𝕮𝖆𝖕𝖎𝖙𝖚𝖑𝖔 11 - 𝕽𝖔𝖘𝖆 𝕭𝖗𝖆𝖓𝖈𝖆
"Eu deveria ser a sua salvação. O ar que invadiria seu fracos pulmões e que lhe faria flutuar sob o chão de espinhos. Eu te tiraria do fogo que queima sua alma e te elevaria para a superfície das águas calmas do paraíso. Mas minha covardia amarrou minhas pernas e apertou meu coração.
Me perdoe, minha luz, mas eu morri antes de chegar até ti."
Ivan Millborn
Brisa. Vento fresco muito comum em regiões à beira-mar. Brisa que beija meu rosto, agora molhado pelas gotas de orvalho que vem guiadas pelas folhas da árvore que me cobre, trazendo uma sombra muito agradável. Abro os olhos aos poucos até me acostumar com a luz do sol que faz a grama macia brilhar e as flores de perfume sutil ficarem mais belas. Me ajeito preguiçosamente para ficar sentado enquanto observo ao meu redor. O único som que chega em meus ouvidos vem das folhas das árvores que dançam com o vento. Está tudo em paz. A partir de tal deixa pacífica, decidi desfrutar do momento e me recostar na árvore, deixando meu corpo relaxar ao passo que observo o paraíso em que me encontro. Não sei onde estou, mas isso não importa, contanto que eu não precise sair daqui.
Estava quase entrando em transe com a calmaria profunda que de dominava quando escuto o som de passos. Não me levanto de imediato, mas volto a me sentar e começo a olhar para todos os lados, até que a origem do barulho aparece, mais linda do que nunca. Com os cabelos escuros levemente cacheados nas pontas e com um vestido de seda branco bem simples marcando sua cintura, Lucy surge tímida, com um sorriso tão encantador no rosto que faz eu me sentir tonto. Ela se aproxima e se agacha na minha frente com um olhar tão sereno quanto um mar calmo. Sei que a qualquer momento ela pode se tornar uma tempestade, mas eu quero correr esse risco. Segundos depois desse momento acalentador Lucy, minha Rosa Branca, levanta meu braço sem dizer uma única palavra para poder se deitar sobre mim, colocando sua cabeça em meu peito e logo em seguida abraçando minha cintura. Em um primeiro momento eu fico estático, sem saber o que fazer e com o coração disparado. Me pergunto se ela é capaz de ouvi-lo. Então simplesmente passo meu braço ao redor de seus ombros, abraçando-a, e assim nós ficamos, em um silêncio confortável, como se não precisássemos de palavras para nos entender.
Minutos depois, Lucy, muito assustada, se solta de meus braços e começa a tossir repetidamente e não demora muito para que ela comece a tossir sangue, deixando seu vestido, outrora branco como a neve, todo ensanguentado. Entro em desespero, mas não demonstro para não deixá-la mais nervosa. Me inclino em sua direção para oferecer ajuda, no entanto, ela coloca sua mão no meu peito para manter distância, e coloca sua mão direita dentro de sua boca, agora cheia de sangue, e tira de dentro da mesma uma rosa, uma rosa vermelha perfeita, que parece ter acabado de florescer. O terror se apossa de mim e sinto minha mãos tremerem e o ar começar a faltar em meus pulmões. Com a rosa em mãos, ela abaixa a cabeça e tosse mais um pouco, dessa vez foi uma tosse fraca.
— Lucy, está tudo bem? — Engolindo a seco o medo, eu tento me aproximar dela bem devagar e tocar seu ombro, mas, com um movimento muito rápido, sua mão esquerda segura meu pulso com toda a força, quase cravando suas unhas em minha pele, trazendo uma forte dor para o local. A dor se intensifica quando tento soltar meus pulsa e ela o segura com mais força, cravando de vez sua longas unhas em mim. — AAAH! Lucy, o que você está fazendo?! — Seu silêncio perdura e sua única atitude é estender a rosa sangrenta para mim como se quisesse me dar a flor.
— Você deve voltar para a sua casa... — Sussurra de cabeça baixa e com os cabelos soltos cobrindo o rosto. Sua voz é tão fraca que mal consigo ouvir o que ela disse.
— Como?
— VOLTE PARA CASA!
Abro meus olhos e logo me sento desesperadamente para olhar ao meu redor, enquanto seguro meu pulso ''machucado''. Estou em meu quarto. Foi tudo um pesadelo.
— Que merda foi essa? — Murmuro para mim mesmo, tentando assimilar esse sonho e falhando miseravelmente. Na expectativa de esquecer isso, me levanto da cama e vou para o banheiro começar o meu dia. Minha perna direita, que foi o lugar mais afetado pelo acidente de carro, ainda dói um pouco quando ando, mas nada insuportável para alguém se saiu do hospital há dois dias. De acordo com os médicos, é um milagre que eu esteja tão bem, visto que a forte batida poderia facilmente ter me matado. Eles ainda não acharam explicações para a minha resistência tão forte, em especial no fator cerebral, já que, aparentemente, eu manchei bem o asfalto de sangue com um ferimento na cabeça que estava cicatrizado quando cheguei ao hospital.
Estamos em pleno sábado de verão e o sol lá fora está rachando. Uma piscina cairia bem. Mal terminei de pensar isso e já recebi uma mensagem de Eric, meu colega de sala. Ele está me chamando para ir em um clube aqui da cidade. Pondero o convite e pergunto se terá muita gente lá. Entende no mesmo momento o por quê da pergunta, ele me confirma que o clube raramente tem mais de dez pessoas, o que me faz aceitar o convite e ir arrumar as poucas coisas que vou levar enquanto passo o endereço do lugar para minha mãe.
