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Capítulo 12

Arrumei a mala, colocando algumas coisas leves, biquínis e sapatos. Passaria o final de semana na praia e a previsão era de sol. Lor e Mari decidiram passar a noite aqui. Então, a Mari ficou no meu quarto e Lor no da Fê.

— Boa noite, Mari. — disse para ela, que estava deitada no colchão ao chão, antes de apagar a luz das luminárias.

A minha cabeça girou num turbilhão quando as lembranças do dia da copinha de primavera me vieram à mente, e isso me fez balançar a cabeça em negativa, recusando o trânsito de memórias. A minha mente estava me condenando, então chutei qualquer recordação que envolvia Thomas, focando apenas em Samuca, e no quanto me sentia culpada pelo momento que estávamos vivenciando.

Conforme o tempo passava, as coisas iam ficando cada vez mais delicadas, e o pior de tudo: eu era a única e exclusiva culpada. Já deveria ter contado ao Samuca, e agora que tudo começava a desmoronar, estava ficando ainda mais complicado. Sabe quando um problema começa pequeno, na verdade, minúsculo e quase imperceptível, e você acha que consegue lidar sozinha com ele? Não, você não consegue. Na verdade, eu diria que nada é tão ruim que não se possa piorar. Depois de um tempo, a situação ganha proporções inimagináveis, e sem perceber, você está se afogando num mar revolto de pequenos problemas do qual ninguém levava a sério. Eu me sentia assim. Uma completa e verdadeira idiota. Empurrar um momento difícil só porque você tem medo dele é idiotice e quase nunca tem boas consequências.

Começou com uma coisa que era para ser simples que poderia ter sido resolvida com uma simples conversa casual. Porque todo mundo tem um ex-namorado que ficou no passado.

Espantei os pensamentos tumultuados e estiquei o braço, a fim de pegar o celular do criado-mudo e desbloqueei-o, apertando os olhos com a luz intensa, que ofuscou minha visão. Coloquei na conversa com Samuca, abrindo a foto do perfil dele. Passei o dedo pela foto, como se pudesse tocá-lo, ao admirar seu rosto lindo, que estava sendo beijado por mim. Suspirei ao me lembrar daquele momento. A roda gigante em segundo plano com as luzes coloridas acesas e desfocadas. Era uma foto linda de inverno. Estava frio. Eu estava de gorro vermelho e sobretudo de lã e Samuca com uma jaqueta grossa. Nós tínhamos ido ao parque, e Davi, o noivo da Lor, registrara o momento com a câmera. Foi um dia inesquecível. Deixei uma risada escapar quando me lembrei da situação. Embora tivesse medo de altura, Samuca conseguira me dissuadir a ir no brinquedo mais alto. Então, como uma boa namorada apaixonada, eu fui, e mesmo estando assustada e morrendo de medo, foi uma das coisas mais incríveis que já tinha feito em anos. A cidade era extraordinariamente linda e iluminada daqueles 90 metros de altura, e o beijo que ele me deu lá de cima, no ponto mais alto da roda gigante, fez tudo valer a pena.

A tela mudou de repente, no momento em que a chamada foi notificada. Era ele, e o meu coração se agitou dentro do peito.

— Oi. — disse, depois que atendi, ouvindo o silêncio do outro lado da ligação.

— Eu estou morrendo de saudades e não aguento mais ficar desse jeito — disparou, precipitadamente, depois de um tempo de silêncio.

— Eu sinto muito... — balbuciei, com a voz trêmula ao perceber o quanto estava sendo idiota. — Também estou com saud...

— Shii... — Ele disse do outro lado me interrompendo, quase baixinho, pedindo o meu silêncio. — Está tudo bem. Todo mundo passa por momentos difíceis.

Sim, todo mundo passa. Mas as pessoas costumam resolver seus problemas, e eu, simplesmente, resolvi que fugiria dos meus. A culpa me fez engolir a seco e ficar uns segundos em silêncio.

