Hospital
Eu não estava morta. Isso já era um grande começo, mas eu me sentia exausta e ainda não estava totalmente acordada, mais alguns minutos e eu começava a ter a consciência de volta para o meu corpo, e ouvir um beep irritante no meu ouvido repetitivo. Abri os olhos bruscamente me arrependendo sendo quase cegada pela luz forte do lugar, tentei abrir novamente os olhos dessa vez com mais cautela, aos poucos consegui ficar de olhos abertos sem eles doerem, mas eu ainda estava meio desorientada.
Era um quarto com certeza e a julgar pelas cores, minha roupa e todos os fios ligados a mim, era um hospital. Tentei me ajeitar na cama para observar melhor o lugar e senti o peso inusitado em meu tornozelo, até metade da canela tinha um gesso branco grosseiro e pesado e somente meus dedos para fora, levei minha mão até a testa lembrando a quantidade de sangue e encontrei minha testa coberta por uma faixa macia. Em um sofá em frente à cama um garoto dormia tranquilamente, forcei meus olhos para focalizarem e vi que era o Calum ali, encolhido em uma manta curta que não chegava a cobrir todo o seu corpo, ele parecia estar em um sono tranquilo, era inacreditável como ele conseguia ser o anjo e o diabo.
- Você acordou. – Ouvi a voz sonolenta do meu pai, Zayn sentado e uma poltrona com um copo de café e um livro na mão, parecendo bem cansado. Ainda me ajeitando a todo aquele ambiente eu tinha uma careta confusa desviando o olhar dele para o garoto deitado. – Ele não quis ir embora, estava preocupado.
Zayn falou novamente, deixando o livro de lado vindo até o meu lado, eu tinha conseguido sentar depois de algumas tentativas, encostei a cabeça no encosto e respirei fundo fechando os olhos e os abrindo em seguida.
- Você pode me dar um pouco de água?- Perguntei com um fio de voz e a garganta arranhando. Ele pegou a garrafa e despejou o conteúdo transparente em um copo de plástico branco e me entregou, bebi tudo sentindo aliviada quando o liquido fresco descia pela minha garganta.
- Você adora nos assustar! – Zayn falou me dando um abraço apertado, quase arrancando os fios.
- Essa é minha especialidade. – Falei retribuindo o abraço igualmente apertado inalando seu perfume que sempre me acalmava quando criança me fazia sentir em casa. –O que aconteceu?
Falei gesticulando para meu tornozelo, depois que nos soltamos do abraço.
- Você rompeu um ligamento. – Ele falou com uma careta, mas logo continuou vendo minha careta de horror. - Mas não há nada que se preocupar, algumas sessões de fisio e você vai ficar bem.
- E a cabeça? – Perguntei apontando para minha testa enfaixada.
- Uma concussão que resultou em um corte profundo e de tamanho médio e você perdeu muito sangue por causa dele, por isso desmaiou novamente.
- Então, estava mesmo feia a coisa. – Murmurei olhando Calum respirar profundamente no sofá, ele parecia bem desconfortável, totalmente desproporcional para o tamanho do sofá.
- Eu vou chamar o Liam, se comporte. – Ele falou dando um beijo em minha testa e voltando para o sofá onde tinha deixado o celular, o pegou e saiu do quarto.
Só ouvi as respirações presentes no quarto e o barulho da maquina monitorando meu coração, depois que a porta foi fechada. Poucos minutos haviam se passado e eu estava muito entediada, esperando o Calum acordar o olhando intensamente, ele era a coisa mais fofa dormindo, até que aos poucos ele foi abrindo os olhos e se situando ao ambiente e arregalou os olhos quando me viu.
- Olá, Bela Adormecida! – Falei rindo de leve o assistindo sentar fazendo uma careta passando a mão em seu pescoço que doía.
- Deus! – Ele murmurou levantando e parando se espreguiçando e só então percebi que ele ainda estava sem camisa e tinha tatuagens em seu peito e um físico...muito...er..bom.
