Das trevas para a luz (parte 1)
Romênia — 1456
I can't see you
(Eu não te ouço)
I can't hear you
(Eu não te escuto)
Do you still exist?
(Você ainda existe?)
Poc – poc – poc — a cada trotar que seu cavalo dava rumo ao Castelo, mais seu coração acelerava. Seus cabelos louros, salpicados com o sangue de seus inimigos, chicoteavam ao vento junto à crina negra do cavalo; a armadura pesada não a fazia parar, pois seu desejo de reencontrar seu amor era enorme.
Uma promessa verdadeira, em momento algum pode ser quebrada. Um sentimento sincero e verdadeiro deve ser regado para que seja frutificado cada dia mais, para que seja eterno. Quem ama não quebra promessas; quem ama move forças apenas para ver bem; quem ama não quebra coração. Em seu peito, o coração acalma e vibra intensamente apenas com um simples sorriso de seu amor, mesmo que precises fazer um enorme sacrifício. E aquele era o arrebatador amor que Jennifer e Lana possuíam... O mais belo romance visto. Um amor no qual havia sacrifícios, lealdade, promessas cumpridas. Havia a verdadeira e pura ligação em seus espíritos. Ligação que nem mesmo a morte pôde quebrar.
Prometera à Lana que retornaria assim que vencessem a batalha. O Centro-Sudeste do país ganhou naquela tarde um cenário terrível: soldados Turcos empalados em enormes lanças. O exército que perdera realmente era enorme, no entanto, seu exército vencera a enorme batalha. Sendo assim, após a vitória, Jennifer deixara seus homens no acampamento para descansarem e retornarem à Romênia quando o sol raiasse, na manhã seguinte. Cavalgara, então, na mesma tarde, sem descansar até o anoitecer chegar e finalmente regressar a sua cidade.
A alegria resplandecia em seu âmago, palpitando depressa o coração, ansiando em abraçar a família que tanto amava. Passar pela pequena cidade de Bucareste, e, em seguida, pelo pequeno povoado de Brasov, apenas indicava que faltava alguns poucos quilômetros, fazendo-a enxergar o alto da torre por trás das árvores da floresta.
— Estarei aqui te esperando... Volte assim que terminar a batalha, por favor. — recordou-se ao olhar seu castelo ao longe, e não avistar ninguém para recebê-la. Seu coração apertou-se em preocupação, fazendo-a acelerar ainda mais em seu cavalo.
A distância, embora fosse pouca, parecia grande dada a necessidade de chegar e ter certeza de que estava tudo bem. Galopava passando pelos poucos troncos de árvores caídos ao caminho daquela trilha, escutando absolutamente nada além do trotar. Apenas a calmaria da noite junto ao som das cigarras, enquanto a lua subia aos céus, dando a esplêndida visão de um céu alaranjado, despedindo-se da tarde, tornando-se negro com a noite.
Seu cavalo parara quando chegara em frente à grandiosa ponte de travessia até o Castelo. O animal pudera sentir uma presença ruim, de perigo, que a loura não conseguia sentir. À vista disso, Jennifer descera às pressas e correra o mais rápido, como se sua vida estivesse correndo perigo – e de fato estava, pois, toda sua vida estava ali, naquele lugar –, até adentrar os enormes portões.
— Lana! — exclamou logo ao chegar ao pátio do Castelo. Um grande deserto, sem indicar presença de pessoa alguma. — Lana, meu amor, eu voltei para ti como havia te prometido! — anunciara ainda mais alto, sem conseguir esconder a preocupação.
O vento assobiava tristemente, como se uma tempestade estivesse por vir, tão lamentável quanto seu coração, ao levar seu amor para sempre; por mais de quinhentos anos. A corrente de ar percorria vigorosamente adentro do Castelo, e assobiava conforme se chocava entre as árvores e o entrar e sair das incólumes telhas alaranjadas.
Tenebrosidade total. As estátuas decorativas formavam um cenário aterrorizante, congelando seu estômago e arrepiando sua espinha, dada a falta de castiçais acesos. Um enorme castelo tomado pela escuridão, iluminado apenas pela fraca luz da noite, exceto a torre mais alta – onde o casal dormia em todas as suas noites –, que estava acesa.
Onde pudera estar os guardas que deixei no Castelo? — pensou. — E Killian junto de Alice, a nossa pequenina?
Um grunhido de alguma pessoa ao longe pudera ser escutado.
— Lana? — correra outra vez, desta vez, subindo os degraus da escada, e seguira o corredor até chegar à primeira porta. Um de seus guardas jazia sobre o piso de madeira, coberto por sangue. — Não... Não! — pudera ter sido dele os grunhidos que ouvira. No entanto, isso só indicava que sua Lana corria perigo. — Alice! Lana! — gaguejava, sentindo pela primeira vez seu corpo tremer de medo.
O medo e a impotência eram os únicos sentimentos que subiam em seu coração, e percorriam suas veias, envenenando sua mente. Drácula não conseguira proteger sua família. A segurança e a confiança se esvaíram desde o momento em que notara seu lar, que era tão bem iluminado e cheio de vida, tão morto. A única coisa que ecoava em sua mente era o nome daquela maldita Ordem do Dragão.
O que mais temera estava acontecendo, assim como sua esposa alertara. Os olhos enchiam-se de lágrimas, o corpo estremecia, o suor causado pelo medo escorria em sua face. Como um sinal de alerta, Jennifer empunhara a espada caso esbarrasse com alguém que não fosse de seu castelo.
