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⚔️ Capítulo 16: A visita na madrugada


   Para quem havia passado pela incerteza de sobreviver, Robb respirava vigor e exalava expressividade, ainda que seu pescoço fosse coberto por um lenço, como Harald havia ordenado em seu processo de trabalho para curá-lo. Em uma semana, sentia-se o aroma da vida e a vontade de voltar a erguer uma espada contra qualquer inimigo que fosse. No entardecer daquele dia, Valakari havia estipulado data e hora para voltarem a viajar. Queria todos de pé antes das dez da manhã e nem mesmo seu danificado escudo lhe atrapalharia a por os pés a bater por entre as florestas outra vez.

   Sigmund e Arno cochichavam em um canto, e o segundo permanecia com seu cachimbo em boca. Artorius e Robb tomavam uma sopa em vasilhas perto da saída traseira enquanto Saknussemm cochilava em uma das cadeiras com os pés descalços para cima e encostados à janela. Dário golpeava o ar com sua espada na área externa. Despido da parte superior e embainhando sua arma na direção oposta ao sol.

   Harald aproximou-se com as mãos em forma de concha, pois trazia comida aos peixes, alimentando-os da beirada da ponte, enquanto ainda não tirava os olhos do Patrulheiro.

   — Vocês vão precisar de uma melhor proteção para combate. - disse previamente. — Devem ser muito bons com as espadas para chegarem até aqui sem grandes ferimentos. Exceto um de vocês, claro! - completou, lembrando-se de Robb.

   — Não temos as melhores condições nas Muralhas e partimos sem apoio popular ou de autoridades. Está tudo por nossa conta.

   A conversa teria se encerrado ali mesmo se não fosse a curiosidade latente do filho de Eustáquio, que voltou a dialogar ainda movimentando sua arma.

   — Or-ash. - falou ao vento, afim de obter algo, que não veio prontamente. — Eu disso Or-ash. O senhor sabe do que se trata? - insistiu.

   — São uma leva de orcs que vivem ao nordeste das Montanhas da Loucura. - respondeu sacolejando a mão, limpando-as das migalhas. — Não vai querer conhecê-los.

   — Talvez queira me dizer o motivo.

   — São os mais sanguinolentos da raça, mas são poucos. Um baixo número se compararmos aos Lurtz-bru e os Tu-gul.

   — Por que a menor quantidade?

   — Em uma certa época, muito tempo atrás, a loucura era tanta que os mesmos se devoravam entre si, como animais ensandecidos e esfomeados.

   Dário pausou o exercício com a espada, olhando fixamente para o Druida.

   — E o nome Gaharg, lhe é familiar?

   — Não, mas eu conheço Burzgimbmur, líder dos Lurtz-bru. Veste uma couraça. - respondeu indo em direção a porta de casa. Dário refletiu por um segundo, pois agora sabia o nome de outro de seus inimigos.

   Foram longos dias de ininterruptas e infindáveis conversas e discussões. Assim foram passadas aquela sete datas de repouso e forçado intervalo na jornada. Harald aproveitou o ensejo para revelar-lhes que havia viajado de leste a oeste buscando informações com outras criaturas, mas nada encontrou. Somente terras morrendo, disse ele em tom amedrontador, mas sorriu ao dizer que daria o contra-ataque cedo ou tarde.

   Mesmo assustado pela luta que havia travado contra a morte, Robb desejava ir embora o mais rápido possível, ainda mais depois que o velho Druida lhes revelou o caminho para chegar ao Povoado Velho. Passem pela Jomfruelig e então chegaram a Huvudet-Ovanpå. Tudo está localizado em suas costas, disse ele. Uma apertada floresta e uma bela montanha, explicou respectivamente. Ainda naquele fim de tarde, Valakari relembrou aos acompanhantes que retornariam a viagem na manhã seguinte, fazendo pouco caso sobre seu escudo quebradiço, como se não precisasse dele para guerrear.

   — Vocês podem ficar o tempo que quiserem. - sugeriu Harald. — Eu sairei amanhã em viagem, pois tenho de me encontrar com um amigo do leste, mas a casa os comporta, e em qualquer empecilho, Immanuel e os outros surgirão, não tenham receio! E nunca uma hoste maligna ousou adentrar em minha casa.

   — Nós agradecemos, mas recusamos. - rechaçou o vigilante Valakari rispidamente. — Temos de partir, ainda mais que já temos conhecimento sobre a localidade de nosso destino.

   Teria sido uma prazerosa noite de descanso que antecederia ao reinício da jornada excitante, mas enquanto todos tentavam pregar seus olhos, Harald sentiu a vinda das sombras. Sentava-se em uma poltrona no andar superior, com o cachimbo em boca e os olhos fixados sobre um livro de runas, até que sua visão suspendeu-se a janela e em meio as suas quinquilharias de Druida. O fornilho parou de esfumaçar o ambiente e logo ergueu seu rosto cansado pelo vidro, fechando rapidamente seu objeto de leitura. Sentiu um horror em seu peito, como se o anjo da morte viesse lhe buscar para voos indesejáveis.

