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Lampejo

Cosima chegou em casa apressada, batendo a porta atrás de si. Deixou os livros de qualquer jeito na mesa de centro, retirou seu casaco e foi à toda velocidade para o quarto. Assim que atravessou a porta do dormitório, começou a procurar desesperadamente pelo carregador do celular.

Droga! Eu preciso urgentemente aprender a ser uma pessoa organizada!

Devido a agitação repentina, logo Felix apareceu para descobrir o que estava acontecendo.

– Que que é isso? O mundo tá acabando e eu não fui avisado?

– Felix! Que bom que você está em casa! – falou enquanto fuçava as gavetas do móvel ao lado da cama. – Preciso da sua ajuda.

– Aí meu Deus Cosima... – ele disse passando as mãos nas têmporas. – O que foi dessa vez?

– Ah, finalmente! ­– ela disse quando enfim conseguiu encontrar o bendito fio que tanto procurava. – Digamos que em um impulso acabei chamando a Delphine para sair.

– Delphine? – a essa altura ela já estava tentando fazer com que o celular voltasse a vida, o conectando na tomada. – Ah! Aquela loira; a francesa que você conheceu na faculdade outro dia?

– Essa mesma.

– Isso é ótimo. Finalmente tomou atitude...

– Tá bom, nem precisa começar – assim que o aparelho ligou ela pode notar que já tinha uma mensagem não lida de um remetente desconhecido. Ao abrir para leitura, descobriu que já era a mensagem que havia solicitado para Delphine. Não passava de uma sequência se emojis, mas aquilo já foi suficiente para trazer o sorriso de volta ao seu rosto. Respondeu algo na mesma linha e voltou sua atenção para a conversa que estava tendo com o amigo. – O problema, é que eu não tenho a mínima ideia de onde deveria levá-la. Tipo, a gente tá no meio do inverno! Minhas opções estão muito restritas e eu não queria fazer nada muito clichê, tipo, simplesmente ir no cinema ou jantar em um restaurante qualquer!

– Calma, desse jeito você vai acabar infartando antes de ir a qualquer lugar – ele se aproximou e puxou ela pelas mãos. – Vamos lá. Você toma um banho enquanto a gente pensa em alguma coisa.

– Tá bom, boa ideia.

No mesmo momento ela entrou no banheiro e começou a tirar a roupa, sendo seguida por Felix, que ficou encostado no batente da porta.

– Vamos começar do começo – ele disse. – O que vocês combinaram até agora?

– Nada exatamente – disse Cosima já ligando o chuveiro. – Ela meio que disse que estava se sentindo solitária para conhecer a cidade, aí eu chamei ela pra sair. Disse que ia pensar em algum lugar legal pra gente ir e avisava depois.

– Ok. E o que ela já conheceu de Toronto?

– Não muito, pelo que me falou. Parece que só foi na CN Tower e deu uma volta no Path.

– Ótimo, então o primeiro item da minha lista já está descartado... Você tem ideia do tipo de coisa que ela gosta?

– Nenhuma. Você sabe tudo o que eu sei sobre ela.

– Certo. Médica francesa... – ele parou pensativo. – Deve ser uma mulher culta. Porque você não leva ela no teatro? A temporada de musicais já começou. A Alison está empolgadíssima com isso inclusive...

– A ideia não é ruim Felix, mas eu tô quebrada. Pelo menos até receber meu pagamento domingo, não posso me dar a esse tipo de luxo.

– Tem razão, tinha me esquecido desse detalhe. Pobre é foda viu...

– E se a gente fosse pra pista de patinação? – ela sugeriu.

– Você realmente acha que isso é uma boa ideia?

– Por que não? É algo bem tradicional ir patinar no inverno. Inclusive, faz muito tempo que eu não vou, já estou até sentindo falta.

– Esse é o problema querida. Sua coordenação motora já é altamente questionável, e ainda sem prática, o mais provável é que você termine no pronto socorro.

– Ei! – ela disse colocando a cabeça para fora do box para encará-lo. – Eu patino muito bem e você sabe disso!

– Uhum – ele disse irônico. – Se você considerar que ir parar na emergência ortopédica com o braço quebrado é patinar muito bem...

– Isso já faz muitos anos – ela falou voltando para debaixo do chuveiro. – Minhas habilidades com os patins melhoram bastante desde então...

– De qualquer forma, você não vai querer correr o risco. Além de que algo que podem te fazer passar vergonha pode ser bem anticlimático para um primeiro encontro.

Cosima fez uma pausa para pensar melhor no assunto.

– É, você está certo. Tô vendo que o melhor vai ser acabar indo pra um pub mesmo... – Ela fez uma pausa pensativa. – Quem sabe o bar da Bob? Hoje vai ter apresentação não vai?

