Capítulo 18 - Ovos nem tão podres
— Você não vai me dizer de quem é o carro?
— Não.
— Acho que não devemos fazer isso...
— Por que?
— Primeiro, você está com o seu bebê no colo...
— Fica tranquilo, nós não vamos precisar correr nem nada do tipo.
— E se a polícia nos ver?
— Larga de ser medroso, homem!
— Tem certeza que quer deixar o seu filho te ver fazendo isso?
— Qual é o problema?
— Pode afetar a educação...
— Você acha que ele vai sair atirando ovos por aí? Fica tranquilo!
Estávamos dentro do carro (a Millenium Falcon), estacionado em frente a casa de Lucas, conversando apressadamente enquanto o pequeno Ícaro nos observava do banco traseiro. Da onde estávamos dava para enxergar o carro luxuoso que minha mãe deu de presente para aquele traste. Parecia recém lustrado, o que é ótimo, considerando o que planejávamos fazer.
Bob disse que nunca fez uma loucura na adolescência e que gostaria de mudar isso. Por isso, sugeri que atirássemos ovos podres no carro do traste, apenas não contei quem era a vítima. Não queria ter que explicar a história inteira que é longa demais.
Passamos no supermercado e compramos duas cartelas.
— Quanto tempo acha que demora para estragar? — Falei enquanto passávamos pelo caixa.
— Mais ou menos doze horas — Bob respondeu com absoluta certeza, como se fosse um especialista em ovos.
— Sério? Que droga! — Suspirei. — Não podemos esperar tudo isso. Vamos jogar esses ovos nem tão podres!
O guiei pelo caminho certo e paramos na rua certa onde discutimos sobre o que estávamos prestes a fazer.
— Droga, se o pessoal que trabalha comigo souber o que estou fazendo nunca mais serei respeitado! — Ele disse.
— Bobagem! — Retruquei. — É capaz de eles te respeitarem ainda mais!
— Ainda assim não tenho certeza, Jéssica...
— Bob, me escuta — curvei-me na sua direção me esforçando para ser persuasiva. — As loucuras são chamadas de loucura porque não fazem sentido. Se você está esperando uma loucura racional e segura, vai acabar não fazendo loucura alguma. É agora ou nada.
No mesmo segundo já percebi que o ganhei.
— Vamos nessa! — Respondeu num momento súbito de coragem.
Ficamos em pé do outro lado da rua, de frente para o carro que logo estaria mais sujo do que rua em fim de feira.
— Ok, eu costumava fazer isso com as pessoas que odiava o tempo todo — falei. — O segredo é mirar um pouco mais acima de onde quer acerta, o ovo vai fazer um arco e cair em cheio. Você primeiro!
— Um pouco mais acima? Acho que consigo...
Bob estava visivelmente nervoso. Olhou em volta para ter certeza de que ninguém estava olhando e jogou o ovo rapidamente, quase sem mirar. Errou feio.
— Nossa, você é horrível!
— Desculpa se não tenho experiência nessa nobre arte.
— Deixa eu te mostrar como se faz, segura o seu melhor amigo aí — passei Ícaro para os seus braços e mirei como fazia antigamente.
Joguei e também errei.
— Droga! — Exclamei. — Vou precisar de tempo para tomar jeito novamente!
Peguei Ícaro de volta e observei enquanto Bob mirava com um pouco mais de cuidado do que antes.
Ele lançou e dessa vez acertou com tudo no parabrisa.
— Boa, rapaz! Sabia que você tinha talento!
Ele deu risadas e foi tomado por um entusiasmo:
— Você viu isso?
— Oh se vi, você é quase um jogador de beisebol.
— Vou tentar de novo.
Ele jogou mais um ovo que acertou em cheio, espalhando a gema amarela por cima do preto lustrado do veículo. Ele gargalhou e parece que até o Ícaro estava vibrando com a vitória enquanto batia palminhas.
Deixamos a formalidade de lado e passamos a jogar os ovos um atrás do outro, sem esperar para ver quem acertava ou não. Não só o carro ficou imundo, como toda a calçada da casa também e até os seus muros.
Estávamos rindo muito. A minha alma foi lavada.
A porta se abriu e Lucas saiu da casa, completamente assustado com a zorra que estávamos fazendo. Ele só soube olhar para nós três (e uma caixa de ovos) e exclamar:
— JÉSSICA?
Bob também se surpreendeu:
— Este é o Lucas da escola? Estamos jogando ovos no carro do pai do seu filho?
— É isso mesmo!
— Ele nos pegou. O que fazemos agora?
— Isso.
Ergui os meus dois dedos do meio para Lucas. Bob não fez o mesmo, mas riu muito enquanto voltava para o carro.
— Que infantilidade é essa, Jéssica? — Lucas perguntou, olhando para o carro desolado.
— Eu volto para conversar direito com você outro dia — respondi. — E você não vai gostar nada. E vê se limpa esse carro direito quando for devolver para mim.
Entrei na Millenium Falcon e partimos.
— Claramente existe uma história aqui — Bob disse.
— Sim — respondi. — Mas não quero falar sobre isso.
— Por mim tudo bem.
Bob parou na porta da minha casa e me ajudou a tirar meu filho da cadeirinha:
— Eu me diverti muito — ele disse. — Mais do que teria imaginado.
— Também adorei. Obrigada pelo convite.
Passamos alguns segundos nos encarando, frente a frente. Ele tinha leves olheiras e eu não havia notado até então.
— Podemos repetir isso qualquer dia — falei.
— Sim, mas acho que seria inapropriado — ele respondeu.
— Como assim?
— Você está contratada.
***
Nota do autor
Eu adoro escrever em qualquer lugar. Mesmo que a minha casa seja o lugar preferido, gosto de sentar em bibliotecas, padarias, livrarias e outros lugares movimentados para deixar a imagem fluir. Este capítulo, por exemplo, foi escrito no sofá de um banheiro de shopping (sério, tem um sofazão no banheiro de um shopping chique daqui de São Paulo). A principal razão era por ser o único lugar do shopping com tomada para carregar meu notebook. Mas eu até que gostei. ;D
Outro lugar em que adoro escrever é no nosso grupo no facebook. Se você ainda não faz parte dele, deveria. É só procurar por "leitores Sali" na busca do facebook.
Até o próximo capítulo!
Felipe Sali
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