— Nós precisamos conversar, Samuca. — Eu disse com boa dose de receio no timbre. Isso não poderia mais se prolongar.

Ele suspirou do outro lado da linha e o silêncio se tornou denso, quase sufocante por um tempo.

— Está tudo certo para amanhã? — Ele perguntou, dessa vez com menos agitação. — Espero que você não tenha desistido...

— Não — Respondi, numa risada espontânea. — Claro que não.

— Então nós vamos ter tempo... — Ele respondeu, compreensivamente. — Essa viagem vai nos fazer bem.

— Vai sim. — Confirmei, acenando com a cabeça como se ele pudesse ver.

— Eu te amo. — Ele disse com a voz rouca e grave.

As palavras dele reverberaram no meu ouvido, e o meu coração estremeceu com a afirmação. Eu também o amava. Amava demais e me sentia horrível pela confusão.

— Eu também te amo. — disse com franqueza, suspirando com o turbilhão de sentimentos.

Deixei um sorriso formar nos meus lábios e abaixei o celular da orelha quando ele encerrou a ligação. Mas não demorou muito para que outro barulho roubasse a minha atenção. Seguidos tilintares de notificações de mensagens irromperam o silêncio. Um... Dois... Três... Quatro...

No quinto, eu puxei a almofada que estava no pé da minha cama e joguei em direção a Mari.

— O que é isso? — Indaguei.

Vi quando a silhueta da Mari se sentou na cama e suspirou ruidosamente. Ela estava sem paciência para o que estava acontecendo, e poucas coisas a faziam perder a paciência.

— É o idiota do Léo.

A Mari costuma ser uma pessoa tranquila, tímida, que dificilmente levanta o tom de voz e não te o hábito de reclamar. Ela procura ver o lado bom das coisas, e só fala se falarem com ela. Super paciente e companheira.

— Porque você não o responde? — Perguntei, sentando-me na cama.

Ela se levantou do colchão e veio na minha direção ao arrastar o travesseiro no chão consigo.

— Eu já te disse. — Ela jogou o travesseiro ao lado da minha cabeça, e praticamente resmungou as palavras — Ele é um idiota — Declarou, e o peso dela acomodando-se ao meu lado na cama fez o meu corpo subir por alguns instantes — e eu vou deixar para lá.

Outra mensagem, e a tela do celular acendeu, iluminando o rosto triste dela.

— Oh! Mari... — disse num suspiro.

Ela segurou o celular. Um Iphone dourado e encarou-o com hesitação.

— Você pode, por favor, ler e apagar? — Ela perguntou, estendendo o celular para mim.

— Tem certeza? — Perguntei ao pegar o celular da mão dela.

— Tenho. Eu não quero ler, porque se fizer isso, vou morrer de vontade de responder e ele não vale o meu tempo...

— Você estava tão feliz... — Contra argumente.

Ela coçou a cabeça antes de dizer.

— Ele é muito imaturo, sabe... — As palavras dela ressoaram num fio de voz.

Fixei meu olhar na tela de conversa e li as mensagens.

23:41 "Mari, nós podemos conversar?"

00:01 "Estou com saudade. Quer sair amanhã à noite?"

00:02 "Aconteceu alguma coisa?"

00:01 "Por que você não quer falar comigo?"

00:04 "Por favor, não me ignora"

00:13 "Ah, Mari. O que está acontecendo? Você, pode, por favor, falar comigo? Diz alguma coisa, tipo: Por que está brava?"

— Tem certeza? — Insisti mais uma vez. — Ele parece tão desesperado.

— Adolescentes, Nina... Eles são desesperados.

A Mari balançou a cabeça e eu comecei a marcar as mensagens que deveriam ser apagadas. Quando o aplicado notificou a caixa de confirmação para exclui-las definitivamente, o celular dela começou a tocar.

