Capítulo 74
Clarissa narrando
Me revirei na minha cama, eu não tava conseguindo pregar meu olho.
Sei lá o que tava acontecendo, mas eu só conseguia pensar no Digão e no meu pai nessa operação, e porra eu já tava tão acostumada com isso tudo, mas dessa vez era diferente os dois homens da minha vida estavam juntos.
Me sentei no colchão e encarei o quarto ao meu redor, ainda estava escuro o que me fez ter certeza que ainda era madrugada, peguei meu celular na cabeceira só pra olhar a hora mesmo.
04:00hrs
Na tela tinha um "eu te amo" dele, eu sorri mas bloqueei a tela e suspirei.
Levantei da cama e caminhei até a cozinha, enchi uma xícara de leite e preparei com canela e açúcar, do jeito que minha mãe tinha preparado pra mim, eu suspirei, tava com tanta saudade dela que não cabia em mim.
Mas tava tudo tão confuso, e eu não queria encarar dona Maria Laura tendo algo tão importante no qual eu tava escondendo dela, isso não fazia parte de mim.
Decidi me sentar com minha xícara de leite no sofá, liguei a televisão e fiquei ali em frente vendo um filme de romance qualquer.
Nem percebi o tempo passar, só percebi mesmo que o tempo tinha passado quando já conseguia ouvir algumas vozes na rua, e aquele filme me fez querer engatar em outro.
Suspirei depois que terminei o segundo e encarei aquela casa vazia, com minha própria excessão.
Fui até o quarto pegar meu celular que tinha deixado a madrugada inteira ali, não tinha nenhuma ligação dele ou do meu pai.
— É... Hoje o dia vai ser longo Clarissa — Encarei meu reflexo no espelho.
~~••~~
Estava a caminho da escolinha, mas decidi dar uma passada no postinho, queria encontrar meu primo.
Fazia alguns dias que não conseguia bater com o Pietro, nossos horários estão dando convergência.
Queria também não dar muito o que falar com o Digão, esse é um segredo que eu ainda guardo dele, prefiro que ele nem saiba também que o Pietro seria o pai do filho da Flávia.
— Patroinha — A recepcionista disse animada.
Foi nesse momento que a ficha realmente caiu e muita gente já sabe mesmo que eu e Digão estamos juntos e que toda essa história já tá escapando do meu controle.
— Não precisa me chamar assim — Fiquei um pouco incomodada — Eu queria ver o doutor Pietro, ele já chegou? — Perguntei direta, tentando escapar daquele assunto
Parece que ela também percebeu
— Ele está na sala dele, pode aproveitar que ainda não tem nenhuma paciente pra ele — Ela foi simpática
Eu agradeço a ela e caminhei até a sala dele.
Bati por educação na porta e escutei o consentimento de Pietro para que eu entrasse.
— Clari — Ele disse animado e levantou da sua cadeira, caminhou até mim e me abraçou apertado.
Retribui o abraço do meu primo, suspirei enquanto o fazia e sorri animada.
— Que saudade, parece que estamos virando desconhecidos — Falei um pouco incomodada
— Você quem some do nada — Isso era verdade
Na verdade eu estava sentindo, eu tô me afastando de todos os meus familiares e isso me deixa um pouco triste.
— Você tem um ponto — Levantei as mãos em rendição
— Mas ao que devo sua visita ilustre, você não está?... — Interrompi ele
— Você sabe que não tem riscos — Falei até um pouco triste
Pietro assentiu em silêncio e compreensão.
Depois de toda essa história da Flávia e do Pietro eu contei ao meu primo sobre tudo entre eu e Digão, ele disse que não era surpresa pra ele pois Flávia já havia lhe contado.
Fiquei surpresa que Pietro não contou a ninguém da nossa família, mas ele disse que nunca contaria algo que é tão pessoal meu sem consentimento.
— É eu sei — Ele coçou a nuca
— Você tem alguma notícia da Flávia?
Ele suspirou e sorriu
— Ela está fazendo o pré natal direitinho, me mandou a gravação do coração do bebê — disse animado
Pietro começou a mexer em seu celular e em poucos minutos um áudio de um coração batendo forte e acelerado começou a encher sua sala, saindo de seu celular.
Sorri contente ao ver a animação do meu primo e como ele sorria abobalhado pra tela de seu aparelho.
— Que bom, que essa criança nasça com muita saúde Pie — Eu estava de verdade desejando isso
— Vai sim Clari — Ele bloqueando a tela
— E vocês dois?
