Capítulo XXXVIII
Filha,
Já escrevi esta carta por diversas vezes, imaginando como seria a coroação da minha princesa.
A minha primeira princesinha.
Quero que saiba que você está pronta, Cecília. Eu tive certeza que estava desde que você era pequena e pediu para segurar a minha coroa. Suas irmãs quase a deixaram cair no chão, mas você a segurou como se fosse o objeto mais precioso que existisse.
Desde aquele dia, eu sabia que você compreendia a seriedade e as responsabilidades que vinham com ela. Você não a via como um acessório brilhante, mas como um símbolo de algo muito maior.
Eu e sua mãe possuímos um imenso orgulho da mulher que você se tornou. Sei que não fui o pai perfeito, mas se fui responsável por ensinar e ajudar a tornar quem você é hoje, meu papel já foi cumprido. Antes de ser rei, eu sou seu pai, e nada me alegra mais que isso. Trocaria, se fosse necessário, o Palácio inteiro e tudo o que nós temos por você e suas irmãs, sem pestanejar.
Essa é a característica mais importante que um verdadeiro líder deve possuir. Um coração puro e verdadeiro, que se importa com seu povo e principalmente, que saiba ser justo e íntegro. Não importa o que aconteça, eu estarei ao seu lado. Se lembre sempre:
Em dias de escuridão, ouça o seu coração.
Tudo se vai, menos o amor do papai.
Fecho a carta e não me surpreendo ao perceber que estava chorando com ela. Levo o papel ao peito e sinto mamãe e minhas irmãs me abraçarem. Elas estavam certas. Meu pai havia me deixado um legado, e eu o honraria. Ele sempre estaria em meu coração, e eu me decidi, sob aquelas palavras, que daria o meu melhor todos os dias para honrar o trono, que seria para sempre, do melhor rei que já existiu.
Eu jamais permitiria que o nome de meu pai fosse esquecido, e enfrentaria o que viesse para proteger Beaumont. Naquele momento, eu enxuguei as lágrimas e sorri, voltando a ter a certeza de que eu iria atrás do que sempre sonhei.
A minha coroa.
Mamãe tinha razão. A reunião começou com os nobres me olhando com repúdio, e terminou com ambos apoiando a minha coroação. O rei de Áquiles foi o que dera mais trabalho, jogando sujo ao ressoar em alto e bom som que uma mulher não possuía capacidade de sustentar um trono sozinha.
Usei o argumento que minha mãe me dera para responder à altura, o relembrando que ele iria depender de uma mulher para alimentar seu próprio povo já que o mesmo não possuía pulso suficiente para isso. Ele não soube o que responder.
Após essa cena, ninguém mais ousou levantar a voz para tentar me diminuir ou desmerecer a minha capacidade. Depois da carta de papai, eu havia me lembrado da força que tinha. Da força que o melhor rei que já existiu havia me ensinado a ter. Meu pai acreditava em mim, nada mais importava.
Além disso, ninguém ousara tocar no nome de Apolo, imaginando que eu havia desistido dele. Suspirei e sorri, sabendo que enfrentaria qualquer coisa futuramente para que ficássemos juntos.
Em relação ao meu soldado, a cada dia que se passara meu coração ficava mais apertado. Eu não conseguia mais dormir direito sem a sua mão quente segurando a minha, sem saber se ele estava bem. Quando a quinta noite se passou, desejei ter ido junto.
Como ir apenas à casa da mãe dele poderia levar tantos dias? E se tivesse acontecido alguma coisa? Minha mente não deixava de me alertar que havia uma mínima possibilidade de que Oliver estivesse vivo e à solta.
— Ceci? — Violetta chama da porta da biblioteca. Empurro o terceiro livro administrativo na mesa e a olho, sabendo que não estava mesmo conseguindo prestar atenção sem pensar, a cada segundo, em como Apolo estava.
— Oi Vi, entre.
— O que está fazendo aqui? — ela se aproxima segurando algo nas costas, e arqueia as sobrancelhas diante a bagunça de papéis que eu havia formado. — Aqui é horrível para você resolver estas coisas. Tem o escritório do papai...
— Eu ainda não estou preparada para ir lá. — confesso e solto uma respiração, reparando que pela primeira vez, mesmo que de forma indireta, Vi havia falado sobre ele. — Sinto como se ele ainda estivesse sentado no mesmo lugar me esperando aparecer para ajuda-lo, entende?
— Entendo. — ela sorri fraco e me estende um bilhete. — Mandaram te entregar. Você irá gostar. — ela se vira e começa a sair, até que para na porta. — A propósito, tenho certeza que papai gostaria que você estivesse lá.
— Eu irei conseguir. Só preciso estar... pronta. Obrigada, Vi. — sorrio e a vejo assentir, fechando a porta atrás de si. Abro o bilhete e sinto minha respiração acelerar ao reconhecer a letra de Apolo e a língua de Russo.