   O Druida puxou agilmente seu cajado e desceu as escadas em ligeireza. Recitou palavras em sussurro e observou o corpo dorminhoco de seus visitantes. Soprou todas as velas acesas e com sua arma silenciou a lareira, deixando sua morada em um breu absoluto que se somava a noite. Parecia inabitável a distância. Valakari em seu sono leve percebeu a agitação do velho e ergueu-se lentamente. Sentando-se com os olhos ainda pouco abertos, visualizou Harald agachado na lateral de uma das janelas, como se estivesse a espera de algo ou alguém.

   — O que está fazendo? - disse pausadamente, e o Druida virou-se à ele.

   — Avise seus amigos que teremos visitas. - respondeu assustado. — E não vieram para comer bolo e gozar de meus cachimbos e ervas.

   Num par de minutos, os homens se puseram de pé com suas espadas ainda embainhadas e quase nenhuma proteção física. Robb ficava atrás de Artorius, não por vontade própria, claro, pois o segundo ainda era receoso em deixar o amigo batalhar livremente.

   — Disse para nós que ninguém entraria em sua floresta. O que é que houve para fazer inimigos mudarem tão repentinamente de pensamento e opinião? - indagou Dário, ainda calçando suas botas.

   — Temos duas opções, meu rapaz. Eu espero que seja a primeira e que tenham somente criado coragem.

   — E a segunda, qual seria? - perguntou temerário Saknussemm.

   — Podem estar na companhia de uma pessoa que eu não gostaria de ver nesta noite. - disse sem virar-lhes o rosto, com pouca educação e assustando ainda mais o restante. Harald suspirou contra as paredes. — Vocês, peguem a pouca bagagem que lhes restam. O máximo que aguentarem para correrem com elas nas costas e se preparem para o pior.

   Foram escassas as tralhas que lhes sobraram e a pouca e leve bagagem foram amarradas em suas costas. Dário girou o pescoço como se fosse uma maçaneta, pois não encontrava seu uniforme negro da Patrulha. O Druida jogou uma capa de cor castanha com um trevo bordado na parte traseira, vendo a demora do rapaz.

   — Vista logo isso, homem. - bradou irritadiço.

   Harald recolheu sua visão por um momento, fechando os olhos suavemente. Posicionava-se agora atrás da porta.

   — Há dois deles se aproximando pela ponte e muitos outros que ainda chegarão pela floresta. - disse ao abrir os olhos. — Valakari, leve seus homens até a porta dos fundos. Em alguns segundos algumas coisas poderão acontecer por aqui. Vocês precisam retomar a viagem, já sabem para onde irem.

   Assim sendo, passado cada milésimo de tempo, o Druida escancarou a porta e tocou seu cajado ao chão. Uma lufada de vento irrompeu como em uma mudança climática instantânea e os dois Goblins que caminhavam em vossa direção foram arremessados pelos ares.

   — Agora corram! Cheguem ao outro lado e desemboquem pela mata. - berrou sem se virar. Os Patrulheiros imediatamente puseram seus pés a trabalhar, atravessando a ponte até o outro lado de terra.

   — E o senhor? - perguntou Dário, o último, pois havia ficado contra a vontade do anfitrião. — Não posso deixá-lo aqui para morrer.

   — Vá embora! Fuja com os outros. - seu pescoço fez uma curva para a entrada novamente. — Agora é tarde demais. - definiu com negatividade.

   Emergiu das terras verdes um grupo de Goblins, acompanhado por um Orc encouraçado e orquestrados por um cavaleiro encapuzado acima de um cavalo negro como a noite e de olhos que brilhavam como um rubi.

   — É como meu pai dizia. - sibilou Dário com muito pavor. Suas mãos travaram, não conseguindo retirar sua espada. Harald o olhou com curiosidade, entendendo a situação e quem recebia em sua casa por tantos dias. Seu pai?

   O Patrulheiro permaneceu imóvel enquanto visualizava a capa negra de tantas eras. A pele pálida era levemente coberta pela sombra que caia pela veste e somente parte de seu queixo se revelava. Então, ele tomou coragem, estufando o peito e apertando o punho de sua espada para desembainhá-la.

   — Vamos cortar a ponte. Jamais nos alcançarão.

   — Bote um pé para fora e dê adeus a sua vida como você conhece. - respondeu com muito destempero. — Seus amigos já foram? - perguntou e logo recebeu um sinal positivo. A porta traseira ainda estava aberta.

   — E então, o que faremos? Não podemos morrer aqui!

   — Calado! Eu já estou trabalhando nisso. Mantenha-se quieto e tente não atrapalhar a já caótica situação. - avaliou o Druida, fechando os olhos e mussitando algo com os lábios vagarosamente.

