Capítulo 18
2786 palavras
"No meio da escuridão mais profunda, descobrimos a extensão do nosso próprio abismo."
Depois que Levi saiu, a sensação de solidão no escritório era quase palpável. Eu estava consumida por uma mistura corrosiva de vergonha, raiva e tristeza. Meu coração batia forte, quase como se quisesse escapar do peito. O que eu estava pensando? Naquele momento, parecia que minha mente estava completamente vazia, paralisada pela vergonha e pelo desespero.
Forcei-me a levantar do chão, as pernas tremendo sob o peso das emoções que me esmagavam. Precisava sair dali antes que alguém me visse em um estado tão lamentável. Meus passos eram pesados e desajeitados, refletindo a confusão interna que me atormentava. Caminhei em direção ao banheiro mais próximo, meu reflexo na janela revelando uma imagem de mim mesma que parecia uma sombra do que costumava ser.
Ao entrar no banheiro, fechei a porta atrás de mim com um estalo seco, como se isso pudesse isolar minha dor do mundo exterior. O espelho diante de mim refletia um rosto marcado pela dor: olhos vermelhos e inchados, a pele pálida e sem brilho. A raiva e a tristeza ainda queimavam intensamente dentro de mim, mas era essencial que eu me recomponha. Liguei a torneira e deixei a água fria correr por alguns momentos, a corrente gelada preenchendo o silêncio do banheiro com seu som.
Mergulhei meu rosto na água fria, o choque do frio penetrante causando uma sensação quase dolorosa na minha pele, como se tentasse despertar meus sentidos atordoados. A água fria me fez sentir como se estivesse tentando limpar a confusão que invadia minha mente.
"Mantenha o controle, Amelie," murmurei para mim mesma, os lábios tremendo enquanto falava. Olhei para o reflexo no espelho, tentando me reconectar com a pessoa que via ali. Era eu, mas parecia uma estranha, uma versão de mim mesma distorcida pela dor e pela frustração. Algo estava profundamente errado, mas eu não conseguia identificar o que. Minha respiração estava descompassada, cada inalação e exalação um esforço consciente para manter a calma.
Depois de alguns minutos, o reflexo no espelho começou a parecer menos abatido. Meu rosto estava menos vermelho, embora ainda houvesse um traço de exaustão em meus olhos. Respirei fundo várias vezes, cada respiração uma tentativa de recuperar a compostura. Não podia me dar ao luxo de parecer fraca, especialmente agora, quando cada momento contava.
Saí do banheiro com a cabeça erguida, a determinação renovada. Preciso focar na missão, deixar as emoções de lado. Cada passo que dava em direção à porta era um esforço para deixar a dor para trás e enfrentar o que vinha pela frente com a força que eu ainda tinha.
Caminhei até o refeitório, sentindo os olhares curiosos e, talvez, julgadores dos soldados sobre mim. Ignorei-os, meu foco estava em seguir em frente, em manter alguma semblância de normalidade. Entrei no refeitório e avistei minha equipe reunida em uma mesa. Levi estava do outro lado do salão, na mesa dos oficiais, mas sua presença era um borrão na periferia da minha consciência. Minha mente estava ocupada demais com o turbilhão de emoções que lutava para controlar.
Sentei-me ao lado de Mikasa, no meio da minha equipe, procurando alguma sensação de normalidade. O calor das conversas e o ambiente familiar ofereciam um alívio temporário para a tempestade que se desenrolava dentro de mim. Mikasa me lançou um olhar carregado de preocupação, que eu procurei desviar com um esforço deliberado.
— Ei, Amelie, está tudo bem? — Sasha perguntou, seu sorriso gentil tentando alcançar a parte de mim que ainda estava em pedaços.
Assenti com um esforço, forçando um sorriso que não atingiu meus olhos. — Sim, só um pouco cansada.
— Entendo, as últimas missões têm sido intensas — Jean comentou, balançando a cabeça com um gesto compreensivo. — Precisamos de uma pausa.
— Concordo, Jean. Talvez devêssemos todos tirar um dia para descansar e recarregar as energias — Armin sugeriu, a ideia de um descanso oferecia um vislumbre de esperança.
— Eu poderia passar o dia inteiro comendo — Sasha disse, arrancando risadas de todos com sua observação despreocupada.
— E correndo — Connie acrescentou com um sorriso brincalhão. — Porque você come muito, Sasha.
— Ei! Eu preciso de energia para as missões! — Sasha retrucou, fazendo um gesto teatral de indignação.