— É um pouco mais delicado — Ele coçou a nuca novamente — Estamos conversando todos os dias, mas tudo que a Flávia fez pra mim... Eu não consigo esquecer assim Clari, ela me magoou muito — e abaixou a caneca
Segurei a mão do meu primo
— Quando nos metemos com eles sabíamos bem aonde estávamos entrando né Pie
— A diferença entre nós dois, é que o Digão nunca amou a Flávia, Clari — Me calei enquanto encarava meu primo e via um sorriso agora triste nascendo em seus lábios — A Flávia era doida por ele e até tentou fazer por onde que essa criança se passasse por dele
Ele tinha um ponto
— Você não sente falta dela? — Perguntei observando seus traços
— Sinto e muita, todos os dias, principalmente agora que ela tá esperando um filho ou filha minha — Ele jogou a cabeça pra trás e encarou o teto — Eu pretendo ir a visitar no dia do chá revelação — Ele me encarou de volta
— Sério?
— Sim, ja combinei com ela, vou ficar uns dois dias e quem sabe a gente conversa também — Pie estava quebrado e tentando se consertar, eu via isso nele.
Torcia muito pela felicidade dele, seja com Flávia ou sem ela e que eles encontrassem a melhor forma de educar essa criança.
~••~~
Não demorei muito na conversa com meu primo.
Tinha que vim trabalhar, quando parei mina moto em frente a escolinha senti meu celular vibrar em meu bolso.
Peguei um pouco apressada esperando ser alguma notícia do Digão ou do meu pai, mas era a minha mãe, atendi de toda forma.
— Oi minha rainha — falei animada
— Tô chegando no Vidigal — Ela disse fria e direta
— Mãe? — fiquei confusa — A senhora tá vindo aqui?
Estava tudo confuso na minha cabeça, minha mãe nunca descia da favela ainda mais pra arriscar a própria cabeça assim
— Tô Clarissa — Ela foi mais direta ainda
— Vou pedir pra o Neto ou alguém te trazer direto na escolinha quando tu chegar, tô indo dar aula agora mas fica tranquila, é bom que tu vê tua filha em ação — Estava animada.
— Tá bom — E desligou.
Fiquei encarando a tela do celular com a testa franzida, mas decidi não pilhar com nada disso.
Whatsapp on
Clari 🩰: Neto tá aí?
Neto ☺️: Fala tu morena
Clari 🩰: minha mãe tá vindo aí, quando ela chegar na comunidade dá um jeito de trazer ela aqui na escolinha tá bom?
Neto☺️: Aí sim, botando banca e me dando ordem
Clari 🩰: Bicho leso da porra
Neto ☺️: Tu num sabe que não tem o que tu me peça que eu não dê um jeito mulher, levo eu mesmo a patroa da Rocinha aí
Clari 🩰: Valeu amigo ☺️
Whatsapp off
Suspirei e entrei na escolinha.
Cláudia já estava recepcionando algumas crianças.
— Tia Clarissa — Kalel um deles correu animado quando me viu o que chamou a atenção dos outros e eles correram pra me abraçar.
— Quem tava com saudades? — Perguntei sorrindo enquanto me agachava pra abraçar eles melhor.
~~••~~
— E um, dois, três — Estava ajudando Monique, uma das minhas alunas a abrir escala enquanto observava as outras o fazer — Postura Larissa — A corrigi
Ela assentiu e corrigiu sua postura em segundos.
Ouvimos a porta da sala ser aberta e de lá surgir minha mãe.
Algumas das meninas na aula perderam a concentração e ficaram observando aquela mulher.
Minha mãe tinha esse efeito nas pessoas, sejam elas adultas ou crianças, todos ficavam impactadas com a imagem impotente que se apresentava sempre que Maria Laura estava em um ambiente.
Também né, a mulher é cheia de tatuagens por seu corpo, piercings e não deixa qualquer um pisar em seus caminhos.
Acredito que até hoje só quem conseguiu dobrar minha mãe tenha sido meu pai, e olhe lá, ela já deu muitas dores de cabeça ao senhor Mikael.
Caminhei até a caixa de som e pausei a música.
— Meninas, essa aqui é minha mãe — A apresentei com orgulho e vi os rostinhos de encherem de surpresa
— A senhora tem quantas tatuagens? — Uma das meninas perguntou
Minha mãe sorriu
— Senhora não, podem me chamar de tia Malau — Ela disse simpática — E acredita que nem eu mesma sei? Perdi as contas depois da número vinte — Ela deu de ombros
Marina assentiu e eu sorri abraçando minha mãe
— Que surpresa boa mamãe — Fiquei tão animada
— Estava com saudades — Ela disse enquanto estava abraçada comigo — Termine sua aula, não quero te atrapalhar — Se afastou um pouco de mim.
Assenti
— Vamos passar a introdução de quebra nozes? — Elas se animaram e voltei a caixa de som para então soltar a música.
~~••~~
— E aqui é o refeitório, a gente sempre oferece uma refeição pra elas — Eu estava apresentando o espaço aonde ficava a escolinha pra minha mãe.
As últimas crianças já estavam voltando pra suas casas pois já tínhamos encerrado os horários de aula.
