O ar tremeluzia por conta do sol escaldante que queima o solo árido da ilha de Baltigo, mas graças ao climatizador instalado no quartel general do Exército Revolucionário, o calor é a menor preocupação dos integrantes do grupo rebelde. Na sala de reunião, a maior de todas dali, uma mulher de cabelos pretos já um pouco grisalhos que vão até a cintura criando ondas suaves, observa o pedaço de papel, um cartaz de recompensa. Ela, de imediato, reconhece aqueles olhos amarelos e vividos, a única característica que puxou do pai. A teimosia, ela concluiu, herdou dos dois. Apreciou o número significativo logo abaixo do nome "Edward Mia" e um leve sorriso brotou em seus lábios carnudos tingidos de um vermelho escuro.

Leu a matéria principal do jornal, a conclusão da Guerra dos Melhores trouxe um gosto amargo à sua boca, mordeu o lábio inferior ao ver o estado lamentável em que os inimigos deixaram o único homem por quem se apaixonou verdadeiramente em sua juventude e que permitiu que ela sentisse, de forma arrebatadora, os mais diversos sentimentos e emoções. Com o dedo indicador, acariciou a foto em preto e branco de Edward Newgate, o Homem Mais Forte do Mundo, que mesmo no fim de sua vida, permaneceu de pé.

A mulher impediu que um turbilhão de memórias invadisse sua mente ao notar a aproximação de alguém. O homem, coberto por um túnica que ocultava seu rosto, ficou ao lado dela, fitando a foto de Mia no cartaz.

- Ela não tem cara de quem é pirata. - A voz um pouco rouca e grave era forte, deixando qualquer um intimidado, mas Morena Laurent não se encolheu, apenas deu um pouco mais de espaço para que o outro pudesse ver o jornal também. - Eu avisei, Morena, foi apenas ela ir contra a Marinha e o Governo para ter um alvo cravando em sua testa. As coisas seriam muito mais diferentes se você tivesse a convencido de se unir ao Exército. Teríamos o seu tão querido recurso para as pesquisas e derrubar esses opressores seria como apagar uma vela em um bolo de aniversário.

Morena solta um riso breve, apoiando-se na mesa para encarar o recém chegado. O homem então retira seu capuz, revelando um rosto duro, sendo que em um dos lados era coberto por tatuagens pretas tribais. Estudou a mulher por alguns segundos, mas simplesmente não conseguia decifra-la, mesmo depois de tantos anos de convivência.

- Uma negociação dessa só daria certo se não fosse a Mia, Dragon. - Morena pega o cartaz, agora comparando sua menininha esforçada e inteligente com a mulher da foto, cheia de bravura para defender sua família, mas os olhos tenazes eram os mesmos. - Talvez agora possamos tentar nosso primeiro contato, mesmo tendo se desligado de suas empresas... - Morena passa precisamente para a folha da reportagem que informava as mudanças em Starlight. - ...Ela com certeza ainda tem influência sobre as decisões de Starlight, além de acesso irrestrito nos recursos da cidade.

Monkey D. Dragon, considerado o homem mais perigoso do mundo, líder do Exercito Revolucionário, suspirava ao menos por saber que teria uma chance de aumentar suas forças contra o Governo Mundial. Na reportagem leu que Mia agora estava sob proteção do Ruivo, a melhor opção ao considerar de que uma aproximação pacífica seria possível.

- Como? - Morena o olha, curiosa, seus olhos castanhos claros amendoados ligeiramente mais abertos. - Como ela conseguiu todo esse tempo não ficar na mira da Marinha ou do Governo? Tenho certeza que os Anciões a consideram um desequilíbrio nos três poderes, então por que deixar Starlight crescer a ponto de estar presente praticamente no mundo inteiro? - Dragon massageava seu queixo, pensativo, enquanto Morena apenas relaxava os ombros, observando a luz do sol que passava pelas frestas das pequenas aberturas da parede oposta.

- Talvez tenha sido minha culpa. Posso não ter sido a mãe mais carinhosa de todas, mas pelo menos ensinei uma ou duas coisas que provavelmente a ajudaram a chegar nesse patamar de "a mulher mais rica do mundo". - Morena, então, se levanta, já demonstrando certo desinteresse na conversa. - Pelo menos recuperamos um pouco as nossas forças. Em breve, Emporio Ivankov estará aqui para decidirmos quais serão nossos próximos passos. Você já tem algo em mente, Dragon? - Morena parou próxima da porta, virando a cabeça para a resposta do líder.

- O que acha de visitarmos um certo ruivo? Creio que você virá comigo? Será um belo reencontro familiar.

A mulher lança um sorriso discreto e o deixa sem uma resposta. Seus passos ecoavam pelo corredor vazio e fresco. Olhou para seu relógio de pulso no braço esquerdo e logo após colocou seus óculos de aros finos e quadrados, mudando completamente sua feição. Agora estava focada e com uma seriedade intimidadora.

- O intervalo acabou. Mia, minha filha, será que você está pronta para me ver?

A mulher então desapareceu na escuridão de seu laboratório, as imensas portas de metal fechando-se automaticamente atrás dela, impedindo que qualquer curioso fosse bisbilhotar.