As brincadeiras e risadas ao redor da mesa eram um bálsamo para minha mente sobrecarregada. Por um breve momento, as palavras cruéis de Levi e o ciúme consumido em meu peito se dissipavam, substituídos pelo calor da camaradagem. Mesmo que o alívio fosse efêmero, era um escape precioso do labirinto de emoções que me assombrava.
Não consegui terminar meu almoço; a comida parecia um peso morto no meu estômago. A apatia me envolvia como uma névoa densa. Levantei-me, sentindo a pressão do que precisava fazer. — Espero você no portão — falei para Mikasa em um tom baixo, que mal foi percebido sobre o ruído alegre da mesa. Ela acenou com a cabeça, seu olhar atento tentando ler o que eu tentava esconder.
Saí em direção ao portão, o frio do dia cortando minha pele como lâminas invisíveis. O céu cinza e pesado parecia estar se desmoronando, engolindo tudo ao redor com sua escuridão crescente. O ambiente refletia a escuridão que se alojava em mim, um eco do desespero que sentia. Cada passo que dava parecia ser um avanço em direção a um abismo, onde o vírus não era a única ameaça; nós mesmos éramos nossos maiores inimigos.
Enquanto caminhava, a realidade parecia um pesadelo em câmera lenta. A luta pela sobrevivência não era apenas contra os monstros que ameaçavam nossa existência, mas também contra o desmoronamento interno de nossa humanidade. A sombra de nossas próprias fraquezas e falhas nos consumia, e eu me via em meio a essa batalha, tentando encontrar uma linha tênue de esperança em um mundo que parecia estar se desintegrando.
Mikasa chegou pouco depois, e decidimos ir a pé até a fazenda, para não levantar suspeitas com o carro. A caminhada seria longa, mas era o melhor caminho a seguir. A estrada coberta de neve se estendia diante de nós, uma trilha branca e silenciosa que parecia absorver todo o som ao nosso redor.
— O que estamos indo procurar? — Mikasa perguntou, quebrando o silêncio enquanto avançávamos.
— Não tenho certeza — respondi, os olhos fixos no horizonte sombrio e indistinto. — Apenas... tenha cuidado. O fazendeiro pode parecer inofensivo, mas há algo estranho sobre ele.
— Entendido — Mikasa respondeu com uma determinação firme na voz.
Caminhamos lado a lado, mergulhadas em nossos próprios pensamentos. A paisagem ao redor era surpreendentemente tranquila, um estado de calma que me inquietava profundamente. A neve caía suavemente, cobrindo o mundo em uma camada de branco imaculada, mas havia um desconforto subjacente naquela serenidade. A tranquilidade parecia uma fachada, escondendo um caos sombrio por baixo.
Quando nos aproximamos da fazenda, um calafrio percorreu minha espinha. Alguns funcionários passavam pela propriedade, imersos em suas tarefas, sem prestar atenção em nós.
— Vamos verificar se ele está em casa — sussurrei para Mikasa, o som da minha voz quase engolido pela neve. Caminhamos até a casa, tentando manter uma aparência discreta. Olhei através das janelas e, para minha apreensão, não vi nenhum sinal de vida; a casa parecia vazia e silenciosa.
— Eu irei entrar. Você fica de olho. Se ele aparecer, me avise — instruí Mikasa, que assentiu com um olhar atento.
Enquanto Mikasa se posicionava nos fundos da casa para vigiar, eu me movi com cautela e entrei pela janela aberta. O interior parecia normal, mas algo capturou minha atenção de imediato. Perto da porta, havia um retrato emoldurado: o Senhor Egner ao lado de uma mulher, ambos sorrindo em uma foto que parecia ter sido tirada antes do apocalipse. Egner parecia mais jovem e alegre, uma expressão de amor e vivacidade que contrastava com a realidade sombria que conhecíamos.
No entanto, um detalhe perturbador se destacou: Florencia, a mulher da foto, nunca estava presente na casa. Egner sempre afirmara que ela estava viva, mas nunca a vimos em lugar algum. Ele nunca mencionou que ela tivesse morrido, e a ausência dela levantava uma série de perguntas inquietantes. Se Florencia estava viva, por que ela nunca aparecia? E se ela estivesse morta, por que Egner nunca mencionou isso?
Cada pista parecia adicionar uma camada de mistério, e a sensação de que algo estava profundamente errado só aumentava. A tranquilidade da casa agora parecia uma máscara, escondendo segredos.
