SEIS | Amigas por acaso, Irmãs por opção
Quer uma amizade dure um dia ou uma vida inteira, nenhuma é um engano.
Conheci a minha primeira melhor amiga no jardim de infância. Nos unimos por duas coisas em comum: cola glitter e a poltrona confortável, e nos tornamos "animigas", apenas três semanas depois. Aprendi assim uma lição crucial, vital, com aquela triste desilusão:
Encontrar uma 'amizade' verdadeira é difícil. Mantê-la é ainda mais.
No início, em seus estágios iniciais, uma amizade é frágil, delicada, mas cheia de potencial. Deve ser cuidada e alimentada, deve ter espaço para crescer, prosperar e florescer, com um toque suava, um segurar sem amarra, que não causa hematomas nem sufoca. Mas é fácil falar.
Essas conexões tortuosas se desenvolvem, à medida que crescemos, em geral, uma transição de quando passávamos mais tempo em encontros de mães e filhos, para quando escolhemos nossas amizades sozinhas, enquanto percorríamos o aterrorizante campo minado de garotos, problemas de pele e deveres de casa. E o que acontece depois da escola, quando não temos mais o tormento das aulas, ou a comiseração mútua dos amores platônicos e problemas com namorados, para nos unir?
É fácil entrar "numas" de ficar com ciuminho quando os nossos amigos se aproximam de outras pessoas. A gente se odeia por ter inveja, mas não tem jeito. É a vida, e ela pode aproximar ou afastar pessoas na marra.
Às vezes, apesar dos esforços, as amizades morrem. Essa é uma verdade inevitável, contra a qual é impossível lutar. Então, quando uma amizade chegar ao fim, não se deixe levar pela raiva ou entrar no joguinho da culpa por circunstâncias inevitáveis. Aceite a realidade como ela é —que essa pessoa entrou na sua vida por uma razão, propósito que foi concluído. Sorria pelo que vocês compartilharam, e abra o seu coração para a possibilidade da chegada de algo novo, e igualmente lindo.
E tem aquelas amizades — aquelas poucas e raras exceções—que não apenas sobrevivem, mas resistem.
Eu tinha quinze anos quando as conheci. Minhas Irmãs.
Eu havia chegado em Nova York, como todo ano, para passar o verão com uns parentes. Os dias do final de junho estavam quentes, mas sem umidade, e o céu estava tomado por um azul cor de brim. O sol, forte e quente, dançava sobre a minha pele até ela quase fritar. Como se os raios deslizassem pelos meus poros, me enchendo de luz e afastando todas as trevas das sombras que se grudavam em mim como teias de aranha.
Era um dia espetacular. Do tipo que cantarolava promessas e mudava a nossa vida inteira.
Eu estava na fila do Starbucks, com o nariz grudado em um livro, como sempre, quando um "broder" derrubou o Frapuccino de café com leite e mel na minha cabeça e começou a rir com os amiguinhos dele. Eu fiquei parada, paralisada em um quadro de mortificação, tentando me articular em movimentos hesitantes, enquanto a bebida gelada escorria pelo meu rosto, me ensopando de café e vergonha. Esse tipo de comportamento não era novidade para mim, mas com certeza não tornava a coisa mais fácil, toda vez que um babaquinha achava que seria hilário me humilhar.
Mas eu não trocaria aquele momento por nada, pois foi quando eu conheci a Shayne.
Assim como eu, ela era ...diferente, embora talvez a sua diferença não estivesse tão evidente na aparência, com seus cabelos castanhos longos, magra com traços simétricos, atributos que fariam com quem qualquer um a considerasse uma gata, mas que também chamava atenção das meninas, e sem uma tatuagem ou piercing no corpo (esses só começaram a surgir depois dos vinte).
Com uma ginga que emanava atitude e honestidade, ela foi me defender quando ninguém mais se atreveu; essa nerd tímida que ela ajudou a reerguer e limpar quando jogaram no chão por ser diferente.
Por me atrever a ser eu.
Depois de me limpar no banheiro, -- me dando uma blusa que ela tinha sobrando na bolsa para usar, -- ela me convenceu a ficar lá na pizzaria com ela. E me apresentou às outras meninas que se tornariam os grandes amores da minha vida. Minhas melhores amigas e minha família mais verdadeira.
Pelo restante daquele verão, eu fui capturada por um redemoinho de companhias femininas diferente de tudo que eu jamais conhecera. E todos os dias, eu me perguntava quando aquilo teria fim. Quando é que elas me descartariam tão rápido quanto me laçaram? Eu não era tão bonita, nem tão inteligente assim. Eu não era popular, nem confiante, nem interessante.
Ou pelo menos era o que eu pensava.
