Capítulo XIX
A ideia da Ashley é a mais radical de todas: mudar minha aparência. Essa escolha, infelizmente, não cabia somente à mim porque os meus pais foram os responsáveis por ditarem a forma como eu me visto. Então, se eu quisesse mudar, precisaria da permissão deles e tenho quase certeza de que não aprovariam essa ideia.
Ashley continua me encarando em busca de uma resposta positiva enquanto me pego divagando por lembranças antigas.
Minha mãe sorria alegre tirando uma foto minha com o aparelho. Aquela coisa incomodava os meus dentes mas, segundo ela, ajudariam a manter o aspecto de "aluno exemplar". Meus olhos descem para a camisa socada dentro da calça e solto um longo suspiro, além de ter que aguentar a dor na boca ainda seria alvo de chacota tanto pela roupa quanto pelo gel no cabelo, dividindo-o ao meio.
— Eu não quero ser visto assim na escola, mãe.
— Ora. Por que não, meu querido?
Para mim, ir contra as ordens da família era quase impossível mas eu precisava expor minha humilde opinião.
— Eu tenho vergonha de aparecer assim.
— Não deveria, você será admirado entre os professores.
Faço uma careta de desagrado porque pouco me importa se os professores irão gostar de mim. Então, bagunço o cabelo em um sinal de protesto enquanto balanço a cabeça para afastar os fios presos.
— Não quero! Eu quero ser eu mesmo e usar as roupas que gosto!
Após um longo suspiro, minha mãe me puxa repentinamente pelo braço exercendo um pouco de força. Seus olhos pairam sobre mim e sinto um calafrio percorrer pelo corpo, pois é a primeira vez que a vejo irritada.
— Você vai se vestir assim e ponto final, Nicholas Carter!
— Mas...
— Sem "mas", você quer ser o orgulho da nossa família, não é?
Ela fica de joelhos para estar na mesma altura, segurando meu rosto com ambas as mãos. Eu faço o maior esforço possível para ignorar a dor no braço decorrente da forma agressiva à qual me apertou. Mesmo com os olhos marejados, aceno positivamente com a cabeça.
— Quero...
— Então, você precisa nos obedecer sem questionar. Tá bem? Nós só queremos o melhor para você.
Quando minha mãe me envolve em um abraço, aproveito para chorar baixinho em seu ombro. Em minha mente, vários questionamentos se formavam: Por que ela é tão rígida? Qual o problema de se vestir de forma diferente? Por que não podem me amar do jeito que eu sou? Porém, as dúvidas iriam permanecer mesmo que eu pensasse nelas pelo dia inteiro e, por isso, optei por deixar para lá.
Eu só precisava ser o filho perfeito para a família perfeita.
A mão de uma pessoa balança na frente do meu rosto, tirando-me dos meus pensamentos com um leve espasmo. Então, viro o rosto em direção à Ashley que me encarava como se eu tivesse acabado de sair de um ataque epilético.
— Você usa alguma droga, nerd? Porque isso não é normal.
— Claro que não! Eu só estava pensando no que você disse...
— E aí?
— Desculpa, mas eu não posso mudar a minha aparência.
— Por que não?
— Porque meus pais não aprovariam.
Interpreto o seu silêncio como uma concordância com suas palavras, pelo menos até ser alvo de um soco no ombro.
— Ai! Por que fez isso, Ashley?
— Porque você é um covarde. — dizia ficando de pé. — Enquanto viver na sombra da sua família, eu não posso fazer nada.
— Mas e o nosso acordo?
— Por mais irônico que pareça, ele depende mais de você do que de mim. Olha, estou caindo fora antes que eu o soque até quebrar meus dedos. Fique aqui e espere todos os professores do curso de Direito verem o cartaz para você tirá-lo. Tchau, idiota!