- Gostando da vista?- Ele perguntou com um sorriso malandrando moldando seus lábios, e seu jeito de convencido. Preferi não responder a sua provocação, já que nada que eu falasse mudaria o fato que eu tinha gostado do que tinha visto, mas isso nunca seria admitido em voz alta. Vendo que eu não responderia ele riu fraco e caminhou até minha cama sentando no pé dela.
Seu cabelo estava todo desgrenhado, e ele o bagunçava mais ainda passando as mãos por ele e no rosto como se isso fosse tirar todo o resquício de sono ainda presente nele.
- Você mentiu pra mim.
Ele pareceu surpreso por alguns segundos com a minha acusação tão repentina, mas logo relaxou o rosto quando percebeu do que eu falava.
- Foi para o seu bem, você já é paranoica normalmente, com um corte que cabe meu dedo eu não sei muito bem como seria sua reação. – Ele falou.
- Cabe um dedo? – Perguntei de olhos arregalados, e a maquina ao meu lado apitando. Os olhos do garoto a minha frente se arregalaram e ele balançou a cabeça negando e fazendo gestos.
- Não, não cabe um dedo, é só modo de falar! – Calum disse ainda de olhos arregalados, e resolvi acreditar no que ele disse.
- Hm, obrigada por ter cuidado de mim! – Falei baixinho, de repente o lençol branco tinha ficado muito interessante.
- Não tem o porquê me agradecer. – Ele disse, me fazendo o olhar.
- Na verdade tem sim, você me odeia, deve ter–
- Uou, uou, pera aí, da onde você tirou isso? – Ele me cortou no meio da frase e tinha uma careta até meio irritada misturada com surpresa.
- A parte de odiar? – Perguntei cautelosa observando sua reação, que não mudou ele só acrescentou um aceno de cabeça. – Eu pensei que você me odiasse.
Falei dando de ombros. Ele soltou uma lufada de ar inconformado.
- Eu nunca disse que te odiava. – Ele falou. – Ódio é uma palavra muito forte.
- Amor também, mas as pessoas falam como se não significasse nada.
Vi um sorrisinho surgir em seu rosto.
- Acabamos de citar Peter Pan? – Ele perguntou rindo de leve. Dei de ombros sorrindo. – Para registrar, eu não te odeio, não sei se conseguiria.
- Eu sei, como alguém conseguiria me odiar? Que loucura. – Falei de um jeito convencido que o fez rir.
- E você não me odeia? – Ele perguntou meio hesitante.
- Não. – Respondi. – Apesar de você conseguir ser um pé no saco e convencido demais.
Ele deu de ombros, como se não pudesse fazer nada sobre isso. E eu lhe dei um tapa no braço. Meus pais logo em seguida entraram no quarto os dois com copos de café em mãos, e o Liam segurava uma mochila.
- A esse ponto já descobrimos que nem eu nem seu pai somos cardíacos, o que é muito bom. – Liam falou se aproximando da cama e me abraçando me dando um beijo na testa.
- E estamos pensando na ideia de fazer um seguro de vida pra você, o que acha? – Zayn falou e o Calum caiu na risada com a minha cara de incredulidade.
- Bom tecnicamente é pra vocês porque eu vou estar morta e vocês vão receber o dinheiro.
- Eu não ia ficar nada triste se me colocasse como um dos beneficiados se ela morrer. – Calum falou como quem não quer nada.
- Nós podemos pensar. – Zayn falou.
- Ok chega desse assunto, vaso ruim não quebra fácil só para avisa-los. – Falei me ajeitando na cama ficando agoniada com aqueles fios. – Quando eu posso sair daqui?
- Essa noite, como você bateu a cabeça precisa ficar em observação. – Liam respondeu. – E isso aqui é seu, sua mãe deixou isso como você não queria sair daqui.
Ok, eu posso admitir isso para mim mesma pelo menos, certo? Certo. Eu nem acreditava que o Calum havia mesmo ficado e dormindo no sofá pequeno demais para o seu tamanho. Ele agradeceu e pegou a mochila indo para o banheiro conectado ao quarto e eu bufei, com o tédio começando a se acomodar.
- Que horas são? – Perguntei me mexendo de novo na cama, a cada cinco minutos eu fazia isso, era muito desconfortável e eu tinha medo de mexer demais o braço por causa da agulha, então eu parecia um robô.
- Duas da tarde. – Zayn respondeu olhando para seu relógio dourado em seu pulso direito. Eu grunhi me jogando para trás dando de encontro com o travesseiro. O Calum saiu do banheiro com uma calça de moletom e uma camisa branca.
- Porque ela ta grunhindo? – Calum perguntou olhando dos meus pais, sentados perto da janela com livros na mão, para mim.
- Tédio. – Eles responderam sem ao menos lançar um olhar para nós dois.
- Em falar em tédio, quem ganhou? – Perguntei, atraindo a atenção deles.
- Ninguém, ainda está acontecendo. – Liam respondeu.
- Meu aniversario de nove anos. – Falei baixinho fazendo com que só o Calum ouvisse e desse uma risada curta revirando os olhos.
- Isso não é seu aniversario de 9 anos. – Ele falou já cansado. E eu dei de ombros não ligando para o que ele disse.
Peguei o controle da tv e fiquei a procura de algo bom que atraísse minha atenção e a do Calum, e acabamos achando por mera coincidência Peter Pan e começamos a assistir, estava no comecinho e a gente ria de algumas coisas. Dei espaço pra ele sentar mais confortável na cama já que o sofá não tinha sido muito bom pra ele.
Durante o filme uma enfermeira entrou pra me medicar e checar se tudo estava bem e logo deixou o quarto, devo ter dormindo no meio do filme, quando acordei o Calum não estava mais no quarto, só o Liam estava no quarto lendo um livro, já estava escuro, mas eu tinha perdido a noção do tempo. E eu não pude deixar de sentir a falta do Calum, mesmo que fosse pouquíssima, a companhia dele era boa.
- Que horas são? – Perguntei, minha voz saindo mais rouca do que o esperado, o remédio havia me drogado. Liam levantou a cabeça e me lançando um sorriso.
- Sete horas da noite. – Ele respondeu depois de olhar para o relógio de pulso.
- O Calum foi embora? – Perguntei, e eu não fazia ideia do porque minha voz havia saído meio decepcionada e esperava que meu pai não tivesse reparado também.
- Sim, seu pai foi pra casa e aproveitou pra deixar o Calum na dele. – Ele respondeu.
- Agora você vai me aturar com tédio. – Falei sorrindo maldosa.
- É por isso que te trouxe livros. – Ele respondeu malandro se levantando junto de uma pequena pilha, que continha uns cinco livros, no braço.
- Eu não estava esperando isso. – Murmurei enquanto pegava os livros e o Liam ria. Entre a pequena pilha peguei um dos livros que eu ainda não havia lido, Shiver, era sobre uma garota que havia se apaixonado por um lobo, quando procurei a sinopse me apaixonei, mas eu sempre fui impulsiva com livros e saia comprando vários e no fim era difícil arrumar tempo pra ler todos.
Logo chegaram com a comida sem graça de hospital que eu não gostava, mas era o que tinha para comer e me medicaram novamente por causa do remédio, e isso me fez ter uma enorme sonolência, que eu nem vi o Zayn chegar e só fui acordar na manhã seguinte. Graças a Deus eu tinha recebido alta e iria tirar os pontos da minha testa daqui uma semana, e já o meu pé eu ficaria usando bota e muletas, maravilhoso, yay.
Para chegar até o carro fui em uma cadeira de rodas, já do carro para casa eu usei as muletas que no começo eu achei bem divertido até meus braços começarem a doer, eu tinha que subir as escadas apoiada no corrimão, e descer sentada, nada que eu não conseguisse me acostumar.
Todo mundo voltava hoje do acampamento, as meninas ligaram enquanto estavam no ônibus eles queriam passar em casa, mas estavam muito cansados, então só nos veríamos amanhã na escola, eles pareciam muito cansados enquanto falavam, um silencio descomunal ao fundo, eu me perguntava o que meus pais haviam feito. O resto do dia eu passei vendo series, filmes e lendo, tentando não ficar entediada e com a bunda doendo de tanto ficar sentada.
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