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⚔️ Capítulo 03: A baderna na taberna


   Dário não tinha papas na língua. Silenciar-se perante Tibério e sua bazófia para evitar um desfecho embaraçoso ao lado de Eustáquio e Fred fora apavorante. Sentiu-se miserável e infeliz. Na noite seguinte, ainda remoendo a impolidez de seu irmão mais velho, o caçula resolveu espareicer e desentediar-se na taberna do velho Moe.

   Abespinhado, o Patrulheiro da Muralha não notificou a ninguém sua partida noturna. Ao aproximar-se da entrada, constatou que o lugar estava abarrotado. Assistiu as sombras dos clientes que sacolejavam de um lado para o outro pelas janelas amareladas tomadas por tiaras de madeira. Bêbados e sórdidos, os consumidores enchiam a cara e se empaturravam sem intervalo.

   Sua caneca transbordava cerveja, o que manchou vagarosamente a mesa e o pano cor de âmbar que lhe cobria. Sentava-se nas proximidades das janelas laterais em um banco amarronzado. Estremado do restante, apenas ouvia a falação em voz alta da freguesia. Moças vestindo roupas claras e finas entregavam e serviam petiscos e aperitivos onde a maioria dos receptores eram do sexo masculino. Percebeu a certa distância, um mal-apessoado sujeito. Arrogante, o homem com a cabeça em forma de melão conversava com um grupo de rapazotes de modo muito gozador. Riam enquanto se debruçavam no balcão de madeira. Cuspiam enquanto falavam e agiam como animais. Quando o malfeito virou-se, utilizava de um tapa-olho à esquerda. Suas roupas gastas e disformes lhe davam um aspecto absolutamente desengraçado. A calvície não lhe ajudava nem um pouco, haja visto que só tinha cabelo ao entorno de sua protuberante cabeça.

   Os ébrios direcionavam-se ao homem de tapa-olho com muito contentamento. Ele ergueu sua bebida e proferiu tais palavras:

   — Vocês ouviram!? - disse em alto e bom som. Dário sequer mudou sua posição, mantendo seus olhos ao observar civis pela janela ao lado de fora. — O velho continua com suas bobajadas e causos místicos!

   De prontidão, o caçula curvou seu pescoço. Seus ouvidos se ativaram para ouvir o que o ignóbil dizia.

   — O maldito não dará descanso enquanto não fizer com que todos fiquem trancafiados em suas casas! O decrépito de fato acredita nessas histórias malucas. A idade é realmente uma lástima, meus queridos!

   Sua gente riu em alusão e tantos outros caçoaram de Eustáquio. O aval ao gritalhão permaneceu, e ele deu continuidade as provocações de baixo nível. Ofendiam o ex-Patrulheiro sem pestanejar, o que fez com que Dário sentisse uma chama de ódio arder em seu peito.

   — O que está a dizer? - berrou ao se levantar. Fez-se um silêncio absoluto na taberna.

   Todos os olhos ali presentes direcionaram-se a Dário, mas ele não se sentiu intimidado.

   — Ora! Está surdo? Refiro-me ao velho tolo que mora ao sul da Muralha! Suas mentiras estapafúrdias e caluniosas contagiam os mais fracos!

   — O homem ao qual chama de velho tolo é meu pai e não tolero tais ofensas! Por acaso acha que ele é louco?

   Os canalhas agitaram-se. Excitados por uma possível briga. Um camarada de olhos esbugalhados e que trajava uma roupa pesada e túnica amarelada resolveu tocar uma sanfona durante a pugna que se fazia.

   — Peço mil perdões, estimado amigo! - respondeu com um sorriso amarelado e detestável em seu rosto magro. — Em momento algum quis ofender sua família. Longe de mim! - os ânimos estavam a ficar frios, mas o sujeito retomou as falas. — Vocês fazem este serviço por conta própria!

   Dário desceu seu punho contra a mesa. O estrondo fez com que o músico parasse seu trabalho por um instante. Moe surgiu por entre a porta da adega. Seu cabelo grisalho entregava sua alta idade. Assustado pelo que ouvira a distância, se pôs adiante, mas dois seguidores do rufião lhe seguraram.

   — Há de ter muita coragem para zombar de minha família em minha frente. Tenho de lhe dizer que admiro tal personalidade, mas infelizmente isso o faz com que seja um sujeito desprovido de inteligência.

   A clientela caiu em gargalhada. O grupo do homem sentiu um frisson e a música retornou a taberna. O caolho cerrou o punho e um amigo aproximou-se.

   — Você é Willy, o Caolho! Não pode deixar esse mentecapto provocar-lhe de tal maneira. Tens uma reputação a zelar!

   Ao ouvir a devida informação, os lábios de Dário se alongaram em um sorriso debochado. Ele deu dois passos para passar por sua mesa.