– Ah, vai sim – ele respondeu. – Os Goblins de Merda.

– Droga – Cosima falou começando a ficar realmente nervosa.

– Calma, nós ainda temos algumas opções – ela fechou o registro do chuveiro e começou a se enxugar. ­– O Toronto Light Fest já está rolando. O clima é bem acolhedor e vai dar bastante abertura pra vocês conversarem. E não deixa de ser um programa de turista interessante pra ela.

– Taí, gostei. E tem vários restaurantes lá por perto onde a gente pode jantar depois.

Nesse momento, o som de uma notificação de mensagem soou do celular dela vindo lá no quarto. Felix se adiantou e pegou o aparelho enquanto ela ainda deslizava para dentro do robe.

– Olha só! – ele disse dando um sorriso irônico. – Não é que a moça está realmente carente?

– O quê? – ela perguntou procurando pelos óculos. – É ela?

Cosima voltou para o quarto, mas a essa altura o amigo já estava digitando alguma coisa em seu celular

– Espera, o que você está fazendo? – ela tentou recuperar o aparelho, mas ele protegeu com o corpo, tornado impossível para ela alcançá-lo. – Felix, nem pense nisso!

– Não pensei, amor – falou rindo e finalmente entregando o telefone a ela. – Já fiz!

– Mas que merda Felix! – ela disse empurrando o braço dele.

– Não precisa me agradecer.

Ela leu o que ele tinha enviado. Certamente não era a postura que ela pretendia adotar de início, mas como Delphine parecia não ter se intimidado, Cosima deu prosseguimento a conversa.

– Vai precisar da minha ajuda pra se vestir? – ele perguntou.

– Acho que não, dou um jeito nisso sozinha – Cosima respondeu ainda atenta a tela.

– Tá bom. Então é a minha vez de ir tomar um banho – ele disse se encaminhando para saída do quarto. – Assim como a senhorita, eu também tenho um encontro essa noite.

– Ainda é com aquele carinha? O legista?

– Ele mesmo.

– Felix Dawkins investindo em alguém... Tô te desconhecendo – Cosima disse com os olhos ainda grudados na tela. – Será que esse moço vai conseguir fazer você tomar jeito?

– Ha-ha-ha – ele fez de forma irônica. – Se precisar de mim pode me chamar.

Assim que ele saiu do quarto e ela parou de trocar mensagens com Delphine, Cosima parou de frente para o armário e começou a tirar peças de roupa de lá de dentro e experimentá-las.

Aquela semana, apesar de ter ficado pouco tempo na faculdade, tinha sido muito intensa no quesito estudos. Fazer o roteiro de pesquisa que o Dr. Leekie havia solicitado acabou sendo mais trabalhoso do que ela esperava. Mesmo indo até a biblioteca em breves ocasiões, para fazer empréstimos pontuais, ela ficou atenta a todas as oportunidades que tinha de encontrar a moça francesa. Mas foi só naquela sexta-feira que conseguiu encontrá-la novamente.

Sua reação excessivamente ansiosa e desajeitada em seu primeiro contato com Delphine a irritou bastante depois que ela parou para pensar sobre aquilo, afinal de contas, ela não era mais uma adolescente. Por conta disso, quando a reencontrou mais cedo naquele dia, decidiu adotar uma atitude mais confiante. Ela até pensou em chamá-la para a festa de domingo, mas já que surgiu uma brecha, por que não adiantar esse encontro em dois dias? Até por que não sabia se aquele tipo de evento fazia muito o estilo de Delphine.

O fato é que, de volta em casa, sozinha – ou quase – permitiu que o nervosismo se apoderasse dela novamente. Nem era tão ruim assim, vai. Aquele friozinho na barriga sem dúvida era uma das melhores partes de se estar flertando com alguém.

Espera, eu já posso chamar isso de flerte?

Ela sem dúvidas estava interessada na mulher de cabelos dourados, mas será que isso era recíproco? Sem dúvidas ela teve uma conduta ambígua em alguns momentos, que poderiam ser entendidos como 'algo a mais', mas, por outro lado, Cosima não podia deixar de levar em conta que havia uma diferença cultural entre elas, o que facilmente poderia fazer com que ela interpretasse as coisas de uma forma equivocada.

Voltando para o presente, seu guarda-roupas já estava começando a ficar vazio à medida que o monte de roupas em sua cama só fazia aumentar. Ela trocava de roupa repetidamente, mas nada parecia ser de seu agrado. Algum tempo depois, Felix voltou a entrar no quarto.

– Tá brincando comigo? Sério que você ainda não está pronta? – ela fingiu não ligar para o comentário dele. – Que horas você marcou com ela?