Ela correra depressa por todo o enorme local em que morava, a fim de encontrá-las. Atravessara corredores e salões de bailes, vazios; atravessara a impecável sala de jantar, também vazia; o salão de festas e bailes, onde ficava guardada a harpa que Lana tanto adorava, mas, como sempre, apenas a harpa e a descomunal sala, pintada em tons dourados e composta por espelhos cintilantes, estavam ali. Seu coração encheu-se de angústia. Ver seu império acabar daquele jeito; ver seu lar destruído por seus inimigos; e, o pior de tudo, a falta de notícia de seus maiores tesouros.
— Minha Senhora... — ouviu, então, a voz de uma de suas cozinheiras ao chegar à cozinha, passando as mãos em seus cabelos, expondo o cansaço e desespero. — Estás viva. — disse fazendo reverência.
As órbitas lacrimejadas e exaustas de Jennifer avistaram, ao canto da cozinha, uma baixinha senhora rechonchuda e pele rosada – a mesma que sempre fizera biscoitos que Alice tanto adorava.
— Mas é claro que estou. — sussurrou, forçando um sorriso. — Por que me perguntas isto?
A mulher encolheu-se, aproximando-se para sentar ao lado da guerreira.
— Os turcos, minha Senhora. — a senhora respondeu vagarosamente, temerosa. Escondera-se e não saíra por nada daquela cozinha, e deveria continuar escondida. Entretanto, estava disposta a dizer tudo o que acontecera à Jennifer. — A Senhora ausentou-se para a batalha há algumas semanas, e, embora tenhas deixado soldados de teu exército aqui, infelizmente não foram o suficiente. Alguns soldados da Ordem Sagrada do Dragão te acompanharam, enquanto outros estavam fora da cidade à serviço da igreja. — a senhora concluiu, porém, ainda não havia terminado o que tinha a dizer. Jennifer a olhava ansiando por não ouvir o pior, pois jamais se perdoaria caso algo acontecesse com Lana e Alice. — Este fim de tarde recebemos uma carta vinda da guerra.
— A carta que anunciara nossa vitória? — indagou a loura.
— O padre recebeu a carta oficial, enquanto a outra foi entregue às mãos de Lana... A carta anunciara tua morte pelas mãos dos Turcos. — levou a mão até a altura do coração, deixando seu corpo amolecer e cair sobre o chão, sentando-se. Lana achava que ela estava morta. Perguntou-se qual pudera ter sido a reação de sua esposa. Matar-se, como dissera? — Desde o recebimento das cartas, eu não retornei a ver o rosto de tua esposa, Senhorita Morrison. Ela trancou-se em teus aposentos.
— Lana está em nossos aposentos? — perguntou esperançosa. — E quanto à Alice? Ela ouviu os boatos?
— Minha Senhora, após o recebimento das cartas, alguns homens anunciaram a notícia para a cidade... Muitos de nossos guardas e servos fugiram imediatamente temendo uma invasão inimiga. — respondeu cabisbaixa. — Todos estavam com bastante medo de o que pudera acontecer. Lana, Alice e Killian permaneceram aqui no castelo, mesmo após a fuga dos guardas.
Então... Eles estão aqui, e estão bem. — Jennifer pensou, finalmente suspirando em alívio, e despejando em forma de lágrimas todo aquele desespero.
— Entretanto, minha senhora, no início da noite cavaleiros negros invadiram o Castelo. Saíram silenciosamente de dentro da floresta, aproveitando que não tínhamos mais guardas. — a expressão aliviada da loura desaparecera, assim como havia surgido. — Alice estava dormindo no momento da invasão... E Lana ainda estava em seus aposentos. Escondi-me aqui até agora, pois eles mataram todos os guardas restantes... Assassinavam todos os que encontravam.
Seu mundo desabou bem em sua frente. Como os Turcos poderiam ataca-los se estavam no campo de batalha?
— Os Turcos? — perguntou, e a cozinheira assentiu. — Tens certeza? — perguntou outra vez, com a voz embargada, observando a cozinheira assentir novamente.
— Minha Senhora, todos sabem que teu ponto fraco são tua esposa e tua filha... Creio que os Turcos planejaram tudo. Quando retornastes da batalha, perceberias que eles não perderam totalmente a guerra, mas, sim, a Senhorita... — Jennifer concordara com tudo aquilo, aliás, fazia sentido. Ela se enfraqueceria sem o que mais lhe importa. — Vá, Senhorita Morrison, procure-as aqui pelo castelo. Lana conhece os túneis e passagens escondidas, então há chances de terem escapado.
O som dos passos apressados sobre o assoalho mesclava-se ao som das batidas de seu próprio coração, apressado como se quisesse sair de seu peito. As pernas fraquejando, impedindo-a de chegar ao quarto de sua pequenina mais depressa, assim como suas pesadas armaduras e o cansaço de dias em batalha ajudavam em sua exaustão.
Até alcançar a torre em que a pequenina Alice dormia, Jennifer percorrera um dificultoso caminho até lá. Desviou-se de alguns corpos espalhados pelos pisos, subia as escadas estreitas e íngremes, atentando-se a cada movimento na suspeita de que pudera ser seus inimigos.
— Alice, minha pequenina... — sussurrou, girando lentamente a maçaneta da porta.
