Agatha Mull:

Vejo meu irmão ainda me encarando fixamente, como se quisesse desvendar os segredos que guardo, mas seria impossível revelar a ele que acabei de avistar o pai biológico dele do outro lado da rua.

Este é um segredo que carrego desde antes do nascimento de Joseph. A história por trás de sua chegada ao mundo é algo que todos nós mantivemos em um silêncio profundo, uma decisão tomada por minha mãe naquela época. Minha avó compartilhou esse segredo comigo pouco antes de partir, e desde então, tornou-se um fardo silencioso.

Não guardo ressentimentos contra o pai biológico de Joseph; afinal, nunca tive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente. A única coisa que sabia sobre ele é que era extremamente generoso. No entanto, em um determinado momento do passado, minha mãe tomou a decisão de nos tirar de casa, levando-me e minha avó consigo. Foi uma partida abrupta e misteriosa, sem explicação aparente, além da promessa de que nunca revelaria a verdade ao meu irmão. Lembro-me vividamente do momento em que minha mãe me segurou nos braços, lágrimas escorrendo por seu rosto enquanto minha avó, perplexa, tentava acalmá-la. O ambiente estava carregado de emoções e silêncios não ditos, criando uma atmosfera confusa e cheia de perguntas não respondidas.

Minha mãe, com a expressão marcada pela tristeza e ansiedade, segurava-me com firmeza, como se estivesse tomando uma decisão difícil. As lágrimas em seus olhos refletiam a intensidade da situação, enquanto minha avó, incapaz de compreender completamente, buscava acalmar o tumulto emocional ao seu redor.

Naquele momento, a confusão pairava no ar, e eu, ainda na infância, absorvia o peso daquelas emoções complexas. Era como se o mundo ao meu redor estivesse repleto de segredos, e as lágrimas silenciosas de minha mãe e o olhar perplexo de minha avó deixavam claro que algo significativo estava acontecendo, algo que moldaria o curso de nossas vidas de maneiras que, naquele momento, eu não conseguia compreender totalmente.

Enquanto minha mãe me segurava, o choro entrecortado ecoava na sala, criando um ambiente de desconforto e mistério. Minha avó, embora tentasse oferecer consolo, permanecia intrigada, seus olhos buscando respostas que ninguém parecia disposto a compartilhar naquele momento tenso.

As palavras pareciam falhar diante da intensidade das emoções presentes naquele pequeno espaço. Minha mãe, em um esforço para conter as lágrimas, sussurrava palavras indistintas, como se estivesse tentando explicar a si mesma a decisão que tomara. A confusão pairava como uma névoa densa, envolvendo a todos nós em um véu de incertezas.

Minha avó, por sua vez, mantinha-se firme na tentativa de ser o alicerce da família, mas seus olhos expressavam uma preocupação profunda, uma inquietação diante do desconhecido. Enquanto minha mãe e avó vivenciavam aquele momento de despedida forçada, eu, ainda nos braços de minha mãe, sentia a tensão no ar, como se estivesse sendo marcado por um capítulo desconhecido de nossa história familiar.

Foi naquele instante que percebi que algo estava mudando irrevogavelmente em nossas vidas, um segredo que seria guardado comigo por anos a fio. A tristeza, os olhares perplexos e as palavras não ditas esculpiram o início de uma jornada que, naquele momento, mal podíamos vislumbrar.

Ao longo de vinte e sete anos, carreguei silenciosamente o fardo desse segredo, tornando-me a única depositária dessa história intricada que moldou o curso de nossas vidas. Uma promessa feita à minha mãe e à minha avó, um compromisso inquebrantável de manter oculta a razão por trás das ações tumultuadas daquela época.

A decisão de minha mãe, carregada de mistério e emoção, permaneceu selada em meus lábios, como um pacto sagrado entre gerações. Eu me tornei a guardiã de uma narrativa que influenciou nossa família, uma história que, por respeito aos desejos e dores daqueles que amo, mantive enterrada no mais profundo recanto de minha alma.