– Oito horas.

– Oito horas?? Então sugiro que você se apresse, querida – ele disse mostrando a tela de seu próprio celular. Faltavamos apenas dez minutos para o horário marcado.

– Merda!

De fato, não tinha mais como enrolar, precisava escolher algo para vestir imediatamente. Tirou uma calça de veludo marrom da pilha de roupas e tratou de vesti-la.

– Onde vocês vão se encontrar? – ele perguntou.

– Eu pedi pra ela passar aqui – respondeu enquanto tentava se decidir entre uma blusa em padrões geométricos ou de estampa floral – O que você acha? ­– perguntou a ele segurando uma peça em cada mão.

– Eu deixaria flores para outro momento.

– Certo. Por acaso você está vendo aquele meu coturno de salto alto?

Felix a ajudou a encontrar o par de sapatos e quando ela estava começando a amarrar o cadarço do primeiro pé, ambos puderam ouvir alguém batendo na porta.

– Pode de deixar que eu atendo – ele disse saindo do quarto.

Cosima pode ouvir a porta de entrada ser aberta, mas isso foi tudo.

– FELIX?

Ela ficou sem respirar durante os segundos que ele demorou para responder.

– É a Delphine! – Cosima escutou em resposta.

Ela tinha acabado de arrumar os dreads em um coque e estava em frente ao espelho com o delineador em mãos, quando o rapaz retornou.

– Não senhora – falou tirando o pincel da mão dela. – Deixa que eu faço isso.

Com os olhos devidamente delineados, ela já estava pegando a bolsa pronta para sair do quarto quando ele a chamou de volta.

– Onde você vai? – ele perguntou segurando uma carteira em uma mão enquanto a outra ficou apoiada na cintura. – Não está se esquecendo de nada?

– Fee... – Cosima disse se reaproximando dele. – O que seria de mim sem você?

– Provavelmente iria passar mais um vexame essa noite – ele falou e entregou a carteira para ela. – Agora vai – disse abrindo um sorriso de maroto. – Tem uma deusa te esperando lá na sala.

– Obrigada ­– ela disse deixando um beijo no rosto do amigo.

– Eu te amo – ele falou.

– Eu te amo... mais – ela retribuiu

Cosima respirou fundo e saiu a passos apressados em direção a sala. Quando se deparou com a loira sentada em seu sofá precisou fazer certo esforço para que seu suspiro não fosse audível.

– Oi! – a morena cumprimentou.

– Oi – Delphine disse se voltando para ela. – Desculpa Cosima, acho que eu acabei chegando cedo...

– Não, não mesmo. Eu que estou atrasada. Eu meio que sempre me atraso, então tô sempre tendo que me desculpar por isso.

– Certo.

– Você quer... beber alguma coisa ou algo assim?

– Não, estou bem. Obrigada.

– Então acho que a gente já pode ir.

– Claro.

Cosima vestiu seu casaco que estava no cabideiro ao lado da porta de entrada, encaixou o coque dentro de um gorro de lã também vermelho e saíram de casa.

– Eu acabei nem pedindo sua opinião mais cedo... – começou Cosima. – Tudo bem a gente ir de metrô? Ou você prefere chamar um táxi?

– Não, metrô está ótimo pra mim – disse Delphine concordando.

– Tudo bem.

– Falando nisso... Será que agora eu já posso sabe onde estamos indo?

Cosima pensou por um instante para então responder.

– Não sei... – se aproximou de Delphine e cochichou. – Eu não estou autorizada a falar sobre isso.

– Não está autorizada? – a loira perguntou desconfiada. – Você não está me levando de penetra em alguma festa ou coisa parecida, não é?

– Você com certeza não vai ser penetra. Tá mais pra convidada de honra.

– O quê? Acho que não entendi.

– Bom... Lá na ordem a gente tem que recrutar uma pessoa por mês, então você meio que está sendo a minha contribuição da vez.

A francesa parecia confusa. Estava inclinada a achar que aquilo era realmente uma brincadeira, mas ao mesmo tempo não tinha 100% de certeza disso. Cosima vendo aquela reação, optou por aproveitar um pouquinho mais da situação.

– O quê? Vai me dizer que você tem preconceito com magia?

– Ah... eu... – Delphine estava começando a ficar nervosa.

Mas então Cosima não aguentou mais e acabou se entregando a uma boa gargalhada.

– Merde – a loira disse envergonhada. – Não acredito que eu caí nessa...

– Pra falar a verdade, nem eu – Cosima soltou entre os risos.

– Eu sou uma idiota...