— Está tudo lindo — Ela disse animada encarando o espaço
— Eu amo esse lugar mãe, é meu sonho sendo realizado — Falei tão feliz
Minha mãe assentiu
— É bom te ver feliz meu amor — Segurou meu rosto porém eu vi uma certa tristeza no rosto da minha mãe enquanto ela me encarava
Franzi a testa
— Mamãe eu estava morrendo de saudades, e eu tô muito feliz que você esteja aqui — Me expliquei — Mas porque exatamente está aqui? Se arriscando tanto? — Eu estava preocupada
Minha mãe suspirou
— A gente pode conversar na sua casa Clarissa? — Estava séria novamente.
Eu assenti
— Claudinha — Chamei atenção da minha amiga que estava ali junto a gente — Você pode fechar tudo pra mim? Amanhã eu pego a chave ou o Neto manda pelo... — Me interrompi quando vi que ia fazer uma bobagem.
Cláudia foi rápida em ver minha tensão
— Eu mando pelo Neto — Ela sorriu
Agradeci mentalmente a minha amiga
— Vamos? — Chamei minha mãe que apenas assentou calada.
~••~
Fomos o caminho todo caladas, não que fosse um caminho longo, minha casa não era distante da escolinha de forma alguma.
Assim que chegamos abri a porta e deixei que ela entrasse.
Minha mãe encarou em volta minha casa, era menor que a nossa lá na Rocinha mas era meu barraquinho.
— Mais sua cara impossível — Ela quebrou o silêncio que estava até já me deixando incomodada
— Não é — sorri
Coloquei a chave da moto em cima do armário
— Quer alguma coisa mãe? Acho que ainda tem cerveja na geladeira — Apontei pra cozinha
— Não, a gente precisa conversar — Ela disse séria
Fiquei um pouco tensa vendo a seriedade que minha mãe estava demonstrando.
— O que foi? — Perguntou preocupada
— Clarissa eu e teu pai já sabemos de tudo... Sobre você e o Digão — Ela disse de uma vez, sem rodeios.
Meu coração errou a batida no mesmo momento e minha única reação foi ficar travada no lugar
— C-como? — A palavra saiu dos meus lábios sem que eu nem tivesse mandado o comando
— Não importa como Clarissa, o que importa é que eu não te criei pra roubar macho dos outros minha filha — Minha mãe despejou aquilo em mim
Uma vontade de chorar e me explicar pra ela naquele momento surgiu em mim.
Eu podia não ter vergonha dessa história toda e sustentar minha banca pra todo mundo sabe? Mas não pra ela, não pra dona Malau ali na minha frente me olhando daquela forma decepcionada.
Minha mãe que sempre acreditou em mim, me deu forças pra seguir meus sonhos, sempre me apoiou em tudo, eu não tinha forças.
— Me desculpa mamãe — Foi o que consegui dizer a ela já sentindo meu peito apertar
— Teu pai tá tão decepcionado com tudo isso Clari, ele tá desnorteado — Ela balançou a cabeça em negação — Tu sabe que o Muka nunca quis essa vida pra tu Clarissa — Ela Suspirou
— Sei — Abaixei a cabeça
— Anda Clarissa me conta toda essa história — Ela pediu
~~••~~
— No começo mãe eu juro que não queria me apaixonar por ele, mas eu não me controlei — Abaixei novamente a cabeça
— Meu Deus parece que a história dessa família de tentar ficar com homem sem se apaixonar repete de geração em geração — Ela estalou a língua no céu da boca — A diferença é que nenhum deles era casado Clarissa
— Mãe eu sei, porra para de repetir isso toda hora
— Como eu vou parar de jogar na tua cara as tuas burradas garota? — Ela me deu um tapa na cabeça
— Olha se te faz sentir melhor, Digão foi corno ok, a esposa dele engravidou do Pietro — Eu tentei aliviar minha barra
Os olhos da minha mãe se arregalaram
— Como é a história? — Ela estava passada — E ele tá vivo?
Eu ri
— Tá, Digao não sabe que é dele — dei de ombros — E eu fiz por onde ele deixar a Flávia ir embora
Minha mãe balançou a cabeça em negação
— Eu estou sem ter o que falar agora Clarissa — Ela se levantou — Eu preciso processar toda essa história, preciso também encontrar o Muka — Ela encarou a tela do celular
— Como assim encontrar meu pai? — Estranhei — Ele e o Digão... — Me interrompi entendendo tudo de uma vez
Meu pai veio aqui no dia anterior falar sobre um carregamento que tinha pra fazer com o Digao, mas agora minha mãe aparece dizendo que eles sabem de toda a história.
— MÃE O QUE MEU PAI FEZ COM O RODRIGO? — gritei as palavras pra ela agora quem estava se fodendo pra respeito era realmente eu.
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Até que a Malau não surtou muito né kkk aonde será que o Muka levou o Digao e qual será a reação dele ao ficar de frente a Clari?
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