   — Então... - introduziu com as mãos em direção ao outro. — Mais uma graça e você deixará de ser Willy, o Caolho. Passará a ser chamado de Willy, o Sem Olho. O que acha disso?

   — Ora! - retrucou. Ficou vermelho como um tomate. — Rir-se de tão respeitado homem seria uma imprudência. Um irresponsável, eu diria! Veja bem, pequeno gafanhoto. Falta-lhe uma espada! - respondeu ao apontar para o provocador.

   — Mas quem disse que preciso de uma para lhe arrancar um olho?

   Willy acusou o golpe. Ele desembainhou uma espada de lâmina curva e larga na extremidade livre. Era muito diferente das quais Dário tinha conhecimento.

   — Defenda-se ou terei de feri-lo aqui e agora.

   — Willy! Já disse para não arrumar mais balbúrdia em meu estabelecimento! - implorou a voz esganiçada de Moe, segurado por capangas desagradáveis.

    (Imagem meramente ilustrativa / Google)

   O desafeto de Dário o olhou com desdém. Deu-lhe as costas e caminhou em direção ao mais jovem. O bico da espada lhe apontava. Ao andar, Dário pensou rápido e arremessou sua caneca de bebida no homem, que desviou. Passou rasante por seu ombro direito e estourou na parede cheia de teias de aranha.

   Willy o atacou. Da direita para a esquerda. Dário agachou-se atrás de sua mesa novamente. O adversário se pôs a atravessar e o filho de Eustáquio foi ágil o suficiente para engatinhar e passar por trás do rixador. Deu-lhe um belo pontapé no traseiro, o jogando contra o banco. A taberna cacarejou em risadas longas. O choque fora muitíssimo cômico.

   — Ataque de frente! De frente! Como um homem! - resmungou ao virar-se.

   Com grandes passadas, o Caolho continuou insanamente. Dário desviou de forma providencial. Ele saltou acima de diversas mesas, chutando canecas e taças como se nada importasse. A sanfona do indivíduo de túnica continuava. Com muita postura, ele tocava sem exitar. Somado a algazarra de todos ali presentes, tínhamos uma trilha sonora.

   — Você não consegue me pegar?

   Seu pulo agora pelo balcão de Moe foi magistral. Ele é como um gato, teriam pensado. Willy sacolejava sua espada e não conseguia golpear seu inimigo. Dário percebeu que havia provocado um grande caos na taberna. Reparou também que os companheiros do fastidioso homem estavam com os nervos a flor da pele. Não lhe restava mais nada a não ser fugir com alguma dignidade.

   Os dois brutamontes largaram Moe e foram em sua direção. Dário respirou fundo e raciocinou. Roubou o prato de uma mesa próxima e o peixe frito que se tinha acima. Jogou o alimento no rosto de um deles e investiu o lenço que cobria a mesa contra o outro. Na continuidade da tragédia, o primeiro retomou ao limpar seu rosto do peixe que havia recebido. Retirou uma faca e contra atacou. Dário então usou o prato como escudo. Aproveitou a brecha para passar por entre as pernas do robusto encrenqueiro. Ainda restavam um e claro, o principal deles, Willy, o Caolho!  Então, se escondeu por entre os clientes. Um por um, foi caminhando a passos largos para escapar, até que Willy o encontrou atrás de um senhor rechonchudo. Ele sorriu sarcasticamente e saltou para trás. Caolho o perseguiu novamente. Ficaram cada um em uma ponta de uma mesa. Quando Willy corria para a esquerda, Dário fazia o caminho inverso. E vice-versa por longos minutos.

   — Se for um homem de verdade, lute! - ordenou Willy.

   — Estou sem uma espada, oh Willy, o grandíssimo Caolho! - gozou do oponente.

   — Mas disse-me que não precisava de uma para arrancar meu olho.

   Dário coçou a cabeça. Gracejou o sujeito.

   — É verdade, mas veja bem! - retrucou com um sorriso de canto de boca. — Eu não disse quando!

   Assim, chutou um dos bancos contra o vidro da janela que se tinha a direita. Saltou como um animal o quebrando por completo. A vidraça estilhaçou, pondo-se a fora.

   Correu como um louco pelas calçadas em direção a sua casa e rezando para que nenhum guarda o pegasse. Partindo como um desvairado, olhou para trás por um segundo e percebeu que havia causado uma grande desordem na taberna do velho Moe.

Oi, eu sou o Rogi! Neste capítulo o destaque é por conta do caçula Dário. Além de mostrar sua personalidade debochada e língua afiada, ele pagou por isso e agora conseguiu um desafeto! Se chegou até aqui, agradeço! Muitíssimo obrigado. Deixe seu voto e comente o que achou! Toda opinião é bem vinda. Tenha uma boa semana!

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