– Ah, que isso... Foi até fofo da sua parte ­– aquele comentário fez o rosto de Delphine corar. – Bom, mas já que não vai rolar nenhum ritual pra gente essa noite, talvez o Toronto Light Fest seja uma boa opção.

– Toronto Light Fest?

– Nunca ouviu falar? – recebeu apenas uma negativa com a cabeça. – É um evento que acontece durante o inverno no distrito histórico da cidade. São diversas esculturas iluminadas em uma exposição a céu aberto, tanto de artistas locais quanto estrangeiros.

– Hum – Delphine ponderou por um segundo. – Parece interessante.

– Sim. Eu ainda não fui esse ano, vai ser uma surpresa para nós duas.

Não muito tempo depois, elas chegaram na estação e precisaram correr um pouco para entrar no vagão que estava prestes a fechar as portas. Devidamente acomodadas, o assunto estava fluindo de maneira agradável e fácil, até Cosima sentir a expressão de Delphine mudando quando pararam em uma estação mais à frente.

– Delphine? Está tudo bem?

– Sim. Tudo ok – disse ela se ajeitando no assento como se tentasse esconder o rosto de alguém. – Tá vendo aquele senhorzinho que acabou de entrar?

– Qual? – Delphine acenou discretamente com a cabeça. – Aquele senhor asiático?

– Ele mesmo.

– O que tem ele? – Cosima perguntou curiosa.

– No outro dia, quando eu saí... Na hora de voltar para casa encontrei com ele no metrô. E, bom... acho que acabei o irritando um pouco...

– O que aconteceu?

– Nem eu sei direito... Ele veio tentando me dizer alguma coisa, só que aparentemente não fala inglês. E como eu não falo mandarim, ou seja lá qual outra língua que ele estava usando, acabou ficando muito nervoso, chacoalhando os braços e andando de um lado para o outro...

Cosima não conseguiu se controlar e voltou a dar risada.

– Ah, por favor... – Delphine perguntou passando a mão no rosto. – Por que você está rindo agora?

– Vejo que você já teve sua primeira experiência com os doidos do metrô.

– Tá me dizendo que isso acontece sempre?

– É, mais ou menos. Mas você tem razão – Cosima disse tentando retomar a postura. – Isso não é engraçado. Chega a ser um pouco triste até.

Delphine pareceu intrigada com aquele comentário e Cosima assumiu uma expressão mais séria no rosto.

– Ninguém sabe ao certo, mas existem boatos que especulam quem são essas pessoas. Como você deve ter percebido, o Canadá é muito aberto para imigrantes. O problema é que as vezes acontece de pessoas imigrarem para trabalhar ou com um visto de turista não retornam para seus países. Muitos trazem familiares que nem sempre falam inglês ou francês. Eu, por exemplo, acredito que alguns desses, por não conseguirem se integrar na sociedade acabam ficando meio maluquinhos – fez uma breve pausa e percebeu que Delphine estava pensativa, com o rosto transparecendo algo que ela julgou ser compaixão. – Digo isso, por que é bem comum encontrar essas pessoas aqui em Toronto, principalmente as mais idosas, mas nas ocasiões que eu fui para cidades menores parece que é uma coisa mais rara de acontecer.

– Nossa, agora eu estou me sentindo uma pessoa horrível – disse Delphine envergonhada. – Fiquei com medo e ele provavelmente só estava querendo alguém para conversar...

– Hey, não fica assim – ao dizer isso, Cosima colocou a mão sobre a perna de Delphine e a apertou de leve. A francesa observou aquele gesto, mas não fez nenhuma menção de interrompê-lo. – Você não é horrível. Só não tinha como saber, acabou de chegar na cidade. Mas da próxima não precisa se assustar, geralmente eles são pacíficos. Nunca vi ninguém falando de já ter sido agredido ou algo assim.

– Ok, vou me lembrar disso.

Elas sentiram o veículo diminuir a velocidade e a voz no alto falante anunciar o nome da estação. Cosima recolheu sua mão e ajeitou a bolsa nos braços, pronta para se levantar.

– Vamos. É aqui que a gente desce.

A estação de metrô ficava a pouco mais de um quarteirão do evento, e assim que elas colocaram os pés na rua, foi possível ver holofotes iluminando o céu. Felizmente estava uma bela noite e não haviam indícios de que nevaria.

Quando chegaram em seu destino, logo de cara já viram o letreiro 'The Distillery District' iluminado em LEDs coloridos. As construções antigas com paredes de tijolo à vista formavam um emaranhado de bares, restaurantes e alguns edifícios comerciais. A principal entrada de acesso fora coberta por uma escultura dinâmica que se assemelhava muito com as duplas hélices do DNA e se movia como em ondas.

