97 - ROMPIMENTO
Não me deixe com toda essa dor
Não me deixe na chuva
Volte e traga de volta o meu sorriso
Volte e faça essas lágrimas pararem
Toni Braxton - Un-Break My Heart
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A reunião seguiu de maneira estranha, era difícil dizer o que cada um estava pensando e seria difícil dizer até que ponto cada um estava afetado com a escolha de Lissa.
Lissa sentia como se estivesse descendo rapidamente em queda livre, mas diferente das outras vezes, dessa vez não estava agradável. Ela sentia como a ansiedade tomava conta do seu corpo pouco a pouco. Daria certo, ela sabia disso e o que ela tinha dito era verdade, ela realmente não se importava com aqueles que estavam presos no porão do navio. A maioria eram predadores sexuais, machistas e abusadores vindos de diversos lugares do mundo na qual ela havia passado desde que conseguiram o navio. Outros eram guardas imperiais que ajudavam no sequestro para o estoque pessoal da rainha... por outro lado, desde que os Malphas chegaram que ela sentia muito mais a dor de usar a ala 9, era uma dor terrível demais para colocar em simples palavras.
Sua convicção de tirar a Kawany do trono e entregar para os Malphas seguia firme desde que ela havia descoberto de que sim, eram eles desde o início, inclusive na primeira linha e para que isso acontecesse ela seria qualquer demônio. Ela seria a pior pessoa do mundo se isso fosse necessário. Mostrar fraqueza nunca esteve em seus planos, mas aqueles rapazes conseguiam fazer sua máscara cair uma e outra vez e saber que eles ainda não confiavam nela doeu muito mais do que ela queria admitir. Ela não havia agido por impulso quando fez o contrato, mas a ideia era que somente Zyon fizesse parte dele. Ela sabia o quanto doeria sofrer por todos eles, mas estava disposta a levar seu corpo ao limite antes de "morrer", ela iria se curando as custas de outros até não aguentar mais. Esse monstro era ela e ela seguiria sendo até que seu objetivo estivesse alcançado. Depois disso, porque ela não poderia tentar juntar Malphas e Kitsunes? Pelo menos seus amigos estariam juntos. Zyon havia dito em determinado momento no canto da sala de reuniões de que aquele não era o lugar dela, de que ela deveria ir para Himura com ele, que sua presença sempre traria algum tipo de dor e sofrimento para a humanidade. Ele tinha razão e ela sabia disso, então faria isso da melhor maneira possível, Malphas e Kitsunes tinham que seguir juntos para que ela fosse para esse lugar estranho com o seu verdadeiro pai sem causar mais sofrimento para ninguém. Ela só precisava garantir que eles estivessem bem.
Lembrou com pesar todo o sofrimento que tinha feito suas amigas passarem, principalmente a Senka. Sua amiga baixinha e irritadiça que nunca havia saído do seu lado. Constatou com pesar o quanto sentiria falta dela.
Assim que todos saíram da sala, ela respirou fundo e resolveu sair também. Ela precisava de ar antes de começar com um treinamento intensivo para atacarem o castelo.
– Foi divertido provocar meu amigo, Lissa? – ela escutou a voz irritada de Carlos ao passar pela porta e se virou com o coração na mão.
– O quê? – ela perguntou tentando se concentrar quando ele praticamente a encurralou na parede.
– Por que merda você fez aquilo? – ele estava furioso – ou seja, mesmo sabendo o que cada um sente você simplesmente vai seguir brincando com o sentimento de cada um? Então essa é de fato você?
– Eu não sei – Lissa falou com o coração acelerado de tal maneira, que ela achou que passaria mal ali – eu já pedi desculpas.
– Não, você não pediu – ela nunca o tinha visto daquela maneira e mesmo tentando se controlar, ela sentia como seu corpo tremia de maneira visível – acha que pronunciar uma simples palavra é o mesmo que realmente pedir desculpas? Você o provocou deixando-o desconfortável, causou um mal-estar no seu próprio capitão que está mais do que na cara de que gosta do Roy... você jogou na cara dele que o sentimento não é recíproco, já que o Yan constatou ali que o Roy segue sendo atraído por você. É difícil para você deixar de brincar com o sentimento das pessoas? Caralho, era brincar com os meus sentimentos que você queria? Tudo bem... dane-se, mas não faça isso com os meus amigos.
Lissa o olhava assustada, ela tentava entender o porquê tinha feito aquilo com Roy e nem mesmo ela sabia. Ela buscou uma e outra vez o motivo de ter agido daquela maneira e tudo o que conseguiu foram respostas egoístas... e aí estava, a resposta era simples, ela fez aquilo porque podia fazer. Quando ela constatou do como ela tinha sido cruel com eles, ela sentiu seu mundo desabar.