A Ashley sai como um furacão pelo corredor, mal dando-me tempo para explicar o porquê não posso aceitar uma mudança na aparência. Se bem que ela não entenderia mesmo que eu explicasse. Nós possuímos visões diferentes, fomos criados por famílias completamente opostas então é óbvio que chegaria um momento onde iríamos divergir nas opiniões.
Eu só não esperava que fosse tão rápido.
(...)
O dia inteiro a Ashley me evitou, até mesmo no refeitório enquanto sua amiga, Ariana, tentava se aproximar do Alan mas ele sempre a afastava. Como o esperado, demonstrando educação e escondendo o incômodo em um sorriso falso. Quando as duas garotas saem do nosso campo de visão, viro meu rosto em direção ao Alan com um semblante interrogativo. Ele ergue o olhar e fala com a boca cheia:
— O que foi? Está se apaixonando por mim?
— Nem se você fosse uma mulher em outra vida, Alan.
— E por que está me encarando?
— Quero saber o que aconteceu entre você e a Ariana.
— Ah, é isso? — engolia a comida e limpava o canto da boca com o guardanapo. — É mais fácil perguntar do que ficar com essa cara de stalker com diarreia.
— Stalker com o que?
— Eu tentei beijar a Ariana. — murmura olhando para o lado. — Mas ela me empurrou. Então, isso me fez abrir os olhos que eu fui um puta idiota e não desejo ser assim com uma pessoa tão especial quanto ela.
Eu nunca vi o Alan como um garoto superficial, diferente dos seus amigos do time. Antes de andarmos juntos, os outros jogadores faziam comentários maldosos sobre a minha pessoa e ele foi o único a me defender nesse momento. O Alan pode possuir vários defeitos mas nenhum ao ponto de se martirizar dessa forma.
— Peça desculpas, Alan. Se ela tentou falar com você, não deve tê-la magoado.
— Eu pedi desculpas depois de tentar beijá-la, mas agora prefiro manter distância para que esqueça de mim. — dizia apoiando os braços na mesa. — Se eu realmente, algum dia, magoar o coração da Ariana não irei me perdoar.
Normalmente, eu apoiaria o seu comentário porque sempre vi a Yale como um lugar de estudos e não de relacionamentos. Porém, ao observar de perto a interação do meu amigo com a jovem, não resta dúvidas de que ambos possuem sentimentos recíprocos. Além de que é visível a felicidade do Alan ao lado da Ariana, algo que me deixa feliz.
— Você é uma boa pessoa, Alan. Eu o conheço muito bem para ter certeza de que não a magoará.
— Eu não sei...
— Bem, se está receoso, o melhor a se fazer é tirar um tempo para pens-...
— Eu decidi sair com a Lisa.
— Oi?
— Ela me convidou para um jogo no sábado e eu acabei aceitando por impulso. Se eu tivesse conseguido um beijo da Ariana, teria certeza da reciprocidade dos meus sentimentos; mas agora não posso me iludir.
— Espera, espera! Como pôde aceitar sair com a Lisa? Ela não te magoou?
— Sim, mas você sabe como eu sou bobão, Nic. Eu perdoo muito fácil qualquer pessoa, principalmente quando ela erra sem querer.
Uma parte de mim duvidava muito do "sem querer" da Lisa em furar com o encontro naquele dia, mas se a Elizabeth a escolheu como amiga provavelmente deve ser uma boa pessoa. E todos merecemos uma segunda chance.
— Eu o entendo, mas está tudo bem para você sair com uma pessoa gostando de outra?
— Se eu me sentir desconfortável com a Lisa, voltarei para o dormitório o mais rápido possível.
— Pensei que fosse para casa esse final de semana.
— Não estou afim de ouvir cobranças do meu pai e o treinador quer fazer um treino intensivo no domingo.
— Como você tem sorte. — digo ironicamente.
— Eu estou achando que, na vida passada, desci a porrada em algum duende verde da Irlanda.
— O que?!