O lugar estava bastante movimentado, mas praticamente não haviam crianças, talvez por conta do horário. O público se formava sobretudo por casais e pequenos grupos de amigos.

Já na primeira intersecção elas se depararam com uma pirâmide de estrutura metálica decorada em forma de mosaico. Ao se aproximarem, a surpresa maior foi ver com que tipo de material o desenho havia sido feito.

– Isso são... – começou Delphine.

– Ursinhos de gelatina! – completou Cosima. Elas se entreolharam e sorriram com aquela constatação.

Como boa recém-chegada em terras estrangeiras que era, Delphine pegou seu celular e começou a tirar fotos de tudo que encontrava pela frente. A iluminação pública fora desligada, então toda a luz do ambiente ficava a cargo das exibições, ora deixando alguns lugares bem escuros – especialmente quando eram os lasers a serem empregados – ora se tornava tão claro quanto o dia, como foi o caso de um túnel formado por uma malha de luzinhas brancas. Cosima gostou muito de um telão cuja silhueta iluminada reproduzia passos de dança no melhor estilo Just Dance. Se empolgou tanto em imitar os movimentos que foi até preciso abrir seu casaco para que não começasse a suar por debaixo daquele tecido pesado.

– Então você gosta de dançar? – perguntou Delphine assim que a morena se recompôs e se juntou a ela para que pudessem continuar seu passeio.

– Sim, é um dos meus hobbies preferidos. Eu meio que não nunca deixo uma oportunidade dessas passar – disse Cosima com um grande sorriso no rosto. – Mas pensando melhor, eu não devia ter feito você ficar parada lá me esperando... Foi bem rude da minha parte, me desculpe por isso.

– Ah, não se preocupa – Delphine falou começando a rir. – Na verdade, você me concedeu um show à parte.

– Ouch! ­– Cosima soltou franzindo as sobrancelhas. – Foi tão desastroso assim?

– Non, pelo contrário – a loira se apressou em dizer. – Você dança muito bem.

Cosima corou com aquele comentário, mas logo teve sua atenção desviada para outra coisa.

– Nossa cara! – falou se aproximando de uma escultura que representava asas de anjo com uma auréola. – Eu vou precisar tirar uma foto nisso! – ela buscou por seu telefone na bolsa, mas ele não estava lá. – Ah, droga... Na pressa de sair de casa eu acabei esquecendo o celular carregando...

– Não tem problema – disse Delphine. – Vai lá, eu tiro pra você com o meu.

– Obrigada!

Cosima se ajeitou entre as asas, abriu os braços e ergueu a cabeça encarando o céu acima de si. Aquela imagem ficou incrivelmente harmoniosa e assim que Delphine levantou a câmera para tirar a foto, as luzes mudaram para tons de rosa.

Cosima achou que a loira estava demorando mais tempo que o necessário com aquilo, mas cogitou que alguém pudesse estar passando atrás dela, ou então que ela só estivesse fazendo algum ajuste no enquadramento.

– Pronto! – falou Delphine abaixando o celular e fazendo com que a morena voltasse a se aproximar dela. – Depois eu te envio as fotos.

– Tá bom. Agora vai – estendeu a mão para que o celular lhe fosse entregue. – Sua vez.

– Ah, não – disse Delphine sorrindo sem jeito e segurou o aparelho mais para perto de si. – Eu passo essa.

– Qual o problema?

– Nenhum. Eu só não sou a pessoa que gosta de estar na frente das câmeras, entende?

– Sério?

– Sério.

É um desperdício poupar o mundo desse rosto...

Por mais que quisesse verbalizar seus pensamentos, achou que ainda não era o momento propício.

– Tudo bem então – Cosima falou dando os ombros. – Você está com fome? Vamos comer alguma coisa?

– Oui. O que você sugere?

Por favor moça, já basta esse sotaque apaixonante, você precisa ficar soltando essas palavras em francês? Desse jeito fica difícil de resistir...

– Quer saber? Vou deixar essa com você. Tem restaurantes para todos os gostos por aqui. A única coisa que eu peço é pra não ser a churrascaria – pontuou Cosima.

– Por quê? – perguntou Delphine. – Você não gosta de carne?

– Tipo isso. Na verdade, eu sou vegetariana.

Delphine olhou ao redor e naquela rua mesmo, até onde sua visão alcançava encontrou pelo menos umas quatro ou cinco opções. No entanto, um estabelecimento em específico lhe chamou mais atenção.

– Libretto – fez uma breve pausa. – Italiano, imagino.

– Isso mesmo.

– O que me diz? – falou voltando a olhar para Cosima.

– Eles têm uma das melhores pizzas da cidade, na minha opinião.