— Oh meu Deus! — A Mari exclamou com nítido desespero ao puxar o celular da minha mão.

Era o Léo, e eu acabei segurando firme o celular quando ela deu um tranco, tentando tomá-lo de mim. Ela forçou mais uma vez, num ato desesperado, e isso fez com que o celular caísse da minha mão e fosse parar do outro lado da cama.

Muito provavelmente o dedo da Mari deve ter esbarrado no botão de atender, porque a chamada começou a contar e o silêncio foi tão grande que nossos ouvidos puderam captar quando ele disse "Alô" do outro lado da linha.

— Ai caramba... — Mari resmungou, engatinhando na cama ao procurar o celular.

Quando ela o pegou, simplesmente apertou no botão de encerrar a chamada.

Ela rosnou algumas palavras de frustração, das quais eu não consegui compreender.

— Me envolver com você foi a pior besteira que eu fiz, e nunca mais quero falar com você, seu boboca! — Ela exclamou para o nada e depois jogou o aparelho para longe caindo, no tapete.

— Posso dormir aqui com você? — Ela perguntou.

Como resposta, apenas ergui o braço, abrindo espaço para ela se aconchegasse. Eu também estava na mesma situação e seria bom, não me sentiria sozinha.

— Vamos ser otimistas. — Divaguei, me lembrando das palavras dela.

A Mari se remexeu na cama, ficando de frente para mim.

— Com ele não tem essa. — Rebateu. — Eu não quero mais saber daquele cabeça-oca. Em duas semanas nós já nos desentendemos e ele ficou lá, de papo furado com um monte de garotas.

P

— Você sabia que a Parilla está sendo processada? — Samuca interrompeu o silêncio da viagem.

Desviei o olhar da janela e cocei o couro cabeludo ao tentar processar a nova informação.

— Não... — Respondi, franzindo o cenho.

— Pois é... Augusto e eu pegamos o caso.

Virei a cabeça e nossos olhares se encontraram rapidamente até que ele se concentrasse novamente na estrada.

— Como assim? — Indaguei, ajeitando-me e virando-me mais para ele.

— É... A Pocket abriu um processo judicial na semana passada. Eles estão acusando a Revista de usar um sistema sem licença.

— Pirataria?

— Basicamente isso, só que um pouco mais sério.

Por que a Revista faria isso? Eles tinham dinheiro para arcar com esse tipo de custo. Assumir esse tipo de risco era idiotice.

— Que sistema?

— Uma plataforma de comunicação corporativa.

Arqueei as minhas sobrancelhas ao me lembrar do sistema que habitualmente usávamos no dia a dia da empresa.

— O Lexos?

Samuca assentiu com a cabeça ao esboçar um sorriso quando percebeu que eu já tinha compreendido tudo.

— Isso é sério? — Os meus olhos se esbugalharam com a notícia. Que tipo de empresário faria isso? É burrice. Burlar o sistema e usá-lo gratuitamente.

— Pior que sim. Eles não têm a licença padrão — ele suspirou, antes de prosseguir — e a Pocket está caindo em cima desse tipo de coisa. As vendas deles despencaram, estão faturando abaixo da margem de lucro, ou seja: desesperados.

— A Fernanda me falou que o Afonso não estava administrando muito bem a Revista, inclusive, chegou a acusá-lo de roubo. Eu achei a ideia um pouco absurda de início.

— Eu não duvido. — Declarou com franqueza. — Já que, em pouco tempo pegamos vários desses tipos de problemas. — Informou, olhando a estrada fixamente. — O negócio é que pirataria é crime, e usar um sistema ilegalmente é complicado, pega mal para a imagem da Revista, fora que o valor referente ao custo do sistema estava na lista de pagamentos.

Isso me fez ficar sem palavras. Fernanda estava, sem dúvida nenhuma, certa. Afonso estava afundando a Revista e pela primeira vez, encarei a venda da Parilla como uma coisa boa.


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