Ao longo dos anos, a carga do segredo tornou-se parte intrínseca de minha identidade, uma responsabilidade que carreguei com zelo, apesar das inevitáveis dúvidas e curiosidades que surgiam em minha mente. A promessa de silêncio não apenas conectava-me ao passado, mas também delineava o meu papel como guardiã das escolhas difíceis que moldaram nosso destino.

Às vezes, durante noites silenciosas e reflexivas, questiono a natureza dessa promessa e o peso que ela impôs sobre mim. No entanto, a lealdade à minha mãe e avó continua a ser a força motriz que me impede de quebrar o juramento solene que fiz. O mistério persiste, mas a promessa permanece inabalável, guardando consigo os segredos de um capítulo oculto de nossa história familiar.

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Retornei ao presente no exato momento em que minha querida sobrinha estendeu-me um pedaço de sua sobremesa, gesto que aceitei de bom grado. No entanto, Joseph persistia em me observar com um olhar inquisitivo.

— Irmãozinho, é falta de educação ficar encarando as pessoas enquanto comem — comentei, esboçando um sorriso na tentativa de dissipar qualquer mal-estar.

Joseph manteve seu olhar por mais alguns instantes, como se buscasse decifrar algo além das palavras ditas. Um silêncio momentâneo pairou entre nós antes que Sky quebrasse a tensão com uma pergunta leve, mas cheia de curiosidade.

— Então, Joseph, quando você vai sair com meu irmão? — perguntou ela, acompanhando a pergunta com um sorriso travesso. A leveza de sua fala aliviou a atmosfera, mas Joseph permaneceu taciturno, seus olhos revelando um turbilhão de pensamentos que ele parecia relutante em compartilhar.

Rogerio dirigiu seu olhar na direção de meu irmão, como se ansiasse descobrir a verdade por trás daquele enigma. Até mesmo a filha deles, com olhos cheios de expectativa, observava meu irmão, como se aguardasse uma revelação iminente. Curiosamente, essa mudança de atenção contribuiu para desviar o foco de Rogerio de mim.

A dinâmica na mesa transformou-se, com a energia concentrada agora na expectativa em torno de meu irmão. Era como se a atmosfera tivesse se ajustado, e a curiosidade de Rogerio, antes direcionada a mim, agora se voltava para meu enigmático familiar. A filha do casal, com sua inocência, apenas intensificava a expectativa ao olhar meu irmão com olhos brilhantes, aguardando ansiosamente qualquer revelação que pudesse surgir.

Essa mudança de enfoque proporcionou-me um breve alívio, permitindo-me desfrutar da sobremesa e do restante da reunião de forma mais descontraída. No entanto, no fundo da minha mente, permanecia a consciência de que o passado, mesmo oculto, ainda lançava sua sombra sobre nós, aguardando o momento certo para se revelar.

— Eu vou decidir quando será, ninguém vai me apressar em nada — declarou Joseph com serenidade, levando a bebida aos lábios em um gesto deliberado.

A resposta de Joseph fez com que Rogerio murchasse um pouco, como se a expectativa que tinha criado tivesse sido dissipada. Observando meu irmão agir com tanta confiança, não pude deixar de sentir um misto de orgulho e compreensão. Conhecia, mais do que qualquer um, as cicatrizes que Joseph carregava devido ao abandono de Rogerio. Seu desejo de manter o controle sobre a situação era uma afirmação poderosa de sua autoestima, uma postura que o tempo e as experiências moldaram.

Estou incrivelmente orgulhosa de como meu irmão enfrenta as adversidades, e sei que, mesmo que Rogerio e ele retomem o relacionamento, Joseph está determinado a fazer com que Rogerio compreenda o valor das coisas de maneira mais cuidadosa. Há uma resolução silenciosa em Joseph, uma força interior que não se deixa influenciar por pressões externas. Enquanto a conversa continuava ao redor da mesa, eu contemplava, com admiração, a jornada emocional que se desenrolava diante de nós.