– Hum. Isso parece ótimo para mim. Vamos?

– Claro.

Ao entrarem no restaurante foram direcionadas para uma mesa e logo um garçom veio anotar seus pedidos. Cosima escolheu pizza de brócolis com queijo, enquanto Delphine preferiu seguir a sugestão do chef, pedindo também que lhes trouxessem uma garrafa de vinho tinto.

O lugar era bem acolhedor. Apesar dos traços de requinte, a cozinha aberta, com os fornos à lenha a mostra, além de contribuir para o clima agradável – contrastando com o frio que fazia lá fora – trazia uma atmosfera quase caseira para o ambiente. Sem considerar o cheiro maravilhoso, que colaborou para que Cosima se lembrasse que já não comia a várias horas.

– Mas então – começou Delphine. – Agora dá tempo de você me contar aquela história de como veio parar aqui em Toronto?

Cosima precisou de um instante para conseguir entender do que ela estava falando.

– Ah, quanto a isso... – falou enquanto deixava o corpo escorregar na cadeira. – Talvez eu tenha exagerado um pouco... – a loira a olhou fingindo ultraje. – Espera, eu não menti! Só não era uma história tão longa como eu fiz parecer.

Nesse momento o garçom retornou a mesa com a garrafa de vinho e serviu uma taça para cada uma, que brindaram brevemente permitindo que Cosima continuasse a falar.

– Como tinha te dito, eu realmente nasci em São Francisco, mas só tive residência fixa lá até os quatro anos de idade – parou por um instante para provar do vinho. – Como pode imaginar, não me lembro de quase nada dessa época. As memórias que tenho da cidade são das semanas que eu passava na casa da minha avó, Anne.

– Mas você não tinha dito que só se mudou pra cá na adolescência? – Delphine perguntou franzindo o cenho.

– É aí que tá – falou se ajeitando na cadeira e apoiando os cotovelos na mesa. – Dos quatros anos até começar o ensino médio eu morei em um barco, pulando de cidade em cidade com meus pais, feito verdadeiros nômades.

– Uma casa barco? – Delphine também se inclinou sobre a mesa boquiaberta.

– Exatamente – Cosima respondeu sorrindo.

– Nossa! – Delphine disse boquiaberta. – Isso deve ter sido incrível!

– Bem, eu estaria mentindo se dissesse que não foi uma infância divertida. Muita gente pensa que pode ser entediante para uma criança crescer em um espaço tão limitado quanto um barco, mas acaba que quando você leva esse tipo de vida seu quintal é o mundo. O tempo em alto mar era relativamente pequeno se comparado com o tanto que a gente passava atracado em alguma cidade qualquer. Tinha sempre muitos lugares em terra para visitar e pessoas novas para conhecer.

– Você não chegou a frequentar a escola então?

– Não. Até o ensino médio eu nunca tinha pisado em um colégio.

Neste momento foi necessário fazer uma pausa para que o garçom colocasse seus respectivos pratos frente a elas na mesa. Começaram a comer, mas isso não impediu que a conversa tivesse prosseguimento entre uma garfada e outra.

– Meus pais nunca deixaram minha educação de lado. Bem ao contrário na verdade, acho que eu acabava estudando muito mais do que a maioria das crianças que estão no ensino formal. Mas depois, conforme eu fui crescendo eles viram que em algum momento seria melhor eu ter professores de verdade para os assuntos que eles não dominavam.

– Se me permite, qual a ocupação dos seus pais?

– Eles são biólogos marinhos.

– Ok – Delphine inclinou a cabeça enquanto acabava de mastigar um pedaço da pizza. – Isso é bem sugestivo.

– Sim – disse Cosima soltando uma risadinha. – Por muitos anos eles rodavam por aí dando palestras, fazendo pesquisas ou pegando alguns trabalhos pontuais. Mas depois do advento da internet, começaram a trabalhar à distância para algumas universidades.

– E como foi pra você se estabelecer em terra firme?

– Bom... eu acho que por conta da minha criação eu sempre fui muito adaptável. É claro que pra uma garota de 14 anos começar a viver sozinha em uma cidade grande como Toronto a princípio foi um choque, mas acabei encontrando pessoas maravilhosas no caminho. Quanto a escola... Nas primeiras semanas, talvez por ainda não estar adaptada ao novo estilo de vida, tiveram algumas tentativas de bullying, mas logo eu entrei pro grupo de teatro e aí foi mais fácil pra eu me enturmar.

– Sério? Tá me dizendo que você atua?

– Não! Não, sem chances. Acho que eu não conseguiria interpretar nem uma árvore se fosse preciso. Apesar do nome, era mais pra um clube de artes no geral. Eu ficava só na parte dos bastidores, na confecção dos cenários, organização, esse tipo de coisa. Acabei aprendo bastante coisa sobre luz e som naquela época.