Enquanto me aproximava do banheiro, um odor insuportável me atingiu — o cheiro inconfundível de um cadáver em decomposição. Era um aroma nauseante que parecia se entranhar em cada respiração, uma presença implacável e podre que se entranhava nas minhas narinas. Respirei o mínimo possível, tentando ignorar o ar apodrecido e tóxico, enquanto minhas mãos tremiam ao tocar a maçaneta fria e úmida. O cheiro se intensificava à medida que eu girava a maçaneta e empurrava a porta.
A cena que encontrei foi um pesadelo absoluto. No fundo do banheiro, uma mulher estava amarrada em uma banheira, suas correntes presas firmemente à parede: uma ao redor do pescoço, endurecida e enferrujada, outras duas nos punhos e mais duas nos tornozelos. Moscas zumbiam em uma nuvem nauseante ao redor dela, e o cheiro de decomposição era quase insuportável. Tapei a boca e o nariz com uma mão, enquanto a outra ainda segurava minha arma com firmeza. A visão diante de mim era horrível e cruel.
A mulher estava em um estado lastimável. Seu corpo estava coberto de feridas abertas e podres. As correntes haviam dilacerado sua pele, deixando-a em carne viva, com profundas feridas infligidas pelo metal enferrujado. Larvas se alimentavam das feridas abertas, suas pequenas formas brancas se movendo freneticamente sobre a carne podre. Havia um buraco horrível na coxa direita dela, de onde se espalhavam mais larvas, o sangue negro e coagulado se acumulava na banheira, formando uma poça grotesca.
Seu rosto estava irreconhecível, inchado e distorcido pelo inchaço e pela gangrena. A mandíbula estava quebrada, forçando sua boca a permanecer escancarada em uma expressão de dor eterna. Eu podia ver metade de sua língua cortada e negra, secreções purulentas escorrendo de sua língua infectada, misturadas com o sangue que se acumulava em torno dela. Sua respiração era fraca e irregular, um som frágil e sibilante que quase parecia um lamento.
A visão era tão perturbadora que não consegui evitar o impulso de vomitar. Me curvei sobre o chão frio, o ácido queimando minha garganta e a bile amarga enchendo minha boca, enquanto o cheiro insuportável do banheiro parecia se impregnar em meus pulmões, me deixando tonta e enfraquecida.
Tentei me recompor, o horror diante de mim quase me esmagando. Com mãos trêmulas, liguei para a central com meu fone de ouvido, minha voz saindo em um tom de desespero e urgência.
— Central de controle... — Não esperei que a pessoa se identificasse.
— Capitã Moreau, comunique a comandante Hange e o comandante Levi para virem imediatamente. É urgente, estou na fazenda.
Encerrei a ligação e saí do banheiro, o pânico acelerando meu coração. Saí pela janela que havia usado para entrar, mas Mikasa estava desaparecida. Ela deveria estar vigiando, mas não havia sinal dela. Olhei freneticamente ao redor, o frio penetrante da tarde me fazendo tremer. O celeiro parecia o único lugar onde ela poderia estar.
— Porra, Mikasa! — Gritei, minha voz carregada de frustração e medo.
Corri em direção ao celeiro, minha mente fervendo com a possibilidade de que Egner tivesse capturado Mikasa, de que ela pudesse estar passando pelo mesmo tormento que Florencia. A adrenalina turvava meus sentidos, tornando cada passo uma luta. Um estalo seco, um tiro vindo do celeiro, parou meu coração por um segundo.
Quando cheguei à porta do celeiro, aberta e balançando levemente, a cena diante de mim foi um choque. Mikasa estava imobilizando Egner no chão com uma força que eu sabia ser característico dela. Mas o horror que eu havia testemunhado no banheiro ainda me atormentava, e estava paralisada.
— Algemas! — Mikasa gritou, sua voz urgente cortando a neblina de choque em que eu estava mergulhada. Com mãos trêmulas e o coração acelerado, peguei as algemas e corri para onde ela estava. Mas minha distração havia sido suficiente para Egner empurrá-la brutalmente para o chão. O impacto fez meu coração acelerar ainda mais, o som do corpo de Mikasa batendo contra o chão ressoando em meus ouvidos.
Egner, com uma agilidade surpreendente, retirou uma pequena faca de sua bota. O brilho frio da lâmina cortou o ar.
— Não! — Gritei, a voz rouca de pânico e raiva. Egner, implacável, cravou a faca no ombro de Mikasa. O grito dela cortou o ambiente gelado, e eu lutava para me aproximar.
