Capítulo 7
Algumas lendas são contadas, algumas se tornam poeira e outras ouro .
- FALL OUT BOY.
☀
Sinto a adrenalina pulsando em minhas veias, assim como também sinto o meu coração acelerado, sem freio. Quero sair de onde quer que eu esteja, mas as minhas forças de dissiparam. Não tenho mais controle sobre o meu próprio corpo, não consigo me mover e isso me apavora.
Quero gritar por ajuda, chamar alguém, clamar por socorro, mas estou completamente imóvel. Sinto uma dor latejante na cintura, no lado direito. É como se alguém tivesse cortado, como se eu tivesse me cortado. O cheiro de sangue está pelos arredores e sei que é o meu, sinto que é o meu sangue.
Em um sobressalto eu acordo. Respiro fundo puxando todo o ar do ambiente, como se eu estivesse sem respirar há muito tempo, surpreendo-me ao sentir uma pontada de dor. Passo a mão na testa e percebo que ela está molhada, seco-a no meu moletom e ao fazer isso um lampejo de dor reflete por todo o meu corpo. Solto um grito estridente e a minha irmã levanta assustada, uma delas pelo menos. Júlia, a mais nova, tem o sono pesado.
— Laura? Está tudo bem? — Natália pergunta, entrando no meu quarto junto com o meu pai.
Seus semblantes refletem o medo e preocupação que sentira e os dois parecem ter acordado agora.
— Não sei...
Levo a mão por dentro do moletom lilás, percebendo que ele está molhado. Passo a mão em um lugar perto da cintura e torço para ser suor, mas a dor surreal que se apodera da minha cintura até uma parte da barriga não pode ter sido causada pelo suor.
— O que está acontecendo? — Thiago pergunta aparecendo no batente da porta, sonolento. Ignoro-o enquanto o meu pai diz alguma coisa. Crio coragem e olho para a ponta dos meus dedos, começando a tremer instantaneamente. Há sangue ali, meu sangue.
— Laura, o que é isso? — Meu pai pergunta, preocupado, aproximando-se.
Levanto-me e sinto as minhas pernas fraquejarem, fazendo-me sentar outra vez. Mas o que é que está acontecendo comigo?
— Não sei, pai — respondo-lhe com a voz fraca.
Minha cabeça começa a rodar e tudo o que quero é chegar até o espelho, tirar a conclusão que mais temo agora.
— Isso no seu moletom é sangue? — Thiago pergunta, preocupado e vejo diversão brilhando em seus olhos. — Acho que alguém vai precisar de absorventes.
— Eu não estou menstruada, idiota!
Levanto de uma vez, usando a cama de apoio e chego até o espelho, tirando o moletom com dificuldade. Todos ficam perplexos ao ver que a minha blusa branca está completamente manchada de sangue.
— Ah. Meu. Deus — balbucia Duda, pausadamente, pela primeira vez hoje, descendo da cama de cima.
— Laura, o que você fez? — Natália questiona, horrorizada.
Coloco a mão na boca e meu pai me ajuda a levantar a camiseta até a altura dos meus seios, deixando apenas a barriga à mostra. Sinto-me cada vez mais fraca e confusa. Quando respiro dói e noto que inspiro e expiro cada vez mais lentamente.
— Natália, ela está pálida — Duda ressalta, perplexa.
— Eu não fiz nada, Nat — respondo e olho o reflexo do corte no espelho, ficando boquiaberta.
Está bem feio e parece ser fundo, ele vai da cintura até o começo da barriga, arde tanto que eu mal consigo respirar. Percebo que o sangue não para de escorrer, sujando a minha calça e pingando algumas gotas no chão. Será que é por isso que eu me sinto tão fraca, como se eu pudesse cair e apagar a qualquer momento? Porém, não pode ser. Era um sonho, não era? Uma paralisia do sono, por isso eu não consegui me mexer, não foi?
— Thiago, pega as chaves do carro! Natália, os documentos dela! — Meu pai ordena com desespero em sua voz.