Me encontre onde tudo começou.
Sorrio e viro o bilhete, encontrando em letras pequenas uma outra frase que fez meu coração se aquecer.
Eu disse que voltaria para você.
Deixei tudo que estava na biblioteca e saí correndo esperando encontra-lo. Ele havia chegado. Seguro firme o bilhete descendo as escadas e paro no jardim, tentando me lembrar o que a frase significava.
Me encontre onde tudo começou. Corri até o estábulo e me suspirei triste ao perceber que ele não estava lá. Meu guarda substituto não me seguiu, fato este que estranhei, mas ignorei. Hoje, eu sabia que era capaz de me defender sozinha.
Encaro os jardins do Palácio e volto a refletir sobre o bilhete. Os nossos treinamentos haviam começado no estábulo. Do que ele estava falando? O nosso primeiro beijo foi no labirinto..., mas não sentia que ele estava falando de lá. Onde tudo começou, onde tudo começou... sinto minha mente girar.
Sorrio ao finalmente entender, andando o mais rápido que podia até o fundo do castelo. Quando cheguei ao banco em que eu o vira pela primeira vez, senti meu coração se acelerar ao encontra-lo com um uniforme diferente, preto com detalhes dourados, semelhante ao que um verdadeiro príncipe usaria. Me joguei em seus braços e ele me girou, em um abraço que eu jamais gostaria de sair.
— Você chegou. Estava começando a ponderar infinitas possibilidades...
— Ei, estou aqui. — ele me beija, extirpando pouco a pouco toda a saudade que eu sentia. — Cada segundo que passei longe de você foi uma tortura, minha princesa.
— Então você tem que parar de fazer isso. — sorrio em seus lábios e sinto ele se mexer, puxando o que parecia ser uma espada enrolada na bainha.
— Trouxe um presente para ti.
— Ainda falta um certo tempo até o dia de meu aniversário. — sorrio e seguro, sentindo meu coração se aquecer.
— Não preciso de data para tentar te fazer sorrir. — ele coloca os braços para trás em sua clássica postura perfeita, e balança a cabeça me incentivando a abrir. — Espero que goste.
Puxo o cabo da bainha e me surpreendo ao ver uma linda espada de punho dourado, cravada com a inicial de meu nome e uma coroa.
— Pedi ao ferreiro que fizesse com Dimeritium, um metal mais leve e ao mesmo resistente. — ele se coloca por trás de mim e me ajuda a segurar a espada da forma certa, com a mão por cima da minha. — A lâmina é fina, você irá usar a ponta para perfurar o inimigo.
— Apolo... ela é... perfeita. — digo emocionada.
— Aprendeu como se segura? — ele sussurra em meu ouvido e eu sinto um arrepio percorrer meu braço.
— Si-sim.
— Ótimo, vamos ver como você se sai com ela. — em uma mudança brusca de movimento, Apolo se afasta e puxa a sua espada, partindo-a para cima de mim. Consigo me desviar do golpe a tempo.
— Isso foi... imprevisível.
— Ataques nunca acontecem quando você espera. — ele tenta novamente e eu rebato com a minha, perdendo rápido a força do braço. — Nunca deixe transparecer sua fraqueza.
— Quem disse que eu estou fraca? — saio rápido da posição da forma como ele havia me ensinado e miro a lâmina da espada no dorso da sua coluna. Parecendo prever minha ação, Apolo se vira e a minha espada fica presa na viga de madeira que estava atrás dele. Ouço o som gostoso da sua risada invadir o ambiente enquanto eu puxava a minha espada de volta.
— A minha parte preferida de nossos treinamentos sempre foi observá-la ficar vermelha de raiva.
— Escute aqui soldado Carter... — começo a dizer e paro no susto ao me deparar com Apolo de joelhos, colocando a sua espada no chão. — O que...
— Controlar o que eu sinto por você foi a maior batalha que já tive que enfrentar, Cecília, e eu realmente não me importo mais em perder.
— Apolo...
— Eu fui atrás do meu pai. — ele confessa e eu abri e fechei a boca, sem saber o que dizer. — Reivindiquei meus documentos que comprovassem minha descendência nobre, e consegui sair de lá sem soca-lo por tudo que ele fez. Pelo menos uma coisa ele pôde fazer por mim na vida, me dar a chance de ficar com a mulher que eu amo. — ele retira algo do bolso, e eu prendo o fôlego ao observar um anel com uma pedra rara de diamante rosa. — Ninguém jamais escreveu nos regulamentos que uma princesa não pode se casar com um príncipe de um reino que já foi extinto, as cláusulas apenas exigem que seja um nobre, de sangue real. Eu sei que não sou um príncipe de verdade, mas eu daria qualquer coisa para me tornar um para você. Em meio a dor, eu quero ser aquele em que você pode se apoiar. Quero que chore ao meu lado, sorria ao meu lado... em qualquer circunstância minha princesa, eu quero estar com você. Permaneceria sendo o seu guarda pelo resto de nossas vidas se esta fosse a única alternativa de continuar lhe vendo todos os dias, mas eu a prometi que moveria céu e estrelas para que ficássemos juntos, e quero cumprir. Cecília Beaumont, aceita se casar comigo?