Com uma explosão de raiva, dei um chute certeiro em seu rosto, jogando-o para o lado. Egner rolou no chão, tentando recuperar o equilíbrio.
— Seu desgraçado! — O grito saiu de mim com uma intensidade que parecia quase sobrenatural. O ódio me consumia. Corri para o lado de Mikasa, que estava estendida no chão, o rosto pálido e ensanguentado. — Mikasa!
Queria correr para socorrê-la, mas Egner já estava se levantando, a faca ainda brilhando sinistramente em sua mão. Apontando minha arma para ele, a determinação e a raiva lutavam pelo controle dentro de mim.
— Espero ter quebrado sua mandíbula, assim como você fez com Florencia.
Egner parou, seu rosto vermelho e os olhos se enchendo de lágrimas. O tremor em seu corpo era visível, e a dor em sua voz era clara.
— Não, eu não... eu não fiz isso...
— Você a torturou, seu filho da puta! — A arma estava engatilhada, e o desejo de acabar com sua vida pulsava dentro de mim. — Você me deve uma explicação!
— Não fui eu, foram eles... — Egner gaguejou, as lágrimas misturadas com o suor. — Foi culpa deles.
— Eles quem? — Minha voz era um rosnado baixo e perigoso, minha raiva quase incontrolável.
— A minha amada Florencia... — Egner soluçava, a dor visível em seu rosto. — Eles me forçaram a deixá-la doente, a colocar algo no seu chá.
Meu corpo congelou ao ouvir isso. As palavras dele eram um golpe cruel. Ele realmente havia envenenado meu chá. Minhas mãos estavam tremendo, e o choque fazia meu corpo tremer descontroladamente.
— O que você colocou no meu chá? — Minha voz se elevou, quase gritando, a impaciência e o horror transbordando.
— Eu posso contar tudo, eu lhe direi os nomes, mas com uma condição.
— Não tem condição nenhuma, porra! — Ignorei a condição dele, o desprezo e a frustração em minha voz. — Fale logo!
— Com a condição de que me mate depois.
Franzi as sobrancelhas, meu olhar cético e irritado. Estava prestes a responder quando um tiro estourou no ar, o som penetrante e chocante fazendo meu coração pular. O sangue espirrou no meu rosto, e olhei para Egner caindo, seu corpo sem vida no chão. Eren Yeager estava atrás dele, a arma ainda fumegante.
Fui até Eren, agarrando a gola de seu uniforme com força, o ódio fervendo em mim.
— O que você fez, seu idiota? — A raiva borbulhava em mim, uma fúria insuportável.
— Ele... ele ia atacar você.
Sem hesitar, derrubei Eren no chão e dei um soco firme em seu rosto. O impacto do soco ecoou no celeiro.
— Ele não ia. Quem te deu a ordem para vir aqui?
— Ele estava com uma faca! — Eren lutava para se soltar, o medo visível em seus olhos.
— Eu não te dei ordem nenhuma, seu bastardo. — Minha mão estava prestes a acertar outro soco, quando a voz de Levi cortou o ar com autoridade.
— Já chega, capitã.
Levi observou a cena com um olhar impassível. Mikasa estava desacordada e sangrando, e o corpo de Egner jazia no chão. Ele me olhou com uma seriedade que fez meu coração amolecer, me forçando a parar.
Hange chegou acompanhada de Moblit, ambos com expressões de preocupação.
— Mikasa foi esfaqueada no ombro. — Moblit imediatamente começou a tratar o ferimento com uma destreza calmante.
— Hange, há uma mulher na casa, no banheiro. Ela está... — Minhas palavras saíam com dificuldade, o cheiro nauseante ainda impregnado em mim, nas minhas roupas. — Ela está viva, mas parece estar apodrecendo.
Hange arregalou os olhos ao ouvir isso, o horror estampado em seu rosto.
— Moblit, quando terminar aqui, vá até a casa. — Sem mais palavras, ela se dirigiu rapidamente para a casa, sua expressão grave.
Eren estava ao lado de Mikasa, com um olhar de preocupação. Eu me virei para ele e Levi.
— O fazendeiro está morto, senhor. — Informei, minha voz ainda tremendo.
— Sim, isso está nitidamente claro.
— Eren o matou sem minha permissão, alegando que ele estava prestes a me atacar.
— E o que acha disso?
— Não sei. Ele estava com uma faca, mas parecia disposto a colaborar. Não tenho certeza, senhor.
Levi balançou a cabeça, aparentemente concordando com minha avaliação. Sua expressão era difícil de ler, mas eu podia sentir a tensão no ar.
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