– Eu... – Lissa começou a balbuciar – eu sinto muito...
– Além dessa merda toda, ainda nos fez assinar algo que vai te ferir do começo ao fim. Você parou para pensar que não é esse o tipo de garantia que queremos?
– Não – Lissa falou surpresa – por isso eu não pedirei desculpas.
– O quê? – Lissa notou um misto de surpresa e raiva nos olhos de Carlos – Não vai? Quer dizer que o que pensamos não te importa?
– Eu fiz isso para que você parasse de duvidar de mim – Lissa falou um pouco mais alto – Você me jogou na cara que não confiava em mim. Queria que eu tivesse feito o quê?
– Eu estava bravo – ele por fim gritou – Você estava provocando o meu amigo na minha frente. Que inferno Lissa – Carlos parou e suspirou de repente parecendo extremamente triste – Acha que não é doloroso? Sabe qual é o pior de tudo? Eu sempre soube que seria assim, sempre soube que essa desconfiança nunca sumiria. Eu sabia que no fundo você nunca acreditaria em mim e eu também nunca poderia confiar em você de verdade. Eu sempre soube que isso não daria certo. Não somos iguais e nossas vidas são complicadas. Somos apenas aliados para um fim em comum, não é mesmo?
– Não – de repente a visão de Lissa se nublou, ele realmente queria dizer aquelas coisas? Não, ela não queria acreditar e a certeza de que aquela dor era imensamente pior do que qualquer dor física fez seus olhos se encherem de lágrimas – Não, espera... por favor.
– Esperar o quê, Lissa? – ele fez um pequeno carinho no rosto dela e notou como a primeira lágrima ameaçava querer sair de seus olhos – esperar que você me convença de que a partir de agora seremos um casal feliz com um futuro brilhante? De que você deixará de fazer o que faz só para que eu fique feliz e que eu deixarei de te usar quando precise de alguma coisa para os Malphas? O que você quer que eu faça? Que eu me declare de novo para você e vivamos uma vida feliz juntos e que continuemos nos ferindo mutuamente? Que romântico, não é?
Lissa sentia como um vazio intenso tomava conta do seu peito, como de repente estava ficando difícil respirar e se concentrar.
– Você está... está terminando comigo? – Lissa falou com a voz falha.
– Não podemos terminar o que nunca tivemos, Lissa – a frase dele atravessou o coração dela de um jeito que a deixou tonta.
– Por favor, espera – ela falou com o choro entalado e a garganta doendo – Não faz isso...
– Eu vou indo – Carlos estava acabado tanto quanto ela, mas o que ela havia feito tinha realmente machucado e ver seu amigo vulnerável o fez entender o quão injusto era aquilo tudo para todos eles. Ele tinha o coração dela? Ela acreditava nos seus sentimentos? Ele teria que simplesmente aceitar aquelas provocações baratas dela com todos, toda vez que ela quisesse algo de alguém ou quisesse se divertir?
Carlos se virou e deixou Lissa parada no mesmo lugar. Ele precisava de ar e precisava colocar as suas ideias no lugar. Era realmente muito doloroso deixar ela, mas não era esse tipo de relacionamento que ele queria com ela... ele a queria com ele, queria que ela quisesse só a ele da mesma maneira que ele queria só a ela. Ele queria alguém para estar ao lado dele em qualquer momento e que estar só os dois bastasse dentro da relação. Ele passou a mão pela cabeça sentindo o como ele estava parecendo velho e o quanto seu pensamento se resumia a uma simples relação tradicional, onde ele poderia constituir uma família e ter a mulher que ama ao lado. Tentou imaginar Lissa ao seu lado como uma boa esposa e essa imagem simplesmente não se encaixava com ela. Por um lado, ele se frustrou, pois sabia que isso não aconteceria, pelo outro ele ficou feliz, porque ele havia se apaixonado por ela daquele jeito, daquele jeito desleixado e louco. Sentindo como sua cabeça dava voltas, ele resolveu que iria tomar um ar.
Ele olhou as ondas batendo logo abaixo no casco do navio. Uma e outra vez alguém chegou nele perguntando se estava tudo bem e ele apenas respondia vagamente que sim, mas não seguia assunto com ninguém.
Ele seguiu assim até que a tarde finalmente caiu. Ele não sabia de Lissa, nem de mais ninguém. Cada um estaria se preparando da melhor maneira possível e ele sabia disso.
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