As janelas da torre encontravam-se abertas, as cortinas esvoaçavam ora para dentro, ora para o lado de fora, conforme o furioso vento chegava ao seu encontro. Os finos lençóis de cama bagunçados junto ao cobertor, quase caído ao chão.
Ela não está... — analisou desesperadamente, circulando o olhar por toda a extensão da enorme torre. Pela bagunça encontrada em sua cama, em seu leito, tudo indicava que Alice dormia durante o ataque, e possivelmente levantou-se amedrontada durante a noite. — A pequena Alice... frágil e inocente, certamente acordara e correra ao encontro de Lana! — juntou as peças, animando-se ao correr outra vez, agora rumo à torre mais alta do Castelo de Bran.
A baixa luminosidade que tomava conta de toda a parte interior do Castelo dificultava sua visão. O frio percorria junto ao assobio do vento e sons de galhos das altas árvores arranharem as vidraças de algumas janelas, e gelava ainda mais sua alma ao enfurecido vento de uma forte tempestade adentrar as sacadas do Castelo.
Subia devagar, por conta da estreita largura das escadas, que levavam até seus aposentos, e piorara ainda mais ao deparar-se com um soldado morto no meio dela. A porta entreaberta, e os feixes de luz saindo pela brecha e iluminando a escuridão ao lado de fora; a única luz em meio ao breu, às trevas em seu derredor.
— Lana, meu amor, eu venci. — afirmou esperando que seus bens mais preciosos estivessem ali, escondidas, esperando-a. — Alice?
Jennifer estava cansada. Guerreara como nunca numa das mais sangrentas batalhas, durante semanas distante de seu lar, e cavalgara o mais depressa assim que levantaram a bandeira de vitória. Deparou-se com seu lar abandonado e aterrorizante; correra por todo o castelo em busca de sua família. E não conseguiu.
"Eu não conseguiria viver sem ti." O sentimento da memória que tais palavras lhe causava era, infelizmente, tão dolorosa que devastava seu âmago. A sacada tão visível, que parecia ter sido a primeira opção que Lana tivera. Não, Lana jamais deixaria Alice, pensou cambaleando com as lágrimas esguichando de seus olhos, até esbarrar no criado mudo e avistar um bilhete.
— Não... — pronunciou, sentando-se sobre a cama. Seus olhos passavam rapidamente a cada palavra de despedida escrita naquele papel. — Por que não consigo acreditar que fizestes isso? — sussurrou entre soluços ao pôr a carta sobre o criado mudo outra vez, levantando-se titubeante, debruçando-se na sacada. — Lana... Por quê despedistes de mim? Deixou-me sozinha, sem ao menos saber onde está nossa filha. Por favor, volte para mim. — clamou choramingando e observando a altura de oitocentos metros daquela torre até o Rio Arges, onde as águas se chocavam com as pontiagudas rochas. — Sei que não fizestes isso, sendo assim, por onde andas? O que os Turcos lhe fizeram?
Após muito chorar, suas cordas vocais encontraram forças para dar o último brado estrondoso demostrando a dor que sentira naquele instante; estrondeando o eco de suas súplicas por todo o Castelo.
Pela primeira vez em anos, Jennifer sentiu o vazio tomar conta de si outra vez; no entanto, desta vez, seu coração parecia rasgar-se e toda a felicidade esvair-se junto à esperança de amar Lana outra vez. Pois, embora não soubesse o paradeiro de seu amor, tinha certeza de que jamais retornaria a vê-la com vida. Uma vez que, se estivesse sob domínio dos Turcos, aceitariam libertá-la apenas se Jen se rendesse e morresse por suas espadas; e mesmo assim, a probabilidade de não libertarem Lana após sua execução era enorme. Entretanto, embora ainda tivesse altas probabilidades de não libertarem sua esposa, aguardaria o recado de seus inimigos e com toda certeza se entregaria sem relutar.
— Jennifer Morrison. — o som de passos lentos se aproximando e a voz familiar despertou-a de toda a sua dor. — Não esperávamos que chegastes hoje, minha Senhora.
Vagarosamente, pôs a mecha de seu cabelo que saia sobre seu rosto atrás da orelha, reconhecendo alguns soldados que adentravam em seus aposentos.
— O que fazeis aqui? — analisou friamente os homens, alguns encapuzados e outros de armaduras como vestimentas.
Lana avisara que aqueles homens poderiam armar algo contra minha família. — recordou-se ao se levantar rapidamente, dando passos furiosos sobre a molhada sacada de sua torre, indo em direção aos "companheiros" que conhecia tão bem. Subindo as escadas, surgira em seus aposentos um cavaleiro da Ordem Sagrada, Robin Locksley Mills, com uma longa espada em mãos. Não foram os Turcos, jamais.
— Retornamos mais cedo de nossos afazeres em outras cidadelas. — respondeu Robin com um repugnante sorriso vitorioso em sua face, formando uma pequena ruga na ponta de seus olhos azuis cintilantes. — Esperávamos teu retorno amanhã após o meio dia.
A mente de Jennifer rodava a mil, fazendo-a recordar do grande temor que sua esposa possuía por aquele homem e por todos os outros membros da ordem, assim como ela mesma tinha bastante cautela quanto a eles; a coincidência de terem chego cedo de suas viagens.
— Todos estavam cientes de tua ausência, Senhorita Morrison. À vista disso, eu e os soldados do Dragão viemos para verificar... — o homem observava alegremente o semblante entristecido da loura a sua frente, lembrando-se do olhar assustado de Lana ao vê-lo. — Viemos verificar como estava a tua família... Lana, Alice, Killian. Infelizmente não retornamos a tempo de impedir que tua amada pulasse daquela sacada.
