⊱ 𝙇𝙞𝙫𝙧𝙤 𝙄; Moreia (Capitulo novo)
✣ Capitulo XXXIII: Moreia ✣
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A cálida luz da lâmpada no abajur centralizado na mesa entre os dois sofás de couro escondia a beleza do uísque no copo, pela janela era possível se ver diversas luzes coloridas a dar vida para a cidade.
Finalizara a primeira garrafa após revisar os relatórios semestrais da hotelaria novamente, desde que seu filho pedira afastamento do cargo uma semana atrás, o patriarca Kang precisava tomar conta de todos os assuntos importantes da empresa.
- Entre. – Ordenou para a secretária que bateu na porta quando a tinta preta da caneta tinteiro marcou outra assinatura em um contrato casual.
Entretanto a maçaneta não ousou ser aberta pela jovem, após gritar mais algumas vezes autorizando a entrada dela, o homem levantou-se em direção a porta escancarando a visão para o cômodo vazio a sua frente.
A mesa que pertencia a sua secretária estava vazia no escuro da sala de espera, a bolsa cor de rosa estava jogada sobre a cadeira, ao seu lado os saltos da mulher encontravam-se apoiados ao vaso em que se erguia uma planta rústica.
- Feche a porta. – Ordenou a voz atrás de si, o rádio começou a soar a melodia triste de Lacrimosa pelo escritório.
- Quem está aí? – Indagou o homem, virou-se na direção da voz vendo sua cadeira na posição contrária a ele. A figura analisava a paisagem através das janelas com zelo.
- Não seja covarde, feche a porta. – Pediu ao emitir um clique alto da arma sendo destravada. – Se não serei obrigado a machucar Kang Tae Oh.
A menção ao nome de seu filho abalou o homem que encontrou a fechadura voltando para o interior da sala, ignorando todos os avisos mentais que insistiam em alerta-lo dos perigos eminentes daquela conversa.
- Muito bem Sr. Kang, não foi difícil, não é mesmo? – Song Kang deixou a cadeira no local em que estava, passou a rondar a mesa indo ao interruptor ligando a luz. – Pode se sentar.
O patriarca atravessou o cômodo em direção ao sofá de couro, a luz permitiu que ele pudesse ver a mancha avermelhada que se seguia pelas botas do assassino em pegadas bruscas pelo piso de porcelanato.
- Espero que não se incomode com a sujeira, sua secretária não se comportou muito bem. Por isso acabamos deixando muita coisa para que a faxineira limpe amanhã. – Comentou ao parar de frente a ele.
- O que você quer? – Indagou sem rodeios, gostaria de acabar com aquele bate papo o mais rápido.
- Anos atrás o senhor me deu o endereço dos pais de Park Nam-do em troca da vida de sua esposa. – Destoou dentre os demais detalhes do cômodo, pelo chão ainda era possível sentir as amargas vibrações da tensão instalada ali. – Agora preciso que localize o hospital onde o pai de Nam-do está internado.
- O velho Park morreu a vinte anos atrás. – Esbravejou ele. – Você o matou com suas próprias mãos.
- Eu lhe dei permissão para contestar algo? – Avançou os sinais contra o homem prensando seu corpo contra o sofá, a fala em sua garganta lhe assegurava do perigo que o mínimo movimento representaria a sua vida. – Aquele homem não está morto, ainda. Tiveram muitos contratempos na noite em questão, abrindo uma brecha para que sobrevivesse.
- Posso tentar localiza-lo, mas não será fácil. – Comentou ao perceber o sorriso de canto que Song Kang esbanjara, o tremor nos lábios agregava-lhe uma aparência mais temível. – Precisarei de algum tempo.
- ... – A risada ecoou destravando a porta, os cabelos tingidos de vermelho cruzaram a porta limpando o punhal em mãos. Pelo rosto diversas tatuagens feitas com maquiagem mascaravam a verdadeira identidade da garota. – Tempo é o que temos de sobre, já você... – Apontou para o velho sob o aperto de Song Kang. – Nem tanto.
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Encontrava-se enrolada no cobertor lilás, ao lado seu irmão dormia abraçado a seu corpo evitando toca-la, como se o mínimo contato pudesse desfazer a garota em milhares de pequenos pedaços.
Sua cabeça pesava ao se recordar das últimas horas, o relógio ao seu lado marcava pouco mais do que três da tarde. Levantou-se sentindo a forte tontura que a fome lhe causara, ignorou tudo ao escolher uma roupa em especifico antes de atravessar o closet para o banheiro.
Trocou o pijama hospitalar pelas camadas grossas de tonalidade amarela do conjunto de moletom, agarrou o celular de Seojun próximo a cama ao esconder-se como um rato entre as roupas penduradas no armário ao discar o número.