Estava quase saindo quando lembro de pegar meus óculos escuros. Odeio ter que usá-los por cima dos de grau, mas eu odeio ainda mais os olhares de medo e reprovação que me lançam quando veem meus olhos.
Chego lá e encontro meu colega encostado em muro ao lado da porta de entrada do clube, ele acena para mim e nós entramos conversando. O lugar é muito bonito. Atrás da porta tem um corredor ao ar livre que dá lugar a uma fileira de grandes árvores que fazem uma sombra extensa. Ao reparar nesse detalhe das árvores eu balanço levemente minha cabeça para espantar as lembranças do pesadelo horrível de hoje. Passamos pela secretária e não demora muito para chegarmos na piscina, onde, para a minha sorte, está vazia.
— Por que não tem ninguém aqui? — Pergunto para Eric, que está colocando suas coisas em cima de uma cadeira de descanso enquanto eu me sento na ponta de uma espreguiçadeira de plástico.
— Por que aqui na cidade, nos dias de calor as pessoas vão para um outro clube que tem um monte de tobogã, escorrega e tudo mais. Nós não gostamos de ir lá justamente por conta da quantidade de pessoas.
— Faz sentido... — Definitivamente aqui é bem melhor, muito mais tranquilo. — mas como esse clube ainda não faliu se não vem ninguém?
— Eu não faço ideia. Acho que é porque esse clube é meio municipal, mas o motivo real eu não sei.
— Hum... e cadê o resto do pessoal? — Indago, olhando a nossa volta
— As meninas estão se arrumando e o Jean tá lá na porta do banheiro fofocando com elas. — Eric responde, ainda de costas para mim, agora mexendo no celular.
— Ele anda bastante com as meninas, né? — Paro para pensar nessa fala. — Eric, o Jean é gay? — Ele para instantaneamente de mexer no celular e se vira para mim com uma expressão tensa e séria que toma todo seu corpo.
— Sim. Isso te incomoda? — Afirma cruzando os braços enquanto os olhos verde escuro queimam em minha direção, claramente na defensiva.
— Não. — Sou direto. — Por que isso me incomodaria?
— Que bom! Te perguntei isso porquê o Jean já sofreu alguns ataques homofóbicos muito fortes, então a gente tem medo que isso aconteça de novo. — Eric suspira fortemente, esquecendo minha pergunta, e volta a relaxar e parece estar aliviado com isso.
— Para mim isso é coisa de gente enrustida que tem medo de se assumir e gosta de ser maldoso. Tipo, e daí que a pessoa é gay, hétero, bi e mais o que tiver? Ela continua sendo um ser humano e merece respeito como tal, sabe?
— Exato! — Ele diz isso e logo após nós pulamos na água.
Não demora muito para o resto do pessoal chegar. Lucy, como sempre está muito arrumada. Mas o que mais me chamou atenção é a roupa que está usando. Uma saída de banho branca que vai até à metade de suas coxas e que é muito parecida com a roupa que ela usava no meu sonho, a única diferença é que esse roupa de agora é de tricô e tem vários espaços entre as flores bordadas que mostram sua pele. Ela está linda.
— Não sabia que viria. — Comenta Lucy, que está sentada na minha frente, com pés na água e um sorriso avassalador que me faz estremecer. Agora eu entendo porque o Saulo gosta dela.
— Fui chamado em cima da hora. — Olho para o seu braço e percebo que está machucado. — O que aconteceu com o seu braço?
— Nada, eu só me arranhei em uns galhos. — Justifica, parecendo ficar atordoada em falar sobre o assunto. Mas se esqueceu de um detalhe, ela, aparentemente, não sabe mentir. Não vou insistir agora, mas vou ter a verdade uma hora ou outra.
— Vai entrar, Lucy? — Pergunta Carla, que eu nem tinha percebido entrar na água.
— Não — Ela se levanta e vai até uma das espreguiçadeiras, enquanto tira sua saída de banho, revelando seu corpo cheio de curvas em um maiô verde água com decote em V. — Vou tomar um sol primeiro, estou muito branca.
— Concordo, você está parecendo o Edward do crepúsculo hahaha — Diz Eric, em zoação. Achei que ela ia ficar chateada com esse comentário, mas vi que levou na brincadeira, já que só o mandou ir à merda e riu junto com os outros.
Passamos uns quinze minutos na água, até que, ao olhar para um pequeno jardim que tem um pouco mais à frente da piscina, vejo um homem muito estranho. Por ser muito alto, ele passa a sensação de ser magro demais para a sua altura. Tem cabelos que vão até um pouco a baixo do pescoço que está preso para atrás com uma tiara tão preta quanto a roupa de couro que usa. Com uma expressão séria e fria ele fixa seus olhos verdes brilhantes em mim, como se fosse me metralhar com o olhar.
Olho para o pessoal com a esperança que alguém tenha visto o mesmo que eu. Uma tentativa em vão, já que ninguém parece ter notado a presença daquele homem esguio. Me viro para na direção do homem, mas ele sumiu, não está em nenhum lugar ao redor da piscina ou da lanchonete. Eu devo estar ficando louco. Mergulho na água para esfriar minha cabeça e esquecer tudo isso. Outra tentativa falha, passo o resto do dia pensando nisso e parece que eu só posso fazer uma coisa, descobrir o que está acontecendo.
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