— Não! — vociferou, dando passos apressados, pegando a espada que deixara ao chão quando adentrou ao quarto.
Olhou-os, então, apontando a espada para os homens.
— Não acreditas que Lana fizera tal ato? — questionou o padre. — Gostaríamos que soubesses que a mesma escreveu uma carta para ti... Podes verificar. É a letra dela.
— Eu a conheço! — esbravejou, a mão trêmula segurando a espada.
— Ninguém conhece totalmente ninguém. — retrucou o padre, pondo uma de suas mãos dentro de seus trajes religiosos. — Não te preocupes, Drácula, pela manhã iniciaremos as buscas nas margens do Rio Arges. Entretanto, devo lembra-la que será uma missão difícil, uma vez que possui trezentos e cinquenta quilômetros de extensão... Nasce numa cordilheira no centro da Transilvânia, aqui em Romênia, chamado de montanha Fagaras, e atravessa os condados de Arges, Dâmbovita, Ilfov, Giurgiu e Calarasi.
Jennifer observava desconfiadamente para cada um ali presente. Questionava-se de tudo o que estava acontecendo naquele instante, já que no bilhete que Lana deixara não mencionara detalhadamente um suicídio. Mencionara, sim, que quando retornasse da batalha ela estaria morta... E, em seguida, uma despedida de arrancar seu coração ao lê-la.
Terias, então, a Ordem empurrado Lana da sacada? — pensou, semicerrando os olhos para todos os homens encapuzados e armados ali.
— Infelizmente, se obtivermos sucesso e encontrarmos o corpo de Lana, não poderemos sepulta-la em nome da igreja. — Robin de Locksley Mills deu três passos à frente, aproximando-se da loura. — Sabes que suicidas não são merecedores de um enterro digno.
— Ela merece o melhor, Locksley. — respondeu entredentes. — Não há nenhuma Ordem ou lei que me impeça de dar o melhor para a minha esposa... Mesmo que tenhas morrido.
— Nós tentamos defendê-la, chegar a tempo... — o padre falava tristemente, aproximando-se da guerreira, e, em seguida disse as próximas palavras em tom furioso ao pegar uma pequena adaga que escondia em suas vestes. —..., mas agora podes juntar-se a ela!
Numa velocidade extraordinária, Jennifer virou-se a tempo de dar um chute aéreo em seu abdome, empurrando o padre para trás. O olhar desesperado, vendo-se cercada por cerca de dez homens, alguns armados e outros não.
— O que fizéreis com Lana? — bradou, passando a espada por trás do padre, fazendo-o cair ensanguentado no chão.
— Não fazemos ideia de qual fora o destino da moça. — respondeu Robin tranquilamente.
Um grito histérico saiu de sua garganta, descontando todo o ódio que crescia em seu interior, fazendo-a avançar ferozmente contra os soldados da Ordem Do Dragão. Pela primeira vez em toda a sua vida, seu corpo não obedecia a seus atos enquanto sua mente programava flashes de momentos com sua amada. Os Turcos não haviam atacado o Castelo naquela noite; Lana não poderia ter se jogado daquela sacada... E ela sempre soube que aquele dia poderia chegar.
Os membros movimentavam-se em alguns grupos, de dois em dois, armando-se em direção à loura. Seu corpo cercado por homens furiosos e pelos móveis daquela torre, fazendo-a perceber que não havia modo de escapar. Enquanto segurava a longa espada, os guardas foram para cima dela, para golpeá-la em desvantagem, mas Jennifer desviou-se para o lado dando um golpe mortal na cabeça de um dos homens; o outro, no entanto, levantou-se para avançar novamente, enquanto outro homem se preparava para lutar contra ela, no entanto, a loura pegou uma pequena adaga que guardava presa em sua armadura e lançou ao ar, mirando no pescoço do soldado – uma vez que, algumas armaduras eram totalmente desprotegias na região do pescoço.
— Agora percebo por qual motivo és considerada a maior inimiga dos Turcos... — Robin Locksley Mills disse, andando em volta da luta que ocorria ali. — Devo parabenizá-la, Drácula, tu lutas muito bem para uma simples mulher.
O cansaço de abatia sobre a guerreira, que há horas antes encerrava uma batalha, e naquele instante encontrara outra em sua própria casa. Sabia que, por estar exausta, não venceria contra todos aqueles homens.
— Psicopata! — gritou se referindo a Robin Locksley. — Estás fazendo isto por não conseguir o amor de Lana? Deverias ficar contente apenas em vê-la feliz.
— Não fazes ideia de como a amo.
— A ama tanto, que não pôde suportar o fato de outra mulher estar fazendo-a feliz; A ama tanto que a matou por isso! — retrucou.
— Eu não a matei, Drácula. — o homem gargalhou, fitando os orbes esverdeados. Soava sinceridade em seu olhar, o que deixou a guerreira confusa. — Nenhum de nós tirou a vida de Lana, podes ficar tranquila quanto a isso. — afirmou ao longe, como um telespectador de toda covardia contra Jennifer.
Em passos fortes, fora a vez dela de avançar em desprevenido contra um dos homens que seria um dos próximos a ataca-la. Acertou-o no nariz, fazendo-o cair dado o empurrão que recebera em desprevenido, esmurrando-o até quebrar o nariz.