— E como castigo, todas as minhas reencarnações serão seguidas de azar.
Pego-me rindo com o seu comentário, feliz e aliviado ao ver que mesmo deprimido o Alan não perde o senso de humor.
— Devia ter descido a porrada no Duende Verde do Homem Aranha, Alan.
— E eu lá tenho força contra uma criatura daquelas? Aliás, o único inseto que me picou foi o pernilongo na noite passada. Ao invés de virar o Homem Aranha, serei o Garoto Febre Amarela.
E tenho mais uma crise de risos, desta vez sendo acompanhado pelo meu amigo. Para o Alan, não há tempo ruim; ele está em um constante processo de reinvenção pessoal dando o seu melhor para ser uma pessoa positiva a cada dia.
Os alunos começam a se movimentar em direção às salas, então precisamos interromper nossa conversa para seguir de volta para a aula. Uma parte de mim queria falar sobre a trapaça do Clark, mas é desnecessário preocupar o meu amigo com algo do tipo. O Alan não é o aluno mais inteligente, apesar de manter um padrão invejável de notas, e também faz pouco caso de batalhar por isso. Segundo a visão dele, cada um devia se preocupar unicamente em atingir seus próprios objetivos e parar de tentar atrapalhar os outros. Em partes, eu concordo com ele mas abrir mão do posto de melhor aluno é burrice para mim.
Alan possui outras qualidades, fora a aparência, então é normal não se preocupar com disputas de Q.I.
Porém, eu não passo de um nerd desajeitado que mal consegue se declarar para o seu amor de infância, mesmo quando as chances de perdê-la para um prepotente são altas. A minha única qualidade é a inteligência, por isso não tenho outra opção senão mantê-la durante meu curso na Yale.
O restante da aula foi um ótimo momento para colocar os meus pensamentos em dia. É admirável que a Ashley queira ir tão longe para me ajudar com minha insegurança, mas temo irritar os meus pais indo contra seus ensinamentos. Desde pequeno, fui ensinado a tomar as escolhas mais benéficas em nome da família Carter, mesmo que isso signifique abrir mão das minhas vontades. Eu queria me arrumar, deixar o cabelo solto e largar os óculos – que, na minha concepção, são desnecessários –, porém ir contra a vontade do meu pai seria terrível.
A mão do Alan sobre meu ombro tira-me dos pensamentos e foco em seu olhar preocupado.
— Está tudo bem, cara?
Nesse momento, percebo que a aula havia acabado e a maioria dos estudantes já saíam da sala. A Elizabeth era puxada por Lisa mas antes acena para mim, esboçando seu lindo sorriso tímido. Em resposta, aceno de volta sem jeito e, logo após, volto a encarar o meu amigo.
— O que você acharia se eu mudasse a minha aparência?
— Bem, isso é uma escolha sua. Eu não tenho que achar nada mas... — dava uma pausa pegando os livros e ficando de pé. — Se isso o fizer feliz, por mim tudo bem. Então, pretende mudar a aparência?
— Eu queria mas os meus pais... — digo o acompanhando para fora da sala. — Eles não aprovariam.
— Você já é grande o suficiente para decidir essas coisas, Nic.
— Eu sei, mas ainda vivo sobre a influência deles.
— Eu entendo como se sente. Você sabe que desejo muito fazer uma tatuagem mas, tanto meus pais quanto o treinador, não apoiam. Como odeio desagradar as pessoas que depositam sua fé e esforços em mim, desisti dessa ideia.
Lembro-me quando o Alan comentou eufórico, no início do primeiro período na Yale, como queria fazer uma tatuagem em homenagem ao seu cachorro. Porém, recebeu reprimendas de todos ao seu redor e resolveu guardar para si esse sonho. Naquela época, eu apoiei os pais dele mas agora me arrependo amargamente. Afinal, estou aprendendo que devemos ser livres para tomarmos nossas próprias escolhas.