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Quando terminamos de comer, paguei a conta, pois fui eu quem os convenci a vir para este lugar. Antes de sair pela porta, olhei para trás para garantir que tudo estava limpo. Retornando ao nosso caminho em direção ao apartamento dele, ele continuava puxando a coleira animadamente, enquanto Matilde conversava com seus pais e Sky permanecia ao meu lado.

— Está escondendo algo? — perguntou Sky. Antes que eu pudesse responder, um carro passou ao nosso lado. Eu congelei quando me deparei com o olhar do homem no banco de trás, que me encarou chocado por alguns segundos antes do carro seguir em frente. Ele ordenou ao motorista que parasse.

— Merda — murmurei quando o carro deu ré com força. A porta do passageiro se abriu abruptamente, e o homem saiu. Como posso descrever isso? Ele era idêntico a Joseph, ou talvez como meu irmão ficaria daqui a alguns anos.

— É você, Leslie? — Ele indagou entre lágrimas, e meu coração apertou-se ainda mais ao ouvir o nome da minha mãe após tanto tempo.

O impacto da pergunta ressoou em mim, desencadeando uma enxurrada de lembranças e emoções reprimidas. O homem à minha frente tinha os olhos marejados, revelando uma mistura de surpresa, saudade e talvez até arrependimento. O silêncio pairou por um momento antes que eu abrisse a minha boca.

— Sinto muito, mas ela faleceu há bastante tempo — falei, encontrando minha voz.

— Papai, o moço está chorando — Matilde disse, e notei que Joseph estava congelado no lugar. O homem ficou ainda mais petrificado ao encarar meu irmão.

Qualquer um perceberia em segundos que o outro era igual a você. Meu irmão voltou a olhar na minha direção, e eu mordi o lábio com força.

O encontro repentino com esse homem, que lembrava tanto a minha mãe, despertou uma série de emoções antigas e complexas. Meu irmão, ao me encarar, refletia a surpresa e o desconforto que eu também sentia.

— Você é...? — O homem voltou sua atenção para meu irmão, sua voz trêmula revelando a mistura de choque e incredulidade.

— Como conhece o nome da minha mãe? — Joseph perguntou e se afastou do homem, que tentou se aproximar. Dessa vez, as lágrimas escorriam ainda mais intensamente pelo rosto do homem. Meu irmão, com uma expressão chocada, nem notou quando Rogério se aproximou dele e o apoiou. O peso do passado pairava no ar, criando um momento de conexão e compreensão, onde as lágrimas falavam mais do que as palavras.

O homem, agora desmoronando emocionalmente, tentou reunir forças para falar.

— Eu sou o seu pai. — Sua voz quebrou, e as palavras pareciam carregar décadas de arrependimento.

Joseph, ao ouvir aquilo, parou abruptamente e virou-se para encarar o homem. O choque em seu rosto deu lugar a uma mistura de emoções difíceis de decifrar. Silêncio dominou o espaço enquanto as lágrimas continuavam a rolar, e a revelação pairava como uma tempestade no ar.

— Agatha... — Joseph começou, e eu olhei para outra direção, sem saber ao certo o que sentia naquela situação, muito menos como agir.

O peso das palavras pairou no ar, criando uma atmosfera carregada de tensão e expectativa. Eu, assim como meu irmão, me vi envolvida em um turbilhão de emoções confusas. As descobertas recentes lançaram uma luz sobre a nossa história, mas o caminho a seguir permanecia incerto.

Nesse momento delicado, as palavras pareciam insuficientes para expressar a complexidade dos sentimentos que nos envolviam. Apenas o silêncio pairava entre nós, como se aguardasse pacientemente que cada um de nós encontrasse seu próprio caminho diante dessa nova realidade.

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Até a Próximo 😘