O outro soldado avançou também, erguendo a espada contra a de Jennifer, que estava ainda ao chão. O som do confronto entre as lâminas tilintava entre aquele âmbito, ecoando pelas escadas do Castelo de Bran, assim como os gritos perturbados da loura.
— Covardes! — esbravejou sentindo o suor porejar em sua pele.
O descompasse de seu coração indicava o temor sentido naquela noite, principalmente quando o soldado que a confrontava empurrava a espada contra ela, só não a acertando, pois, a mesma impedira com a própria espada. No entanto, seu olhar permitiu-se direcionar para os outros guardas, percebendo, então, que um outro caminhava em sua direção. À vista disso, Jennifer inseriu um chute na tíbia do homem, fazendo-o cair, e, em seguida, se levantou com a espada, acertando-o.
E, assim, entre golpes acabara com três grupos, faltando apenas seis membros naquele local.
O próximo soldado que se aproximava vagarosamente possuía o dobro de seu tamanho, e não aparentava estar cansado, diferente de Jennifer.
Deixaram-no por último para que me derrotasse. — pensou, engolindo em seco e tentando se manter de pé, a visto que não tinha mais forças pelo cansaço.
— Renda-se, Drácula. — ordenou o soldado.
— Nunca! — respondeu, fazendo-o apressar pouco mais os passos.
Naquele instante, a visão de Jennifer era apenas a de alguns membros telespectadores de fundo, exceto Robin, que durante o confronto a loura não percebera para onde fora, e, em sua frente, o soldado que não mostrara a face correra para cima dela. E, no entanto, quando o homem estava quase próximo a ela, a loura fora surpresa por um adversário, que deu uma forte investida em seu pescoço, fazendo-a desmaiar.
— Durma bem, Jennifer Morrison. — sussurrou Robin ao sentir o corpo da loura amolecer-se em seus braços, em seguida, deixou-a cair no chão.
As recordações do nosso passado dizem quem nós somos; refletem nossa verdadeira essência, e muitas vezes servem como aprendizado para a vida. As recordações e as consequências delas, nos tornam quem realmente somos...
Memórias da última batalha agitavam sua mente, como uma tempestade agita um barco até afunda-lo. Gélidas correntes apertavam seus pulsos, assim como o escuro frio congelavam sua alma naquele porão da antiga capela em que os membros da Ordem puniam seus infiéis.
— Lana? — sussurrou ao recobrar a consciência e abrir com dificuldade seus olhos. A garganta seca a deixava sufocada, junto com a falta de arejamento naquele recinto. — Alice... — choramingou, lembrando-se de retornar após a batalha e não as encontrar.
Puxou os braços, sentindo as algemas apertarem seus pulsos, ao ouvir os passos no assoalho. Aquele local era reconhecido por ela. Era a maldita capela abandonada aos derredores da região de Brasov e Bucarest; a mesma em que a Ordem queimava mulheres acusadas de bruxaria.
— Tua família não foi encontrada, Jennifer. — o homem responde descendo a escada do porão, analisando o rosto da loura.
Um zumbido cessava lentamente de seu ouvido, assim como a visão deixava de estar embaçada, fazendo-a se recuperar gradualmente dos efeitos físicos do ataque.
— Jennifer? — a voz alta e clara soou, enquanto as mãos largas erguiam seu rosto. — Sabes quem sou?
— Robin Locksley Mills, responda-me onde está minha família!
— Vejo que se recorda de mim e de tudo o que ocorreu. — a voz era suave e calma, como se estivesse com uma tranquilidade sem igual, embora parecesse prender o choro dado o tom embargado de sua voz. — Isto é bom... Pensávamos que não acordarias, mas felizmente acordastes. Teus pais estão preocupados.
— Impossível! Meus pais estão em viagem. — afirmou.
— Lembre-se de que boatos correm rápido, Jennifer. — o homem comentava, observando em contemplação a lâmina ensanguentada da adaga em suas mãos, limpando-a com um pano, até fazê-la cintilar. — Teus pais receberam a notícia do ataque ao Castelo, e retornaram ontem. — sorriu vitorioso ao perceber o olhar confuso de Jennifer. — Sei que deves estar confusa, mas teu Castelo foi atacado três noites atrás. Todos teus soldados retornaram da batalha, e decretaram sete dias de luto... Mal sabem eles que estás viva. Imagines, Jennifer, a reação ao vê-la retornar para o lar.
— Então... Não morrerei? — balbuciou, olhando-o nos olhos sem entender o porquê a prenderam e a libertariam sem matá-la.
O homem não parara um momento sequer de limpar a adaga, que minutos atrás estava pingando em sinal de tê-la utilizado recentemente. Em seguida, novos homens encapuzados desceram ao porão, trazendo uma tigela com um líquido não distinguido por Jennifer no momento.
— Teu castigo será outro, loirinha. — respondeu deixando um ar de mistério. — Irei te adiantando sobre os últimos acontecimentos, estamos entendidos? — a loura suspirou e assentiu. — Como eu lhe disse, teus pais e teus soldados estão de luto pela tua família. Dizem que tu, assim como Lana, Alice e Killian estão mortos. Sabemos que pelo menos tu estás viva.
— Não... — sussurrou pausadamente, num suspiro vagaroso, quase que perdendo o ar. — Lana, Killian, tampouco Alice estão mortos! Digam-me que estão bem!