Natália corre em busca dos documentos, ao perceber que a situação é grave e sinto tudo rodar.
— Eduarda, você acalma a Júlia e a Nina junto com o Thiago caso elas acordem.
— Pai, o que está acontecendo? — Consigo perguntar, tentando soar calma, mas o desespero na minha voz me entrega.
Sinto as minhas pernas fraquejarem e caio de joelhos no chão.
Consigo sentir o meu pai passando um dos braços atrás das minhas pernas e o outro atrás das minhas costas, pegando-me em seu colo. Ouço o choro de alguém, mas acho que é o meu choro. Meu pai começa a andar em passos rápidos e precisos, murmurando um: "vai ficar tudo bem, meu amor.", mas eu não sei se devo acreditar nisso.
Eu só quero saber o que aconteceu, só isso. Era um sonho, eu tenho certeza, mas não consigo me lembrar agora.
Tudo começa a se transformar em um borrão e vozes de fundo. É como se a minha mente estivesse bem longe. Escuto alguém dizer que eu não posso fechar os olhos, que preciso resistir e ficar acordada, mas as minhas pálpebras pesam toneladas e preciso fechá-las, só assim a dor passará.
Já não sinto mais nada, incluindo a dor lancinante no meu corpo. As vozes estão cada vez mais distantes, e a tentação de fechar os olhos e dormir está cada vez mais forte. Sinto algo gelado pressionar as minhas costas, talvez seja uma maca ou o banco do carro. Estou confusa.
Decido ceder e tudo escurece de vez. Os borrões acabam e as vozes também. Um abismo se instala e eu gosto dele, traz paz e tranquilidade. Até que tudo para de vez, incluindo o abismo.
☀
Abro os olhos e me arrependo no mesmo minuto. Antes mesmo de os meus olhos se acostumarem, o cheiro de desinfetante entrega que estou em um hospital.
Memórias da madruga surgem em minha mente como um raio, fazendo-me levar a mão até a cintura por reflexo. Olho para baixo e vejo que estou com aquelas camisolas esquisitas de hospital, o que dificulta olhar se há ou não um corte na minha cintura. Porém, se tudo não tivesse passado de um pesadelo eu não estaria aqui. Isso é fato.
Tento me sentar na cama, mas o ardor me impede. Olho ao redor e percebo que eu estou sozinha, tento decifrar se isso é bom ou ruim, mas no momento eu não consigo pensar em nada. Nada que não seja o sonho estranho, a paralisia do sono, a dor, o sangue, o suor.
A porta do quarto abre e o meu pai entra junto com uma mulher, presumo que seja uma enfermeira. O lado bom, se é que existe um, é que o plano está em dia. Sem despesas pelo que aconteceu ontem, um grande alívio.
— Como se sente?
Meu pai afaga meus cabelos e noto o alívio preenchendo os seus olhos castanhos escuros, sei que lhe dei um susto e tanto.
— Como se tivesse levado uma facada e sido costurada brutalmente depois — brinco.
Meu pai ri, mas em questão de instantes sua expressão passa de brincalhona para séria.
— Preciso que me conte o que aconteceu, Laura.
Suspiro, arrependendo-me de fazer isso. Começo a contar tudo para ele, desde o sonho estranho até a possível paralisia.
— Isso é impossível, filha — ele murmura, passando a mão pela barba recém feita.
— Eu sei, mas eu não me machuquei, pai — esclareço antes que ele pense que eu sou uma suicida maluca. Jamais faria algo para me machucar, por vários motivos.
— Natália disse que você poderia ser sonâmbula. — Ele diz olhando a janela que está coberta por uma persiana aberta, dá para ver o reflexo dos carros velozes daqui.
— Pai, eu não sou sonâmbula. Nunca fui. Por que isso começaria agora?
— Não sei. Os médicos disseram a mesma coisa, mas eles também sugeriram outra coisa...
— O quê? — Pergunto, confusa.