   Um som estrondoso veio em seguida, e Dário esforçou-se para entender o que havia acontecido. Logo viu a ponte se rompendo nas águas, criando ondas e com as cordas desatadas, impossibilitando qualquer vinda ou ida. Água respingou para todos os cantos e o filho de Eustáquio curvou as sobrancelhas, sem entender o que estava acontecendo. Saboreou o resultado ainda assim, pois parecia muito vantajoso.

   (Imagem meramente ilustrativa / Google)

   — René. - soprou Harald.

   — Roendo tudo... - complementou o Patrulheiro com um sorriso debochado no rosto. — E agora? Vencemos?

   — Agora, corra o mais rápido que puder para o outro lado e não pense duas vezes. Em breve estarei com vocês. Minha visita ao camarada do leste foi-se por água abaixo!

   Dário discordou, pois pensou não só duas vezes, mas um número muito maior. Gostaria de ficar, logicamente, mas sabia que precisava partir agora. Sentiu-se confiante pelo resultado obtido e tinha certeza que Harald estava sabendo o que fazer. Acenou com a cabeça e disparou pelos fundos, deixando o velho à sós.

   Harald caminhou para fora, lentamente e com olhos brilhantes. Ele testemunhou René encostado em pedras na rabeira da terra firme e deu-lhe um sorriso triunfante. Aqui, nem mesmo o Orc encouraçado ou a figura acima do cavalo atentou contra o patrono verde. Os Goblins deram um passo para trás, pois sabiam que não estavam encarando qualquer um. Houve um grande temor e também respeito no ambiente.

   — Fico contente que tenha tido coragem de visitar a minha casa novamente. - conversou apoiando o cajado no chão. Dirigia-se ao encapuzado. — Uma pena que não tenha vindo sozinho. Minha casa tem espaço para tomarmos um chá e fumar um cachimbo, mas com tanta gente assim, é inviável. - brincou destemidamente.

   O encouraçado sentiu uma ebulição em seu corpo. Enraivecido pelo desdém do Druida e louco para cravejá-lo de alguma forma. O então comandante da tropa adversária arriscou um dialeto em idioma obscuro, mas o Druida rebateu-o prontamente.

   — Tenha ao menos dignidade e fale comigo na nossa língua e não no linguajar dos mortos. Por favor! - respondeu com grosseria e sem sorriso no rosto cansado.

   O inimigo acima da montaria ergueu sua mão ao ar pacientemente, como se esperasse por algo. Então, manifestou-se uma luz púrpura em seu punho direito, desenhando-se em um cajado negro e com parte de ossos, com adornos da morte e detalhado em vermelho-sangue. Havia um crânio no topo dele. A troca de olhares permaneceu por um breve segundo, até que o lago pareceu diminuir, como se estivesse a se secar totalmente. Os dois Goblins de outrora suspenderam suas mãos emporcalhadas por terra firme, ressuscitando. Avançavam lentamente contra o Druida, que os olhou de cima para baixo. Refletiu por um segundo, pois a água estava a desaparecer e logo estaria em maus lençóis.

   Harald empurrou seu cajado contra o solo, dando alguns passos retardatários. A terra subiu pelo corpo das criaturas pequenas, tomando-os por completo, deixando-os imóveis e dando tempo suficiente para o Druida raciocinar novamente.

   Ainda do outro lado, o Orc gargalhou com sua armadura pesada e o restante dos Goblins sacolejaram suas curtas espadas pois sentiam a vitória iminente. O inimigo que portava um crânio em sua arma permaneceu estático em seu cavalo, aguardando o desaparecimento total da água para que seus capangas atravessassem em definitivo.

   Restou para o mestre dos animais lamentar e arriscar sua última cartada. É em momentos como esse em que eu lamento por ter passado parte de minha magia para Émile! Harald fixou seu cajado a terra uma vez mais, gerando uma corrente de ar tão potente quanto um furacão, arrasando os inimigos como sacos de pães. Os Goblins arrastaram suas unhas pútridas pelo chão e o Orc da couraça esforçou-se para não voar junto, enquanto o encapuzado e pálido inimigo permaneceu inerte como se a magia não lhe fosse danosa. Então, Harald suspendeu sua arma em direção a lua e fez-se um clarão tão grande quanto o sol, uma resplandecência absoluta na qual nada se enxergava. Assim desfeita após menos de um minuto, o Druida já não estava mais lá, e sua derrota não aconteceu, ganhando sobrevida não só para ele, mas para seus antigos visitantes.

   Oi, eu sou o Rogi! Muito obrigado se chegou até aqui. Neste capítulo descobrimos quem eram os dois orcs passados, do que se trata os Or-ash e também as duas outras tropas da raça! Além disso, finalmente chegamos ao desfecho da condição de Robb! Mas por qual motivo Gaharg, o segundo orc, não estava acompanhando seu líder na emboscada? E para qual lugar a Patrulha irá, já que foram obrigados a anteciparem o retorno da jornada e correram pelas florestas sem pensar duas vezes? E Harald, o Druida protetor da Floresta Verde, o que aconteceu em seu sumiço!? Deixe seu voto e comente!

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