— Não há sinal de nenhum deles desde aquela noite. — Robin de Locksley finalmente terminara de limpar a lâmina da adaga, para, em seguida, levantar-se arranhando a ponta do espadim sobre o chão. — Lana desapareceu após deixar a carta de suicídio para ti, e, mesmo com todas as buscas pelo Rio Arges, o corpo não foi encontrado até agora. Alice e Killian, no entanto, é como se tivessem desaparecido sem deixar rastros.
Os olhos se fecharam, fazendo-a entrar temporariamente em recordações de Lana; a mulher mais bela, sorridente e vívida que conhecera em toda a vida. A mulher que a livrou das trevas de seu passado, que a curou com toda aquela luz que cercava a morena.
Seria muito mais fácil aceitar a morte, se tudo o que lhe disseram for real, uma vez que toda sua vida e toda a família que construíra acabou-se.
— Vamos, matem-me! — rendeu-se para todos os membros. Era vergonhoso o estado em que se encontrara, era enlouquecedor e insuportável os sentimentos que sentira, sendo considerado o pior de todos. A dor como uma flecha em seu coração fazia com que a fome não importasse; fazendo-a crer que jamais passaria, e aquela adaga na mão de seu inimigo apenas a ajudaria a não sofrer.
— Teu castigo não será a morte, Drácula, será pior. — Robin fez um sinal com a cabeça para que dois homens, que seguravam a tigela, se aproximassem. — Teu castigo é a vida...
O medo crescia e consumia seu interior, quase a matando internamente, fazendo com que tentasse dar passos para trás, porém, não conseguira, visto que seus braços se mantinham acorrentados. Fechou, então, os olhos e apenas os abriu quando sentiu homens a segurando nos braços, mesmo que estivessem acorrentados, e outros segurando seu rosto, erguendo-o.
— Eu estou aqui, meu amor. — seu medo cessou, e tudo o que ocorria naquele instante não lhe importava mais. Suas forças aumentaram ao vê-la, tão linda e delicada, atrás daqueles homens, no canto da parede. — Não temas, Jen, pois lembra-te que sempre lhe disse que estaria ao teu lado? — a loura assentiu, desacreditada, olhando para a figura resplandecente de Lana.
A primeira materialização que vira de sua esposa, deixou-a confusa, sem respostas para a pergunta – o que ocorrera com Lana –, porém, fez com que perdesse todos os medos. As órbitas esverdeadas não demostravam mais temor ou dor ao olha-los nos olhos. Os homens abriram sua boca, fazendo-a engolir forçadamente o líquido grosso composto ali, naquela tigela. Em seguida, estranhamente tiraram as correntes de suas mãos e a levaram pelos corredores cheios de portas até chegar ao centro da capela, onde antigamente faziam as missas.
— Hm, tens algo a dizer, Jennifer? — perguntou Robin segurando a adaga afiada, observando os objetos de torturas na mesa provisória.
— Vá pro inferno! — bradou e cuspiu sobre os pés dos homens.
— Nos encontramos lá, minha cara. — respondeu em tom debochado.
Era espalhafatoso o modo em que Robin de Locksley Mills cuidava daquela adaga, quase como se fosse um filho para o homem. Alisava a lâmina, que refletia a imagem do rosto suado da loura, movia-a de um lado para outro, espetava o próprio dedo em avaliação de se estava afiada o suficiente.
A loura deveria sentir medo, entretanto, sua adorável esposa estava ao seu lado sem que os homens pudessem ver. O ser resplandecente parecia saber o que estava por vir, sendo assim, sentou-se ao seu lado numa distância de poucos centímetros.
— Estes homens não poderão apagar o nosso amor, lembre-se disso. — a meiga voz de Lana fez com que a loura quase perdesse os sentidos, desligando a mente de seu inimigo.
Estava tão entorpecida, que sentira apenas a lâmina cortar seu pescoço e o sangue tingir todo o assoalho da capela. E, embora sentisse a dor da morte se aproximando, sua audição e visão se focavam apenas em Lana.
Sussurrava-lhe palavras que pareciam tirar a loura daquele mundo real, segurava-lhe a mão, acariciava seus cabelos como se estivesse realmente ali. E, embora a loura não soubesse, ela sempre esteve lá por ela, mesmo após todos os séculos.
— A vida é a tua punição, Drácula. — vociferou, observando vitorioso última cena daquela loura com vida; a loura que roubara o coração da mulher a quem desejava desposar.
Sob seus olhos, caída sobre o assoalho, jazia Jennifer Morrison deitada com seu olhar retamente ao teto, com um pequeno sorriso – o qual ninguém saberia responder qual era o motivo –, enfraquecendo-se. Os fios dourados começaram a serem tingidos pelo vermelho sangue, que transvazava de seu pescoço, assim como seus olhos verdes claros pareciam perder a vida.
Romênia — 1891
Durante a sensação de um século de silêncio, Alice olhara serenamente para a arqueira, que suava conforme o veneno de lobisomem percorria em suas veias até consumi-la por completo, e, em seguida, suspirou em devaneios ao fitar os orbes verdes de Robin.