Até que as meninas me provassem o contrário, e quanto mais eu passava na companhia delas, mais eu passava a acreditar. A sonhar. A ter esperanças. À medida que os dias de verão chegavam ao fim, ficava mais difícil não perder aquele meu novo brilho. Talvez, por sentir a minha ansiedade, a Shayne propôs que fizéssemos um pacto de irmandade.
Estávamos na casa da família da Priya em Nova York. Os pais dela estavam passando as férias em Dubai, e contrataram uma acompanhante para ficar na casa com ela, a Ms. Mills. Como a Ms. Mills tinha uma quedinha por uma vodca com relaxante muscular, em um domingo à tarde, nós levamos uma garrafa de vinho Rosé para o segundo andar, na encolha, e nos apinhamos no closet gigantesco do quarto de casal; o lugar era maior do que o apartamento onde passei a infância. Naquele closet, nos enchemos de pizza gordurosa e bebemos o vinho gelado, cercadas por centenas de saltos stiletto maravilhosos.
Aquele espaço se tornou o nosso santuário particular, o nosso templo. Até mesmo a Shayne parecia estar igualmente atônita e encantada pela beleza daqueles saltos altos.
Juntas, brindamos ao final de um verão glorioso, a uma nova amizade (quer dizer...eu!), e para desejar boa sorte para a Caitriona, já que a família dela se mudaria para Paris no mês seguinte.
Foi quando a Shayne se sentou, o cabelo castanho todo bagunçado (como sempre naquela época), e no lugar de uma Bíblia, ela pegou o que se tornaria o símbolo da nossa revolução.
"Vamos fazer um juramento," ela disse, lançando seu olhar sério para cada uma de nós, o sotaque hispânico carregado pelo álcool, "que não importa o que aconteça, sempre seremos amigas. Não, mais do que amigas. Irmãs." Ela estava tão empolgada que tentou se levantar, mas só conseguiu cair de joelhos, segurando o Rosé em uma das mãos e o sapato na outra. Ela colocou o salto entre nós. "Eu juro, por esse Stiletto, lealdade às nossas Irmãs. Que este símbolo nos una, agora e sempre, para que nada possa quebrar o nosso voto. Nem distância, nem garotos, nem o que quer que a vida atire em nosso caminho. Unidas, seis por seis, não importa o que aconteça."
As seis bêbadas, rindo, nós juntamos as mãos uma em cima da outra, como atletas em um jogo importante, e fizemos um juramento de irmandade e fidelidade, de apoio mútuo, amor e união para sempre; um pacto sobre um par de incríveis saltos de verniz preto, com solas vermelhas como o pecado.
E eu, que sempre quisera uma "irmã", agora tinha cinco.
A Irmandade do Stiletto nasceu naquele momento. Nosso manifesto era simples, nossas regras, sagradas. Era a marca de um novo capítulo. Uma nova fase das nossas vidas.
E eu estava lá, naquele momento crítico da concepção. Como voyeur, assistindo aquelas garotas lindas se unirem, e seja lá por que motive, elas queriam que eu participasse. Elas me adotaram.
Às vezes eu imagino o que seria da minha vida, se não tivessem entornado aquela batida doce na minha cabeça. E se eu nunca tivesse conhecido a Shayne? E se ela não tivesse decidido me levar para o seu círculo de amigas, transformando a minha vida em algo muito maior do que a solidão e o isolamento no qual eu estivera tão imersa que estava me afogando?
Não daria para combinar seis garotas mais diferentes, se tentasse.
O prodígio, a independente Priyanka, indiana por parte de mãe e sueca por parte de pai, (Segundo os documentos do banco de esperma que ela encontrou aos doze anos), o chaveirinho, Caitriona, uma coreana adotada e criada por pais alemães, que citava a revista Cosmo como alguns citariam Sócrates. Isobel, a fofa, metade italiana, metade irlandesa, abandonada pela mãe aos sete anos (mais detalhes depois); Shayne—o membro relutante da realeza, pansexual de gênero fluido, que não dava para saber se era um mulherão de arrasar quarteirões ou um cara gatinho. Eshe, africana e filipina, com um rosto e corpo que se destacavam pela beleza, mas que não conseguia se olhar no espelho sem se odiar profundamente.
E tinha eu...
Tímida demais para formar frases, as minhas irmãs me chamavam de Silenciosa Seis; e mais tarde, virei Seis, já que eu não era mais tão calada.
Eu sei o que você está pensando. De todos os símbolos—por que Stilettos, esses instrumentos de tortura? Ícones de opressão feminina e masoquismo masculino? Algumas são de opinião, até bem forte, de que os saltos altos reduzem as mulheres a objetos sexuais. Nós discordamos.