— Desculpa, Alan... Naquela época, eu fui um péssimo amigo o impedindo de lutar pelo seu sonho...
— Não fique com essa cara de peixe morto, Nic. — dizia apoiando a mão em meu ombro com um largo sorriso. — Um dia, eu farei.
— Fará?
— Sim, mas no momento certo. E quanto a sua mudança, se é o que deseja, faça. Em relação aos seus pais, devo admitir que é difícil convencer o Enrico Carter.
— Quase impossível.
— Isso mesmo, mas a sua mãe é mais gentil e compreensiva. Por que não pede para ela?
No final, Alan deu um ótimo conselho. A minha mãe, Samantha Carter, é mais maleável do que o meu pai, apesar de ainda seguir as regras da família.
Após dar alguns tapinhas nas costas do meu amigo como agradecimento, corro em direção ao dormitório feminino torcendo para uma certa pessoa estar lá. Porém, acabo esbarrando com a Elizabeth e a ruiva cambaleia para trás. Por sorte, eu a seguro antes de cair trazendo-a contra o meu corpo. O rosto dela vai contra o meu peito e engulo seco pois, dessa forma, Elizabeth poderá ouvir as batidas aceleradas do meu coração. Ao erguer o olhar para fitar minhas orbes, sinto o rosto esquentar mais ainda e faço o maior esforço possível para não desviar o olhar para o lado.
— Desculpa, eu...
— Tudo bem. — ela sorria gentilmente e meu coração falha nas batidas. — Você está melhor?
— Estou sim, obrigado.
Lentamente, eu abro os braços para a ruiva se afastar mas ela demora alguns segundos para sair da sua posição. O seu rosto corado dava maior ênfase às belas sardas nas bochechas e o cabelo levemente bagunçado tirava o meu fôlego. Nessa breve troca de olhares, eu poderia jurar que seria reconhecido mas uma mão surgiu no ombro dela, puxando-a para perto do rapaz. Quando percebo se tratar do Clark, escondo o semblante de bobo apaixonado antes de ser motivo de chacota.
— Nem vi que estava aí, Carter. — debochava envolvendo o braço por cima dos ombros da jovem. — Elizabeth, espero que não tenha esquecido dos estudos hoje.
— Er...
Elizabeth encara-me com um olhar difícil de definir, um misto de receio e confusão. Porém, eu sorrio de forma desajeitada para disfarçar a tristeza em meu âmago. No final das contas, não importa o quanto eu me esforce, o Clark sempre estará um passo à frente. Como posso mostrar o meu amor por ela quando não consigo amar nem mesmo quem vejo diante do espelho, todos os dias? É impossível. A confiança do Clark cegou-me de uma maneira desconfortável, mas necessária pois percebi a grande diferença entre nós dois. Mesmo Elizabeth não notando, eu sabia como ele estava conquistando um espaço em sua vida a cada atitude.
— Tudo bem, Elizabeth. Eu estarei ocupado esses dias.
— Tem certeza? Eu posso mudar o horário para a gent-...
— Não se preocupe.
— Já eu tenho todo o tempo disponível para você. — Clark dizia animado. — Por sinal, o que acha de sairmos esse final de semana?
Não queria ouvir a resposta dela, por isso saí dali o mais rápido possível com o olhar cabisbaixo. Em outras circunstâncias, eu iria desistir mas tenho certeza que irei apanhar da Ashley se jogar todo o esforço dela em vão. Por isso, irei seguirei a sua dica quando obtiver a aprovação da minha mãe.
Quando chego no dormitório, a pessoa a abrir a porta é Ariana, a sua melhor amiga.
— A Ashley está?
— Sim, mas ela não quer falar com você.
— Por que?
— Espere um pouco. — pedia educadamente fechando a porta e segundos depois surgia. — Ela disse que você é um idiota por não seguir os conselhos dela.
— Diga à Ashley que mudei de ideia, quero seguir o seu conselho.