– Olha só... – Delphine parou por um instante para molhar a boca com o vinho de sua taça. – Você está me saindo mais surpreendente do que eu esperava.

Aquele comentário fez com que a morena sorrisse e voltasse a sentir o rosto esquentar. Cosima voltou a atenção para a pizza, percebendo que tinha comido pouco mais da metade da porção que lhe fora servida, mas mesmo assim afastou o prato já se sentindo plenamente satisfeita. Logo Delphine terminou de comer e juntas elas acabaram com a garrafa de vinho. Pouco tempo depois, o garçom retornou para a mesa e perguntou se elas desejavam mais alguma coisa. No entanto ambas preferiram voltar para o lado de fora e ver o restante da exposição.

Assim que pagaram a conta e saíram do restaurante, Cosima as guiou por uma viela especialmente escura. A única iluminação daquele caminho se dava por algumas letras iluminadas que juntas formavam a frase 'Mude sua perspectiva'. Delphine parecendo pensativa, decidiu retomar a conversa que elas iniciaram durante o jantar.

– Você nunca pensou em voltar para sua antiga vida depois que terminou o colégio? Digo, voltar a viver com os seus pais?

– Pensei, tanto que eu até voltei por um tempo – Cosima respondeu. – Digamos que eu passei por um período difícil no final do meu último ano, então quando terminei a escola quis me afastar de tudo por um tempo. Voltei a morar com meus pais por, tipo, uns três, quatro meses no máximo – finalizou a fala com um suspiro. Não se sentia confortável naquele momento para entrar em maiores detalhes sobre aquela parte de sua vida, então achou melhor mudar o tom da conversa. – Aparentemente não consegui me acostumar com o fato de que dentro de uma casa barco você não pode ter mais coisas do que estritamente o necessário e ainda por cima tem que ser tudo muito bem organizado.

Felizmente elas chegaram a um lugar aberto, cheio de pessoas e com distrações o suficiente para impedir que Delphine pudesse fazer algum questionamento sobre aquilo. O ambiente envolto pelo som de 'I Follow Rivers' era a única divisão da exposição que elas ainda não tinham visitado. Tirando a palavra 'Love' escrita em letra cursiva com uma mangueira de LED vermelho, na qual os casais disputavam espaço para uma foto, a principal atração dali era a escultura de um enorme urso polar apoiado sobre as patas traseiras, cujo topo da cabeça ficava no mesmo nível da cobertura das construções ao redor. Um pequeno filme era projetado sobre ele; primeiro mostrando as belezas do oceano, como recifes de coral e cardumes de peixes, para na sequência alterar para imagens de coisas como derramamentos de óleo que contaminam extensas áreas, ou ainda a grande ilha de lixo no Oceano Pacífico.

– Não sei se fico mais triste ou revoltada com essa situação... ­­ – disse Delphine olhando a projeção.

– Nem me diga. Perdi as contas de quantas vezes meus pais tentaram em vão salvar algum animal marinho com o organismo todo obstruído pro ter comido lixo, principalmente pedaços de plástico.

– Parece que as pessoas não entendem que, por exemplo, aquele copinho descartável que elas jogam no chão, mas que é "só um", vai acabar parando no sistema de drenagem urbana, que por sua vez é despejado nos rios e todos os rios acabam desaguando no mar.

– Exatamente. Eu tento ser otimista quanto a isso, mas as vezes fica difícil.

Elas deram mais uma volta, mas de fato já tinham percorrido toda a exposição. À medida que ficava mais tarde a temperatura só fazia diminuir, então chegaram à conclusão que era hora de voltar para casa. Delphine chamou um Uber e elas pegaram o caminho de volta para a rua principal através do túnel iluminado.

– Então – começou Cosima. – Gostou do passeio?

– Muito! – Delphine respondeu empolgada. – A exposição está realmente muito bonita. E você não exagerou com relação ao restaurante, a comida estava deliciosa.

– Fico feliz que tenha gostado. – Já estavam quase saindo do túnel quando Cosima parou de andar. – Só tem uma coisa.

– O que foi? – Delphine contraiu a testa, imaginando que ela talvez tivesse esquecido alguma coisa.

– Eu me recuso a ir embora se você não tirar uma única selfie comigo – disse dando um sorriso de lado e cruzando os braços.

– Cosima...

– Qual é! O celular é seu mesmo. Se não gostar, é só apagar depois – a loira hesitou por um instante, mas acabou cedendo ao olhar pidão que Cosima estava lhe lançando.