— Eu devo acorrentá-la... — olhou as correntes sobre as gramíneas, enrolando o tronco de uma forte árvore acima das duas. — ... Por segurança. Desculpe-me, Nobin... Robin. — corrigiu-se, dando um fraco sorriso. — As pessoas que caem sob a maldição da lua, ou seja, os lobisomens, perdem a consciência quando se transformam em cada lua cheia. Alguns, conforme vá passando o tempo e tendo alguns treinamentos, conseguem manter o controle de seu instinto assassino. Tu, no entanto, ainda estás em tua primeira lua. Certamente irás descontrolar-se. — a mulher não respondeu, a contragosto sabia que aquilo era o correto, restando-lhe apenas assentir em silêncio àquela ordem.
Robin, ora ou outra, permitia que suas pálpebras descansassem, pois, sua cabeça já não mais aguentava as fortes dores causadas durante sua longa transição. Sentia-se um incomodo, visto que a moça que acabara de conhecer mantinha-se atenta, amarrando-a nas correntes, verificando se as algemas feriam sua pele.
Passar pela transição era ainda pior que imaginava. Recordava-se, então, de olhos fechados, do exato momento em que foi mordida por um lobo em uma de suas caçadas ao lado de sua prima. O medo que sentira por todos os dias até a chegada da lua cheia não poderia sequer ser comparado ao temor daquele instante.
— Deves ir, Alice. — pediu ainda de olhos fechados, tremendo as mãos.
— Ouça-me, Nobin, irei ficar aqui até o fim. — afirmou com seriedade, fazendo com que a outra abrisse os olhos para verificar em seu olhar se o que dizia era verdade. E, realmente, seus olhos azuis expunham honestidade. — A lua começa a surgir mais claramente ao céu, após a chuva. É questão de tempo até sua transformação começar... E eu estarei aqui, ao teu lado, tudo bem?
— És mesmo louca, Alice. — sorriu, abrindo os olhos e observando a moça loura posicionar a aljava sobre as folhas ao chão. — Eu poderia matá-la! Sem mencionar que tua família deve estar preocupada.
— O veneno está quase todo alastrado em teu corpo... — avaliou ao secar o rosto da arqueira com as costas das mãos, retirando o excesso do suor frio, que molhava a face e os cabelos. Sentiu, também, a alta temperatura e os olhos pesados da jovem, indicando o início da transformação. — Não te preocupes quanto a minha família. Quando eu tinha quatro, quase cinco anos de idade, perdi para a morte uma de minhas mães. Minha outra mãe veio a desaparecer após alguns anos. — explicava sem muitos detalhes, pois percebera o semblante confuso da arqueira. — Hoje vivo apenas com meu pai, e quando retornar para casa direi que te ajudei.
— Dissestes que se lembrou de uma de tuas mães ao olhar em meus olhos... — sussurrou.
— Sim. — respondeu contente, olhando outra vez para as órbitas verdes a sua frente. — Ela desapareceu há tantos anos, que já não recordo de como era sua voz. — abaixou a cabeça frente a frente de Robin, que usou o pouco de sua força para erguer outra vez o queixo da vampira. — Em contrapartida, minha outra mãe se foi há tantos anos, que faria de tudo para vê-la outra vez, e recordar de cada detalhe. Queria relembrar de como ela era, sem precisar de quadros com seu rosto desenhado neles.
Robin, após reerguer a cabeça da outra loura, olhou-a nos olhos. Ela sabia como era perder os pais, e ficar apenas de recordações. Era como um vazio que jamais se preenchia, uma dor inacabável. E, assim como Alice, ainda possuía um familiar vivo, que no caso dela era sua prima, Zelena.
— Oh, Alice, sinto muito. — pediu suavemente, compartilhando o mesmo silêncio que se instalara entre elas. As folhas das árvores pareciam respeitar a quietude do momento, aquietando-se com o vento. — Nunca te vi em Bucareste. És nova na cidade, ou vens de Brasov? — perguntou quebrando o silêncio.
A vampira olhou perdidamente para frente, ao pensar em o que responder. Seria mais fácil dizer que habitava pelas redondezas de Brasov, uma vez que nos séculos passados era apenas um pequeno vilarejo abaixo das colinas do Castelo de Bran, há quase um quilômetro andando entre as estradas de terra e as florestas. Bucareste, no entanto, era uma cidade mais desenvolvida e pouco mais distante do Castelo, cercada também pela floresta, e possuinte de uma longa estrada até Brasov e outras cidadelas. Sendo assim, Brasov era mais perto do Castelo que Bucareste.
— Juras que é este o assunto que queres discutir enquanto estás sentindo o efeito da transição? — Alice soltou uma leve risada pelo nariz.
— Por que não? Pergunto-me onde poderias morar. — a arqueira encarou as feições da loura; observava cada traço, cada linha de expressão tirando a conclusão de que ela procurava uma resposta para sua pergunta. — Quero apenas conhecê-la, saber onde moras, a única pessoa que se disponibiliza a me ajudar neste momento.
Alice abaixou a cabeça, sorrindo timidamente. Ela adoraria responder todas suas perguntas, mas colocar alguém no meio do mundo vampiresco era arriscado demais. Mesmo que este alguém, de alguma forma, seja um outro ser sobrenatural.
— Nobin, não é qualquer um que entende o que se passa nas noites de transição... Embora seja o correto ajudar quem precisa de ajuda. E, no entanto, pessoas comuns não saberiam o que fazer nessas horas. — respondeu mudando o foco da pergunta.
— Minha família não é comum, Alice... — a vampira a encarou confusa, sem entender ao certo de o que a arqueira se referia. — Para dizer a verdade, uma parte da minha família não é comum, mas todos estamos ligados a este mundo sobrenatural.