— Então, espere um pouco. — e mais uma vez, a mulher fechava a porta e só a abria quando obtinha a resposta da amiga. — Ela disse que não confia em você.
— Diga à ela que eu estou determinado, é diferente.
— Olha, eu não quero ser pombo correio. — Ariana choramingava. — Por que vocês não conver-...
— Nicholas! — exclama Ashley surgindo na porta. — Como você quer que eu acredite em você depois de desviar de todos os meus conselhos? Sinceramente, você é um mimado que vive debaixo da saia dos pais e, desse jeito, nunca terá a ruivinha.
Pelo visto, hoje é o dia de destruir mais ainda a minha autoestima. Após desviar o olhar para baixo, coloco as mãos dentro dos bolsos da calça enquanto aceno positivamente com a cabeça.
— Você está certa...
— Oi? Eu ouvi direito?
— Eu não passo de um covarde mimado que vive na sombra da família, por isso nunca adquiri confiança em mim mesmo para buscar o que desejo. No começo, causar orgulho para o meu pai era tudo que importava e eu não poderia me sentir mais feliz. Mas, após te conhecer, estou aprendendo a dar valor à quem eu sou e não à qual família pertenço. Eu não quero ser conhecido como "o filho de Enrico Carter", eu quero ser o Nicholas... Só isso. — digo ainda olhando para meus próprios pés, sentindo um nervosismo interno depois de desabafar tudo que havia em meu peito. — Eu quero criar a minha identidade... Mesmo que isso signifique confrontar os meus pais...
O longo silêncio deixou-me confuso, porque não sabia se era um sinal bom ou ruim. Ao ouvir alguém bater palmas, ergo o olhar em direção à Ariana que estava boquiaberta igualmente a sua amiga, Ashley. As duas se entreolham ainda incrédulas e a morena se aproxima. Nesse momento, dou três passos para trás temendo alguma bronca. Porém, sou alvo de um soco fraco no peito vindo dela.
— Ai! Por que fez isso?
— Eu estou orgulhosa de você, Nicholas.
Tudo bem que é uma simples frase, mas para mim causou grande impacto. Em toda a minha vida, eu nunca ouvi alguém dizer que sentiu orgulho de mim – mesmo com todo o esforço para ser o filho perfeito – e vindo da Ashley deve ser algum sinal do apocalipse. De qualquer forma, a alegria fez-se presente em meu semblante e não pude controlar o impulso, abraçando-a repentinamente. Eu sei que é errado mas não me importo, estou feliz demais para temer uma surra vinda da morena.
Contudo, para a minha surpresa, ela retribuiu o abraço afagando minhas costas e eu a aperto mais ainda, sem entender o porquê seus braços trazem uma sensação tão boa.
— Você está indo bem, Nicholas... Eu irei ajudá-lo a mudar a aparência.
— Quanto a isso... — interrompo o abraço para me afastar. — Tenho que fazer algo antes.
— O que?
— Falar com a minha mãe sobre essa decisão.
Ela arqueia a sobrancelha apoiando as mãos na cintura.
— Isso é alguma desculpa para fugir do que acabou de dizer, nerd? Porque se for, eu vou te quebrar até...
— Não, não! Eu estou realmente decidido, mas não quero mudar radicalmente sem avisá-la.
— Tudo bem. — dizia revirando os olhos. — Pode falar para ela.
— Eu falarei esse final de semana.
— Ótimo.
— Mas tem um probleminha...
— Qual?
— Eu não tenho tanta coragem para enfrentá-la sozinho, então tenho um favor para te pedir...
— Pode pedir.
— Poderia me acompanhar até minha casa esse final de semana?
— O que?!
— É que você é a melhor pessoa para isso, tenho certeza que ela te ouvirá.
Pela expressão da Ashley, só há uma frase possível para sair de seus lábios vermelhos:
— Puta que pariu!
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro