Arma Secreta
1666 – Londres
Após um certo período e a derrota da armada espanhola, Londres desenvolveu-se a partir de uma certa estabilidade política na Inglaterra. Em vista desses fatos, mesmo aquele século tendo sido difícil para os londrinos, tornou-se uma boa escolha para fugir da vista da Ordem do Dragão. Sendo assim, em mil seiscentos e sessenta Clarke e Lexa mudaram-se para Londres, na Inglaterra, e permaneceram lá por seis anos.
As órbitas azuis mar abriram-se junto ao nascer do sol, deparando-se com um par de olhos verdes tão claros como a água. Arrepiou-se ao sentir o percorrer dos dedos da morena sobre seu braço, antes de lhe roubar o primeiro beijo do dia. Sentia o corpo gélido da vampira puxar-lhe mais para perto. E era nisso que Clarke sempre pensava quando sentia a frigidez de sua namorada:
Dois séculos desde o início de suas fugas, e finalmente haviam sossegado em uma cidade.
— Imaginaste que conseguiríamos? — ela perguntou, passando as mãos sobre a face de Lexa como se estivesse gravando cada detalhe de seu rosto. A vampira arqueou a sobrancelha e franziu o cenho, sem entender. — Sobreviver. Passaram-se cento e noventa anos que estamos juntas fugindo, e finalmente parece que encontramos um lar aqui em Londres.
— Para ser sincera? — sorriu ao escutar a risada contagiante que Clarke dera com o seu menear de cabeça, respondendo que não achava que conseguiriam. — Bom, eu sabia que conseguiríamos por algum tempo. — deitou-se de bruços, analisando o pequeno quarto. Era totalmente diferente dos quartos em que dormiam no castelo; era tão pequeno que cabia praticamente apenas suas camas. — Talvez por dez anos, mas por dois séculos? Nunca, em toda minha vida, escutei falar de pessoas que conseguiram escapar de perseguição da Ordem. Entretanto, conseguimos escapar todas as vezes que chegaram perto.
— E continuaremos a escapar... Vejas, passaram-se seis anos desde que pusemos nossos pés em Londres. — ela pôde examinar uma certa aflição emitida de dentro dos orbes verdes, desenhada em cada linha de expressão em sua face. — O que houve?
Lexa não poderia esconder o fato de que estava preocupada com alguns acontecimentos, mesmo que a Ordem possivelmente não tivesse as encontrado. Porém, a sociedade encontrara as duas mulheres. Escutara murmúrios sobre as irmãs não se casarem, ou sobre os olhares quando algum rapaz tentava cortejá-las que aparentemente incomodava a outra; até sobre jamais serem afetadas pelas doenças da época.
A vampira virou o rosto e suspirou.
— Diga-me... — a loura pediu, deslizando uma de suas mãos sobre o ombro exposto de sua namorada. — Sabes que não consegues esconder algo de mim.
— Gostas de Londres? — Clarke assentiu, com o rosto interrogativamente, sentando-se ao seu lado e levando o lençol para cobrir seu próprio corpo. — Passaram-se seis anos. Um ano atrás a peste que se instalou no mundo retornou, porém, aqui em Londres e em poucos países da Europa. Cerca de setenta e cinco mil pessoas perderam suas vidas, e pelo menos uma pessoa de cada família morreu com a doença... Exceto nós, que, para todos eles, somos irmãs e permanecemos aparentemente saudáveis.
— Bem, sabíamos que algum dia teríamos que partir... Principalmente após seis anos.
— Tens algum destino em que gostaria de ir?
— Gostaria de retornar para Romênia. — a loura sussurrou chateada, o que não foi surpresa para a vampira ao seu lado. As duas sempre desejaram retornar para seu antigo lar, mas lembravam-se de que Jennifer dissera para fugir sem parar e sem olhar para trás. Obedecer a suas palavras havia feito com que conseguissem estar juntas por quase dois séculos. — No entanto, por motivos não podemos mais por nossos pés em Bucareste ou Brasov. Então, gostaria de ir para Budapeste ou para a França.
Lexa balançou a cabeça sorridentemente.
— Budapeste seria uma boa ideia, e no início do próximo ano a França seria um ótimo destino.
— Budapeste me lembra Bucareste. — Clarke comentou, soltando um risinho.
— E a Hungria fica próxima à Romênia. — Lexa respondeu. — Seria este o motivo de escolher Budapeste como o próximo destino?
— Talvez. — a morena riu com força, soltando uma gargalhada antes de se abraçarem juntas.
— Então, arrumes algumas coisas tuas para irmos para Budapeste na próxima semana. — disse a morena, empurrando delicadamente as costas da loura feiticeira sobre a cama, encarando-a alegremente e estupefazendo a beleza que, para ela, era incomparável. — Ano que vem, quando formos até o porto para a França, passaremos rapidamente em Bucareste, tudo bem?
Clarke olhou para a morena e posteriormente para a janela, a qual era coberta por uma cortina, antes de lhe dar um sorriso em agradecimento. Deveras agradecida por tudo o que vivera ao lado da mulher que amava, por todas as lutas que enfrentaram juntas em todos aqueles anos. E mesmo com o preconceito, ainda estarem unidas, amando uma a outra como se a cada dia se apaixonassem cada vez mais.
— Sempre fazes a minha vontade...
— Lembras que, antes de todos os membros que perseguiam minha mãe descobrirem sobre o amor entre nós, eu lhe disse que faria de tudo para vê-la feliz? — a loura curvou os lábios em um sorriso emotivo, deixando uma lágrima descer de seus olhos.
— Como eu poderia esquecer? — Clarke respondeu com uma pergunta, esticando-se para alcançar os lábios da mais velha.
Os dias passavam-se lentamente, aparentando que o tempo estava de complô para que as duas permanecessem em Londres. Algo tocava no interior das duas, de uma forma tão intensa que haviam organizado todas suas bagagens em menos de um dia, mesmo que a passagem de navio fosse apenas para o final da semana.
Para Clarke, aquele mal pressentimento era devido a desconfiança das pessoas que moravam em sua volta. Provavelmente haviam descoberto que as duas não eram irmãs, ou, o que era pior, cogitassem que eram irmãs cometendo incesto.
Para Lexa, no entanto, caçadores da antiga Ordem do Dragão estavam prestes a encontrá-las. Mas, no final de tudo, as esperanças de que saíram bem como todas as outras vezes permanecia em seu peito.
— Sim, infelizmente eu e minha irmã teremos que partir, Bellamy. — Lexa disse para o amigo que ambas haviam feito nos anos que permaneceram em Londres. — Mas saiba que sempre teremos consideração por ti.
— Tens certeza de que não poderão ficar?
— Absoluta. — ela disse, sorrindo fraco. Era um dos motivos que odiava criar raízes em algum lugar. Simplesmente se tornava difícil dizer adeus. — Ficamos mais que devíamos.
O ecoar do som de batidas contra a porta despertou os dois, fazendo com que Lexa se levantasse para atendê-la. Não era ninguém. A vampira buscou com o olhar a pessoa que poderia ter lhe incomodado, mas tudo que seu olhar encontrava era pessoas andando pelas ruas de Londres. Poderia ser qualquer um, até que avistara um envelope negro no chão, pegando-o rapidamente e entrando para não se expor por muito tempo no sol.
Para sua surpresa não havia nenhum bilhete dentro do envelope, mas sim um bracelete que Clarke usava ainda nos anos em que viviam no Castelo de Bran e alguns objetos que pertenceram à Jennifer e Lana. Ela identificou o recado.
A Ordem do Dragão sabia onde ambas estavam, e estavam perto de encontrarem Clarke. Seu coração apertou naquele instante, assim que abriu a porta novamente e viu que a luz do sol ainda era forte.
— Quem era? — Bellamy perguntou ao chegar e se deparar com a morena aflita. — O que houve?
Ela andava sob a luz do sol, e aquilo era fato, por este motivo ninguém suspeitava que ela era uma vampira. Entretanto, o feitiço que Clarke fazia semanalmente para que ela andasse no sol estava fraco. A loura sempre foi uma bruxa poderosa, assim como todas de sua linhagem. Ela conseguiu tardar o tempo e não envelhecer, quase como os vampiros, e também conseguia fazer com que Lexa andasse sob o sol – o que lhe custava mais poder que podia usar.
O feitiço estava quase enfraquecido, fazendo com que sua pele suportasse poucos minutos no sol, sendo assim ela não conseguia ir até Clarke.
— Eu preciso ir até Clarke, Bellamy. — Lexa afirmou, sabendo que os conselhos do amigo não serviriam de nada visto que ele não sabia dos segredos das duas. — Mas... Não estou bem. Não conseguirei ir até ela.
— Isso não é problema! — os orbes verdes preocupados voltaram-se aos negros do homem, que sorriu largamente. — Eu posso ir até ela ou te levar em minha carruagem.
A Srta. Griffin estava sonhando acordada, com sua mente tão leve que mal prestava atenção em tudo a sua volta. O olfato se deliciava com os pães frescos, que saíam da fornada naquele mesmo instante. O Senhor Beckham não estava ali, o que era estranho já que o padeiro costumava trabalhar sozinho.
— Os pães estão demorando, não é? — a loura assentiu com a cabeça, direcionando seus orbes azuis para a janela, concluindo que o homem de cabelos negros percebera como ela o olhava. — Sinto muito, mas a senhorita não se preocupará com isso daqui em diante. — a bruxa deu um sorriso forçado e arqueou a sobrancelha. — Bom, não sei como Beckham consegue administrar toda a padaria.
— O Senhor Beckham está bem? — ela indagou.
— Sim, claro que sim. Hoje ele não estava disposto, então me prontifiquei a ajudá-lo. — pela sua expressão, ele estava nervoso, passando as mãos na nuca. — Mas está claro que não sei muito bem o que estou fazendo.
— Bem, teremos resposta quando eu e minha irmã experimentarmos os pães! Aposto que estão tão saborosos quanto os de Beckham! Tu só estás nervoso e, no entanto, enrolado em tuas obrigações. Isso é normal.
O jovem sorriu e olhou para a mulher, tentando ler suas expressões. Em seguida, ele terminou de tirar os pães do fogo.
— Me pareces ser uma boa pessoa. — ele fez a observação.
— Obrigada. Bem, eu tento ser uma pessoa melhor a cada dia.
O jovem deu um sorriso curto, embora estivesse sem saber o que fazer diante àquela situação. Observou-a durante dias e sempre a considerou como uma boa pessoa, e naquele instante de aproximação ele não tinha coragem de completar sua primeira missão.
— Então tens uma irmã? — ele perguntou e ela assentiu. Engoliu em seco com certa dificuldade, desviando o olhar. Clarke Griffin odiava ter de dizer que Lexa era sua irmã. — És casada?
— Não, não sou. Digamos que sou feliz apenas. E tu?
— Bem, — ele pausou sua fala, lembrando-se em ansiedade de sua família. — casei-me com Edith e tenho uma filha.
— Onde elas estão?
— Em casa... — suspirou. — Não vejo a hora de terminar a missão para voltar para as duas.
— Missão!? — Clarke perguntou, afastando-se e levantando pouco a voz.
— Bem... Sim, uma missão. — o jovem gaguejou amedrontado ao lembrar-se de tudo o que ouvira falar daquela mulher. — Estou a honrar o legado de meu pai, mas decidi passar um tempo ajudando o Senhor Beckham. Faz parte de meu passatempo... Ajudar pessoas. — ele dizia a verdade. Era possível ler isso em suas linhas faciais, na sua postura, embora Clarke percebesse que ele estava tenso e não estivesse sendo cem por cento honesto.
A loura permaneceu em silêncio, observando a sombra do homem formada pela luz alaranjada da fornalha. Ele escondia algo, e ela percebera.
— Bem, senhorita, podes ir lá pra fora? — pigarreou incomodado. — Irei levar os pães que pediu assim que eu colocar outra fornada. Não gostamos de pessoas atrapalhando nosso trabalho. — ele tentava arrumar alguma desculpa para aquela mulher sair dali, mas ela parecia analisá-lo insistentemente. — Por favor.
Um pedido suplicante para alertá-la, fazê-la ir embora antes que fosse tarde demais. O homem considerava-se um completo frouxo, que não conseguira completar sua primeira missão no lugar de seu pai, que havia falecido há pouco tempo. Ele estaria colocando a vida de sua família em jogo caso a deixasse fugir.
— Estás nervoso. — Clarke fez a observação, aproximando-se do homem. — Não sei qual tua verdadeira missão, mas não o deixarei até vê-lo calmo.
O homem de orbes castanhos e cabelos negros citaram as órbitas azuis da loura. Retirou o restante dos pães da fornalha, e sentou-se.
— Deves ir embora imediatamente. Tu e tua esposa. — ele sussurrou, fazendo que ela desse alguns passos para trás ao ouvi-lo revelar o segredo que guardara por séculos. Ninguém, absolutamente ninguém, sabia sobre seu romance com Lexa.
— Quem és tu? — bradou, levantando uma de suas mãos em posição de ataque, mostrando-lhe que se precisasse usar magia ela o faria.
— Meu pai, Joseph Mills, morreu há pouco mais de um ano. Não faço ideia de o que ele fazia, mas um grupo religioso veio a minha procura e disse que era um legado de família e que eu deveria entrar para a Ordem. Não tinha como eu negar. É difícil explicar visto que eu sequer sei o que eles fazem... Essa é minha primeira missão antes de entrar pro grupo.
— A Ordem do Dragão. — Clarke sussurrou, levando suas mãos até seus cabelos. — Eles nos encontraram... Mesmo durante a peste.
Não era surpresa de que se Clarke e Lexa criassem raízes em algum lugar, a Ordem as encontraria e iria atrás de ambas. Entretanto, para elas, a peste em Londres os manteria longe.
— Disseram-me para que eu a levasse para eles. — ele explicou. — Garantiram-me de que tu és uma péssima pessoa e tua esposa uma assassina.
— Eles são os assassinos! — a bruxa gritou. — Eles mataram a família de minha esposa, amaldiçoaram a mãe dela... E depois a levaram. Ameaçaram matar uma criança indefesa. E vêm a nos caçar pois abominam o nosso amor.
— Nem imagino quão difícil deve ser para tentar ser invisível em nossa sociedade. — respondeu amigavelmente, ainda percebendo que Clarke estava com as mãos erguidas e que qualquer movimento ela poderia quebrar seu pescoço. — Não quero que penses mal de mim, Senhorita. Não me deram muita escolha. Achas que se pudesse escolher eu estaria aqui, te caçando sendo que nem faço ideia de quem tu és... Vá, Senhorita.
A Ordem do Dragão não esperou a loura dar alguma resposta, aparecendo em poucos minutos ao lado de fora da porta que levava exatamente até às fornalhas de pães.
— O mestre ficará bastante contente em por as mãos nesta bruxa, Senhor Mills. — um dos homens afirmou, sendo seguido por uma mulher de cabelos ruivos. — Serás muito bem recompensado quando entrares para a Ordem.
— O que irás fazer com ela?
— Parabéns, Senhor Mills. Estaremos levando-o para nomeá-lo o mais novo membro da Ordem do Dragão. — disseram-lhe sem mais detalhes, observando a mulher ruiva gesticular a mão e fazendo com que Clarke caísse de joelhos ao chão. Um outro homem segurou o jovem, levando-o para fora contra sua vontade. — Saberás tudo sobre nossos inimigos e terás que lutar conosco para derrotá-los.
Ainda de joelhos dobrados sobre o chão e de cabeça baixa, sentindo o pesar da magia em sua mente, a loura forçava a levantar a cabeça para analisar o local. A padaria era pequena. Um forno pequeno, mas bom o suficiente para fazer alguns pães por vez; o recinto parecia velho e inacabado – resultado de um trabalho humilde e esforçado pelas próprias mãos do Senhor Beckham –, encontrava-se lado a lado com fileiras de casas amadeiradas daquela rua.
— Onde está a sanguessuga? — um homem perguntou ao outro.
— Estava somente esta, o que é de grande valor para nosso mestre. Sabes como ela é poderosa? — sussurrou enquanto andava em direção à loura, segurando cordas em mãos. Raciocinando direito, aquelas cordas poderiam estar enfeitiçadas uma vez que seria tolice achar que simples cordas detê-la-iam.
Eles acham realmente que será tão fácil capturar-me? — ela pensou, tocando as mãos no piso e fechando os olhos ao buscar concentração.
Havia o total de quatro homens dentro da pequena padaria. Clarke, no entanto, aparentava não se importar. Permitia com que o ar entrasse e saísse profundamente em seus pulmões, como se estivesse removendo todas as impurezas de seu interior. Posto isto, sua respiração e seus pensamentos voltavam-se à esperança em si mesma. Estava impossibilitada de se levantar dado o feitiço que a mulher ruiva jogava sobre ela, apesar de pequena parte de sua mente conseguir raciocinar a ponto de salvar-se. O clima seco apenas contribuiria com isso.
As chamas amareladas dançavam levemente e crepitavam num som leve e tranquilo. Lançava faíscas, enfurecendo-se e ganhando força dentro do forno cada vez que Clarke respirava fundo o ar seco. Os homens se agitaram com o fogo aumentando enfurecidamente, e as faíscas saltarem para fora do forno. A bruxa ruiva que havia parado Clarke, sentira um líquido grosso escorrer de seus olhos, de seu nariz, de seus lábios.
Logo, as cores quentes tomaram conta do local que antes era velho e sem vida. A padaria do Senhor Beckham estava em chamas. O fogo passava entre os homens, o sangue da bruxa ruiva caía sobre o chão, fazendo com que libertasse Clarke não intencionalmente. E ela correu o mais rápido que pôde.
— Clarke! — a loura, que corria cansada, escutara os gritos preocupados de Lexa indo ao seu encontro. — Meu Deus, o que eles te fizeram?
— Eu... Eu incendiei o quarteirão inteiro! — Clarke exclamou com as lágrimas esguichando de seus olhos, envolvendo-se nos braços de Lexa. — O fogo está se alastrando e tenho que neutraliza-lo.
— Não, Clarke. — Lexa pediu, colocando suas mãos no rosto da loura, fazendo-a olha-la. — Tu fizeste o suficiente para escapar. Os governantes terão que apagá-lo... Vamos embora esta noite.
— Nosso navio sairá daqui uns dias.
— Entraremos em algum de última hora, meu amor. — garantiu, escondendo o medo que sentia. Se a Ordem do Dragão não temeu a peste bubônica em Londres, então não haviam de temer quaisquer outras coisas. Elas não estavam seguras em lugar algum. — Londres não é segura para nós duas.
A estrutura medieval da cidade e o clima quente ajudaram o fogo a se alastrar e destruir a cidade. Considerou-se a maior catástrofe de Londres. O incêndio ameaçou destruir o distrito de Westminster, o palácio e alguns subúrbios, mas não chegou a destruí-las. Destruiu treze mil e duzentas casas, oitenta e sete igrejas, a catedral e quarenta e quatro prédios públicos.
1891 – Romênia, Bucareste
— Façamos uma passada na igreja. — Emma alertou sua amiga, enquanto ainda dirigia entre as ruas de Bucareste. — Os homens dessa irmandade são capazes de tê-la levado para a igreja.
— Igreja é um local santo, Emm.
— Fui assassinada numa capela, Lobinha. — a loura olhou-a, analisando o espanto emitido na face da amiga após ouvir suas palavras. Nunca perguntara exatamente como a loura havia sido amaldiçoada, pois a maldição do lobo era ativada através de uma única mordida, por isso não tinha total certeza de que tiveram de matar Jennifer. — O único louco que conheci e sei que era capaz de cometer atrocidades na casa de Deus foi Robin Locksley Mills. Portanto, pensei que após eu tê-lo matado poderiam ter cessado tais atos.
A mais nova abaixou o rosto, sem palavras a partir daquele momento, fazendo-a pensar se algum dia Emma Swan poderia perdoar Regina por ser uma Mills. Desde que retornaram para a antiga cidade em que a loura habitava, a jovem Luccas perguntava-se por qual motivo a vampira possuía ainda mais ódio pela família Mills. E, naquele instante, percebera que seu ódio não havia sido por terem sido os ordenantes para o assassinato de Lana, mas, também, por terem tirado sua vida.
— Por isso teu ódio é maior pelos Mills? — ela indagou. — Robin Locksley Mills, além de assassinar Lana, também tirou tua vida?
— Robin Locksley Mills me tirou tudo, Senhorita Luccas. — a loura respondeu, daquela vez sem dor carregada em sua voz. Seus olhos brilhavam, num misto de tristeza e determinação em terminar o trabalho que a assassina Tilly havia feito séculos atrás. — Ele não acabou somente com minha vida. Aquele maldito tirou a vida de minha esposa, separou-me de minha filha pequena e caçou Lexa só Deus sabe por quanto tempo! Sem mencionar que eu o vi matar pessoas inocentes e não pude fazer nada... Usou o poder que tinha para fazer mal à pessoas. Por fim, ele me matou e me amaldiçoou.
— Emms, sabes que se matar todos esses homens não terá volta... Aquele Mills era o Robin, o homem de tua época, nos dias de hoje pode haver um descendente bom. Não quero vê-la com tanto rancor e trevas. Livre-se somente desses que estão com Roni, por favor, não fiques cega por tua história passada. Reescreva tua felicidade, Emma. — a mais nova tocou as mãos da vampira, pedindo-lhe gentilmente para que não levasse sua vingança tão a sério, principalmente a vingança contra os descendentes de Robin.
— Eu não posso, Ruby! — Emma gritou, finalmente liberando uma lágrima. — Peça-me tudo, exceto que eu desista de vingar a morte de Lana e todas as outras pessoas que essa ordem causou. Eu jamais te pediria algo assim, se algum dia isso acontecesse com tu.
A vampira parou a Panhard et Levassor, descendo imediatamente do automóvel e ajeitando seu terno, deixando para trás uma morena sem palavras e absorta em pensamentos. Ruby tinha total certeza de que se ela tivesse no lugar de Emma, a mesma jamais iria se opor às suas decisões, mas a loba sabia que Roni era uma descendente de Robin Locksley Mills.
— Virás comigo, Ruby? — Emma lhe chamou, estendendo a mão para que a mais nova saísse do veículo.
A morena piscou os olhos verdes três vezes, voltando a atenção para a amiga e assentindo.
— Parece vazia ao meu ver. — Ruby afirmou, ao empurrar com força a porta da igreja, abrindo-a e dando de cara com o enorme e decorado salão. — Bom, somente com algumas pessoas rezando.
Jennifer Morrison, desde sua vida passada, era uma pessoa determinada e decidida. Tais características não eram defeitos, exceto naquele caso. Ela estava decidida a ir fundo em sua vingança, assassinar lentamente os Mills e acabar de uma vez por todas com a Ordem do Dragão.
Os orbes analisavam atentamente a mulher de cabelos tão dourados como o sol entrar no salão, caminhando por entre as fileiras de cadeiras organizadas. A mulher loura fechava os olhos e inspirava o ar, parecendo querer captar algum aroma, e quando abria seus olhos rodeava todo o local com o olhar.
— Entrarei por aquele corredor... Padres e todos os que trabalham aqui nessa igreja ficam lá dentro. — Emma alertou, virando o olhar para um corredor no canto próximo à imagem principal de Cristo. Era aonde padres resolviam seus assuntos. — Se quiser ficar aqui eu entenderei.
A loba negou com a cabeça, recebendo um sorriso da vampira. Ela consideraria a lobinha como uma filha, mas ela se nomeou como uma péssima mãe que não conseguira tomar conta de suas filhas, sem mencionar que no decorrer das décadas passou a enxergá-la como uma irmã mais nova.
— Eu irei ao teu lado, Emms.
Em seguida, começou a seguir a figura de terno em sua frente, sempre atenta a qualquer barulho. O corredor era enorme e recebia pouca luz, fazendo com que ela sentisse pouco de medo às vezes. Não demorou muito e um jovem esbarrou com a loura, resultando um temor na loba; medo da vampira matar um simples garoto.
— Hey! — Emma exclamou simpática, quase convencendo a própria amiga de que ela estava tranquila e sem intenções.
— O que as senhoritas estão fazendo aqui? — o garoto semicerrou os pequenos olhos castanhos, analisando a reação das duas. Emma, por sua vez, suspirou nervosa em uma tentativa de arrumar uma desculpa. — É proibida a entrada de pessoas que não trabalham para Deus nessa igreja.
— Bem, eu já trabalhei em serviço da igreja, meu jovem. — o menino olhou-a minuciosamente, percorrendo o olhar dos pés até o fio de seus cabelos louros. — Faz bastante tempo, mas eu era fiel à igreja.
— Não me parece alguém temente à igreja. — o menino torceu o nariz, julgando-a por sua aparência.
— Pois bem, eu gostaria de falar com o padre ou líder dessa igreja. — a vampira deu um sorriso forçado, controlando-se para não dar um soco naquele garoto.
O menino corrigiu a postura, ergueu a cabeça e lhe olhou com uma expressão séria.
— Diga-me. — ele pediu. A loura cruzou os braços e arqueou a sobrancelha. — O padre não está aqui, por isso eu, o aprendiz dele, fico responsável por tudo que diz respeito.
A vampira entreabriu seus lábios, sem saber quais palavras pronunciar para aquela criança.
— És... És um menino ainda.
— Sim, eu sou. Por tal motivo sou o aprendiz, pois algum dia irei substituí-lo. Contudo, já possuo conhecimento e poder suficiente para tratar de assuntos do interesse da igreja enquanto o Padre Gold se ausenta. Então, acompanhe-me até uma sala para que venhamos a tratar quaisquer assuntos que julgas importante.
Emma Swan calou-se por alguns minutos, ao mesmo tempo em que seguia os passos do jovem. Ruby Luccas os acompanhava logo atrás. O corredor era estreito e escuro, com diversas portas, mas a loura já sabia que ele as levaria até a última porta no final daquele longo corredor.
As estátuas angelicais repousavam ao canto de cada curva do sombrio corredor, fixando seus olhos sobre as duas mulheres.
Era um conflito, Emma pensou, afinal, nunca havia assassinado uma criança. Mas aquele garoto provavelmente seguiria os mesmos passos que todos os membros da Ordem do Dragão.
— Qual o assunto que gostarias de tratar? — o jovem foi direto ao ponto.
O garoto endireitou-se, mudando a postura de uma forma em que começara a assemelhar-se aos membros da Ordem do Dragão. O olhar frio investigava ambas mulheres em sua frente, enquanto colocava os braços um sobre o outro, cruzando-os.
Ele foi treinado tempo demais por aqueles homens. — Emma pensou, sentindo sua consciência pesar e gritar em alertas de que ela estaria tirando a vida de um menino. Roni jamais a perdoaria por tal atitude. Entretanto, o jovem mostrava-se ser perigoso para ela, principalmente para sua amada Roni.
— Um desaparecimento. Eu gostaria de conversar com o padre Gold.
— Desculpe-me, mas não trabalhamos com pessoas desaparecidas, Srta. — afirmou, andando em círculos como se estivesse pensando. Aquela mulher que parece homem não quer ajuda para uma desconhecida, ele raciocinou. Nenhuma mulher em sã consciência ousaria entrar na igreja vestida daquele jeito.
— Regina. — disse o nome, lembrando-se que Ivy Belfrey a havia procurado dizendo que Regina havia desaparecido. — Ela frequenta a igreja.
— Lembro-me vagamente de uma Regina. Escutei murmúrios ao respeito dessa moça, pois as mulheres respeitadas comentavam. Foi aconselhada a usar espartilhos uma vez. — o garoto riu sozinho. — É uma mulher bonita, inteligente, mas esquisita.
— Não fale assim dela! — Emma ameaçou avançar, mas foi impedida por Ruby Luccas.
— Acalme-se Emms, acalme-se. — sussurrou, abraçando-a e impedindo com que a vampira matasse aquele garoto. — Vamos procurá-la em outro lugar, tudo bem?
— Tentes avançar outra vez e se arrependerá. — o menino provocou. — Não és apropriada socialmente e ameaça um membro da igreja? Em contrapartida, para provar que não guardo rancor, colocarei Regina em minhas orações e comunicarei ao Padre Gold sobre o desaparecimento.
Emma e Ruby retiraram-se do local sagrado já sabendo que haviam de passar por outros. A morena escutara os passos pesados e enfurecidos da vampira sobre o piso da igreja, levantando a poeira da rua de Bucareste em seguida. Não encontrava coragem de trocar palavras, pois era possível escutá-la bufando com ódio. Ela não havia matado o garoto e sabia que poderia se arrepender daquilo. O jovem havia sido treinado pela Ordem do Dragão.
Ambas passaram o dia inteiro a procura de Roni, ou melhor, Regina. Haviam procurado por Bucareste, pelas igrejas e até na capela abandonada na qual haviam torturado e matado Jennifer Morrison. Mas não havia sinal algum de que haviam levado Roni para lá, em algum momento.
O único lugar que resta é Brasov, Emma pensou dirigindo em direção à pequena cidade.
Romênia – Brasov
— Um, dois, três... — a voz ecoou como um sinal para tirar a venda de seus olhos.
A consciência fragmentou-se a inúmeras sensações ao sentir seus braços serem desamarrados; sensação de medo por não saber o que aconteceria a partir daquele momento, momento no qual retiraram sua venda e suas amarras. Sensação de confusão, pois, por algum motivo achava que iriam matá-la, portanto apenas a mantiveram presa o dia inteiro.
— Mais que diabos! — Regina murmurou, em reação ao que estava presenciando.
Estava sob o teto de uma construção de tijolos, com portas aparentemente de aço e como se não fosse pior, aquele âmbito era fechado e sufocante, desprovido de janelas. As trevas habitavam sobre aquele teto, deleitando-se sob as colunas e paredes que escondiam o pior lado de um ser humano.
Aquele lugar não era a pequena capela.
Regina deduziu que aquela era uma sala de reunião entre os homens, no entanto não era na igreja. Haviam crucifixos, vidraças, água benta, quadros onde Jesus estava desenhado, livros e artefatos antigos. E junto a todos aqueles objetos, havia uma adaga, que no momento em que seus orbes se direcionarem ao objeto ela afastou-se – como se fosse adiantar.
— Shi, Regina Mills, não há diabo algum escondido por essas paredes. — o único homem que retirara o capuz, identificando-se como Arthur, disse. — Os demônios estão a solta por entre as ruas das cidades.
— Gostaríamos de ter uma conversa com a senhorita, jovem Regina. — o padre, ao lado de Arthur, pronunciou-se seriamente.
Mesmo diante de seu desespero interno, desconfiada de que daquela vez a mataria, a jovem pôs as mãos em sua cintura e deu um sorriso debochado.
— Oras, padre, se querias conversar não precisava de tanta cerimônia. — disse aparentemente despreocupada. O olhar semicerrou contra os olhos negros do padre, escondendo o medo dentro de si. Eles já haviam a torturado anos atrás e agora possuíam uma adaga naquela mesma sala, afinal. Seria uma tola se não tivesse medo.
O padre deu uma única risada, sentando-se numa cadeira.
— Vejo que não tens medo de nós. — ele disse, tocando na adaga de Robin Locksley Mills. — Isso é bom! Talvez colabore para que venhamos a ir direto ao ponto. — a jovem permanecia de pé, de cenho franzido, tentando juntar as peças daquele quebra cabeças. Para onde eles haviam a levado, afinal? Por que não fazer uma conversa decente? — Regina Mills, sei que és uma mulher inteligente e muito avançada. Imploro-te que uses tua inteligência agora e colabore conosco.
— Eu nã... — calou-se antes mesmo de terminar de protestar, observando todos os homens falarem juntos.
Todas as pessoas reunidas fizeram o sinal da cruz e puseram-se a repetir palavras tão rapidamente que ela, uma mulher estudada, sequer entendia. Podia-se entender algumas poucas palavras no meio de outras distintas. Pelo motivo de todos repetirem as palavras com seriedade ao mesmo tempo em que faziam os sinais da cruz no ar, fez com que ela acreditasse que era latim.
Em seguida, todos calaram-se. Regina viu a oportunidade de abrir sua boca para protestar as atitudes absurdas daqueles homens, mas sua mente lhe alertava de que se eles se calaram havia de ter um motivo. Aquieta-se, sua mente alertava. A única porta do recinto abriu-se, e dela saiu um homem diferente de todos os outros. Um homem sério, cabelos louro escuro pouco grisalhos e olhos azuis, trajando roupas formais com sapiscos de sangue sobre ela e, diferente dos outros, sem capuz algum escondendo sua face.
— Mestre... — os homens se referiram ao outro, que possuía um jeito superior.
Estou ficando louca, ou esse grupo que diz ser a igreja adora outra pessoa? — Regina pensou consigo mesma, calada e sem reação.
Os orbes azuis pareceram analisá-la desde o momento em que ele entrou ali. Admiração. Regina Mills, afinal, era a cópia fiel de Lana Parrilla e ele podia ver isso com seus próprios olhos. Passeavam pelos detalhes de seu rosto, pelos seus cabelos e até pelo seu corpo, o que a deixou incomodada, fazendo-a cruzar os braços deixando evidente sua irritação.
— Tu és Regina Mills... — finalmente ele se pronunciou, com um sorriso confiante em seu rosto. — Fico contente em ter vivido para ver-te outra vez.
— Sabes quem eu sou, mas não sei quem tu és. — ele se sentou numa cadeira, em frente a uma mesa, e fez um sinal em autorização para que a mulher se sentasse do outro lado. Não conseguiu controlar o riso ao ouvir aquelas palavras que ela acabara de dizer. — Sabes quem sou, fizeste um alvoroço onde moro, e chegas como se nada tivesse acontecido! Não estou com muita paciência para formalidades, tratando-se de seja lá quem tu for.
— Senhorita Mills, colabore conosco, eu lhe peço apenas mais uma vez. — o padre pediu.
Regina sentou-se e cruzou os braços, direcionando seu olhar para o padre logo após o pedido que o mesmo havia feito. Gold perguntou-se de onde aquela jovem, que há alguns anos era medrosa, havia encontrado tamanha coragem de enfrentá-los; justamente eles quem lhe feriram no passado. Talvez, somente talvez, Regina Mills e Emma Swan estivessem se fortalecendo apenas por de conhecerem.
— Vejo que tens uma personalidade diferente. — ele disse, virando o olhar para Gold, referindo-se ao fato de que ela era parecida, mas, ao mesmo tempo, diferente de Lana. Lana jamais levantaria a voz para ele, uma vez que ela era amedrontada pelos homens da ordem, já Regina mesmo que tivesse sido raptada continuava a se opor a tudo. — Pois bem, chamo-me Robin Locksley Mills, e estou aqui para ter uma única conversa contigo.
— Senhor Locksley, é isso que pretendia conversar comigo? — a morena perguntou soltando uma risada debochada, fazendo com que o homem apertasse as próprias mãos em tentativa de permanecer sob controle. — Não estou disposta a ouvi-lo se tudo o que tens a me dizer são mentiras. Eu sou a ultima Mills viva!
— Sim, de fato, és a última Mills viva. — ele reforçou, estalando os lábios no final de sua resposta, enquanto brincava com a caneta tinteiro.
Regina Mills arqueou suas sobrancelhas por ouvir aquela resposta, iniciando seu olhar analisador. Não, aquele homem não era um parente seu, pois todos os seus haviam morrido e nunca ouvira falar de outro Mills. Os olhos azuis não era algo que os Mills carregavam, uma vez que todos possuíam cabelos negros e olhos castanhos.
O homem também a analisava, completamente desacreditado por seu plano estar dando certo. Aquela mulher era totalmente idêntica à mulher que tanto amou, mas que fora roubada por Jennifer Morrison. Entretanto, a personalidade era totalmente diferente, o que fazia com que seu interesse aumentasse por aquele ar misterioso que Regina possuía.
— Considere-se minha mais nova melhor amiga. — ele disse.
— Diga-me de uma vez, meu melhor amigo, o que queres conversar comigo? Tenho que me apresentar na Universidade e não gostaria de estar ausente. — Regina foi direta, enfatizando a palavra “melhor amigo”, enquanto inclinava-se mais para perto do homem, encarando-o com sua expressão de quem não estava afim de muitas delongas.
— Hm, és estudada. — ele repetiu mais para si, que para ela, porém a mais nova não respondera a sua tentativa de simpatia. Aquele lado que ela acabara de mostrar era parecido com Lana, fazendo-o crer que talvez poucas características de Lana se materializaram na personalidade de Regina. — Vejo que não queres que eu gaste pouco de nosso tempo conversando. Pois bem, a esta hora as universidades estão todas fechadas, minha querida, mas fiques tranquila... Terei uma conversa com seu professor sobre tua falta.
— O que?
— Meus amigos têm observado teus passos, Regina. — explicou seriamente afim de mostrar que era ele quem tinha poder naquela sala. Ele era o chefe de todos aqueles homens. — A primeira mulher a se destacar em uma Universidade. Gostas de afrontar a tradição da sociedade... Desde estar solteirona e estudando, até a parte de estar apaixonada por outra mulher.
Regina esbugalhou os olhos com tal informação, fazendo com que Robin Locksley Mills percebesse que de fato ela e Jennifer já haviam se encontrado – o que não foi surpresa para o mesmo. De fato, Regina estava apaixonada e ambas possuíam a ligação de suas vidas passadas.
— O que? De onde tiraste essa ideia? — indagou alterada.
— Pediste para que eu fosse direto ao assunto... Então, Senhorita Mills, não precisas mentir para mim. Sei muito bem de teus sentimentos pela mulher de cabelos dourados.
A morena sentira um nó formar em sua garganta, talvez indicando que ela estava prendendo seus sentimentos naquele momento; prendendo toda a vontade de gritar. Estava diante de pessoas que provavelmente a levariam para algum julgamento da sociedade... A isolariam, pois era impossível interná-la já que a mesma não tinha parentes vivos para autorizarem.
— E estão aqui para me julgar? — perguntou levantando a cabeça, sem demonstrar medo, olhando-o nos olhos.
— Talvez. — ele disse, pensando nos métodos de punição que usavam no novo século. Interná-la talvez fosse uma excelente opção. — Entretanto, podemos deixar teu julgamento de lado, Senhorita Mills.
A morena arqueou uma de suas sobrancelhas, analisando a expressão séria do homem. Ela pôs a mão abaixo do queixo e inclinou-se, descansando o cotovelo sobre a mesa de madeira, mostrando-se interessada. Afinal, se ela fosse a julgamento jamais viveria ao lado de Emma Swan, e provavelmente iriam atrás da loura para julgá-la também.
— O preço que deves pagar para que não vá a julgamento é entregar Emma Swan. — naquele instante ela deu um salto para trás, com seus olhos esbugalhados em choque. Encarou-o por um instante, estremecendo diante ao olhar vitorioso que possuía naqueles olhos azuis. — Emma Swan é muito perigosa e procurada pela igreja, Senhorita Mills.
— Não! — ela esbravejou, levantando-se da cadeira, fazendo com que todos os homens encapuzados ficassem atentos a qualquer movimento que ameaçasse fazer. — Eu não posso fazer isso! Emma não é perigosa e eu não irei entregá-la!
O homem jogou o corpo para trás, apoiando-se todo na cadeira, enquanto tamborilava seus dedos sobre a madeira nova da mesa.
— Eu sabia que negaria, minha jovem. Mas, se negares, além de ser julgada, estarás sendo cúmplice de todos os crimes que aquela mulher cometeu.
— Pare! — ela gritou, tentando tampar os ouvidos com as mãos, enquanto sua respiração estava acelerada e as lágrimas começavam a cair. — Chega de mentiras!
— Então, peças para que a Senhorita Swan seja sincera... Vejas com teus próprios olhos. — ele se levantou e caminhou até um quadro coberto por um pano, descobrindo-o e tendo toda a atenção de Regina. Em seguida, enquanto a mais nova se aproximava do quadro, ele pegou um livro antigo, tentando procurar a página certa.
Os orbes castanhos não podiam acreditar em tudo o que estava diante de seus olhos. Deslizou os dedos trêmulos sobre a tinta seca na tela, dedilhando os dedos sobre o desenho de si mesma. Aquela, sem sombra de dúvidas, era ela trajando vestes nas quais jamais se recordara de tê-las posto. Ainda em descrença, analisou a data em que o desenho foi feito, contando que fora pintado há mais de quatrocentos anos.
— Por quê estou aqui? Por quê Emma está ali? Por quê há uma criança ali?
— Vejo que a Senhorita Swan não te contou a verdade. — Robin disse, tocando em seus ombros.
— Qual verdade? — ela indagou.
O homem abriu o livro, mostrando uma página em que Emma estava retratada com couraça protegendo seu corpo e uma espada em mãos, montada num cavalo negro.
— Jennifer Morrison foi a maior guerreira que tivemos em toda a história. — ele afirmou. — Ela era aliada da Ordem do Dragão, mas cometeu erros. Após a esposa, Lana Parrilla, enlouquecer e tirar a própria vida, a mesma também enlouqueceu. Foi amaldiçoada à imortalidade, e desde então vagou sob as trevas, alimentando-se da vida humana. Por isso a mantivemos presa por séculos, até libertarem aquele demônio. Hoje, aquele demônio quer o que lhe foi tirado: o seu amor, no caso, tu.
— Espera mesmo que eu acredite nisso? — a morena piscou três vezes, tentando despertar-se de qualquer loucura que estava escutando, rindo sem humor.
— Espero que analise os desenhos, minha jovem. Jennifer Morrison casou-se com uma mulher idêntica a ti, por isso nessa realidade ela se apaixonou por ti. Jennifer teve duas filhas, uma em que criara com a esposa e outra que criara para a guerra. — os orbes castanhos voltaram para o quadro, para a criança de cabelos dourados e ondulados. — Essa se chamava Alice, a menina que ela criou com a esposa.
— É impossível! O casamento entre duas mulheres não é permitido, imagine três séculos atrás.
— Para uma pessoa influente e protegida não é impossível. Ela era a protetora da Romênia, então ninguém ousou protestar. Os inimigos de Jennifer atacaram o castelo e mataram todos os que ela amava, e a igreja a amaldiçoou por todos os pecados. A maldição foi a sentença sobre ela. — Regina escutava atentamente, enquanto tentava ligar aquelas informações com tudo o que Emma havia lhe dito sobre seu passado.
— Usaram magia negra contra ela? — levou as mãos entre seus cabelos, ainda rindo sem humor. Era muita coisa para acreditar em um único dia. — Que diabos de pessoas de igreja sois vós?
— Ela enlouqueceu após algumas décadas sem a esposa... Massacrou pessoas, colocou terror em guerras que enfrentou. Por isso, a aprisionamos. E até hoje é conhecida como Drácula, aquele que foi criado pela Ordem do Dragão.
— Drácula é uma lenda. — ela sussurrou.
— Isso porquê o tempo em que Drácula atormentou foi há séculos e nós trabalhamos muito em mantê-lo em sigilo, assim como sobre ele ter sido uma mulher. Quero que a entregue para nós. — ele enxergava o desespero emitido sobre os orbes castanhos, um misto de descrença e medo. — Lembre-se: há outros iguais ela. Esses demônios noturnos continuarão vivos enquanto ela viver, pois se matar a criadora todos eles morrem.
— Por quê eu deveria fazer isso? Não há provas contra Emma, somente a tua palavra.
— Perguntes sobre o passado, Senhorita Mills. Haverá fatos que hão de bater com tudo o que eu disse. — enquanto ele falava, duas pessoas encapuzadas trouxeram uma pessoa, colocando-a próxima ao homem. — Essa é a tua missão. Por todos esses anos os descendentes dos antigos membros da Ordem aguardaram o momento em que as palavras se cumpririam... O dia em que a única pessoa que poderia derrotar Jennifer nasceria, uma cópia de Lana.
— Então eu existo somente para matá-la? — a jovem perguntou com a voz embargada e os olhos marejados, observando-o assentir com a cabeça. Por muitos anos pensou que seu propósito na terra era o de ser uma pessoa lembrada, uma pessoa que salvava vidas, mas tudo o que estava vendo comprovava o contrário. Ela era parte de um plano de renascer em outro século e matar a pessoa que amava e, aparentemente, estava dando certo. — Não... Eu não posso ser uma mera cópia de alguém que nem sei quem é. Eu não sou parecida com esta mulher e Emma me ama por quem eu sou. Sou Regina Mills, a primeira médica estudada. Não sou essa Lana Parrilla a quem se referem.
O homem virou-se para a pessoa que seus homens trouxeram, ao mesmo tempo em que acariciava a face, enquanto Regina Mills observava de longe. Seus olhos analisavam um semblante assustado, fazendo-a crer que haviam torturado outra pessoa inocente.
— Ainda tort... — calou-se em espanto quando o homem apertou a pessoa contra seu corpo, mordendo o pescoço da mesma enquanto gritos esganiçados escapavam da garganta da vítima. — O quê? Estás louco! Solte-o! — correu para perto daquela cena, acertando o “mestre” com alguns tapas. — Irá matá-lo! — gritou entre soluços por ver uma pessoa morrendo em sua frente, e não poder fazer absolutamente nada com seus conhecimentos. — Pare! — sentiu um baque contra seu corpo, sendo jogada contra a parede após um tapa daquele monstro.
O som do corpo pesado e sem vida caindo sobre o chão fez com que o pânico retornasse ainda maior. Ela podia escutar seus próprios batimentos cardíacos quase rasgando seu peito, enquanto a respiração parecia falhar a cada passo que aquele ser ensanguentado dava em sua direção. Procurava ar, mas não o encontrava, fazendo-a acreditar que estava morrendo por alguma crise de desespero; e se não morresse pelo desespero, morreria da mesma forma aterrorizante que aquele homem.
Regina Mills nunca parou para pensar na morte. Ela sempre soube que a morte era algo inevitável que chegava até para a melhor das pessoas, mas pensar em como ela mesma deixaria o mundo nunca havia passado em sua cabeça. Principalmente que sua morte seria daquela forma... A jovem desaparecida, que teve seu pescoço rasgado por um demônio.
— Regina Mills, — o homem sentou-se sobre seu corpo e segurou seu braço com força, recebendo o olhar espantado da mulher. — preste atenção. Há muitos como eu, e só morreremos quando nossa criadora morrer. Sei que lutas para deixar as pessoas viverem, e isso vai contra tudo o que estuda e ama.
O padre Gold se aproximou com a adaga em mãos, entregando para o homem que segurava Regina.
— Leve esta adaga e use-a, golpeando o coração de Emma Swan. — Robin Locksley pediu, soltando seu braço. — Desejas mais mortes como a deste rapaz?
— Não. Eu não desejo isso... — choramingou, olhando de soslaio para o corpo caído.
— Então sabes que deve sacrificar a pessoa que amas.
— Não, eu não posso... Emma Swan é a pessoa mais pura que pude conhecer em toda minha vida. — Regina respondeu com receio por estar dizendo aquilo para os homens que puniam as pessoas. — É corajosa e me incentiva a seguir meus sonhos. Parece que... Quando a conheci eu conheci a vida.
O homem fechou os punhos e virou o rosto para esconder seu olhar furioso com aquelas palavras. Em sua mente, não sabia por qual motivo as duas versões daquela jovem sempre amavam aquela loura.
— Sei que a ama, Senhorita Mills, por isso se chama sacrifício. — ele aconselhou, acariciando a adaga e colocando-a nas mãos de Regina. — Matando-a irás salvar inúmeras vidas, Senhorita Mills. Penses sobre isso e faça a escolha certa.
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