— Entendo perfeitamente. — sorriu. — Mais do que imaginas.
Sem força alguma, Robin finalmente encostou a cabeça no tronco de árvore, rendendo-se à exaustão do momento.
— Muito obrigada, Alice. — respondeu com dificuldade, praguejando mentalmente, pois achava que seus esforços para falar estavam a deixando pior. — Por estar aqui comigo... — interrompeu a própria fala, dando um sobressalto ao sentir uma dor aguda em seu peito.
Numa falha tentativa de se recompuser, sorrindo desajeitadamente, Robin ajeitou-se sentada sobre as folhas secas, posicionando-se de forma ereta com uma de suas mãos pousadas em seu próprio tórax. Como brasa quente da fornalha, seu coração queimava como o fogo, incendiando suas veias conforme o sangue bombeava.
— O que houve? — Alice desesperou-se, sentindo a temperatura da jovem arqueira. — Diga-me, Robin, o que estás sentindo! — segurou delicadamente o braço da jovem.
A essa altura, o suor porejava intensamente de sua face, assim como do rosto febril da arqueira. Reanimar alguém em tais condições, de envenenamento por algum tipo de maldição – tanto a do sol, quanto a da lua –, é uma tarefa árdua mesmo que tenha total controle sobre a situação. Chegaria, então, algum momento em que não poderia fazer mais nada. A temperatura aumentaria gravemente, o que poderia causar delírios; os ossos e nervos doeriam como se estivessem se quebrando um de cada vez; o coração aceleraria desenfreadamente, para finalmente transformar-se em lobo.
— Eu não hei de aguentar! — exclamou, tossindo e engasgando, provavelmente indicando seus últimos minutos em forma humana naquela noite. — Os meus ossos, as minhas veias... O lobo! — o suor escorria pela face alva da bela jovem, mas, pelo incrível que pareça, ela não emitiu nenhum som além o da respiração pesada.
Alice ficou observando de coração apertado o sofrimento daquela jovem, enquanto segurava firme suas mãos. Como o esperado, estava nos minutos finais da transição. Os ossos e as veias estavam doloridos, como já sabia que aconteceria. "O lobo!" pudera ser sinal de suas alucinações, como também já sabia.
— Claro que irás aguentar, Robin, tu não estás sozinha. Eu estou aqui. — disse confiante, amenizando a situação difícil que se passavam. — Não temas. — pediu suavemente, sentindo a respiração da arqueira relaxar, embora ainda sentisse dor. — Chegastes até aqui, então há de conseguir. Lobisomens costumam estraçalhar as vítimas, portanto levar apenas uma mordida e não morrer pelo sangramento é sinal de como és forte. Passastes pelas alucinações durante a recuperação... Então há de passar desta noite.
— Tu estás aqui, portanto não temo. — arfava em choro silencioso. As batidas de seu coração soavam tão agitadamente, que as ouvia claramente, sentia-as bater contra seu peito. — Oof! — a arqueira soltou um alto grunhido de dor, rangendo os destes e contorcendo-se no chão.
Alice levantou-se ao levar um forte susto, pois que aquela era a primeira vez que estaria a presenciar uma transformação de lobisomem de perto. Conhecia muito bem todas as transformações, porém, sempre teve cautela já que os lobos possuíam poder de matar os vampiros.
— Robin... — chamou, afagando suas costas. — Levante-se... Olhe para meus olhos.
Por alguns segundos, a loba olhou-a em seus olhos como havia pedido. A lealdade, amabilidade e, principalmente, o temor estavam estampados sobre as órbitas azuis da vampira, principalmente ao ouvir o estalar dos ossos de Robin.
— Olhe para meus olhos, Nobin. — Alice sussurrou, ao mesmo tempo em que se afastava por precaução. — Estou aqui. Bem aqui.
Robin impulsionou-se para frente, encostando a face sobre o chão coberto por folhas trazidas pelo vento. Seus orbes, que antes tonalizavam-se numa belíssima cor de verde água, mesclavam-se agora com um tom forte de âmbar; soltava um grito estrondoso a cada vez em que seus músculos se contorciam junto com suas mãos, quebrando seus ossos e os aumentando de tamanho. A pele humana parecia tornar-se pó, desmanchando-se, enquanto suas vértebras quebravam-se, surgindo macios pelos negros sobre o tecido de toda sua pele.
Levantou o olhar diretamente à face delicada da vampira que a ajudara e que, agora, segurava algumas lágrimas para não deslizar sobre seu rosto espantado.
Obrigada, Alice. — pudera tentar pronunciar tais palavras de agradecimento àquela mulher que arriscara a vida apenas para acompanha-la. No entanto, de seus lábios começavam a sair uivos, como de lobos, até perder totalmente a consciência de seus atos.
— Nobin? — suspirou, soltando o ar que prendia em seus pulmões, ao observar a figura de um enorme lobo negro em sua frente.
Conforme a força que fazia para soltar-se, as correntes que amarravam o gigantesco lobo arrebentaram, fazendo com que Alice desse três passos para trás. A forte respiração ofegante do lobisomem fazia com que as folhas saíssem do chão, e causava um som que arrepiava as espinhas da vampira. Os dentes afiados salivavam ao avistar Alice em sua frente. À vista disso, o lobo assustado correu em direção à sua presa.
— Robin, sou eu, Alice! — exclamou, desviando-se ao perceber que a arqueira não havia a reconhecido.
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