— Que alguém pode ter tentado machucar você. — Ele suspira e encara os meus olhos, dessa vez, vejo pânico nos seus.
— O quê?
Ninguém tentaria me machucar, ninguém tem motivos para isso.
— Por que eles disseram isso?
— Porque talvez você não conseguisse fazer esse estrago sozinha, filha.
— Ah... — é tudo o que consigo falar. Silêncio. O bom e velho silêncio toma todo o cômodo, um silêncio estranho. — Onde a Natália está ?
— Ela foi para casa ver se está tudo bem por lá e trazer uma troca de roupas para você.
Meu pai ficou conversando comigo sobre a quantidade de pontos que eu levei e também disse que eu teria que conversar com o terapeuta do hospital antes de ir para casa. Avisou que falou com o coordenador responsável pelo IFSC que estudo e que não teria problemas se eu faltasse pelo tempo que os médicos sugeriram.
Tentei dormir mais um pouco e sugeri que ele fosse até a lanchonete do hospital comer alguma coisa ou tomar um café, é sempre bom. Minutos depois que ele saiu e eu fechei os olhos para "descansar", fui surpreendida pelo barulho da porta sendo aberta outra vez. Ao ver quem era, eu me surpreendi mais ainda. Lucas está bem aqui, na minha frente, com um buquê de girassóis.
Eu nunca ganhei flores, nem uma catada do chão. Estou até emocionada. Lucas é um amor de pessoa mesmo. Sorrio tanto que as minhas bochechas doem e ele caminha até a cama de hospital, abrindo os braços e me dando um leve abraço para não me machucar.
— Thiago respondeu as mensagens do grupo ontem à noite. Fiquei muito preocupado com você, Laura.
Ele sorri, olhando em meus olhos e me entregando as flores.
— Obrigada pelas flores e por vir até aqui, não precisava — agradeço com um sorriso de canto a canto.
— O que aconteceu?
Lucas se senta na poltrona ao lado da cama e se acomoda da melhor forma que consegue, esperando que eu lhe conte. Não deixo de notar o brilho de preocupação que ainda não saiu de seus olhos.
— Tive um sonho estranho, na verdade, acho que era um pesadelo. Depois, não consegui me mexer, uma paralisia do sono talvez. Então eu acordei e percebi que havia algo errado, foi aí que eu vi que eu estava coberta pelo meu próprio sangue e que uma dor insuportável me consumia. Depois eu apaguei e acordei aqui.
Percebo que ele fica sem cor e isso me preocupa mais ainda. Lucas está perplexo, como se tivesse acabado de viver algo completamente insano.
— O que? — Ele sibila desacreditado. Eu sei que é loucura, mas nem os médicos ficaram desse jeito quando o meu pai contou.
— Eu sei que é maluco, mas eu estou bem. Depois de 10 pontos, só preciso me recuperar e não fazer esforço — continuo e ele fica ainda mais perplexo.
— Que bom que você está bem...
Ele sorri, mas ainda está assustado. Ele parece estar em conflito consigo mesmo. Meus pensamentos vão direto para Elena, por que só ele veio me ver ou respondeu as mensagens?
— Cadê a Elena? Ela foi para o IFSC? — Pergunto e ele fica ainda mais pálido, parece que vai desmaiar a qualquer momento. — Lucas, o que aconteceu? Você está me assustando.
— Isso é impossível... — ele murmura.
— O que é impossível?
— Elena também está aqui — ele responde e eu o encaro.
A preocupação me invade e eu franzo o cenho, agora eu estou assustada de verdade.
— O que aconteceu? Ela está bem?
— Aconteceu a mesma coisa, Laura. Um corte profundo durante a madrugada, perda de sangue, desmaio, pontos e repouso. — Ele revela e olha no fundo dos meus olhos, espantado.
— O quê?
Já é estranho estar em um hospital sem saber bem o que aconteceu para eu vir parar aqui, mais estranho ainda é descobrir que a minha melhor amiga também está no mesmo hospital que eu, com o mesmo problema.
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