala ainda sorrindo.
Ela sabe que Christopher vai me escolher, por isso quer outro príncipe. Não pode ser princesa de Cristália, mas a vaga para Outrora está liberada.
Dominique é esperta, quer me ter como aliada e não inimiga.
- Podemos nos unir -- fala. - Negue as recompensas, me ajude a conquistar a coroa de Ônix e não contarei sua origem Poeirinha -- diz em seguida - O que me diz Rose? -- pergunta finalmente.
Não penso direito e apenas respondo.
- Feito -- falo entrando em meu quarto.
Sinto que bati a porta com força, mas acho que Dominique pouco se importa.
Vejo duas cartas em minha escrivaninha, uma sobre a outra. De longe posso avistar o broche da Pedra de minha família.
Da mamãe eu já esperava, agora do papai para mim é novidade. Abro primeiro a dele, sinto o cheiro de café que foi derramado na pontinha do papel. O cheiro me abraça de uma forma indescritível, devora a caligrafia treinada do meu pai.
"Querida filha, perdoe seu pai de não ter te escrito antes. Parabéns minha princesa, foi uma conquista merecida, sei que treinou bastante e teve um desenvolvimento incrível no palco. Se você quiser, não precisa mais se casar com um príncipe, a recompensa é o suficiente para nos poupar. Não pagaria a divida completa é claro, devo uma fortuna para Traxiz...
Traxiz é uma cidade de Cristália fica a poucos kilometros da nossa capital Prada. Papai tinha negócios lá e em Outrora.
... Sinto sua falta minha querida, fomos informados sobre um baile de máscaras. Não entendi o motivo, mas não perderia uma oportunidade de te ver novamente. Os Esmeralda se despediram do filho ontem mesmo. Por algum motivo eles tiveram que sair do baile mais cedo, talvez queriam passar o tempinho que sobrara com ele. A guerra já começou, atacaram uma região próxima a Matriz, tiveram que convocar os representantes o mais rápido possível. O guerreiro que contratei para nos representar entrou em campo de guerra hoje de manhã. Só quiz te informar, sei que se interessa por política. Te amo minha princesa.
Com todo amor
Papai".
Releio a carta umas duas vezes, a cada vez consigo ainda mais sentir a presença dele. Não perco tempo e abro a de mamãe. Diferente da de papai, a dela tem cheiro de um perfume doce e suave.
"Querida filha, gostaria de te perguntar por que desapareceu do nada? Mostrei a Saori todo o palácio, ela já não está mais em nosso Palacete. Disse ao seu pai que ela precisava pegar o primeiro barco para Outrora. Daqui a dois dias o ataque começa, tenho ido em várias reuniões, gostaria que fosse na de amanhã. O ataque será por trás do palácio, no jardim, por isso precisamos combinar como irá dá passagem a eles pelo túnel subterrâneo que contou. Meus parabéns por ganhar o show, você realmente arrasou. Como vai você e o príncipe? Lembre que dependemos do seu relacionamento com ele. Muitos desistiram do ataque, por causa da guerra que começou. Poeiras morreram ainda hoje de manhã, colocados em linha de frente. Saori soube que perdeu um irmão, está a pilhas por isso. Sua cede de vingança aumentou, está determinada em matar o rei e por Christopher no trono, ou melhor colocar você em um trono.
Com afeto
Mamãe"
Guardo a carta junto com as outras no baú. Quando levanto sinto o arranhar do piso por causa da minha cadeira.
Deito em minha cama, preciso descansar, minha cabeça dói tanto. Talvez seja o futuro peso de uma morte em minha consciência.
Diana entra em meu quarto, escuto a porta bater atrás dela e rapidamente me endireito e fico sentada.
- O príncipe deseja vê-la novamente -- ela fala.
O que é que Christopher quer de novo?
- Não estou afim no momento -- falo.
- Ele disse que é importante -- ela fala.
Bufo com força e me levanto da cama. Passo por Diana em silêncio, saio do quarto e vou até o corredor.
Christopher está lá, no meio dele, me esperando como um guarda. Uma mecha loira está para cima, seu cabelo não está tão arrumado. Ando em sua direção e ele faz o mesmo com agilidade, porém com toda elegância que um príncipe deve ter.
- Por que me chamou? -- pergunto e ele cora.
Sinto sua respiração falhar e se complicar. Ele pega minhas duas mãos e entrelaça seus dedos nelas, seu toque me faz tremer.
Christopher percebe o meu desconforto e abaixa o olhar, como um cachorrinho triste.
- O que você fez me machucou muito. -- sua voz falha e ele aperta a minha mão na tentativa de controlar suas emoções. - Mesmo assim, não deveria ter te tratado daquela forma -- ele fala tirando os olhos das nossas mãos para me encarar.
Consigo ver o mundo em seus olhos, o mundo que arruinei e ainda não terminei o estrago.
- Me deixe recompensá-la -- ele pede.
Desvio seu olhar, mas depois sinto a necessidade deles.
- Você me perdoou? -- pergunto.
Christopher fecha os olhos os apertando e depois abre.
- Preciso de um tempo para esquecer -- ele fala. - Meus sentimentos estão confuso, nunca pensei que pudesse controla-los -- fala. - E quando você apareceu, eu pensei que estava no caminho certo, pensei quz finalmente estava ciente do que realmente sentia, agora não sei mais. -- diz olhando para o chão. - Me convença de que estava certo, de que você é o meu caminho -- pede me encarando.
Não sou, talvez nunca serei.
Preciso de que meu relacionamento com Christopher esteja bem, quero isso tanto quanto quero uma coroa.
Eu o amo, mas o amor não é o único em jogo. Tenho um povo que depende de mim, a Cidade Sul precisa. Mesmo que o machuque, preciso de seu consolo.
- Christopher -- falo baixinho e ele me encara. - Talvez eu não seja o caminho certo, não somos e é essa a graça -- falo tocando em seu peito.
Christopher é rápido e me envolve pela cintura me puxando para perto dele. Estou tão próxima que consigo escutar seu coração.
- Acha que podemos ser feliz com o que restou? -- ele pergunta e solto um suspiro longo.
Vá direto ao que você quer.
- Christopher... -- falo - Eu preciso ir até o meu Palacete amanhã de novo. -- peço e ele me encara.
- Responda a minha pergunta -- ele pede.
- Diria que sim, mas um talvez é mais interessante -- digo e ele sorri.
Seu nariz roça pelo meu rosto me fazendo carinho. Ele não me beija, talvez não consiga, ou não quer. Também não o beijo, respeito sua dor.
- Vou falar com Samara -- ele diz - Por favor, não fique muito tempo fora.-- pede e eu faço que sim com o rosto.
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