"Alô? – A voz feminina do outro lado da linha ecoava pelos ouvidos da autora.
- Mãe? É a Mi-so. – Revelou ouvindo os suspiros da matriarca, por mais que soubesse que aquela mulher não era sua verdadeira mãe, ela se recusava abrir mão daquela relação.
"Minha querida, quanto tempo você ficou sem nos ligar, estávamos tão preocupados. – Choramingou pelo telefone, ao fundo Mi-so podia ouvir seu pai pedindo para que a mulher lhe passasse o telefone para que pudesse ouvir a voz da filha. – Está nos ouvindo? Coloquei no viva voz.
- Oi pai! Desculpe por não ligar para vocês durante a viagem, meu celular quebrou. – Mentiu, a última coisa que desejava era lhes trazer preocupações desnecessárias. – Como está em Seul? O vovô está melhor?
A conversa se seguiu por alguns minutos, queria poder correr para os braços da mãe e receber seu carinho. Sentia falta da época em que podia ficar o dia todo na cama dos pais recebendo caricias, se pudesse voltar no tempo com certeza seria para impedir a si mesma de crescer.
Largou o celular na cômoda abrindo a porta do quarto para vagar pelo apartamento, na sala de estar o barulho da televisão era alto e se assemelhava a uma das músicas de desenho animado que ouvira durante toda a infância.
- Tia Mi-so? – O pequeno Dong-hee cruzou o corredor entre os tropeços abraçando a jovem.
Olhar para aquele garoto remetia a ela apenas a visão da acionista já sem vida pendurada pelo pescoço no centro do teatro municipal. O sangue que escorria por suas pernas a pingar no assoalho de madeira pelo palco.
- Dong-hee cadê você? – A promotora apareceu pela porta da cozinha notando as pupilas tremulas da amiga. – Cuidado, ela ainda não está totalmente recuperada. – Pediu para o garotinho ao passar o braço da autora por seus ombros guiando-a para a sala.
- A tia ainda está com dor? – Perguntou a criança recebendo uma ordem da promotora para que trouxesse um copo de água.
- Você está bem? – Questionou DaEun para Mi-so.
As imagens ainda repercutiam em sua mente, amarrada a uma das pilastras a autora somente podia observar o assassino costurar os girassóis por toda a pele de Kim Bok Joo. O cheiro de água sanitária em suas mãos quando foi obrigada a esfregar o piso para limpar o sangue, suas unhas descascando com o atrito da madeira áspera.
- Lee Mi-so, você está segura agora. – Abraçou a jovem para que ela repousasse a cabeça nas pernas da amiga encarando fixamente a televisão como fizera nos dias em que esteve sob a mira acirrada de Song Kang.
- Parem de agir como se nada tivesse acontecido. – O timbre tremulou entre as palavras. – Eu matei a mãe dele.
- Você não fez isso Mi-so, foi ele. – DaEun segurava as lágrimas ao consola-la. – Fez o que pôde, tenho certeza disto.
- Eu não puxei o gatilho. – Comentou se desfazendo das doces palavras da promotora. – Mas fui o motivo pelo qual ele o fez.
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- Ela está usando amarelo. – Tae Oh constatou triste ao observar a namorada pelas portas de vidro da sacada.
- Algo de especial nessa cor? – Nam-do seguiu o olhar dele para o sofá.
- Quando nos conhecemos este era o sinal de que ela estava mal. Parece bobo, mas quando Mi-so ficava doente sua mão lhe vestia com um pijama amarelo, desde então ela usa essa cor quando está mal sem ao menos perceber.
- Parando para pensar, eu não nunca a vi com essa cor antes. – Nam-do buscou em suas lembranças algumas memórias, mas nenhuma pareceu vir à tona.
- Isso é por que ela repudia o amarelo. – Sussurrou bebendo outro gole da garrafa de água. – Era a cor do quarto que possuía no hospital psiquiátrico.
- Ela esteve em um lugar como este? – Questionou surpreso com o comentário. Suas sobrancelhas grossas se arquearam retirando algumas risadas do namorado que se aproximou massageando o rosto de Nam-do.
- Quando sua versão morreu no mundo dela, Mi-so precisou de um tempo fora da circulação para se reconectar com o mundo. – Aproximou-se selando os lábios num casto beijo. – Foram apenas quatro meses, mas o choque a fez acordar para a vida novamente.
- Como sabe tantos detalhes sobre a vida dela? – Indagou recebendo uma resposta curta, nos dias em que Nam-do se ausentou pela raiva que o processo de aceitação lhe causar, Tae Oh jamais saiu do lado da jovem. – Eu não deveria ter agido daquela maneira quando descobri a verdade sobre tudo.