O olhei sentindo cada parte do meu corpo petrificar. Eu estava extasiada, como se tudo aquilo não fosse real. Apolo me fitou com as sobrancelhas erguidas parecendo nervoso com o silêncio que se estendeu, e coçou a parte de trás da nuca.
— Agora seria um bom momento para você me dar uma resposta. Este chão não é exatamente confortável... — ele começa a dizer e eu o calo com um beijo, sentindo ele se levantar e segurar a minha cintura.
— Sim. — respondo sentindo a minha voz embargada. — É claro que sim.
— Pelos reinos Cecília, você ainda irá acabar comigo. — ele sorri de lado e me beija novamente.
— Tudo o que eu mais quero é me casar com você.
— Que bom princesa, porque eu realmente não pretendia te deixar sair da minha vida.
— És um convencido, Carter.
— Será uma característica útil para o futuro marido de uma rainha.
— A propósito... para nos casarmos, além dos documentos que provam que você é da realeza, é preciso...
— Disso? — ele me interrompe e retira um broche do uniforme, deixando-me ainda mais boquiaberta. — Vosso pai me deu antes de morrer. Ele pediu que eu cuidasse de você, e que honrasse o trono que ocuparia ao seu lado. Eu tentei devolvê-lo... nunca me achei digno de receber algo tão importante...
— Apolo... — seguro em sua mão e sinto meus olhos marejarem. Não acreditava que papai havia feito aquilo por mim.
— Eu nunca pensei em assumir algo tão grande como um reino, Cecília. Eu sou um soldado, estou acostumado com batalhas e colchões duros. Não tenho educação, não sei dançar em bailes, não conheço absolutamente nada de administração política e não sei me portar com normas de etiqueta. Me questionei muito o motivo pelo qual o rei me entregou este broche. Não tenho o necessário para ser o próximo rei de Beaumont ao vosso lado.
— Eu sei o que o meu pai viu em você. — toco em seu rosto e sorrio. — Lealdade. Força. Fidelidade. Caráter. Isso é o necessário para se assumir um trono, e não conheço homem algum que tenha todas estas características como você. — entrelaço os nossos dedos e puxo a sua mão, me sentando no banco em que nos conhecemos. — Sabe, quando eu era pequena, papai me mostrou este broche e disse que só o daria ao homem que provasse a ele que era digno de mim. Fico feliz ao saber que a escolha do meu coração por você também foi aprovada pelo meu pai. Com o broche, ninguém poderá questionar a nossa união. Significa a decisão irrevogável do rei, um ato de honra e confiança.
— Eu quero ser digno de merecê-la, Cecília. Prometo me esforçar, estudar, aprender o que for preciso para tentar ser um pouco mais parecido com um príncipe que você sempre sonhou.
— Eu não quero que você mude. — aperto sua mão e encosto minha testa na dele. — Eu me apaixonei pelo ogro que você é, soldado Carter. Um guarda grosseiro e insolente que diz que eu estou parecendo uma gema de ovo quando necessário. Eu amo você, você é o homem que sempre sonhei. Apesar de que admito que este uniforme lhe caiu muito bem.
— Era o antigo uniforme real de Russo. Quis impressioná-la de alguma forma. Esse anel foi da última rainha, a antiga esposa de Vladimir. Minha mãe havia o escondido, é herança do filho mais velho, ela disse que só me daria quando tivesse certeza que eu havia encontrado a mulher certa.
— Fico feliz em receber a aprovação da minha sogra, mas sua mãe possuía este anel o tempo todo? Ela poderia ter vendido...
— A pedra não possui mais valor desde que o reino foi extinto. O diamante rosa não é encontrado a quase dois séculos, ninguém acreditaria que é verdadeiro porque não há outro para comparação. É raro, ninguém jamais terá um igual ao seu. Queria te dar algo único, minha princesa. Agora você já pode jogar fora este de palha que ainda guarda em seu dedo.
— O quê? — toco o anel já gasto em meu dedo, e balanço a cabeça em negação. — Estás louco se pensa que irei me desfazer deste anel. Para mim, ele é mais valioso do que qualquer pedra.
— Eu já disse que és a princesa mais teimosa que existe? — ele sorri de lado e coloca o novo anel em meu outro dedo.
— Já, e isso foi uma ofensa real, peço que se retire. Guardas!
— Eu sou o seu guarda, alteza. Não acredito que sou pago para escutar desaforos de uma princesa arrogante e mimada. — ele sussurra em meus lábios.
— Como é? — abro a boca fingindo estar ofendida e sorrio, dizendo a frase que agora, era perfeita. — Está demitido!
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