– Tá bom... – a morena abriu mais o sorriso ao ouvir aquilo. – Mas tem que ser rápido. Nosso carro já está chegando.

– Sim senhora – ela brincou prestando continência.

Por conta a diferença de altura entre elas e a necessidade de Delphine se abaixar para caber no enquadramento, ficou a cargo de Cosima tirar a foto. Esta se arrepiou ao sentir o marcante perfume francês assim que a loira aproximou o rosto do dela e apoiou uma mão em seu ombro.

Selfie tirada, elas voltaram a caminhar em direção a saída e assim que chegaram na rua, a motorista do uber já estava esperando por elas. A moça fez menção de abrir a porta para que as duas entrassem, mas Cosima dispensou aquele gesto de gentileza tomando a ação para si. Quando entraram no veículo, o rádio estava sintonizado em uma estação que recapitulava as notícias do dia. A motorista perguntou se elas preferiam que ela desligasse, mas ambas concordaram que tudo bem que continuar ligado.

Dentro do carro, ambas permaneceram em silêncio com Delphine olhando para rua através da janela. Ali sentada, tão perto da francesa, bastando apenas esticar um pouco braço para que pudesse alcançar sua mão que repousava sobre o banco, Cosima voltou a se sentir ansiosa.

– Sabe... – começou ela chamando a atenção da loira para si. – Domingo vai ter essa festa... É uma tradição da faculdade para recepcionar os novatos. Não sei se faz muito seu estilo, mas se você não tiver fazendo nada, talvez queira dar uma passada por lá...

– Hum. Tudo bem. Qual é o horário?

– A entrada é liberada a partir das 9 da noite, mas a banda só começa a tocar depois das 10:30. Vai acontecer no ginásio de basquete da Universidade.

– Você vai estar lá, né?

– Sim – Esse é o momento que eu digo 'Te busco em casa'? – Eu ofereceria de nos encontrarmos para irmos juntas, mas eu vou precisar chegar mais cedo.

– Ok – falou sorrindo. – Talvez eu vá.

Cosima devolveu o sorriso e na sequência virou o rosto para sua janela. Ainda que estivesse escuro preferia não correr o risco de ser vista corando novamente.

O restante da viajem se deu de forma tranquila. Já estavam quase chegando quando, no rádio, os jornalistas terminam de comentar as notícias dando espaço para as músicas. Começaram com 'I'm Yours', o que fez Cosima se sentir uma boba por se identificar com um trecho específico daquela letra. Ainda era cedo demais para aquilo...

Nobody asked to get me attached to you / Ninguém me disse para me apegar tanto a você

In fact you tricked me / Na verdade você me enganou

And I wasn't trying to fall in love / E eu não estava tentando me apaixonar

But boy you pushed me / Mas você forçou a barra

So all that I'm asking / Então tudo o que eu peço

Is that you handle me with caution / É que você me trate com cuidado

'Cause I don't give myself often /Porque eu não me entrego com frequência

But I guess I'll try today / Mas acho que vou tentar hoje

'Cause I've had my heart broken before / Porque meu coração já foi quebrado antes

And I promised I would never let me hurt anymore / E eu prometi nunca mais me deixar sofrer

But I tore down my walls / Mas demoli minhas paredes

And opened my doors / E abri minhas portas

And made room for one / E fiz espaço pra mais um

So baby I'm yours / Então, querida, eu sou sua

Conforme a motorista se aproximava do destino, ela pode perceber que Delphine seria a primeira a ser deixada em casa. Quando o carro parou em frente ao seu prédio, a loira não desceu imediatamente. Cosima podia jurar que ela também se sentia excessivamente ansiosa enquanto ajeitava a bolsa para sair do veículo, mas nada impedia que fosse só o efeito do álcool começando a confundir seu julgamento.

– Bom, é isso então – falou Delphine olhando-a nos olhos. – Foi uma noite realmente divertida. Obrigada.

– Que isso... Foi ótimo estar na sua companhia.

– Nos vemos no domingo?

– Sim, nos vemos no domingo.

A francesa hesitou por um instante. A princípio parecia que ia se inclinar para despedir da morena com um beijo no rosto, como tinha feito da primeira vez em que se encontraram, mas no último instante ela recuou, dando apenas um 'Tchau' e saiu apressada do carro.

Será que eu fiz algo de errado?

O carro logo voltou a entrar em movimento e pouco tempo depois Cosima já estava de frente a sua própria casa. Uma vez do lado de fora, por um instante ela se permitiu apenas inspirar o ar gélido da noite. O vento estava forte, então achou por bem não se demorar muito ali e entrar em casa.

Agora seria só controlar a expectativa de reencontrar a francesa por pouco mais de um dia.

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