- Pessoal, está na hora do almoço! – Gritou a promotora chamando todos para a sala de jantar, entretanto a autora retornou para o quarto deitando ao lado do irmão.
Tae Oh estaria mentindo se dissesse que não estava preocupado com o atual estado da jovem, seu olhar tão perdido, olheiras profundas e comportamento esquivo. No momento em que a reencontrou nos braços do detetive a cruzar a porta apressados, seu coração se partiu ao ver o corpo dela marcado pelos hematomas.
Foram cerca de quatro dias desacordada, todos revezaram para poder zelar por seu sono. Nenhum dos três médicos que visitaram a cobertura puderam constatar o motivo pelo qual a jovem não acordava, alguns ousavam a receitar vitamínicos, mas nada além disso.
Algumas horas depois do almoço a visão de Mi-so tomando sorvete no chão do quarto parecia sair de um conto de fantasia onde nenhum dos recentes problemas parecia realmente importar. Aproximou-se receoso sentando na ponta da cama a observa-la.
- Como se sente? – Tae Oh rondou seu corpo com o olhar não deixando que nenhum mínimo detalhe pudesse escapar.
-Você pode pintar minhas unhas? – Pediu enquanto esquadrinhava a estampa do tapete com os dedos.
-Eu não sei pintar unhas... – Confessou ouvindo o choro copioso que a garota iniciou, os soluços apertados entre os longos suspiros. – O que aconteceu?
- Por favor, tira essas marcas. – Estendeu os braços enquanto os balançava desesperadamente referindo-se aonde ficara amarrada.
- Tudo bem, calma. – Abraçou a jovem afagando suas costas. – Ele a obrigou a fazer algo que lhe machucou as mãos?
- ... – Se manteve silenciosa ao confirmar com um simples gesto, sua mão segurou a bainha da camiseta do empresário o impedindo de solta-la.
- Algo ruim? – Recebeu outro sim como resposta, o peito pareceu apertar. Gostaria de encontra-lo e mata-lo com as próprias mãos, mas conteve-se ao beijar o topo da cabeça da garota pedindo para que subisse em seus pés.
- ... – Mi-so rodeou o peito de Tae Oh com os braços deixando que ele a conduzisse para a cama, deitados, ambos admiravam as estrelas de plásticos que brilhavam no teto do quarto com a baixa luminosidade. – Eu o vi matar Kim Bok Joo, limpei o sangue e observei cada flor ser costurada a mão.
Foram longos dez dias ao lado do assassino que quase lhe matara pela terceira vez. Partes conectadas de uma teia de acontecimentos descarrilhados por uma garota que nunca fora capaz de realmente dar um fim a obsessão de um homem entorpecido pelo desejo de tê-la só para si.
- Esta é a pior lembrança que terei, para sempre irei me recordar de cada lágrima que aquela mulher soltou antes de morrer por minha causa. – Comentou sem tirar os olhos das estrelas, do outro lado da cama Nam-do se juntara a eles afagando a mão dela ao repousar a cabeça em seu ombro sobre o colchão. – Mesmo que todos digam que a culpa não é minha, eu nunca vou acreditar. Todos aqueles que morreram até hoje, seja aqui ou no meu mundo, foram por que eu não fui capaz de protege-los.
- Você não pode protege-los se não for capaz de se proteger também. – Nam-do sussurrou aninhando seu corpo, com a mão livro atrelou seus dedos ao de Tae Oh o olhando por cima da pele da garota.
- Nada disso é sua culpa, nunca será. – Tae Oh fitou os fios negros que se espalhavam pela cama como um rio turbulento. - Song Kang os matou por que é um psicopata, mesmo que você não existisse, isso não mudaria o fato de que ele nasceu assim.
- Está tudo bem ter alguns momentos de fraqueza durante a trajetória, só não pode deixar que estes momentos levem embora o que você mais precisa ter agora. – Fechou os olhos acompanhando o som da respiração dela. – A sua coragem.
- Durma um pouco, tudo estará melhor quando acordar, eu prometo. – Pediu Tae Oh os cobrindo. – Não iremos sair do seu lado.
Mi-so poderia adormecer tranquilamente ao lado das pessoas que ama se não fosse pela tinta que ousava pingar da parede na cabeceira até sua testa. Aos poucos as palavras delimitavam o espaço no mais vivido vermelho a rasgar o papel de parede.
Como num passe de mágica suas fotografias de infância surgiram pelo cômodo estampando qualquer espaço vago, nelas seu rosto estava borrado com caneta permanente. Mi-so gritou se desprendendo dos rapazes, o cobertor tomou-lhe a cabeça lhe protegendo da visão pitoresca.
"Quem é o próximo? "
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