#FeministasTambemUsamSaltoAlto
Afinal de contas, a Cinderela foi a primeira a ensinar para garotinhas que tudo era possível, seja tornar os próprios sonhos realidade ou dominar o mundo, com o sapato perfeito.
A palavra italiana stiletto significa adaga de lâmina fina que era usada no Renascimento. Um nome bem apropriado, já que mulheres ao longo dos séculos, brandiram seus stilettos exatamente dessa forma: como armas contra as feministas sofisticadas demais e homens sofisticados de menos. Armas contra expectativas de papéis sociais de gênero, e para lutar pela igualdade.
Símbolo de controle e repressão de outros tempos, nós resgatamos o stiletto e reivindicamos a sua natureza se símbolo de feminilidade para enfrentar o mundo en pointe, na ponta do pé, tal qual uma bailarina; andar de stilettos exige postura e precisão.
A via depois daquele verão foi difícil com cada uma indo parar em um canto diferente do mundo. Com isso, o MySpace, o Facebook e o Twitter ajudaram a reduzir toda a milhagem entre nós a quase nada. Nos mantínhamos em comunicação constante, e apesar dos fusos horários discrepantes, dos compromissos e das exigências da vida, os verões eram só nossos. Eram a hora de nos reconectar e nos redescobrir. Nós nos reuníamos, cada uma sendo a anfitriã da vez.
Até este ano. Esta seria a primeira vez em que algo maior do que o nosso amor e amizade mútuos nos separaria ainda mais:
A vida adulta.
Aquela perspectiva aterrorizante do início de carreira, com rotinas de trabalho de quatorze horas por dia, e salários ridículos, levantando voo do ninho familiar rumo a um "apertamento", e ter coisas como contas no nosso nome. Contas de água, de luz e wifi. Contas que chegam todo mês e se você não pagar em tempo hábil, levam a pessoas gritando contigo pelo telefone.
Quando se passa os sábados fazendo compras de mercado ou fazendo faxina e os domingos lavando a roupa, porque comer for a custa uma fortuna, ninguém quer uma mancha no chão do box e as suas roupas não vão ser lavadas nem passadas sozinhas.
Mas se tinha uma de nós que eu sabia que nasceu para vencer esse tipo de desafio, essa pessoa era a Priya.
Feroz. Inabalável. Dança como se ninguém estivesse olhando, adora tequila, coleciona fotos vintage de paisagens, sabe recitar Tolstoy de cor, e sempre chora no fim de Titanic.
Em nossos oito anos de irmandade, ela manteve os nossos pés no chão, concentradas e sempre apresentando o melhor de nós. Por causa dela, nós havíamos elaborado um plano, com base nas nossas ambições, e fizemos escolhas acadêmicas inteligentes, enfrentando mais alguns anos de inferno acadêmico, na forma de ensino superior, para chegar lá (exceto a Shayne, que se recusou a desperdiçar mais um segundo sequer com estudos, quando o coração dela estava no ringue). Era a Priya quem comandava as noites que viramos estudando, quem corrigia nossas redações, mandava citações motivacionais e emprestava o ombro e o ouvido quando alguma de nós surtava com o stress das provas ou quando os planos davam errado.
Se a Shayne era a fundadora da irmandade, a Priya então seria, com certeza, a espinha dorsal.
Ela nasceu para ser líder, e para usar qualquer cor de batom.
Principalmente se fosse vermelho.
***OBSERVAÇÃO***
A amizade é uma coisa linda. É algo que eu sempre lutei para ter. Eu era uma garota tímida, insegura, meio geek, com medo de olhar as pessoas nos olhos, quem dirá me apresentar a um grupo. Na adolescência, eu passei a maior parte da minha vida atrás de uma tela de computador, imersa nas minhas histórias.
Eu sei que vocês sabem como a vida de escritora pode ser isolada.
O que eu mais gosto do Wattpad são todas as pessoas incríveis, maravilhosas, que eu passei a conhecer, admirar, respeitar e valorizar, pelo seu apoio e carinho infindáveis. Que me apoiaram quando eu não conhecia ninguém, que pegaram a minha mão e me trouxeram para o grupo, como a Shay fez com a Seis. Que me deram a chance de fazer parte de algo, de uma oportunidade que eu poderia não ter tido.
Só para citar alguns:
E mais milhões que vou citar e tietar, à medida que a história for avançando.
Então, agora eu queria que vocês mandassem um oi para as suas Irmãs Wattpad (digo irmãs mas pode ser homem ou mulher) e os citassem nos comentários abaixo, para dizer o quanto vocês os valorizam e agradecem o seu carinho/apoio!
#JoinTheSisterhood (FaçaPartedaIrmandade!)
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